Os Dezessete escrita por Supremacia Verde


Capítulo 9
Capítulo IX - Joana Salvatore


Notas iniciais do capítulo

Capítulo escrito por Kamilah Carriço e editado por Gabriel Dacoregio e Emily de Farias.



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Eu já estava correndo com meu novo companheiro fazia horas e não tinha noção de quanto tempo se passara desde que deixei minha antiga casa. Lá nunca foi realmente um lar para mim, a única coisa que me prendia naquele lugar era meu pai e não consigo pensar nele sem lembrar das coisas que tinham acontecido, tudo tão recente... Mas me recusei a me esvair em lágrimas novamente, eu ia ter a minha vingança e com esse pensamento, já que estava muito cansada, adormeci em cima da minha raposa gigante e comecei a sonhar.

“Estava escuro, todos já estavam em suas camas, porém eu relutava em dormir.Tinha algo de errado, minha intuição dizia isso, fiquei mexendo no camafeu¹ que meu pai me dera quando tinha cinco anos e que tem a imagem da minha mãe. Eu nunca a conheci, todos me chamam de bastarda por isso, minha madrasta cretina e seus filhos (que me recuso a chamar de meios-irmãos) me fazem lembrar disso todo santo dia e isso me faz odiá-los ainda mais.

Nosso castelo estava silencioso. Meu pai era o Senhor Feudal daquelas terras, então não havia muito com o que se preocupar no quesito segurança, mas se tem uma coisa que eu sei desde que me entendo por gente é: Nunca confie em ninguém, muito menos nos nobres do castelo e foi então que ouvi passos metálicos contra o chão do castelo. Levantei-me e fui olhar pela varanda do meu quarto, no pátio do castelo caminhavam soldados usando mantos azuis, e por serem diferentes do vermelho bordo dos mantos dos homens de meu pai, tive certeza de que eles eram desconhecidos. Com isso eu peguei minha adaga, que sempre deixava debaixo do travesseiro, como de costume amarrei-a na perna para escondê-la, coloquei o primeiro vestido que consegui pegar, embainhei minha espada e a prendi na cintura e atrás das costas prendi outra adaga. Não tive mais tempo para nada. Eu sabia o que vinha depois. Eu teria que fugir.

Algumas luas atrás, eu havia escutado uma conversa da minha madrasta com a corja que vivia sob o meu teto sobre como o meu pai era um otário e que se ela pudesse, ela acabaria com ele e a filha de chocadeira dele (que no caso sou eu, achei bem ofensivo na verdade) para poder se casar com alguém mais poderoso e no plano isso incluía o Rei do Feudo Espanhol, Santiago. É óbvio que alertei meu pai e também é óbvio que ele não acreditou em mim, o que me deixou muito magoada porque ele preferiu acreditar naquela desgraça da humanidade a acreditar na própria filha, isso era um ultraje. E ali estava o preço a ser pago, não dava tempo de alertá-lo, ele provavelmente falaria que eu estava sonhando e me mandaria de volta para a cama e é lógico que minha querida madrasta me acusaria de loucura. Então peguei um dos caminhos que ninguém conhecia para fora do castelo. O ar estava morno e eu estava quase passando os limites do terreno quando escuto uma voz masculina:

– Ei, o que a senhorita faz aqui fora desacompanhada? – Ele falava o idioma comum e a voz soava gentil, mas quando virei vi que era um dos homens estranhos de armadura.

– Vim pegar um ar, estava passando mal com o meu quarto abafado. – Respondi rápido.

Eu estava com um vestido que tinha uma abertura na lateral que dava para a ótima vista que eram minhas pernas. O guarda se distraiu, sequer percebendo a faca presa ali, que com um movimento rápido a arremessei e acertei uma das brechas na armadura dele, depois corri para cortar sua garganta para ter certeza de que ninguém se lembraria de mim.

Antes de deixar minhas raízes e cortá-las definitivamente, olhei para trás enquanto escutava os gritos horrendos do meu pai. A agonia que eles expressavam me fez sentir uma dor tão intensa que eu nunca antes tinha passado. Em meio às lágrimas, corri para o primeiro lugar que me passava na cabeça: a casa do meu melhor amigo, na Vila depois do rio.

Conhecia Juan desde os meus 7 anos de idade, que foi quando comecei a frequentar a floresta abandonada da região para treinar habilidades de luta. Ele só me observava enquanto eu arremessava facas, atirava com arco e flecha e manuseava espadas, tudo isso eu pegava escondido do salão de armas do meu pai. Ele não aprovara a ideia de que eu lutasse e minha madrasta insistia que eu deveria ser internada em um local onde me ensinassem bons modos para aprender “a virar mulher”, foi quando decidi aprender e treinar sozinha. Nunca estive totalmente sozinha lá, já que tinha Juan para me fazer companhia. Só ele sabia o que eu passava, às vezes eu sentia pena dele por ter que escutar minhas inúmeras reclamações sobre a vida, meu único amigo.

Quando cheguei na casa de Juan, entrei pela janela do quarto dele. Naturalmente eu o assustei, quando ele percebeu que era apenas eu em prantos, tentou me acalmar com um abraço. Passou-se algum tempo e consegui lhe contar o que tinha acontecido. Ele também tentou me fazer esquecer o ocorrido, fiquei muito grata por ter alguém para quem eu pudesse desabafar.

Eu sabia que logo teria que ir embora dali, já que os soldados iriam procurar pela bastarda fujona sem demora e o que eu menos queria era de alguma forma afetar a vida de Juan ou lhe causar algum mal.

– Jo, você pode ficar aqui escondida para sempre se quiser, já és de casa. – Tentando me convencer a não o abandonar, eu observava cada movimento dele, seus olhos negros como a noite estavam tristes em contraste com seus cabelos cor de areia levemente bagunçados, de um jeito adorável eu diria.

– Juan, eles vão me achar aqui, não é seguro nem para mim e muito menos para você. Não gosto da ideia de sumir assim, ficar sem te ver e sem saber quando poderemos nos reencontrar, mas não vejo outra saída. – Sem mais delongas, resolvi terminar isso que talvez possa ser chamado de despedida com um beijo cheio de carinho em sua boca, que fora nosso primeiro e último.

Passei dias escondida e perambulando por perto das Vilas espanholas sem rumo até que boatos de que um menino tinha sofrido um acidente chegaram às redondezas. Falei com uma senhora em busca de respostas e as descrições batiam com as de Juan, e estava mais do que claro que não havia sido um acidente, tudo fazia parte do jogo da meretriz daquela mulher que se dizia minha madrasta, mas se ela acha que vou me entregar assim tão fácil, está redondamente enganada, vou aprender a jogar esse jogo tão bem quanto ela.

Comecei a correr rápido demais e sem saber por onde ir, passando por entre as árvores e me distanciando da civilização. A raiva tomou conta de mim, até que desabei no chão sem forças para continuar... Foi então que escutei um leve barulho nos arbustos e minha mão logo foi para a guarda da minha espada por puro instinto, a coisa foi se aproximando e quando consegui distinguir o que era, vi que era apenas uma raposa gigante, um pouco maior que um cavalo de porte grande. Se tem uma coisa que eu gosto é animais, então tentei fazer contato com a raposa, mas ainda receosa sobre o comportamento dela. Ela reagiu bem, deixou que eu acariciasse sua pelagem macia e avermelhada.

– Ei, vou te chamar de Milo, está bem?

E quase como em resposta ele encostou o focinho em minha bochecha. Passei algum tempo ali com Milo até adquirir certa confiança e ele passar a confiar em mim também, então resolvi partir, montei em cima dele e tudo o que podia sentir no momento era apenas o vento em meu rosto.”.

Quando voltei a ter consciência o Sol já estava lá no alto e Milo parecia cansado, então fizemos uma parada perto do riacho e percebi que tudo que sonhei foram eventos recentes. Espero que isso não se repita todas as noites, não quero ficar revivendo os fantasmas do passado.

Fui me banhar no rio e vi que minha aparência era imunda, peguei uma das minhas adagas e resolvi cortar o cabelo para me adaptar ao meu novo estilo de vida e deixar para trás as coisas de ruim que tinham acontecido. Ter uma vida nova daqui para frente, inclusive seria muito mais útil como disfarce agora que eu teria cabelo curto e não mais na cintura como eu costumava ter.

Resolvi dar uma olhada no local a fim de achar algo para comer, já que não aguentava mais essa fome e de repente eu estava de cabeça para baixo pendurada em um galho por uma corda, não deu nem tempo de ver de onde tinha sido a armadilha, mas o dono dela estava se aproximando e eu tinha pouco tempo para pensar no que fazer, espero que ao menos Milo consiga se salvar.


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Notas finais do capítulo

1: Camafeu = Uma pequena joia com a pedra esculpida à semelhança de alguém