Jogos Vorazes - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 35
Parte 35




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Enxugo minhas lágrimas, e tento decidir por onde começar. Reparo que há uma seringa enfiada em meu braço, com apenas um restinho de liquido dentro. Olho imediatamente para minha perna, e sorrio, percebendo que está bem melhor que antes. Retiro a agulha com cuidado do meu braço, e decido que, se esse remédio foi capaz de fazer algo tão miraculoso com minha perna, irá ajudar Katniss também. Enfio a agulha em seu braço, e injeto o pouco liquido que restava. Ela dá um suspiro longo. Por um instante, penso que ela irá acordar, mas nada acontece. Consigo me levantar, com muito custo, pois todo esse tempo ora deitado, ora sentado, deixaram minhas juntas relativamente duras. Me movo devagar até a mochila de Katniss, onde encontro um kit de primeiros socorros. Acho uma espécie de gaze, que será bem útil para enfaixar a cabeça dela, e estancar o sangramento. Limpo mais uma vez seu rosto com minha jaqueta, que já está parcialmente ensopada de sangue, e enfaixo rapidamente sua cabeça. Em seguida tiro suas botas e meias que estão encharcadas. Ela está muito gelada. Consigo arrasta-la um pouco para o lado, para tira-la daquela horrível poça de sangue, e a coloco dentro do saco de dormir. Penso em ir até o lago, procurar por comida, pois a nossa está acabando, e quando ela acordar, terá que ficar descansando por algum tempo, sem poder caçar. Mas quando olho para fora, entre pequenos buracos, da parede de pedra que Katniss deve ter construído com o intuito de fechar a boca da caverna, vejo que um temporal está se formando. Logo, uma chuva torrencial começa a cair, me desanimando da hipótese de sair daqui. Goteiras aparecem por todos os lados, começo a procurar algo para proteger Katniss das gotas frias, que caem sem parar, quando acho em suas coisas, um pedaço de plástico. Depois de um bom tempo tentando fazer algo útil, consigo montar uma espécie de proteção ao redor do corpo de Katniss. Fazer tanta coisa, me deixou exausto, e minha perna está latejando. Mas, me dou por satisfeito pelo dia de hoje. Por mais que seja doloroso ver Katniss assim, desacordada, não consigo desfazer essa sensação de felicidade do meu coração. Nós podemos voltar para casa, afinal, porque ela me salvou, de novo.

– Agora eu vou cuidar de você, docinho – sussurro, pois talvez ela possa me ouvir.

Me abaixo e dou um beijo em sua testa.

Pela primeira vez, em dias, sinto que estou com fome. Muita fome. Pego um punhado de ervas, e como, me arrependendo em seguida, pois quando Katniss acordar, terá de se alimentar bastante devido à perda de sangue. Talvez essa chuva pare, e eu possa sair para procurar alguma coisa. Estico minha jaqueta e as meias de Katniss em uma pedra, na esperança que seque um pouco. Já está bem escuro, não sei se pela tempestade ou se realmente anoiteceu. Sento-me ao lado do corpo aparentemente sem vida de Katniss, desejando fazer algo para ela acordar. Coloco a mão em seu rosto e ela continua gelada. Resolvo deitar com ela, dentro do saco de dormir, para aquece-la. Não me sinto à vontade fazendo isso, pois, ela está desacordada. Mas o que mais eu poderia fazer? Envolvo seu corpo em meus braços, e a sensação de ter seu corpo tão colado ao meu, me provoca arrepios. Um calor enorme toma conta do meu corpo, e eu percebo que Katniss está menos gelada. A música começa, e eu estremeço, só de pensar que a foto de Katniss poderia estar aparecendo no céu hoje. Aperto seu corpo um pouco mais, como se isso confirmasse que ela está aqui comigo. Pelas frestas entre as pedras, vejo a foto de Clove. Eu não deveria ficar triste, mas, apesar de o tempo em que convivi com ela, não me trazer boas lembranças, não consigo ficar feliz com a sua morte. Decido que é hora de ser menos sentimental, e passar a ver esses jogos como a capital quer que nós, tributos, vejamos. O que realmente importa para mim, é tirar Katniss daqui, não vou deixar me abalar por outras mortes. Não mais. Mesmo que eu seja o causador delas.

Pensar assim, faz eu me sentir enjoado. Me concentro na sensação de ter Katniss comigo. Logo todo e qualquer pensamento ruim, some de minha mente, e eu passo o resto da noite, fantasiando, como seria maravilhoso ter Katniss tão junto ao meu corpo, pela sua própria vontade.

Já está amanhecendo, quando eu me forço a descolar meu corpo do de Katniss, preocupado, por ela não ter acordado ainda. Passei a noite em claro, acalmando ela, enquanto ela tremia, e sussurrava coisas. Não sei se ela estava sonhando, só sei que isso me preocupou muito. Sento ao seu lado, pensando o que fazer. Ela começa a tremer novamente, e sussurra algo, quase inaudível. Acho que ela disse mãe. Começo a afagar seus cabelos, e chamo seu nome da forma mais calma que consigo.

— Katniss. Katniss, você pode me ouvir?

Tudo que eu mais queria, acontece. Ela abre os olhos, parecendo momentaneamente perdida. Ela encontra meus olhos, e me encara.

Não consigo pronunciar uma só palavra, enquanto sinto a tensão aumentar.

— Peeta – ela fala, num tom de afirmação, como se estivesse constatando o fato de eu estar aqui.

— Oi — digo, aliviado. — Bom ver seus olhos novamente.

— Por quanto tempo estive apagada? — ela pergunta.

— Não tenho certeza. Acordei ontem de manhã e você estava deitada ao meu lado numa poça de sangue assustadora — conto, fazendo uma pausa, pois minha voz começara falhar. — Acho que finalmente parou, mas eu não me sentaria nem nada.

Ela leva a mão até a cabeça, instantaneamente a cor some de seu rosto. Pego uma garrafa, e levo até seus lábios. Ela bebe toda a agua, sedenta.

— Você está melhor — ela observa.

— Muito melhor. O que quer que você injetou no meu braço fez um truque. Essa manhã, quase todo o inchaço da minha perna tinha sumido – respondo, sem deixar transparecer que ainda estou magoado pelo fato de ela ter se arriscado por mim.

— Você comeu? — ela pergunta.

— Sinto muito por dizer que engoli três pedaços daquelas ervas antes de perceber que elas deveriam durar mais. Não se preocupe, estou de volta à dieta rígida.

— Não, é bom. Você precisa comer. Vou caçar em breve.

— Não tão em breve, certo? Você só tem de me deixar tomar conta de você por ora.

Ela não resiste. Eu a alimento com o pouco de ervas e frutas secas que temos, e a faço beber mais agua. Ela começa a tremer de frio, e eu tento não fazer o mesmo. Abaixo o saco de dormir até seus pés, que estão frios como gelo. Eu os massageio um pouco, e depois esfrego-os, até eles esquentarem. Ela parece um pouco desconfortável com isso, mas eu não vou deixa-la morrer de frio, depois de ter quase a perdido. Vou até suas meias, mas elas estão molhadas. Já minha jaqueta, curiosamente está seca. Eu a pego, e enrolo ao redor de seus pés, em seguida enfio o saco de dormir até seu queixo novamente.

— Suas botas e meias ainda estão molhadas e o tempo não está ajudando muito — comento.

Nesse instante o ruído de um trovão, estremece a caverna.

— O que provocou essa tempestade? Quero dizer, quem é o alvo? — pergunto, curioso em saber quem resta, além de nós.

— Cato e Thresh — ela faz uma pausa. — Cara de raposa está em seu esconderijo em algum lugar, e Clove... ela me cortou e então... — Sua voz falha.

— Sei que Clove está morta. Vi no céu noite passada — digo, desejando secretamente que Katniss não a tenha matado. Desejando que Katniss não tenha sido forçada a ter atitudes terríveis, como a que eu tive, matando aquela garota. — Você a matou?

— Não. Thresh quebrou sua cabeça com uma pedra.

Solto um gemido, sabendo que o mesmo poderia ter acontecido com Katniss.

— Sorte que ele não te pegou, também — digo, disfarçando o pavor que me acometeu, só de pensar em algo assim.

Katniss olha para baixo.

— Ele me pegou. Mas me deixou ir.

Não consigo entender o que o levou a deixa-la viva. Ela percebe que preciso de uma explicação, e começa a me contar uma série de coisas, que eu não fazia a mínima ideia. Começou contando sobre sua aliança com Rue, e sobre ela ter explodido a pilha de mantimentos dos carreiristas, ficando surda de um ouvido. Faço uma careta de dor, pois a armadilha que eu ajudei a criar, poderia ter acabado com a vida de Katniss, como eu temia. Sinto uma certa gratidão pela garota ruiva, cara de raposa, pois como Katniss disse, se não fosse ela, as minas passariam despercebidas, até explodirem. Quando ela conta sobre a morte de Rue, em consequência, a morte de Marvel do distrito 1 e os pães do distrito 11, meus olhos enchem de lagrimas por diversos motivos. Pensar naquela garotinha tão doce morrendo vitima desses jogos, pensar em Katniss, como uma assassina, igual a mim, e pensar nesse gesto de gratidão, nessa homenagem do distrito onze, faz meu coração desmanchar. Me lembro de ter decidido, não me deixar abalar com as emoções, mas saber dessas coisas, faz essa minha tarefa ser ainda mais difícil. Ela resume que tudo isso leva ao que aconteceu, de Thresh ter deixado ela viver. Ele estava pagando uma dívida.

— Ele te deixou porque não queria dever nada a você? — pergunto meio confuso, meio descrente.

— Sim. Não espero que você entenda. Você sempre teve o suficiente. Mas se você vivesse na Costura, eu não teria de explicar.

— E não tente. Obviamente sou muito burro para compreender – digo magoado, pois ela fala como se eu fosse rico. Sem saber, que não foi sempre que tivemos o que comer.

— É como o pão. Como eu nunca pareço pagar a dívida com você por aquilo.

— O pão? O quê? De quando éramos crianças? — digo surpreso, por ela achar que tem uma dívida comigo. Uma dívida por eu, numa atitude idiota que jamais esquecerei, ter jogado pães para ela, como se ela fosse um animal. — Acho que podemos deixar isso. Quero dizer, você só me trouxe de volta da morte.

— Mas você não me conhecia. Nós nunca tínhamos nos falado. Além disso, o primeiro presente é sempre o mais difícil de pagar. Eu não estaria nem ao menos aqui se você não tivesse me ajudado. Então, por que você fez, de qualquer maneira?

— Por quê? Você sabe o porquê — digo, logo lembrando, que para ela, meu amor não passa de uma mentira. Ela agita a cabeça, negativamente. — Haymitch disse que demoraria bastante para te convencer – completo, tentando mudar de assunto.

— Haymitch? O que ele tem a ver com isso?

— Nada — digo, sentindo a tristeza voltar. — Então, Cato e Thresh, hum? Acho que é esperar demais que eles se destruam simultaneamente?

— Acho que nós gostaríamos de Thresh. Acho que ele seria nosso amigo no Distrito Doze — ela diz, nervosa.

— Então vamos esperar que Cato mate Thresh, assim não teremos de fazer isso —respondo, decidido a mais uma vez, pensar apenas em Katnis, em nós. Por mais que, eu sempre seja grato a Thresh também. No quesito de dívidas, essa é uma dívida que eu nunca poderei pagar a ele.

Lagrimas começam a se formar nos olhos cinzas de Katniss, me deixando extremamente preocupado. Ver Katniss chorar, não é algo que eu esteja acostumado a ver.

— O que é? Você está sentindo muita dor? – pergunto, acariciando seu braço.

— Quero ir para casa, Peeta — ela choraminga, tão frágil, tão exausta, tão triste.

Ver, aquela garota que eu sempre considerei extremamente forte, abalada desse jeito, me desconcerta. Respiro fundo, tentando buscar forças, para fazer mais uma promessa, sem saber se serei capaz de cumpri-la.

— Você vai. Prometo — digo, e me inclino impulsivamente para dar um beijo em seus lábios. Eu hesito, ela recua. Decido então, dar um beijo em sua testa. Mas antes de ela recuar, enquanto me olhava com seus olhos cinzentos marejados de lagrimas, apenas por um momento, eu tive a impressão, de que ela queria verdadeiramente, me beijar também.


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