Licantropia: A Reserva escrita por Paulo Carvalho


Capítulo 24
Capitulo 23: Herói.


Notas iniciais do capítulo

E aí, galera? Tudo bom? Depois de um século, eu voltei.
Primeiro, gostaria de agradecer e pedir desculpas por não ter falado antes, à Little Dana e Gs Hayes Grey pelas recomendações maravilhosas!! Eu adorei e fiquei mt feliz que vocês estejam gostando da minha fic. Vcs são demais!! Milhões de obrigados.
Agora, desculpas a todo mundo. Eu estava muito apertado no meu colégio com milhares de coisas pra fazer, precisava me concentrar. Mas tenho boas notícias, estou quase de férias e vou poder voltar a me concentrar em Sam, Soren, Ran e todos os outros que ainda vão surgir.
Espero que gostem do capítulo. ;)



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Já havia passado da meia-noite há algumas horas, mas Sam ainda não havia dormido. Nem mesmo sentia vontade. Sentada sobre o parapeito da janela, com a cabeça repousada sobre o vidro, ela encarava o céu estrelado acima de si, mas não o via de verdade. Ninguém podia vê-la ali, ela sabia disso. Seu quarto ficava no encontro de duas partes do telhado que formavam um V, onde sombras se acumulavam a noite e escondiam qualquer um em seu interior. Porém, se algum espectador mais atento olhasse naquela direção, veria o brilho de cabelos dourados de uma menina de olhos vidrados voltados para a escuridão pontilhada milhares de metros acima.

Nada chamava sua atenção. A única coisa que importava eram seus pensamentos. Suas lembranças, na verdade. Ela viajava nelas naquele momento. Tão profundamente imersa quanto um peixe na água. Desde aquele dia sua atenção desviava-se constante e irritantemente de qualquer tarefa que lhe fosse designada. Sam não conseguia se concentrar em qualquer coisa que não o envolvesse. E isso, ao mesmo tempo, a irritava e animava.

Na Reserva ninguém chamara sua atenção da forma como Soren havia chamado. Existiam garotos bonitos no local, é verdade, mas todos que conhecera pareciam estranhamente distantes, desinteressantes e rasos. Como se vivessem em um mundo completamente diferente do dela. Todos na Reserva, no geral, causavam-lhe tal impressão. E agora, mais do que nunca, ela entendia o porquê.

Eu nunca pertenci à Reserva. Nunca fiz verdadeiramente parte daquele lugar. Ela sempre soubera daquilo. Desde o minuto que a palavra Impura adquirira o sentido que a perseguiria por toda sua vida. Todos os risos, agressões e maus-tratos que sofrera pelo simples fato de ser uma órfã já seriam suficientes para que ela odiasse a salvação das populações humanas: A Reserva. Seus pais serem licantropos, feras infectadas com o pior vírus já enfrentado pelos seres humanos era apenas uma questão que a tornava um alvo mais fácil.

Na Reserva todos tinham um papel, ela aprendera em alguma das aulas quando ainda era uma criança. Alguns eram fortes e defendiam as muralhas que mantinhas as grandes feras conhecidas como Filhos da Noite longe dos pobres humanos mais fracos que não conseguiam se proteger. Outros eram inteligentes e procuravam encontrar soluções para acabar com esses mesmos monstros. Alguns ainda, eram bons em construir coisas e criavam os meios de transporte, comunicação e as armas que auxiliavam na grande guerra que só acabaria quando o último dos lobisomens morresse. Havia ainda mais uma infinidade de tarefas: médicos, professores, policiais e produtores de alimentos. Alguns de altíssima importância e status, como os Intendentes e outros secundários e sem prestígio como os mensageiros.

Quem não era capaz de ajudar de nenhuma das infinitas formas de trabalho da Reserva eram tratados com asco e eram os últimos a receberem ´´benefícios`` como roupas novas, cobertores, remédios e a comida destinada a eles, embora ninguém dissesse isso em voz alta, eram os últimos lotes que passavam pelas muralhas. As últimas colheitas e as carnes mais fibrosas. Deficientes, idosos e órfãos eram todos marginais por não poderem contribuir para a máquina da salvação conhecida como Reserva, uma importante seção do núcleo de defesa principal da raça humana: A Resistência.

Sam fora uma marginal até seus 12 anos quando finalmente ingressara no Corpo de Patrulheiros da Reserva. Durante 12 anos ela ouvira os adultos se referindo a ela como um animal indesejado e as crianças rindo de suas roupas rasgadas e aparência suja. Até mesmo o diretor do orfanato olhava para os seus acolhidos com certa repugnância e irritação.

A Reserva não era um local para pessoas diferentes. Ela aprendera isso nos primeiros anos de sua vida. Por detrás da bela face do Diretor da Resistência, havia um dedo apontando para todos os marginais, mandando-os para fora das muralhas para procurar seu lugar. Talvez eu tenha encontrado. Ali, naquela alcateia, todos eram diferentes à sua maneira, unidos por um vírus. Restava a Sam saber se mesmo sem o vírus, ela poderia fazer parte daquele lugar.

Os fragmentos de cascalho atingiram a ponta de suas botas, recentemente encontradas em um armário de uma casa aos pedaços do lado não explorado da cidade, tirando-a de seus devaneios. Ela virou os olhos na direção de seu agressor e avistou um brilho dourado no meio da escuridão que cobria a rua. Sua respiração se acelerou por um momento quando reconheceu o rosto sorridente escondido nas sombras. Ele acenou com uma das mãos em sua direção e foi o suficiente para que Sam disparasse para o lado de dentro de seu quarto.

Ela surgiu das portas laterais da grande mansão que servia como abrigo para dezenas de licantropos minutos depois segurando as pontas do casaco fino de lã que a protegia fragilmente do vento frio da noite.

Soren a esperava com as costas apoiadas na parede de um prédio do outro lado da rua, onde as sombras eram mais escuras e densas. As roupas escuras que usava pareciam se fundir à penumbra atrás de si, transformando-o em um fantasma de olhos brilhantes e sorriso afiado. A cada dia que se passava, Sam se sentia mais atraída por aqueles olhos. Por trás do âmbar derretido que os compunha parecia haver um buraco negro que prendia sua atenção sempre que ela olhava para o fundo dele.

–--Fiquei 20 minutos aqui, parado, esperando você me notar, mas aparentemente o céu estava mais interessante. ---Soren disse quando ela se aproximou o suficiente para ouvi-lo sem que ele tivesse que falar muito alto.

–--Eu só estava pensando. ---Sam respondeu e percebeu que estava murmurando. Eles estavam fazendo muito isso nas últimas semanas.

–--Em que exatamente? ---ele perguntou enquanto se aproximava.

–--Em muitas coisas. ---ela tentou desviar do assunto. Não queria falar de suas ansiedades naquele momento.

–--Em mim, por exemplo? ---Soren ergueu uma das sobrancelhas maliciosamente.

–--Não seja tão convencido. ---Sam respondeu e notou o quão próximo estava do Filho da Noite. Podia sentir a respiração quente e calma dele contra sua pele. ---Existem coisas maiores na minha vida do que você.

–--Então... acertei, não é? Estava pensando em mim. ---Ele sorriu como uma criança e subitamente se virou e começou a caminhar. ---Eu posso sentir o cheiro da mentira em você. Sabe disso, não?

–--Cale a boca. ---Sam respondeu e acelerou o passo para alcança-lo. ---Então como estão as coisas com os Nômades? --- a pergunta também foi preparada para despistar, mas o interesse no assunto era genuíno.

–--Tudo ainda está muito confuso. Nem mesmo Raniah entende o que Licáon pretende. ---Soren mordeu a isca para o alívio de Sam. ---Temos algumas teorias, mas todas parecem muito improváveis. Licáon é um sádico e gosta de se sentir no poder, mas não é burro e seu senso de sobrevivência é muito mais apurado do que você pode imaginar. Ele não seria estúpido o suficiente para iniciar uma guerra conosco uma vez que tem cinco ou seis licantropos a mais do que nós. A maioria dos seus seguidores são Filhos da Noite mal treinados ou sem habilidades de combate que se juntam aos Nômades buscando exatamente proteção. Sendo realista, são um peso morto.

–--Então porque Licáon fica com eles? Se o senso de proteção dele é tão afiado, seria óbvio que ele percebesse que esses licantropos são apenas um atraso, não?

–--Não exatamente. Eles não são um atraso em todos os sentidos. Os soldados ... ---Soren fez aspas ao pronunciar a palavra. --- de Licáon treinam dia e noite. Eles aprendem tudo o que podem sobre como caçar, lutar e rastrear. São muito bons em usar a força e a velocidade extras que o vírus lhe proporciona. Mas, em compensação, são poucos os que ficam até o final. A maioria foge ou desiste. A maior parte dos que Licáon permite viver viram ajudantes de acampamento, carregam suprimentos, caçam, cozinham, limpam e coisas desse tipo. Nenhum soldado faz esse tipo de coisa. A função deles é simplesmente descansar e treinar. Todos tem uma função estratégica nos Nômades, mas no final tudo se resume em uma única coisa: proteger Licáon acima de tudo.

Eles haviam chegado ao novo quarto de Soren. Ninguém mais ocupava o prédio que se mantinha cheio de destroços e áreas interditadas, inalcançáveis. A sala ocupada pelo Filho da Noite ficava em dos pequenos espaços do quarto andar que resistiram aos ataques. Não era amplo, porém aconchegante à sua maneira.

O ambiente era dividido por uma parede de vidro. De um lado ficava uma espécie de antessala com um balcão abarrotado de CD´s, um sofá de couro preto empoeirado e quadros exibindo pessoas desconhecidas em poses estranhas com microfones na mão ou tocando guitarras e pianos. Em alguns destes haviam CD´S, pintados de prateado e dourado, indicando algum tipo de prêmio qualquer. Havia também um painel cheio de interruptores, luzes de LED e botões.

O outro lado do quarto estava conectado ao resto do espaço através de uma pequena porta de metal com uma placa em cima que dizia: gravando. As paredes eram feitas de um material esponjoso e macio. O chão acarpetado havia sido retirado recentemente exibindo um piso de mármore escuro e estranhamente elegante.

–--O que houve com seu antigo quarto? ---Sam perguntou quando se deu conta de que não haviam entrado no mesmo prédio de antes.

–--Decidi mudar. Alguns Filhos da Noite estavam começando a se mudar para lá. Prefiro ter privacidade.

Sam tentou avaliar se acreditava nele. Desde o primeiro beijo um acordo silencioso havia sido feito entre os dois. Samantha percebera que se a alcateia que tanto admirava Soren e seguia seus conselhos quase como se fosse normas descobrisse que seu líder estava se relacionando como uma prisioneira, ele indubitavelmente sofreria consequências. Na melhor das hipóteses, o licantropo perderia parte de sua credibilidade e liderança na alcateia; na pior, os Filhos da Noite poderiam se revoltar.

Ela nunca havia dito aquilo em voz alta, mas aparentemente Soren percebera as mesmas coisas. Eles passaram a se ver escondidos quando todos estavam muito ocupados com outras coisas. Como dormir, por exemplo. Sam não se incomodava com aquilo. Na verdade, o segredo tornava as coisas mais interessantes de certa forma. Não que ela precisasse de mais incentivos.

Sam encarou Soren novamente, dessa vez sob a luz das lâmpadas fragilmente instaladas e alimentadas por um gerador encontrado no prédio central da prefeitura que ainda funcionava. Não pela primeira vez, ela notou o quanto o Filho da Noite era bonito. Os cabelos eram os mais escuros que já vira, a pele queimada de sol parecia cobre sobre sob as sombras do quarto. Os olhos dourados eram como ouro puro e líquido. A barba escura que cobria seu queixo só tornava-o mais atraente para Samantha.

Ele pareceu notar seu olhar e virou-se em sua direção. Os olhos amendoados se contraíram por um instante e sua cabeça se inclinou ligeiramente para a direita. O licantropo permaneceu nessa posição por um instante antes de sorrir de uma forma que deixou Sam quase chocada. Como sempre aconteciam quando ficavam sozinhos, era como se seu corpo tivesse vontade própria e ela o puxou em sua direção confiantemente.

Soren respondeu solicitamente a ordem, deixando-a agarrar a parte da frente da sua camisa. Ele, contudo ,foi mais rápido e antes que Sam pudesse se inclinar em sua direção, os lábios do Filho da Noite já pressionavam os dela com habilidade e calma. Era uma espécie de provocação. O licantropo tinha muito mais autocontrole do que Samantha e aproveitava-se disso. Divertia-se com sua suas reações e respondia comportadamente a cada um de seus pedidos.

Sam torceu seus dedos no cabelo macio e grosso do licantropo, puxando-o para sim com ferocidade. As mãos de Soren permanecem firmemente em sua cintura quase como se estivessem lhe fornecendo apoio. A irritação misturada ao desejo a fez ir além. Suas mãos desceram pelo pescoço do Filho da Noite, passando pelos ombros incrivelmente largos e braços firmes.

Ela cravou as unhas na cintura de Soren recebendo risos e um leve aperto como resposta. A irritação a fez ser ainda mais incisiva, e Sam passou as mãos por debaixo de sua camisa explorando os músculos do abdômen do licantropo. Ela quase pode senti-lo se arrepiar e, animada, ela se aproximou e mordeu o lábio inferior do Filho da Noite com força. A reação foi quase instantânea.

Com um semirrugido, Soren ergueu-a como se Sam não pesasse mais do que uma caixa de papelão vazia e a levou até o sofá de couro preto. Ela agora não era a única que parecia desesperada. Ambos pareciam perdidos em outro universo, com as mãos de ambos percorrendo cada espaço que encontravam, os lábios se movendo quase em sincronia, as respirações aceleradas aquecendo suas faces.

Eles perderam a noção do tempo. Poderia ter se passado poucos minutos ou toda a madrugada quando ambos se afastaram alguns centímetros e ficaram simplesmente deitados sobre o sofá estranhamente confortável. As pernas entrelaçadas poderiam ser confundidas se as do licantropo não fossem muito maiores. A cabeça da patrulheira estava apoiada confortavelmente sobre o braço direito de Soren.

Eles permaneceram em silêncio por um bom tempo. Soren encarava o teto com os olhos semiabertos. A mão esquerda brincava com um anel de prata que ele mantinha preso no pescoço por uma corrente fina de metal. Sam estava de olhos fechados apenas seguindo o padrão das veias no braço do licantropo com os dedos.

–--Eu tinha 17 anos quando fui transformado. ---A voz grave e rouca de Soren fez Sam abrir os olhos quase que imediatamente. --- Antes disso eu morava com meu pai em um Reserva bem a oeste daqui. Minha mãe morreu depois de dar à luz. Ela era chamada de Muralha do Sol porque a qualquer hora do dia o sol batia na Torre de Comunicação e se refletia em todas as direções na Reserva. Eu estava caminhando pelas redondezas, sabe... não era como na sua Reserva onde o risco dos licantropos aparecer fosse grande e precisasse de um grande contingente de proteção. Não éramos muitos e nunca cheguei a ver um Filho da Noite. Até aquele dia.

Sam pode senti-lo enrijecer e a tensão era quase sólida ao seu redor. Ela pensou em falar algo para mantê-lo falando, mas concluiu que ele falaria quando estivesse pronto e voltou a traçar caminhos em seu braço com a cabeça cheia de pensamentos e a curiosidade crescendo a cada segundo.

–--Devia ser duas ou três da tarde quando aconteceu. ---ele voltou a falar depois de algum tempo. --- Era uma cidade abandonada como esta. Todos os jovens da Muralha do Sol gostavam de ir para lá de vez em quando e encontrar coisas antigas, ultrapassadas. Algumas vezes até encontrávamos livros em boas condições e CD´s funcionando. --- Eu entrei em um supermercado aleatoriamente. Não procurava por nada.

´´ Andei até as áreas mais distantes pensando em talvez achar alguma ala que tivesse roupas. Você sabe como é difícil conseguir alguma coisa na Reserva. Acho que foi azar. Se eu tivesse virado em um corredor diferente teria ouvido o som antes e poderia ter ido embora sem que ele me notasse. Quando cheguei até uma bifurcação entre os corredores que separavam a parte de produtos de limpeza da área contendo objetos de higiene pessoal, eu o vi. ´´

´´ Devia estar procurando por comida. Estava sujo, muito sujo. Descalço e as roupas rasgadas estavam manchadas de sangue. Ele estava revirando as caixas lacradas e ouviu o som que os meus tênis fizeram no chão de mármore. Os olhos eram escuros e cheios de...loucura. Selvageria. Não tive a menor chance. Eu disparei pelos corredores derrubando prateleiras e carrinhos, mas ele era muito mais rápido. O Filho da Noite me alcançou depois de alguns minutos e tudo de que me lembro é da dor absurda que começou nas minhas costas. Ele me mordeu e arranhou várias vezes. Acho que iria me matar, me devorar, não sei. Mas, por alguma razão, ele simplesmente fugiu e me deixou lá sangrando e agonizando.``

´´Eu achei que ia morrer no início. Nas primeiras horas tudo que eu sentia era a dor excruciante que tinha se propagado por todo meu corpo e o sangue escorrendo em rios de mim para o chão. Só me lembrei do vírus quando percebi que depois de tanto sangue eu já deveria estar morto e tudo o que eu sentia eram dores e febre. Não conseguia me mover pelos machucados e vi o sol descendo pelas portas de vidro e finalmente a Lua subindo. Pensei se finalmente me transformaria numa fera, mas não foi isso que aconteceu. Apenas permaneci queimando no chão cada vez mais frio.``

´´ Não sei quanto tempo se passou até que a transformação se completasse. A febre passou gradualmente e meus machucados pareciam doer cada vez menos, ou talvez a dor em minha cabeça tenha se tornado pior e eu passei a tratar meus ferimentos como secundários. Senti que minha cabeça ia explodir e em algum momento, desmaiei.``

´´Quando acordei, tudo estava diferente, por dentro e por fora. As ruas estavam banhadas em escuridão, a Lua era um ponto prateado do lado de fora. Minhas costas não doíam mais e o sangue tinha secado em minha camisa. A febre também havia cessado. Levantei zonzo e perdido. Demorei algum tempo até notar que minha visão e minha audição estavam melhores. Eu conseguia ver de um lado ao outro do corredor sem dificuldades. Podia ouvir as folhas raspando no chão do lado de fora. Eu soube naquele momento que eu tinha me tornado um Filho da Noite.``

´´ Eu acho que havia chorado tudo durante o ataque e não pude chorar mais no caminho de volta. Nem quando voltei para casa e vi minha irmãzinha chorando ao lado do corpo frio do meu pai. Ele finalmente havia tido o ataque cardíaco que ameaçava ter sempre que eu ou Caly fazíamos algo errado. Tudo o que eu fiz naquele momento foi pensar: Caly precisa ficar comigo. Sabia que tinha de mantê-la perto de mim. Lembro do orfanato na Reserva. Caly nunca ficaria naquele lugar.``

´´ Agi rápido, Sam. Eu não a deixei ligar para a Ala Médica. Mandei-a fazer uma mala com tudo o que ela queria levar para uma longa viagem e fiz o mesmo. Durante todo o tempo ela chorava e me perguntava o que estava acontecendo e eu só gritava para que ela fosse mais rápida. Fugimos no meio da noite pela mesma brecha que eu havia usado mais cedo para ir até a cidade abandonada. Eu nunca senti tanto medo na minha vida. Medo de me transformar em uma fera e atacar minha irmãzinha, medo do licantropo que me transformara me encontrar e terminar o que tinha começado, medo da Reserva nos encontrar.``

´´ Mas nada disso aconteceu. Não naquele dia, pelo menos. Eu achei um prédio lacrado longe da Reserva e do mercado para onde o maldito Filho da Noite poderia ter voltado e fiquei a madrugada inteira acordado pensando no que fazer enquanto ouvia a respiração acelerada de Caly que chorou até cair no sono. Eu não sabia o que fazer. Não podíamos buscar ajuda de ninguém. Eles me matariam e jogariam minha irmãzinha em um orfanato até ter idade suficiente para trabalhar em alguma coisa. Mas do lado de fora ela também corria o risco de ser devorada por alguma fera. Humana ou não. Ela precisava de mais defesas do que apenas um irmão semi-transformado que sequer sabia rugir para assustar os cães de noite. Foi por isso que a transformei na manhã seguinte. Infligi a pessoa que mais me amava a mesma maldição que eu carregava. Foi a única maneira que consegui pensar para salvá-la. Até hoje seus gritos de dor durante a transformação me assombram, Sam. ``

O silêncio cobria todo o quarto como gelo, podendo-se quebrar a qualquer momento. Sam pensava em milhares de coisas ao mesmo tempo. Imaginando um Soren mais novo, mais magro e frágil chorando e sangrando no chão sujo de um supermercado abandonado enquanto se transformava na coisa mais perigosa que ele poderia imaginar naqueles dias. Depois na pequena Caly chorando a perda de um pai, chorando pela mordida de seu irmão que deveria protegê-la sempre. E então outras imagens vieram. Suas. No orfanato quando pequena, sempre cheia de medo, tristeza e solidão. Sempre muito pequena e insignificante para qualquer coisa.

–--Você acha que eu sou um monstro? ---Soren perguntou finalmente e sua voz parecia muito frágil. Sam pensou se era assim que ela devia ser quando ele tinha 17 anos.

Ela se ergueu e encarou os olhos dourados, cheios de expectativa, do licantropo. Os lábios franzidos em uma linha fina e tensa. Sam respirou fundo e por fim respondeu:

–--Você foi um herói.


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Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam? Muitas coisas ainda vão ser reveladas. Não só sobre Soren, haha. Até sabado que vem se Deus quiser.
XOXO



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