Os Dezessete escrita por Supremacia Verde


Capítulo 17
Capítulo XVII - Albjorn


Notas iniciais do capítulo

Capítulo escrito por Gabriel Dacoregio e revisado por Emily de Farias.



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Tavernas são lugares odiosos. Fedem a mijo, cerveja, sangue e no caso de tavernas como esta, a morte também. Sempre tive certa repugnância pelo aspecto animalesco do tipo de taverna que sou forçado a frequentar, mas uma das primeiras lições que aprendi no meu ramo de trabalho é que, nas tavernas e becos mais escuros, você sempre acha alguém disposto a pagar por um serviço violento. Pensando nisso, tento ignorar a orelha humana alfinetada ao lado da porta, e entro na taverna mais perigosa de Kranzberg.

É de se esperar que uma taverna esteja rodeada de bandidos baratos, populada por bandidos sérios, recheada de criminosos dos mais perigosos e eventualmente de mercenários de variadas qualidades sem nenhum escrúpulo (no meu caso, considero minha qualidade respeitavelmente alta, visto que tive apenas duas falhas em vinte anos de carreira). Mas essa taverna conseguia superar minhas definições gerais. Dois homens se esfaqueavam sucessivamente em um canto da taverna, bêbados loucos apostavam em um deles e batiam com malhos em quem quer que apostasse nos outros, os garçons pareciam ter acabado de fugir de uma prisão, e tinha três homens enormes estuprando uma moça morena, que se retorcia e guinchava feito uma porca.

E, no entanto, por sobre todas essas distrações, havia um canto mal iluminado e anormalmente quieto onde se sentava um estranho com um casaco de peles marrom, bebendo pacientemente cerveja de um caneco. No pulso esquerdo, muito à mostra, ele trazia um bracelete de ferro na forma de uma cobra mordendo o próprio rabo. Assim que eu a vi, fui em sua direção e, sem nenhuma cerimônia, puxei a cadeira e me sentei.

“Oh, uma visita inesperada de um mercenário vestido de negro! Precisarei eu fazer minhas preces, ou perguntar a que devo o prazer da visita?”, ele pergunta, com um sorriso zombeteiro por baixo da barba. Não gosto daquilo, mas mantenho o profissionalismo.

“Creio que você sabe tão bem quanto eu, não sabe? Presumo que você já saiba do que se sucedeu ao Lobo.”, eu respondo, firmemente, analisando a reação do homem. Ele não parece ter interesse em se fingir de tolo por mais tempo e responde prontamente.

“Perfeitamente. Eles tentaram esconder, naturalmente, mas você sabe melhor do que eu como essas coisas funcionam.”, ele comenta, sem rodeios. “Os homens que o acharam juram manter segredo, um deles conta para o seu melhor amigo, que fala pra esposa, seus filhos ouvem e contam pros outros, e de repente todos nós sabemos que o grande líder Hernarr, o Lobo, foi encontrado morto com uma espada de sua própria posse enterrada no peito, como uma estaca, e uma marca profunda de mordida no pescoço. E aqueles de nós que têm um pingo de bom senso somam dois com dois e sabem que foi trabalho do Mercenário Negro. É assim que você se apresenta há uns dez anos, não? O que aconteceu com “Morte Negra” ou “Sombra da Noite”? Muito extravagante?”, ele completa com aquele sorrisinho zombeteiro.

Assim que ele termina de falar, dirijo meu olhar diretamente para os olhos dele. Vi olhos castanhos, confortáveis e seguros. Não era comum um homem sustentar o azul frio e inumano dos meus olhos sem vacilar, mas ele parecia bem capaz de fazê-lo. Agora, pelo menos. Pela última vez, eu retiro a carta do bolso interno de meu manto negro como a noite, abro-a e a mostro para ele.

“Eu vim atrás disso. Agradar-me-ia ouvir um conto detalhado, preferencialmente entre cuspidas de sangue, sobre como você conhece tanto minhas alcunhas anteriores. Mas no momento, os conteúdos desta carta são minha maior preocupação. O que você tem a me dizer sobre ela? Não recomendo fazer provocações quanto a isso, senhor, ou você vai descobrir que eu posso ser um pouco... intolerante.”, eu digo, removendo a luva da mão esquerda. Para muitos, um gesto inofensivo, mas ele me conhece melhor do que isso. Aqueles que já foram informados sobre mim sabem do meu hábito de retirar as luvas antes de me pôr a trabalhar com negócios sangrentos. Ele olha para a minha mão, seu sorriso diminui um pouco e, quando fala, sua voz está um pouco mais sóbria, ainda que retenha um toque de animação.

“Heh. Surpreende-me que você consiga manter os seus olhos nesse tom monótono de azul enquanto me ameaça tanto. Rezam as línguas que quando você fica mais abalado, seus olhos tomam uma coloração vermelho vibrante. Mas isso não importa. Adianto-lhe uma coisa: Seu cliente não sou eu. Eu fui enviado pelo meu mestre para lhe entregar seu pagamento pelo serviço, em duas partes. Aqui, tome.”, disse o homem, e retirou uma carta e uma bolsa de moedas do sobretudo. Eu ignoro a bolsa, pego a carta e a abro, disfarçando uma animação que crescia em mim. A carta trazia a seguinte mensagem, em caligrafia suave e trabalhada:

Meus cumprimentos, Albjorn. Já soube de seu sucesso com a questão dos Lobos de Gelo, e por este êxito, estou encaminhando uma soma em ouro maior do que a que, segundo minhas informações, você geralmente cobra por alvos desta importância e dificuldade. Espero que você esteja apto a aceitar minhas desculpas, mas Hernarr não vale a informação que você deseja, e foi uma espécie de teste para avaliar suas habilidades. Se você puder acompanhar meu mensageiro até uma fortaleza não muito longe de Kranzberg, eu o encontrarei lá e o encaminharei a um contrato que, desta vez, renderá a verdadeira informação acordada.

Por fim, a carta era marcada com um selo de uma cobra mordendo o próprio rabo, mas eu mal o vi antes de amassar a carta na mão puxar a adaga e cravá-la na mesa.

“O que significa isso? Você e seu... mestre tomam-me por um tolo? O contrato era a morte de Hernarr pelas informações e nada além disso. Quem vocês julgam ser para testar minhas habilidades? Acho que vão descobrir que os últimos a tentarem fazer isso jazem em túmulos gelados sob os fiordes nórdicos, e creio que seu mestre anseia pelo mesmo destino”, disparo para ele, em leve descontrole.

O homem hesita brevemente e parece ter recuado, mas para fazer isso com o tipo de sujeito que frequenta uma taverna imunda como esta, é necessária uma visão realmente ameaçadora. Uma visão como o brilho vermelho que meus olhos certamente tomaram ao ler os insultos escritos naquele pergaminho, que indica que eu passei o ponto onde é seguro para ele fazer provocações, e o sujeito entendeu isso rapidamente.

“Rogo-lhe que não se apresse, mercenário. Vamos acertar essa história pelo começo.”, ele começa, diplomaticamente, mas continuo impaciente. “Meu nome é Irwin Tauridel, e sou um executivo a mando de meu mestre, que atende apenas por Servo da Sombra. Assumo esta aparência para tratar dos assuntos mais... sujos de meu mestre, mas na realidade sou um modesto senhor feudal do leste. A intenção de meu mestre não foi insultá-lo, mas sim atraí-lo para o nosso meio, assegurando-se de que havíamos contatado o mercenário correto, já que antes não pudemos ir em pessoa ao seu encontro. Agora, meu trabalho aqui está feito. Se tiver interesse no contrato oferecido por meu mestre, por favor, dirija-se ao portão oeste da cidade precisamente ao meio-dia de amanhã, onde teremos uma carruagem esperando. Como condição secundária para negociações, peço a você que não me siga até minha hospedagem, e não deixe sua tradicional “marca” caso assassine alguém esta noite. Nosso interesse nos seus serviços também incluem que ninguém saiba por onde você anda cumprindo contratos. Agora boa noite, caro Mercenário Negro.”, ele finaliza, levantando-se. “Lembre-se. Amanhã, meio dia, portão oeste. Até mais ver.”

O sujeito chamado Irwin me dirige um curto aceno com a cabeça, anda até a porta e some na noite de Kranzberg. Eu o sigo com o olhar até a porta, mas permaneço em silêncio onde estou. Momentos depois, retiro a adaga da mesa (onde já existiam várias marcas de adaga similares, algumas com manchas irremovíveis de sangue seco) e observo novamente a fétida taverna.

Os homens se esfaqueando em um canto haviam (sem nenhuma surpresa) matado um ao outro, e os outros bêbados apostadores agora aparentemente puxavam suas próprias facas para convencer os outros que o seu campeão havia caído por último. Não tenho dúvidas de que nenhum deles sobreviverá a esta noite, e sinto que eles estão fazendo um favor a esta cidade.

Agora que já não estou mais abalado da conversa com o mensageiro do tal “Servo”, noto que os guinchos chorosos cessaram, e dirijo meu olhar para onde a infeliz menina estava sendo violentada, minutos atrás. Os três homens pareciam estar ajeitando as calças, e discutiam sobre algum assunto trivial com um muito interesse. A garota estava atirada por cima de uma mesa, com um semblante pálido e inexpressivo, seus olhos eram pouco mais que duas órbitas vazias. Ela estava nua, mas algum garçom teve a mínima misericórdia de cobri-la com uma toalha gordurosa e imunda, e mesmo com a toalha era possível ver que alguma parte da garota sangrava seriamente. Ninguém na taverna a dirigia o olhar, assim como ninguém dirigiria o olhar para uma mosca sobrevoando a simpática orelha que dava boas vindas aos visitantes na soleira da porta.

Decido que já vi o suficiente por aqui enquanto guardava a bolsa de ouro dentro do manto. Guardo a nova carta no mesmo bolso interno do manto onde sua predecessora estivera, e retalho esta última, jogando os pedaços na lareira da taverna. Um garçom tenta se aproximar, possivelmente para reclamar de eu ter desfrutado do ambiente sem consumir nada, mas se afasta ao ver minha expressão. Nunca tirei o capuz enquanto estava sob aquele teto, o que dá um elemento surpresa ainda mais impactante à apatia gélida dos meus olhos. Saio a passos lentos da taverna, inspirando o ar frio da noite e pensando no que fazer a seguir. Por mais imunda, fétida, horrenda que a taverna atrás de mim seja, o ar da noite é gelado demais para ela. Como sempre, minha única companhia verdadeira é o frio, que mesmo quando não me cerca em uma noite como esta, sempre flui de dentro de mim, purificador.

Ouço um ruído atrás de mim e me viro, com a mão indo suavemente na direção da adaga. Os três gigantescos homens que haviam estuprado a garota morena saíam da taverna, e estavam se posicionando para me cercar, com olhares animados e ao mesmo tempo cautelosos. Retiro as luvas e pouso a mão sobre a adaga presa na minha cintura. Não são necessárias palavras para mim. Apenas o meu silêncio e a minha expressão bastam para que eles falem.

“É você, não é?”, fala o homem que se encontra à minha direita, o que parece ser o mais lento e pesado dos três, que carrega um grande machado de guerra nas mãos. “O tal Mercenário Negro do Norte. Um homem alto, vestido com um manto, botas, capuz, luvas, tudo completamente negro, carregando um machado de arremesso ridículo nas costas e uma adaga comprida demais na coxa. Você é esse tal sujeitinho, não? Estávamos ocupados com aquela camponesinha apetitosa enquanto você conversava com o outro viajante, mas provavelmente você veio ser pago, né? Então, nós vamos ficar com esse pagamento... e com a reputação de ter assassinado um dos maiores mercenários do norte.”, ele termina com um sorriso amplo, que mostra dentes amarelados e quebrados, com restos imundos de carne presos entre eles. Eu o encaro por um momento, e então me dirijo a todos eles, sem nenhuma emoção, e que é um reflexo perfeito do que eu penso sobre esta situação.

“Entendo. Agora me digam exatamente o quê faz vocês acreditarem que um mercenário de renome, como vocês colocam, morreria nas mãos de um trio patético de bêbados fedorentos que têm a indecência de estuprar uma garota com metade do tamanho deles em uma mesa de taverna? Não me recordo de tais glórias do submundo serem reservadas a covardes que abusam de violência sem sentido.”, eu digo a eles, me virando a cada um deles enquanto falo, mastigando cada palavra e vendo que assim que essas mesmas palavras saem da minha boca, uma nova gota de fúria surge em seus rostos, palavra a palavra. Da próxima vez, é o da minha frente que fala, o mais alto dos três e de aparência mais fraca, porém mais ágil. Ele carregava um facão e um cutelo rústico, que aparentava ter saído de um açougue.

“Não nos provoque, seu mercenariozinho de merda. Vocês do norte pensam que são bárbaros, que são selvagens, que são fodões, mas são só um monte de sacos de merda comparados a nós, bandidos sulistas de verdade, que sabemos foder os inimigos no campo de batalha como fazemos com nossas mulheres na cama. Agora fica quietinho e abaixa a cabeça, que a gente pode pensar em não te torturar muito.”, disse ele, seguindo com um escarro e um cuspe. Os cabelos negros deles estavam sujos e gordurosos, e ele salivava muito enquanto falava, parecendo um cão raivoso. Julguei que o palavreado vulgar combine com um animal selvagem destes. Resolvo não responder mais, apenas ponho a mão direita no cabo da machadinha, flexiono as pernas e espero.

Minha espera não demora muito, uma vez que o alto de cabelos pretos se adianta com o facão na frente do corpo e erguendo o cutelo para um golpe vertical. Ao mesmo tempo, aos meus dois lados, os outros homens também partem para o ataque, mas em tempos diferentes: O sujeito silencioso à minha esquerda tinha estatura mediana, mas braços fortes e ágeis, e utilizava duas espadas curtas com aparência de razoável qualidade, enquanto o gordo com o machado longo se demorou mais para encurtar a distância. Apesar da vantagem do açougueiro alto, o da esquerda acabaria chegando ao mesmo tempo, e não penso duas vezes em pular para a minha direita, quase que em direção ao homem gordo. Ele não parece estar habituado em ter pessoas se aproximando com tanta ausência de cautela, pela expressão em seu rosto, mas ainda consegue brandir o machado com força o suficiente para decapitar um homem forte (isto é, se o machado estiver bem afiado, o que eu duvido. Provavelmente, ele conseguiria decepar meia cabeça, e temo que apenas tocar no machado cause casos horríveis de cinco doenças diferentes). Lento demais.

Eu me abaixo e avanço em direção à esquerda, passando logo abaixo do movimento diagonal descrevido pelo machado longo. Saco a machadinha do seu suporte rapidamente e a cravo entre duas costelas do homem gordo. A intensidade do seu ataque o deixa completamente desprotegido e embalado no momento do mesmo, algo típico de um lutador que decide seus combates em um golpe violento e brutal. É uma pena para ele, pois antes dele poder processar o que acaba de acontecer, eu enterro a adaga no centro de sua nuca. Enquanto isso, os dois outros homens quase se esbarram no local onde eu estava antes, mas já se recuperando.

Largo a machadinha, que estava enterrada profundamente demais na banha do homem para eu conseguir puxar a tempo, e uso a mão livre para rapidamente livrar a adaga, ao mesmo tempo atirando o corpo agonizante do gordo na direção dos outros dois. Isso tem o efeito desejado: Eles se separam, um para cada lado. Movo-me na direção do da direita, o homem alto de cabelos negros, com armas de açougueiro. Ele era o mais eufórico dos três, e brandia ambas as armas de maneira aleatória e confusa, quase se cortando no processo. Eu sabia que tinha de agir rápido, então desvio do facão por milímetros, aparo o cutelo com a adaga, e agarro firmemente na frente das vestes do homem com a mão livre. Uma das vantagens de ser uma criatura como eu é que sua força física aumenta substancialmente, independente de aparências, então eu consigo forçar o corpo do homem a se mover um pouco para a esquerda...

... Onde ele encontra as duas lâminas do homem silencioso, que avançavam para me atacar pela lateral. O açougueiro alto solta um grunhido de surpresa, e acidentalmente solta as duas armas. Sem perder tempo, mergulho em direção ao cutelo, agarro a arma e faço um rolamento para o lado, a tempo de desviar da espada do homem, que já se recuperara do ataque.

Permito-me um momento para analisar meu oponente: Ele tinha cabelos pretos cortados irregularmente, uma barba mal feita, olhos sanguinários e uma cicatriz horrível na boca, que possivelmente explicava a ausência de som vinda de lá. Dos três, era obviamente o mais capaz, com duas espadas em estado decente, e braços e pernas musculosos e ágeis. Eu havia despachado os outros dois o mais rápido possível, justamente porque notei que ele daria mais trabalho do que seus amiguinhos. Ele também me analisa por um segundo, bate com uma espada na outra, e avança cautelosamente.

O estilo de luta deste terceiro homem é muito mais polido do que o de seus companheiros, tanto na precisão dos golpes quanto no controle que ele exerce sobre as armas, para que elas não tirem o movimento do seu corpo dos eixos. Procuro manter um ritmo de desviar de uma espada e aparar a outra, preferencialmente com o cutelo imundo do homem alto, procurando uma oportunidade de estocar com minha adaga, mas não acho oportunidades boas o suficiente, porque ele mantém um bom controle sobre a distância proporcionada pelas espadas. Começo a me concentrar nos pés dele, então, e sinto o ar à minha volta ficando mais condensado, mais pesado... Mais frio.

O homem não tem como perceber o que eu estava fazendo, até escorregar na fina camada de gelo recém-formada no chão e tombar para o lado. Assim que ele começa a cair e perde momentaneamente o controle sobre os braços, eu avanço rapidamente e desfiro um golpe com a adaga. Até ele cair no chão, a barriga dele já tinha sido aberta de um lado ao outro. O homem bate a cabeça no chão com um baque surdo, mas parece estar se agarrando à consciência com o único propósito de saber o que se sucedera. Em resposta, atiro longe o cutelo do outro homem, ergo minha mão e crio um pequeno palito de gelo entre o polegar e o indicador, mostrando-o para o homem. Ele me dá um olhar de compreensão e aceita o abraço da morte.

...

“Ouvi falar sobre um trio de bandidos mortos na frente de uma certa taverna ontem”, diz Irwin, em tom de censura. “Cada um com um buraco no lugar do coração. Um deles ainda estava trespassado pela própria espada. Que me diz disso?”, ele completa. Ele obviamente já sabe da história, mas quer ouvir uma explicação.

“Digo que quando as pessoas procuram pela própria morte, elas devem ser atendidas com a assinatura do mensageiro que elas escolheram. Apesar de qualquer situação, aquele que serve a morte para os outros deve ao menos se responsabilizar pelo ato. Embora não pela morte, pois a morte vem para todos”, digo a ele. Eu me contive de congelar estacas nos peitos deles como de costume, e não fazia a menor questão de beber o sangue daqueles três homens asquerosos (especialmente depois de recolher minha machadinha de bom aço das banhas do homem gordo), mas me senti obrigado a, pelo menos, furar o coração de cada um deles com uma das espadas do terceiro homem, e deixar a outra cravada no próprio coração dele. É mais do que três porcos depravados merecem, mas é o compromisso que eu assumi, quase duas décadas atrás.

Irwin murmura algo, mas não presto atenção nele e fecho os olhos, deixando o balanço da carruagem reverberar pelos cantos gelados do meu corpo, e lembrando do frio ar da noite anterior.

Há quem diga que o fogo purifica a alma e deixa o essencial, mas eu discordo. O fogo queima e transforma em vapor todas as gorduras e impurezas, impregnando o ar com uma fumaça preta, quente, densa e horrível, espalhando essa sujeira pelo ar. Já o frio purifica, preserva, eterniza. Após terminar meu ritual com os três brutos e recuperar minha machadinha na noite anterior, andei até o riacho que corta a cidade para limpar minhas armas sujas, e me aproveitei do frio da noite para refletir sobre a proposta do mestre de Irwin Tauridel. Cheguei a uma conclusão simples: O que iniciou minha jornada foi a morte congelante e devastadora que me chegou um dia, que purificou tudo até não existir mais nada. E me transformou em algo similar. Portanto, para ir de encontro a ela, tenho que usar as armas que ela mesma me deu. E, assim, há mais ou menos meia hora, eu encontrei Irwin no portão oeste da cidade, e sigo em direção ao desconhecido. Um desconhecido que sabe onde o gelo absoluto se encontra, aparentemente, mas nunca o sentiu na pele. Não o teve dentro de si.

Ainda.


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Notas finais do capítulo

Como eu prometi no último capítulo do personagem, este fez jus a vários dos temas mais pesados da classificação da fic, mas espero que tenham gostado!



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