“A mulher era bela, mesmo na escuridão onde tudo o que se podia ver eram sombras e silhuetas. Bela de uma forma intimidante, hipnotizante e temível. Como um animal selvagem que você sabe que não deve chegar perto.

A garota conseguia perceber que estavam numa caverna. Era úmida e fria, provavelmente devido à proximidade com algum rio. Seu corpo estava coberto de cortes e hematomas, e seu cabelo mais parecia um ninho de passarinhos.

– O tempo está chegando. Não há nada que eles possam fazer para impedir. Os Olimpianos ainda estão abalados, os mortais são fracos e não entendem o que acontecerá – Falou a mulher – Logo você estará forte o suficiente para realizar a profecia.

Eles não falavam inglês, mas a ruiva conseguia entender o que diziam. Estava apavorada e queria correr, queria fugir, mas estava acorrentada a pedra.

– E os meio-sangues? – A voz dentro da caverna respondeu – Eles certamente mandarão uma missão para o que ameaçar o precioso acampamento. Gaia não conseguiu segurar eles, o que te faz pensar que conseguirá?

O rosto da mulher se contorceu em uma máscara de desprezo. Sua voz era suave e melodiosa, quase como uma canção, em contraste com a voz na caverna, que era gutural e áspera. Cada palavra que a caverna proferia causava um arrepio na menina dos cabelos de fogo.

– Pai, sabes tanto quanto eu que Gaia era uma mera distração para que tivéssemos o tempo necessário. Ela é poderosa, mas tola. Subestimou os heróis de um jeito que nunca faremos. Os meio-sangues estão em festa, exultantes por terem vencido. Não esperam que surja uma nova ameaça tão cedo.

– Conseguiu falar com teu irmão?

A mulher assentiu.

– Ele se reunirá conosco em breve.

– Bom. E quanto aos outros.

– Já foram avisados. A senhora da neve recusou, mas disse que também não se unirá aos Olimpianos.

– Não importa. Ela mudará de opinião quando a hora chegar.

A mulher fez uma mesura, para então se virar na direção da garota. O andar dela era tão suave quanto sua voz, quase como estivesse flutuando. Seus cabelos eram tão negros quanto à noite, dando um toque especialmente pálido a sua pele, que se parecia com a lua. Seus olhos brilhavam como milhares de estrelas, e o sorriso dela era malicioso e falso.

– O que faremos com você, querida? – a menina se encolheu ao perceber a proximidade dela com a mulher dos olhos estrelados. Ela esticou o braço, tocando o rosto cheio de cortes da garota – Não posso te devolver a seus amigos, mas você não tem mais utilidade para mim.

Ela tirou a mão do rosto da ruiva e deu de ombros.

– Suponho que meu irmão encontrará uma função para ti. Não se preocupe, ele é tão divertido quanto eu.”

Rachel acordou com o próprio grito. Estava suada e havia jogado os travesseiros para fora da cama ao se debater. Todos os dias tinha o mesmo sonho, sempre acordando no mesmo momento. O problema é que tudo parecia muito real. A profetisa ainda podia sentir os dedos frios em sua bochecha esquerda.

Preciso falar com Quíron.

A garota saiu lentamente da cama, sentindo o corpo dolorido. Colocou chinelos e saiu do quarto de pijamas mesmo, tanta a pressa que estava. Precisou apenas entrar na Casa Grande para encontrar Quíron lá, analisando um jogo de xadrez já finalizado.

– Rachel, o que faz aqui? – O centauro olhou para ela com a face preocupada – Não deveria estar dormindo?

– Não consigo dormir – Rachel bocejou e passou a mão pelos olhos cheios de olheiras – Há dias que não durmo, na verdade. Quando adormeço, tenho um sonho. É sempre o mesmo. Quíron, isso está errado. Eu não sou semideusa, não deveria estar tendo esses sonhos.

– O tempo está estranho.Os dias estão cada vez mais curtos e as noites cada vez mais escuras, embora seja verão. Mortais tem sonhos que apenas semideuses deveriam ter. Conte-me sobre o seu sonho, Rachel.

A ruiva contou cada detalhe do pesadelo. Quando terminou, o rosto dele estava mais preocupado do que Rachel jamais vira. Ele suspirou, antes de fazer um sinal com a mão que indicava que Rachel deveria sair.

– Tente dormir e não se preocupe com isso no momento.

A garota estava saindo, quando sentiu uma névoa esverdeada lhe envolver. O espírito tomou conta de si antes que percebesse, e a garota começou a ditar a profecia:

Nove meio-sangues sonharão o chamado

Em meio destes, um traidor encontrado

Na caverna da Donzela, a flecha dourada encontrar

Para que assim, possam os filhos parar

Quíron ouviu com atenção a profecia ser ditada, sabendo que uma missão deveria ser designada para cumpri-la. Sabia também que essa não era a nova Grande Profecia, pois Rachel já havia falado essa alguns dias antes.

O centauro esperou o espírito deixar o corpo da garota, para que pudessem discutir o significado do que acabara de escutar. Mas, em vez disso, a névoa envolveu cada vez mais o corpo da ruiva, até que ele estava completamente coberto.

Então a névoa se dissipou.

O corpo de Rachel havia desaparecido.