Licantropia: A Reserva escrita por Paulo Carvalho


Capítulo 26
Capítulo 25: Rota 32


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal ? Finalmente consegui postar um capítulo na data certa. Sem desculpas dessa vez.
Espero que gostem e boa leitura!
Ah, desculpem pelo tamanho do capítulo de novo, hehe.



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O céu adquiriu o tom arroxeado de um hematoma e o vento tornou-se mais frio e selvagem enquanto Sam esperava pelo retorno de Soren. A cada segundo mais ansiosa e nervosa com o que poderiam decidir. O Filho da Noite decidira conversar com Raniah e deixar que ele decidisse o que fazer. Samantha não podia culpá-lo por querer seguir as ordens de seu líder, mas sentia medo do que Raniah poderia concluir. Traidora? Amiga? Ambas as possibilidades são muito prováveis.

Além de ser, possivelmente, considerada uma inimiga, havia ainda o olhar de Soren quando ela lhe contou seu último segredo. A única coisa que decidira manter consigo por motivos que ninguém acreditaria. Aqueles belos olhos dourados pareciam ter se transformado de âmbar líquido e quente em ouro duro e frio quando Samantha revelou o que sabia sobre a Rota 32.

–-- Um boato? ---Soren balançou a cabeça, confuso, quando ela revelou seu segredo. ---Do que você está falando? Venha aqui.

Ele a segurou gentilmente pelo braço e a levou para fora do armazém onde treinava. Longe do som das lutas corpo a corpo e do cheiro de suor, Sam conseguiu se acalmar e normalizar a respiração. Seus pensamentos disparavam de um lado ao outro, mas sua expressão tornou-se calma e franca quando ela começou a falar.

–--Quando vocês me interrogaram... ---ela começou respirando fundo. ---Vocês queriam saber sobre qualquer coisa que poderia ajudá-los a ter alguma vantagem em relação a Reserva. E eu disse que não sabia de quase nada. Que eu era uma simples mensageira e que estava cobrindo problemas de contingente na Patrulha naquele dia. Eu...

–--Você mentiu? ---e a voz dura e fria de Soren foi quase dolorosa aos ouvidos de Sam, mas ela esperava por isso.

–--Não! ---ela respondeu rapidamente. ---Quero dizer, não sobre isso, pelo menos. Eu sou... era uma mensageira. Quando vocês me capturaram foi apenas falta de sorte. Mensageiros não sabem nada sobre a Reserva. Eles entregam mensagens que estão sempre criptografas para que nenhum curioso as leia. Nunca ficamos nas salas dos oficiais quando eles as abrem e não somos solicitados para acompanha-los em reuniões ou coisas desse tipo. Mensageiros são invisíveis nas Reservas. Apenas entregamos mensagens. Não devemos saber o que tem dentro delas. Em teoria, ao menos.

–--Pare de enrolar. --- o licantropo respondeu simplesmente, inexpressivo.

–--Tudo bem. Há cerca de um ano atrás, eu estava carregando uma mensagem para o Conselheiro Huellen. Eu a entreguei e estava prestes a sair quando ele pediu que pegasse um livro na sua biblioteca pessoal. Ele se sentou de frente para uma tela que continha um mapa da Reserva e as áreas ao redor e digitou uma série de códigos. Pareceu a mim que ele copiava as letras da mensagem que eu entreguei. Enfim, quando ele terminou de digitar a série, uma linha vermelha surgiu na tela sobre o mapa. Começava na... ---sam hesitou em lhe contar.

–--O que foi? Começava aonde?

Ela tinha medo de revelar o que sabia. Se os boatos que ouvira sobre aquela rota fosse verdade era um caminho, talvez o único, que permitia a entrada de alguém na Reserva sem que 50 ou 60 patrulheiros visse o invasor. Uma guerra. Outra guerra.

–--Dentro da Reserva, no subsolo dela, na verdade. ---Sam decidiu contar. Precisava confiar em Soren. ---Ela passava pelo interior, por locais que eu nunca havia visto antes. Em seguida, a linha vermelha seguia para fora da Reserva, através das ruínas, passando pela floresta. Se afinava em alguns lugares e parecia não ter fim. Acho que o Conselheiro esqueceu de mim. No fim da linha havia um triângulo vermelho grande piscando cercado por círculos azuis e dois retângulos verdes.

´´ Ele falou com alguém no telefone, mas finalmente pareceu me notar e cochichou algo que não pude escutar. Em seguida, ele mandou que eu o acompanhasse até a sala de reuniões e convocasse os Chefes dos Setores de Mapeamento, Transporte e Armamentos. Eles ficaram conversando durante horas e o Conselheiro Huellen parecia irritado. ``

´´ Por muito tempo eu ignorei o que havia visto naquele dia porque tinha medo que talvez pudesse ter sido um teste, mas ninguém veio me procurar meses depois e decidi investigar. Conversei com alguns colegas que trabalhavam no setor de Códigos e entendi como funcionava a criptografação, mas nunca tive coragem de abrir qualquer mensagem. Mas, foi o suficiente para que eu passasse semanas tentando me lembrar de todos os detalhes que Huellen havia digitado. E depois de algum tempo eu finalmente entendi.`` Sam tentou sorrir, mas o rosto rígido de Soren a desencorajou. ´´ O que eu vi era uma rota que começava na Reserva e levava até outro local. Depois de um tempo descobri que nos mapas, triângulos são Areas Protegidas. Círculos são Hounds. E retângulos são Comboios. Eu investiguei mais ao fundo e descobri que ninguém sabia sobre rotas que terminavam no meio do nada. De acordo com os Mapeadores todas as rotas existentes interligavam Reservas. E foi então que ouvi a história da Rota 32. ``

´´Algumas poucas pessoas tinham ouvido falar dela. Teoricamente é uma rota de encontro entre a minha Reserva e a Reserva mais a Nordeste. A segunda maior do Arizona pelo que aprendi. A Rota 32, portanto, seria uma região de encontro entre essas duas Reservas. Possivelmente o caminho mais rápido entre as duas.`` Sam permaneceu em silêncio esperando pela reação de Soren.

–--E daí? ---Ele perguntou. ---Porque um caminho entre Reservas é tão importante para nós? Como isso nos ajuda?

–--Você não me ouviu? Ao fim da linha vermelha tinha um triângulo. Um triângulo, Soren. E triângulos, significam...? ---ela ergueu as sobrancelhas esperando pela resposta.

–--Área protegida. Espere. Você acha que...

–--Por que eles iriam colocar comboios e Hounds no meio de uma rota entre duas Reservas? Para proteger alguma coisa. A Rota 32 existe e tem algo que as duas maiores Reservas da região querem! E se algo pode os beneficiar, então...

–--Pode ser ainda melhor para nós. ---Soren respondeu e sorria, mas Sam notou que não era para ela.

Agora, a noite havia adquirido um tom escuro intimidador e Soren ainda não havia voltado da reunião com Raniah.

Um súbito farfalhar atrás de si chamou sua atenção e Soren pôs a cabeça pelo quadrado de um metro e meio que era sua janela. Ele tinha cortado os cabelos recentemente e eles não caiam mais sobre os olhos dourados. Eles pareciam mais amarelos naquela noite. Quase como se fossem faróis. Sam se perguntou se aquilo era efeito do vírus e se antes disso ele tinha olhos de cores diferentes.

–--E então? ---Sam perguntou sem tentar esconder a ansiedade.

–--Raniah... ---Soren respondeu enquanto se sentava ao seu lado. ---Decidiu que iremos atrás dessa rota. Amanhã de manhã. Não podemos nos dar ao luxo de perder ninguém.

–--Ótimo! E como ele reagiu quando descobriu que eu estava...

–--Eu não pude falar muita coisa porque tinham outras pessoas ao redor. Alguns que não gostam de você, como Oscar. Eu disse que eram apenas boatos que resolvi investigar e que podem, talvez, levar a suprimentos. Acho que consegui enganá-los. Oscar sabe usar os músculos, mas não o cérebro. Mas Raniah suspeita de algo e pretendo contar quando voltarmos.

–--Não. Eu conto a ele. É minha responsabilidade. ---Sam respondeu.

Soren deu de ombros e se recostou na parede exterior e fechou os olhos. Sam não esperava que ele a perdoasse tão rapidamente e considerou o fato do Licantropo não ir embora, um bom sinal. Ela respirou fundo algumas vezes e se preparou para falar.

–--Soren. ---ela o chamou. ---Me desculpe por ter...

–--Você não tem de se desculpar. ---ele respondeu rapidamente. ---Eu faria o mesmo se fosse você. Essa rota é como... um incentivo para o ataque. Eu entendo. Se Oscar ou qualquer outro dessa alcateia que odeia a Reserva mais do que tudo soubesse onde essa trilha começa seria o suficiente para que eles arriscassem as cabeças contra um exército de 100 ou 200 patrulheiros protegidos por muralhas de aço e com armas de ultima geração. Além disso, por que você nos daria uma fraqueza, talvez a única, de sua Reserva? Não faz sentido. E eu não a culpo, por isso.

–--Não? ---Sam perguntou com as sobrancelhas franzidas.

–--Não. ---ele respondeu sorrindo, porém com os olhos ainda fechados. ---É só que eu esperava... --- o Filho da Noite parecia ligeiramente desconfortável. ---Pensei que você confiasse em mim totalmente. Mas eu entendo que...

–--Soren. ---Sam se moveu até ficar de frente para ele. Ela pôs as mãos nos dois lados de seu rosto. ---Eu. Confio. Em. Você. Cem por cento. A razão verdadeira para eu não contar sobre essa rota antes era pelo simples fato de ainda estar presa à Reserva. É muito difícil aceitar que o lugar onde eu vivi durante dezoito anos era uma farsa. Uma máquina de mentiras. Foi só quando vi Gregory morrendo aos poucos e sem nenhuma esperança que consegui me desconectar completamente daquele lugar. Talvez eu não pertença a este lugar, mas definitivamente não faço parte da Reserva.

O Filho da Noite ficou em silêncio por um momento e depois sorriu. Ele se aproximou de Sam muito rápido para que ela pudesse acompanhar e a beijou. Devido ao choque, a resposta veio alguns minutos depois quando o licantropo começava a se afastar. Samantha agarrou sua nuca e usou toda sua força para puxa-lo em sua direção. Ela suspeitava que talvez seus esforços fossem insignificantes para Soren, mas ele cedeu imediatamente.

As mãos do licantropo deslizaram de sua cintura, puxando-a para cima dele. A barba arranhava a pele de Sam, mas a sensação enervante que percorria seu corpo naquele instante suprimia o desconforto. Ela não se lembrava de ter sentido algo semelhante quando beijara outros garotos na Reserva. Claro que não. Não existem pessoas como Soren naquele lugar.

Quase que instintivamente, as mãos de Sam percorreram os ombros largos do licantropo e desceram a procura da barra de sua camisa. Naquele momento todos os outros pensamentos de Samantha haviam sido substituídos pelas sensações que o licantropo provocava nela. A sensação de seu toque, o cheiro doce, o efeito que o som emitido do fundo da garganta do Filho da Noite provocava na sua respiração. Tudo se resumia a ele.

–--Espere. Espere. ---Sam tentou empurrá-lo sem muita convicção. Ela não queria se afastar.

–--Me desculpe. ---ele pôs sua testa contra a dela e sorriu. ---Eu não estou acostumado com isso. ---tudo o que Sam conseguiu fazer foi rir. ---E então? Como faremos para encontrar aquela rota maravilhosa?

–--Preciso de um mapa. --- Sam respondeu, tentando normalizar sua respiração.

–--Acho que não temos algo desse tipo aqui. ---Soren respondeu calmo e controlado.

–--Tem sim. E eu sei exatamente onde está.

–--Eu encontrei marcas de pegadas perto dessa área, próximo ao Lago Partido. Pareceram botas para mim, mas pode ser apenas minha empolgação. Não tive coragem para ir muito além. Podemos seguir por aqui, paralelo a Reserva até o lago e em seguida procurar por alguma trilha ou coisa do tipo. Se essa rota realmente existir ela vai estar escondida, mas não invisível. Os comboios não iriam atravessar a mata fechada.

Enquanto falava, Soren passava o dedo indicador pelo mapa desenhado a carvão no quarto de Raniah. Sam se lembrava do dia em que estivera ali tão claramente quanto as suas lembranças de quando o mesmo mapa surgiu em uma tela digital de 45 polegadas acima da cabeça do Conselheiro Huellen.

Eram praticamente iguais. O de Raniah obviamente não tinha mensagens criptografadas, nem marcadores de temperatura, altura e umidade, mas tinham os mesmos formatos e os locais de importância significativa haviam sido marcados em ambas as representações. Sam não conseguia acreditar que aquilo fora criado sem um Rasante para fotografar a região de cima, mas ele lhe garantira que foram apenas suas observações do local.

–--E quando você foi investigar isso? O Lago Partido fica a uns sete quilômetros daqui. Não me lembro de sua ausência por tanto tempo. ---Raniah ergueu uma sobrancelha.

–--Eu... foi quando...

–--Soren não foi procurar por essa trilha. ---Sam respondeu. O fato de ser muito cedo e, portanto, não haver ninguém treinando no armazém deu coragem para ela que contasse a verdade. Ou quase isso. ---Eu sabia sobre ela e não contei a vocês. Tinha medo que isso pudesse levar a algum confronto com a Reserva e minhas chances de sobrevivência iriam cair muito caso isso ocorresse. Mas, decidi que não quero voltar para a Reserva. Considere isto como uma prova do que estou falando.

Raniah ficou um bom tempo em silêncio. Os olhos escuros pareciam dois poços negros em comparação com os cabelos cor de areia. Ele cruzou os braços e analisou o próprio mapa novamente e Sam quase podia ver sua mente trabalhando, procurando por possíveis armadilhas. Depois de alguns minutos, o líder da alcateia se virou e sorriu.

–--Bem. Nesse caso, Sam vai com você, Soren. E é ela que vai liderar. ---Ele notou a expressão consternada dos dois e riu. ---Não que eu vá contar isso aos outros, é claro.

O suor escorria pela nuca de Sam enquanto ela pulava por sobre meia centena de raízes entrelaçadas umas as outras como tentáculos de um polvo. Os outros estavam alguns metros à frente e ela invejava a constituição física semiolímpica de todos os licantropos. Todos os cinco Filhos da Noite que a acompanhavam eram altos, ágeis e fortes. Eles também conhecem essa floresta como ninguém. Nem mesmo os Mapeadores devem saber como andar nesse lugar.

Enquanto eles pulavam os galhos mais baixos das árvores, saltavam de pequenas elevações e pareciam olhar apenas para o sol ou o vento para se guiar por entre os caminhos que a Sam pareciam exatamente iguais; ela precisava ter cuidado com cada protuberância que surgia do chão, desviar dezenas de metros das depressões súbitas da floresta e ainda manter-se atenta aos sons mínimos que os Filhos da Noite faziam durante sua movimentação para não se perder.

Vez ou outra, ela ouvia uma risada e sabia que era Oscar rindo de algum deslize seu ou Hadron se divertindo com sua falta de jeito. Idiotas. Sem mim eles estariam andando por horas para nada. Além dos dois, Soren, Dragan e Trish a acompanhavam. Nenhum deles, além de Soren, sabia que Sam estava ali para guiá-los. Ela era a única que sabia o caminho certo da Rota 32 e sem isso, provavelmente, nenhum deles, nem mesmo Soren, seria capaz de encontrar a trilha usada pela sua Reserva para conseguir... Bem, ela não tinha muita certeza do que era. Apenas boatos e teorias. Mas Samantha sentia que havia algo naquele lugar.

–-- Finalmente. Água. ---Trish respondeu e deslizou por um pequeno morro com a agilidade de um cervo. Sam deliberou quantos ossos quebraria se fizesse algo semelhante.

O lago surgiu alguns minutos depois para ela. Era largo, muito maior que o próximo à cerca que protegia o acampamento. De início, Sam acreditou ser um rio pelo que ela julgou serem suas margens, mas conforme se aproximava notou que eram apenas pequenas ilhas que se estendiam por dezenas de metros ao leste. Um espelho de água azul brilhante sob o sol da manhã.

Todos concordaram em descansar por um tempo e Sam tentou identificar qual direção seguir visualizando o mapa do local mentalmente. Todas as áreas pareciam exatamente iguais para ela e o desespero fez um filete de suor escorrer por sua testa, mesmo estando fresco onde estava. Respire fundo e pense, Sam.

No mapa a trilha seguia pelo lago. Se o lago se estendia a leste então havia dois lados possíveis a seguir. Ela procurou por outro ponto marcante no mapa e lembrou- se que devia haver uma clareira e depois um pequeno monte. Logo depois a trilha seguia quase reta até o fim, o que Sam esperava significar alguma trilha mais concreta. Se tivéssemos partido da Reserva teria sido muito mais fácil. E provavelmente uma guerra aconteceria em poucos dias.

Sam resolveu seguir a lógica e apontou para nordeste, discretamente, para Soren que assentiu e deu ordens aos outros como se fossem dele. O plano era que Samantha os guiasse sem que ninguém percebesse. Ela entendia o ponto de Raniah. Os Filhos da Noite seguiriam Soren para a morte, mas nunca iriam atrás do que uma patrulheira aponta como uma fonte de suprimentos.

Para sua felicidade e surpresa, o caminho a levou até a clareira, uma espaço oval de quase 3 quilômetros de diâmetro cheio de flores azuis, amarelas, roxas e vermelhas. Sam achou o local maravilhoso, mas não fez nenhum comentário. Sabia que seria respondida com piadas ou xingamentos. O monte surgiu meia hora depois, uma parede de quase 5 metros que exigiu muita força de Sam e rendeu muitas risadas de Oscar e Soren. Quando finalmente chegou o topo, Samantha deitou no chão e demorou bons minutos antes de notar a diferença do solo.

Era duro e firme. Completamente diferente do traiçoeiro e macio solo da floresta. Sob a fina camada de terra, plantas mortas e sedimentos, o chão era cinza e rachado com retângulos amarelos em intervalos regulares.

–--É uma estrada. ---Hadron pronunciou a palavra quase como se não a conhecesse?

–--Nunca viu uma? ---Oscar perguntou com um sorriso idiota no rosto. ---É tão selvagem assim?

Um soco em resposta foi o que recebeu. Sam tentou conter o sorriso, mas foi impossível. Ela se virou antes que alguém percebesse e começou a seguir o grupo para o norte. Sempre norte. A estrada era estreita e seguia as curvas e depressões naturais do monte, mas lentamente eles subiram e depois de quase meia hora desceram novamente.

–--Tentem não fazer muito barulho. ---Soren os alertou. ---Quanto mais pertos estivermos do fim dessa possível rota, maiores são as chances de encontramos alguém da Reserva. Acho que eles não ficaram felizes com nossa presença.

As paredes de concreto surgiram minutos. Deviam ter cerca de 8 metros e terminavam com arame farpado. A muralha se estendia por ambos os lados cercando uma construção quadrada e baixa como um armazém. Em intervalos regulares havia câmeras de segurança. Quadrados brancos com lentes negras que se moviam de uma lado ao outro como sentinelas automáticas. Sam prendeu a respiração e sentiu-se feliz por estar certa sobre a rota, mas a tensão do perigo não a permitia sorrir. Esses muros e essas câmeras. Esse lugar está protegido pela Reserva. Isso significa que deve haver Patrulheiros aí dentro.

Oscar começou a se aproximar, saindo da região protegida pelas folhas tentando enxergar melhor e Sam o segurou, impedindo-o. O Filho da Noite se afastou como se ela tivesse alguma doença rara e sem cura.

–--Você está louca? ---o homem perguntou.

–--Mais dois passos e você morre, idiota. ---Sam respondeu. ---As câmeras não são o único problema.

–--O que você acha, Sam? ---Soren perguntou.

–--Você está pedindo opinião da inimiga? ---Oscar perguntou com as sobrancelhas franzidas.

–--Eu acho... ---Sam tentou pensar em alguma coisa. Ela não contava com tanta proteção. Como pude ser tão estúpida? É claro que haveria proteção. –--As câmeras sempre tem um ponto cego. Precisamos encontrar ele. As muralhas... vocês conseguem escalar?

–--Trish consegue e Soren, também. ---Hadron respondeu. ---Eles podem abrir as portas para nós.

–--Não é tão fácil assim. A Reserva não implantaria um sistema de câmeras e criaria muralhas desse tamanho para proteger coisas sem importância.

–--Isso é óbvio. ---Trish respondeu. ---É por isso que estamos aqui, não?

–--O que estou querendo dizer é que com certeza há patrulheiros lá dentro. Talvez outras defesas estejam implantadas ao redor, também. Teríamos que testar todas as possibilidades. Eu as conheço e sei como fazer isso, mas são 15 defesas automáticas, 5 táticas e também podem haver sensores de calor...

–--Nós não temos tempo para isso. ---Hadron respondeu.

–--Eu sei! ---Sam respondeu e a raiva crescia a cada segundo. Contudo a raiva era direcionada a si, dessa vez. ---Eu preciso pensar. Atrair os patrulheiros, isso poderia ativar sensores e a Reserva poderia saber de nós. Testar as mais básicas e ignoras as complexas, isso seria suicídios. Eu... ---nenhuma ideia surgia em sua cabeça.

–--Acho que ouço a solução. ---Soren sorriu. ---Ouço pneus se aproximando. E aposto que estão trazendo presentes para nós.

Eles se esconderam. E esperaram. Os carros surgiram minutos depois. Eram grandes e pareciam extremamente resistentes. As rodas deviam ter um metro de diâmetro e Sam nunca vira o material que parecia formar a lataria. Era semelhante a aço, mas parecia mais rígido e resistente de alguma forma. Soren esperou que os três carros surgissem e parecia prestes a dar o sinal quando subitamente se virou e fez sinal para que o grupo o seguisse para longe do armazém. Oscar o encarou como se ele fosse louco, mas Sam entendeu.

Nada saía da Reserva. Os comboios tinham vindo da Reserva de Sam, o que significava que eles estavam buscando materiais. Se eles esperassem e se afastassem do armazém as chances de vencer em caso de luta eram muito maiores. Secretamente, ela anotou para nunca subestimar o Filho da Noite.

As horas passaram e todos esperavam pacientemente a volta dos comboios. Sam não ouviu o som dos motores até que eles surgissem na curva ao norte, mas os Filhos da Noite já haviam se preparado há muito para a chegada. Soren ergueu o arco e acertou uma dúzia de flechas nos pneus dos três comboios em uma sucessão impressionante. Nenhum ser humano seria capaz de fazer aquilo.

Os carros frearam imediatamente e Trish fez sinal para que Sam ficasse pronta. Silenciosamente, os Filhos da Noite subiram as árvores mais próximas e se prepararam para o ataque. Eles disseram para Samantha não se mover até que fosse necessário. O som poderia alertá-los.

De cada comboio desceram dois Patrulheiros vestidos com o uniforme azul dos Internos e portando armas que Sam usara durante os treinamentos. Eram feitas pelos engenheiros da Reserva. Uma peça de 2 quilos com cadência de 900 tiros por minuto e mira projetada para acertar alvos minúsculos a centenas de metros. Ao ver as peças negras nas mãos dos soldados, Sam temeu pela vida dos Filhos da Noite. Especialmente a de Soren.

Um deles se abaixou para procurar o problema e a flecha atingiu sua mão tão subitamente que Sam quase deslizou de onde estava. Por reflexo, a arma do homem voou alguns metros e caiu por entre os arbustos próximos a estrada. O segundo que os outros patrulheiros levaram para reagir foi o suficiente para que Trish e Oscar acertasse mais três deles. As armas caíram no chão no mesmo instante que os outros dois soldados começaram a atirar, mas os Licantropos já tinham se movido há muito tempo.

Hadron surgiu quase que instantaneamente por detrás de um deles, saltando de uma altura que teria quebrado ambas as pernas de Sam e com um movimento rápido fez com que o homem caísse inconsciente à sua frente. O outro patrulheiro mirou em Hadron e atirou três vezes em seu peito. Sam tinha certeza que o licantropo cairia no mesmo instante, mas as balas acertaram seu braço esquerdo. Duas de raspão e uma perfurou a carne. Tudo que o Filho da Noite fez foi rugir.

Sam finalmente saiu da letargia e chutou a parte interna do joelho da única patrulheira ainda armada. A surpresa a fez se virar muito lentamente e Sam chutou seu rosto com toda sua força. Ela ouviu um crack e a mulher caiu, desacordada. Hadron ergueu uma sobrancelha e fez sinal de positivo para ela.

–--Eu a matei? ---Sam perguntou.

–--Você não é tão forte assim, garota. ---Hadron respondeu. ---Mas, belo chute.

Trish imobilizou uma patrulheira e com habilidade, atingiu a parte de trás de sua cabeça, fazendo-a desabar, sem sentidos. Soren desviava de um dos patrulheiros que segurava uma faca de aparência mortífera. O licantropo não parecia particularmente preocupado, desviando-se com facilidade das investidas, virando o corpo segundos antes da lâmina o tocar. Depois de alguns segundos, ele chutou o queixo do homem, deixando-o inconsciente. Oscar ergueu o último homem pelo colarinho e o jogou com força para o lado.

O soldado se moveu com habilidade, como Sam se lembrava de ter sido treinada e pegou a arma de última geração ao seu lado. Ele não mirou em Trish que estava mais próxima ou em Oscar que havia lhe atacado. O patrulheiro atirou em Sam. O mais fraco do grupo. Ensinaram bem a ele. Tudo o que Samantha pode fazer foi fechar os olhos e esperar pelo impacto. Ela demorou alguns segundos notar que nada havia acontecido.

Soren estava a sua frente segurando a lateral do corpo. O casaco cinza estava lentamente tornando-se vermelho. Oscar atingiu o rosto do homem no minuto seguinte. Sangue voou do rosto do patrulheiro e o som de ossos se quebrando foi audível até mesmo para Samantha que estava mais distante. Naquele momento, ela não se importou se o homem estava morto. Ela apenas correu até Soren. Ele gemia e segurava as costelas, pressionando com força. Havia dois buracos na lateral do casaco e outro mais acima, no ombro. Dos três, o sangue jorrava em abundância.

–--Ah, droga. Eu preciso de água e... ---Sam tentou organizar os pensamentos. Precisava improvisar um torniquete, mas antes tinha de limpar o ferimento.

–--Ei. ---Soren sorriu. ---Calma, tudo bem? Esqueceu o que eu sou? Me curo rápido. Antes de voltarmos vou estar melhor do que você. ---ele pôs a mão carinhosamente em seu rosto e depois de se lembrar dos outros, retirou-a.

–--Soren. ---Trish respondeu com a voz abafada pelas portas abertas do comboio. ---Você vai querer ver isso.

O Filho da Noite caminhou mancando até onde Trish esperava e encarou o interior de um dos comboios. Havia dezenas de caixas brancas empilhadas umas sobre as outras, presas por correntes de ferro. Em cada uma havia faixas negras identificando o conteúdo de cada uma delas.

Munições e Armamento, Vestuário, Alimentação, Recreação, Comunicação, Saúde. Sam leu cada um dos rótulos com incredulidade crescente. Ela tinha acertado. A Rota 32 existia e tinha suprimentos importantes. Suprimentos que ajudariam toda a alcateia. Suprimentos que salvariam Gregory. Ou, ao menos, ela esperava.

–--Vamos precisar de sacolas maiores. ---Hadron falou depois de abrir uma das caixas.


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Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam?
Será que haverá consequências desse ataque?
Até semana que vem!



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