O elevador descia muito devagar, Matheus estava inquieto, nos olhando a cada momento com um sorrisinho. Bernardo estava entre nós, percebia que estava um pouco incomodado também. Olhava os números no painel do elevador ficando cada vez menores e quando as portas abriram senti um alívio imenso.

Ao sair do elevador cumprimentamos Matheus educadamente com um gesto de cabeça e nos dirigimos ao carro.

–Acho que isso vai gerar algum mal entendido- comentei

–fique tranquila, esses boatos de escola são coisas efêmeras, sem falar que quase ninguém acredita muito quando ouve um, já que a maioria são inventados, é só não dar muita importância

–mas isso pode sujar minha imagem para os seus pais

–fique tranquila que eles sabem como são os colegiais, boatos como esse iriam sair mais cedo ou mais tarde

Quando chegamos à escola estava tudo normal, será que Matheus tinha alguma dignidade em não espalhar um boato?

–parece estar tudo bem por aqui, nada fora do comum, será que...?

–só comemore depois que o primeiro intervalo passar

Era aula de literatura, o professor iria passar um filme, então as luzes estavam apagadas, Bernardo estava deitado na minha mesa enquanto eu fazia carinho no cabelo dele. Comecei a notar uma atividade anormal de pessoas no celular, elas olhavam para mim e Bernardo discretamente. Pelo jeito Matheus não tinha a dignidade que eu estava esperançosa em ver.

–Bê, parece que já se espalhou a notícia

Meu celular começou a vibrar

–não me fale que já descobriram seu número?

–já sim, essas pessoas não deveriam estar estudando para o vestibular?

–vá se acostumando hahaha- ele pegou o celular da minha mão e desligou- estou monopolizando a sua atenção agora, não quero dividir com essa máquina

–nem dividir com o professor de literatura?

–para ele eu abro uma exceção, fazer o que? Não posso competir com um velhinho barrigudo beirando os 60 e que sabe usar as palavras- ele disse isso com os nossos narizes quase se tocando, éramos o flautista e a cobra, uma sincronia em total hipnose

–verdade você não teria nenhuma chance com o poder sobre as palavras dele! Haha

–vejo então que terei que te conquistar mais

–muito mais- por um momento sai do transe e vi vários olhos arregalados e ouvidos atentos- acho melhor amenizarmos nossas conversas em público

Ele olhou envolta, demonstrando já estar farto de se conter em público. Desenhei um coração no caderno dele e tentei manter a minha atenção na aula.

No intervalo estávamos seguindo nosso caminho de sempre rumo ao jardim secreto quando um furacão chamado Bruna entrou em nosso caminho, Vanessa e Thiago vinham atrás

–Melody! Parada! Vocês dois vêm comigo!

–Bruna, caso você não tenha percebido hoje não é um bom dia para muita exposição pública!

Foi inútil falar, ela nos levou para uns bancos mais afastados, mas expostos ao movimento de pessoas do mesmo jeito

–Pronto falem! O que está rolando entre você?

Olhei para Bernardo que estava achando a situação divertida, ele fez um gesto dizendo que eu deveria anunciar

–estamos namorando- disse mostrando o anel de compromisso

–AAAAAAAh!!!!- disseram Bruna e Vanessa

–Então o boato que esta rolando é verdade??

–o que estão dizendo nesse boato?

–Que Matheus pegou vocês dois saindo do apartamento comemorando uma noitada

–Esse boato é uma mentira - Alegou Bernardo- Matheus nos viu saindo do mesmo apartamento e tirou conclusões erradas

–O que? Mas o que vocês estavam fazendo no mesmo apartamento então?

Eu havia comentado com Bernardo que não queria que ninguém soubesse que estávamos noivos nem que morávamos no mesmo apartamento, pelo menos por enquanto. Iria parecer tudo muito rápido e estanho. Queria tentar manter segredo o maior tempo que conseguisse. Não pensei que descobrirem iria ser tão rápido, então não tínhamos nenhuma justificativa bolada para essa situação. Tínhamos que pensar rápido em uma resposta...

–O que acontece é que os pais da Mel precisaram viajar...e ela é neurótica em perder aula não é Mel? Então os pais dela a deixaram ficar lá em casa desde que houvesse um adulto responsável por nós dois a todo momento.

–e eles estão fazendo marcação cerrada, ligam a cada cinco minutos, é um inferno!

–hum... a coisa está ficando sério entre vocês hein!!! anel de compromisso, até ficaram sobre o mesmo teto!

–pois é

–que continue assim não é?- falou o Bê

Fiquei tranquila de ter esclarecido o boato para os três, por que assim eles iriam espalhar a “verdade” pela escola. Só conseguimos um pouco de paz indo ao nosso jardim secreto no segundo intervalo.

–é tão bom o silêncio daqui

Bernardo olhava o céu, era uma imagem poética aquela, naquele dia ele estava usando uma blusa branca de botão e uma calça preta, e o vento que trazia o perfume dele a mim me deixava dopada.

–o que foi?

–nada não, só te observando

–eu achei um desperdício

–o que?

–esse boato não ser real

Ele começou a se aproximar de mim com a precisão e dominância de um felino caçando. Senti minhas bochechas ficarem vermelhas, comecei a rir por causa da vergonha, e tentei esconder meu desconforto:

–e não vai se realizar tão rápido assim, só depois do casamento!- Eu estava sentada no banco de lado, ele estava bem de frente para mim, se aproximou de uma forma que acabei deitada, com a cabeça na pedra fria do banco, presa entre seus braços, que a força que eles faziam era o que impedia de ele dar uma cabeçada em mim, achei cômica a cena, mas o clima era denso de uma forma que não conseguia me concentrar em nada.- se nos pegarem assim vão fazer interpretações erradas de novo!

Ele então se afastou sem dizer nada, e relaxou no banco. Aquilo tinha sido estranho.

Ele ficou normal depois que saímos do jardim como se nada houvesse acontecido, achei melhor eu ignorar o fato de me sentir uma presa algumas horas antes. Estava tudo indo bem, até que no almoço ele falou:

–Mel, você sabe que eu só estava aqui para encontrar uma noiva, certo?

–sim, sei

–e eu encontrei a ideal para mim

–assim você me deixa sem graça Bê

–então...chegou a hora de eu ir para a faculdade- Aquilo me chocou! Como assim? Ele me deixar sozinha no meio dessa escola!! Sem a proteção dele as garotas iriam me comer viva! E eu não conseguia imaginar uma escola sem ele! – acalme-se –disse ele vendo minha agitação- provavelmente só vou precisar parar de frequentar o cursinho semana que vem, ou até mais tarde, sinto muito sair em meio a essa situação do boato, mas acho que até eu sair todos já terão esquecido isso!

–mas e se eu não for a garota certa para você, e se eu desistir, e se eu...

–eu confio em você, assim como sei quem eu quero ao meu lado, e tenha a certeza de que eu farei de tudo para não te perder!