O Regresso do Desespero escrita por Duchess Of Hearts


Capítulo 19
Nowhere to Run


Notas iniciais do capítulo

Yooo! Então gente... Sem Hopeful Moments dessa vez. Vou explicar muito brevemente o que aconteceu: Eu estava com IMENSAS dificuldades a escrever esse capítulo. Primeiro porque alguns leitores ficaram de me dar notícias e não deram e, assim sendo, o voto acabou num empate que me impedia de escolher as personagens.
Eu ia escolher ao acaso, contudo ao mesmo tempo acabei ficando completamente desmotivada para fazer isso. Então decidi que ia parar com esses free time events, então os próximos capítulos serão focados só na história.

Talvez faça os free time events no final da fic, não sei. Depois vejo como isso será, pois ainda acho que vão haver personagens com pouca (ou quase nenhuma) exploração.

De qualquer jeito, espero que gostem desse capítulo, e me perdoem a demora!
Não reli (como sempre), então qualquer erro não hesitem em falar!



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– Isao! – Chamou a justiceira no seu habitual tom irritado – ISAO! RESPONDE LOGO!

Abri os olhos com um susto, esperando encontrar o meu quarto. Em vez disso, encontrei um absoluto nada. Flutuava, sem chão abaixo de mim para me apoiar, e tudo o que eu via era completo branco. Senti uma mão tocar-me no ombro.

– Isao! – Resmungou Shizue quando eu me voltei para encará-la. Ela… Não estava morta?

Estaria eu sonhando…?

– Shi… Shizue? – Balbuciei, ainda sem saber bem como reagir à situação. Ela fechou os olhos e inspirou fundo.

– Até que enfim! – Comentou ela, as mãos caindo sobre a anca – Precisamos de falar contigo.

– Precisamos…? – Olhei à volta, certificando-me que estávamos sozinhos. Quando voltei a encarar a justiceira, não era mais ela que lá estava.

– Mas é claro, Isao. – Sorriu-me Evan com o seu habitual tom calmo. Segurava uma bíblia no braço, como sempre. – Nós todos temos algo a transmitir.

– Humpf, isso não é o tipo de coisa que eu estou habituado a fazer. – Eikichi, atrás de mim, estava de braços cruzados e encarando o vazio ao meu lado em vez de me olhar diretamente. Quando ele começou a falar, Evan já não estava mais perto de mim – Normalmente sou EU a extrair informações… Não a dá-las. Considere-se sortudo, Isao.

O sorriso malicioso dele surgiu no seu rosto quando se virou para mim.

– De qualquer jeito! – Disseram duas vozes ao mesmo tempo, distraindo-me de Eikichi por um segundo e fazendo-o desaparecer da minha vista. À minha esquerda, Kayo apoiava-se no meu ombro fazendo beicinho, como se algo não a agradasse. Na minha direita, o cotovelo de Ichiro fazia peso sobre o meu outro ombro. – Vamos logo ao assunto, sim?

– Que sonho mais estranho. – Murmurei para mim mesmo distraidamente. Logo recebi um beliscão no braço, fazendo-me recuar um pouco para ver Natasha à minha frente.

– Então, ainda acredita que isso é um sonho? – Deu uma risadinha e piscou-me o olho. – Vá, não nos interrompa, por favor! Quero apressar isso logo.

Impaciente e impulsiva, tal como a minha primeira impressão da astrofísica, ela não mudara muito. Massajei o meu braço, a dor ainda me fazendo uma ligeira impressão. Ela tinha mais força do que parecia.

– Você queria ver se ele estava sonhando ou arrancar o braço dele fora, Natasha? – Inquiriu Evan com surpresa, atrás de mim. O jeito que eles continuavam aparecendo e desaparecendo estava me incomodando, mas dessa vez Natasha mantivera-se no lugar.

– Heheh. Eu não sou assim TÃO ruim, Evan! – Disse ela com uma risada feliz.

– Eu juro que não te entendo, moça. – Resmungou Chiyeko, ao lado de Natasha – Você uma hora diz que tem pressa e depois fica calmamente conversando com o Evan? Qual a lógica?

– Ohh, Chieyko! É óbvio que isso acontece porque ela ~gosta~ dele! – Sugeriu Kayo, com uma risadinha alegre.

– Humpf. Os dois estrangeiros loiros. Que bonitinho. – Zoou Ichiro.

– Não é como se isso fosse um segredo para ninguém. – Completou Eikichi, bocejando – Bom, talvez para o ISAO… Mas não para nós.

Minha mente não conseguia acompanhar aquela conversa. Cada um ia aparecendo à medida que falava, formando uma roda à minha volta. Uma roda de pessoas que não deveriam mais existir. Contudo, em vez de perguntar o que raios estava acontecendo, o que saiu dos meus lábios foi bem diferente.

– Onde… Está Kurama? – Inquiri. Que coisa mais bizarra. Eu estava perguntando pela presença de uma pessoa morta, a outras pessoas mortas.

– Onde está ela, de facto…? – Fora Kayo quem respondera à minha pergunta. – Ela é…

Não consegui entender o que ela falava, apesar de estar ouvindo atentamente. As suas palavras saíram estranhas, sem nexo, apesar de ser claramente japonês. Pisquei os olhos algumas vezes em surpresa mas, por algum motivo, dei-me por contente com aquela resposta incompreensível. Como se eu a tivesse compreendido.

– Você e Ichiro…

– Somos a mesma pessoa sim. – Respondeu o automobilista – E daí? Apesar disso, não somos a mesma personalidade.

– Logo merecemos ter dois corpos diferentes! – Exclamou Kayo entusiasticamente – Teria facilitado muita coisa se assim fosse, não é mesmo?

Mais uma vez, acenei afirmativamente com o que ela dissera, aceitando-a com naturalidade. O que se passa comigo?

– Já está esclarecido? – Perguntou Chiyeko, suspirando e rolando os olhos como se não tivesse paciência para o que estava acontecendo. – Sério, o nosso tempo se escasseia.

– É verdade. – Concordou Evan com seriedade – Isao, nós viemos aqui para te fazer um pedido.

Um pedido? O que poderia tal coisa ser? Em uníssono, todos os mortos responderam à pergunta que eu fizera apenas na minha mente.

Tente se lembrar. – Não pareciam várias pessoas falando isso. Falavam com tamanha coordenação que soavam como uma só voz.

– Me lembrar…? – A minha surpresa não chegou à minha face, que se mantinha numa expressão calma, como se eu tivesse sido anestesiado.

– É imperativo.

– Necessário.

– Um tanto impossível.

– Salvará vidas.

– Matará outras.

– Não há outra hipótese.

A escuridão subitamente começou a tomar conta da minha visão, cada um dos meus ex-colegas subitamente começando a desaparecer.

– HEY! – Finalmente meu corpo começara a ceder ao que eu realmente sentia – E-ESPEREM! Eu preciso que me respondam a umas coisas!

– Desculpe, Isao. – Respondeu Shizue, a sua voz soando cada vez mais distante – O tempo acabou.

– N-NÃO!

Traidores. Vítimas. No meio deles estavam pessoas que tinham perdido completo a sua sanidade e vida para o desespero.

Ainda assim, eu queria…

– X -


Acordo sentindo-me exausto, uma dor de cabeça excruciante quase me impedindo de me levantar. Decidi ficar deitado por mais uns tempos até que finalmente consegui forçar-me a sair da cama. Arrastei-me pelo quarto até chegar ao banheiro, onde me encarei ao espelho. Tinha olheiras profundas e a minha cara de sono era irrefutável.

Que espécie de sonho tinha sido aquele? Cocei o braço distraidamente quando subitamente senti uma dor fortíssima que me assustou e fez recuar um passo. Um vermelhão enorme estava presente nele, e ao mínimo toque sentia dor.

O que estava acontecendo…?

Já estavam todos à minha espera quando eu cheguei à sala comum. Quando o fiz, alguns suspiraram de alívio.

– Até que enfim, Kimoto! – Disse Reiko que já estava de pé, com os braços cruzados e uma expressão impaciente – Já estávamos com medo que te tivesse acontecido alguma coisa!

– Ah... – Suspirei, as dores me impedindo de levantar o olhar – Desculpem.

Fizeram silêncio por um tempo. Eufrat aproximou-se de mim e, delicadamente, pousou a mão sobre o meu ombro.

– Isao… Está tudo bem? – Inquiriu num tom preocupado. Tentei sorrir para acalmá-la, mas não consegui obrigar os meus músculos a fazer isso.

– Sim. Estou só com dores de cabeça… Hoje não descansei muito bem. – Expliquei, pelo que a empresária acenou afirmativamente.

– Bom, tenha cuidado, sim? – E com isso, voltou a ir ter com Ai. Dei por mim a pensar como Eufrat era praticamente a única pessoa com quem a ativista falava. Certamente, ela de vez em quando conseguia trocar umas palavras comigo ou com Teemu, mas nunca era da mesma forma aparentemente aberta e alegre com que ela conversava com a empresária.

O dia prosseguiu como esperado. Depois de tomar o café da manhã, Monokuma apareceu para nos avisar que um novo andar tinha sido aberto. Já era o esperado por todos. Aparentemente, era mais um andar inferior, abaixo daquele que havia sido aberto da última vez. Deixei-me ficar um pouco pelo refeitório antes de finalmente descer, sendo por isso o último a lá chegar. Logo que entrei, encontrei Teemu a encarar a parede. Não demorei muito a perceber que, ao contrário dos outros andares, aquele tinha um nome escrito numa placa.

“Andar da Arte”

– Não é interessante, Kimoto? – Perguntou ele, numa pose pensativa, mais para ele mesmo do que propriamente para mim – Isso me fez perceber que os andares estão, de facto, distribuídos de uma forma… Digamos que temática.

– De facto, assim o parece. – Concordei, não demorando muito a perceber a onde ele queria chegar – A ala oeste do andar onde nós ficamos tem laboratórios… Talvez pudesse ser chamado “andar da ciência” ou algo assim?

Recebi um aceno afirmativo como resposta.

– O outro andar é claramente o “andar do desporto”. – Comentou ele, franzindo a testa – E agora temos o “andar da arte”… Certamente, eu ouvi dizer que Hope’s Peak era uma escola mais virada à prática do que à teórica, mas não pensei que fosse desse jeito.

– Não achámos nenhuma sala de aula propriamente dita, não é mesmo? – Completei, coçando a cabeça – Meio que dá a sensação que não estamos em Hope’s Peak de verdade…

– Não. – O tom do aventureiro foi anormalmente cortante – Nós estamos DEFINITIVAMENTE em Hope’s Peak Academy.

Limitei-me a lançar um olhar surpreso ao outro, mas não recebi qualquer resposta. Ainda tentei trocar mais umas palavras com ele, mas rapidamente percebi que Teemu estava demasiado preso nos seus pensamentos para dizer alguma coisa. Saí para o corredor para explorar um pouco mais.

Parecia um andar relativamente mais pequeno que os outros. Pelo mapa que estava no nosso ID de estudante, tinha uma forma de Z com ângulos retos. Tinha, no total, apenas 4 salas, sem incluir os banheiros. Entrei na primeira sala que encontrei ao caminhar pelo corredor. Abri a porta apenas para encontrar Reiko e Connor passando o que parecia ser o melhor momento da vida deles.

– KIMOTO! – Chamou Reiko, num tom feliz – Você tem de ver esse lugar, é DE-MAIS!

– Quantos jogos! – Os olhos de Connor brilharam enquanto ele observava umas prateleiras cheias de CDs – OHH, E TEM ANIMES TAMBÉM! JÁ POSSO MORRER FELIZ!

A primeira sala, como dizia na placa à entrada, era a sala de jogos. Um pouco estranho, supondo que aquele seria o “andar de artes”. Supus que talvez fosse para os alunos terem algo para fazer enquanto esperassem entre as aulas, sem ter de sair daquele andar? De qualquer jeito, era uma sala cheia de coisas que serviriam para entretenimento em geral, não apenas jogos. Connor logo pegava num dos DVDs de anime e sentava-se rapidamente à frente da televisão plasma para começar a assisti-lo, os olhos brilhando de entusiasmo. Logo o título de Pokémon apareceu na tela e o cosplayer, com o capuz cobrindo a sua cabeça, logo apontou para o título e soltou um alegre “Pikaaa!”. Reiko estava mais entretido analisando o que pareciam uns jogos de tabuleiro de… pesca. Eu nem sabia que existiam jogos desses.

– Hmm, pessoal… Não se esqueçam que temos de ver primeiro se tem aqui alguma coisa que nos ajude a sair e DEPOIS aproveitar os espaços… – Avisei, torcendo o nariz em descontentamento. Foi Reiko quem me respondeu, pois o outro já estava demasiado vidrado no anime para sequer me ouvir.

– Não se preocupa, cara. Nós vamos explorar isso cuidadosamente.

– Isso eu… Não duvido. – Dei uma risadinha nervosa e decidi sair dali antes que eu mesmo começasse a me distrair com aquela sala de tentações.

Continuei caminhando pelo corredor. Como era só um, ao contrário dos outros, não era difícil de encontrar as salas e os outros estudantes. Entrei no quarto seguinte.

Aproximava-se de uma sala de aula normal. Estava cheia de quadros inacabados e materiais de pintura, manchas de tinta espalhadas em todo o lado. Parecia uma confusão, mas o tipo de coisa que deixaria um SHSL Painter em êxtase. Aquele era, de facto, a sala de desenho. Observando um dos inacabados quadros, estava Ai sentada numa das mesas. Eufrat debruçava-se por trás dela, o seu queixo quase que repousando no ombro da outra.

– Está vendo aqui? – Dizia Eufrat com a serenidade de uma professora, apontando para um ponto específico do quadro – O uso das cores…? Sim, definitivamente, o pintor está transmitindo uma sensação de pêsame, de perda, de sofrimento. Pelo menos é assim que eu interpretaria. Não concorda?

A albina abanou a cabeça negativamente.

– E-Eu acho que é bonito… Não vejo nada disso – Comentou ela inocentemente, parecendo um pouco desiludida consigo mesma por não entender a visão da empresária – D-Desculpe…

– Não tem problema. – Com um sorriso, Eufrat endireitou-se – Nunca fui muito boa a entender arte, por muito que tenha tentado aprender. Talvez seja uma coisa que não se aprende, não sei.

Após ter notado a minha presença, recebi um sorriso da parte da morena.

– Olá, Isao. – Cumprimentou ela educadamente – Sente-se melhor?

– Oh. – Nem sequer tinha notado como a minha dor de cabeça se atenuara para um estado ignorável, apesar do cansaço continuar ali – Sim, acho que comer ajudou.

Ela acenou afirmativamente, satisfeita.

– Veio ver o que tinha aqui? Receio que não tenha grande coisa. Apenas imensos utensílios para pintura… Sério, tem todo o tipo de coisas aqui. E os quadros que estão aqui são lindos, apesar de inacabados.

– Dá a sensação que foram obrigados a deixar isso feito pela metade, não é? – Inquiri. Ai soltou um som que parecia assustado.

– I-Isso… Significa que… Já h-houveram outros alunos aqui…? – Perguntou ela, se afastando do quadro que estava à sua frente como se tivesse descoberto que ele tinha peste.

– Talvez não alunos, mas ALGUÉM já usou esses utensílios. – Concordou Eufrat, numa expressão subitamente preocupada – Oh… Isso meio que significa que…

– Esse lugar não foi construído apenas para nos prender aqui dentro. – Completei. Meu olhar passeou pela sala, tentando encontrar uma resposta. Algures no passado… Aquele lugar teria sido usado para pinturas. As provas estavam à nossa frente. Até mesmo as manchas nas paredes e no chão davam a entender que não era uma mera encenação.

– Seria possível que estamos, de facto… Em Hope’s Peak? – Soltou Eufrat, hesitante. Mordi o lábio inferior, tentando arranjar alguma lógica no que estava acontecendo.

Não faria sentido que estivéssemos em Hope’s Peak.

Contudo, não podíamos dizer que estávamos em outro lugar que não esse.

– Não. – O tom do aventureiro foi anormalmente cortante – Nós estamos DEFINITIVAMENTE em Hope’s Peak Academy.

O que é que Teemu queria dizer com isso…? Teria ele notado alguma coisa?

– Que pergunta boba, essa minha. – Ela sorriu, tentando acalmar o ambiente subitamente tenso que se instalara ali dentro – Eu já visitei Hope’s Peak, eu SEI que isso é diferente de lá.

Por alguma razão, ela não me soou muito segura no que dizia. Como se ela mesma começasse a duvidar um pouco das suas memórias. De tanto que Monokuma jogara na nossa cara “isso é Hope’s Peak Academy”, a mentira quase que parece se tornar real. Mas seria realmente uma mentira…?

– De qualquer forma, ainda não vi as outras salas. – Comentei, tentando dar aquele assunto por terminado – Então até logo.

– Sim, até logo.

– A-Até logo.

E dito isso, saí daquela sala. Não fui logo para a próxima, limitando-me a ficar na porta por um tempo pensando no que tinha acabado de discutir. Após algum tempo, cheguei à conclusão que isso nada me ajudaria, pelo que fui até à porta da sala do lado. Ia entrar quando notei que a sala seguinte estava com a porta aberta, e dela podia-se ouvir uma bela música tocada num piano. Decidi seguir então o som, entrando para ver Satoru tocando. Não sabia bem o que eu esperava, mas ver o ilusionista com aquela seriedade era algo… Diferente do normal. Quando notou a minha presença, parou de tocar para me observar. Diretamente nos olhos. Do jeito mais constrangedor que eu alguma vez vi.

– Hmm… Oi. – Falei, tentando fazer com que ele desviasse o olhar – Você er… Toca bem?

– Obrigado. Aprendi uma vez para um truque. – Explicou-se o ilusionista. Após algum tempo, recomeçou a tocar mas, seguidamente, levantara-se e a música não parara – Esse truque, para ser mais preciso.

Como é que…? Olhei para o piano numa expressão interrogativa, o que só aumentou quando Satoru começou a tocar OUTRA musica, que tocava ao mesmo tempo que a primeira. E logo ele tocava uma terceira. E as três músicas se sincronizavam, todas elas tocadas sem que o ilusionista mexesse os dedos, formando uma linda sinfonia.

– Isso... Como que…?

– Mágica. – Respondeu o outro, sorrindo perante a minha cara de estupefacto. Após um certo tempo estalou os dedos, fazendo com que a música imediatamente parasse, mas eu ainda fiquei o encarando boquiaberto. Tentei me recompor.

– Err… Pois. Ahem. Você achou alguma coisa? – Perguntei, à qual recebi um distraído menear negativo de cabeça. Como vi que ele estava demasiado na lua para realmente dizer alguma coisa de útil, não fiz menção de forçar a conversa. Decidi, em vez disso, olhar em volta.

Era uma sala bastante abastada para uma simples escola – mas de qualquer forma, TODOS as salas daquele lugar eram assim – com praticamente todos os instrumentos musicais possíveis e imagináveis ali presentes, quase que não dando espaço para se mover ali dentro. Tinha algumas cadeiras e um pequeno palco para apresentações. Certamente, seria ali onde clubes de música e orquestras treinariam diariamente. Mas não havia nada de especial que chamasse realmente a atenção. Suspirando, acabei saindo da sala, após me despedir de Satoru (que parecia bastante focado em usar um dos instrumentos num próximo truque de mágica em vez de realmente procurar uma saída).

Saí para encontrar Kobayashi na porta da sala ao lado, onde eu ia entrar. Parecia cansada.

– Ah, oi, Kobayashi. – Cumprimentei. Não recebi qualquer resposta. Melhor assim. Conversar com uma piromaníaca psicopata como ela era sempre uma tarefa exaustiva. Entrei pela porta dentro apenas para vê-la saltitando atrás de mim, me seguindo. Tentei ignorá-la, mas conseguia sentir sempre a garota de vestes rosa-choque ali perto, o que me deixava absurdamente desconfortável.

A sala em que estávamos era uma sala de escultura. O pó de barro estava espalhado pelo chão e, tal como no caso da sala de pintura, diversas esculturas incompletas estavam posicionadas ao longo da sala, sobre as mesas e balcões. Tinha umas torneiras no canto e diversos utensílios próprios para a construção e manipulação dos vários tipos de materiais de escultura. “Essas coisas são perigosas. Umas perfeitas armas” disse uma vozinha na minha mente. Essa voz soava estranhamente como Chiyeko… Subitamente comecei a pensar no meu sonho e… Abanei a cabeça, tentando manter o foco. Apesar daquela sala ser obviamente dedicada à escultura, tinha um pequeno quarto extra no canto, tal como a piscina ou o ginásio. Aproximei-me do quarto e olhei para a porta. Possuía uma pequena janela de madeira que podia ser aberta por dentro, do tipo que deslizava. Abri o quarto – absurdamente pequeno, por sinal – para ver uma pequena banheira e um cheiro estranho a químicos. Estavam estendidas fotografias no topo e uma máquina numa mesa num canto. Uma luz vermelha, que estava desligada, brilhava no topo.

– Takane viu isso também! – Disse a designer. A sua voz estava muito mais próxima de mim do que eu esperava, pelo que reprimi um salto com o susto. – Muito estranho, nee? Uma sala para revelação de fotografias, pareceu a Takane. Ohh, sabia que esse químico é bastante inflamável? Takane não pode esperar para experimentá-lo! Ara ara, o seu coração está em chamas só com a ideia!

Não me dei ao trabalho de lhe responder em vez disso, soltei uma pergunta eu mesmo.

– Porque é que um quarto desses estaria numa sala de escultura…?

– Ohh, você faz muitas perguntas, Isao-kun! – A resposta não veio de Takane. Em vez disso, estava o urso na minha frente, fazendo-me dar um salto para trás com o susto – Essa sala era originalmente a sala de fotografia. Mas depois decidiram que não valia a pena ter uma sala SÓ para fotografia, já que, bom, as fotografias não são tiradas na sala mas sim em outros lugares. Então adaptámos isso para uma sala de escultura e deixámos só esse quarto para revelações intacto!

– …Obrigado. – Foi tudo o que eu consegui dizer perante aquela informação. Contudo, Monokuma não pareceu satisfeito.

– Upupu… Porque não dá uma olhada nas fotografias? Elas são excelentes… Tiradas pela Super High School Level Photographer, nem mais! Com certeza que vai achá-las… Interessantes.

E dito isto, ele saiu. Takane apressou-se a empurrar-me para pegar nas fotografias que estavam penduradas nos fios no cimo do quarto.

– O quêêê!? Hey, Isao-kuun! Me diga, me diga, QUAAANDO é que você conheceu Junko Enoshima-chan? – Ela se virou para mim com uma expressão irritada – Ela é basicamente a modelo mais kawaii para qual eu alguma vez fiz uma peça de vestuário! E VOCÊ NÃO ME CONTOU QUE A CONHECIA? Ara ara, Isao-kuuun! Você é uma fogueira de surpresas!

– Fogueira de… surpresas? – Tinha a certeza que essa expressão não estava correta. De qualquer jeito, logo peguei na fotografia na mão dela e…

Ali estava eu, sorrindo. Ao meu lado, estava a grande supermodelo, a extremamente famosa e conhecida Junko Enoshima – sorrindo e me abraçando. O quê? Desde quando é que eu a conhecia? E parecia estar tão feliz ao lado dela…

– Isso deve ser montagem. – Concluí, encolhendo os ombros. Não havia jeito nenhum para aquela foto ter sido alguma vez tirada. Com certeza… Aquela era mais uma peça de Monokuma para nos distrair.

– Mas Isao-kuun! – Reclamou Takane, fazendo um beicinho enquanto ela começava a ver as outras fotografias – Fotografias tiradas com câmaras analógicas não são fáceis de fazer montagens, neee? E isso com certeza parece bastante real, nee! Diga a verdade a Taka…

Ela parou quando estava vendo uma fotografia em particular, soltando um tímido “…ne” apenas algum tempo depois. Parecia genuinamente surpreendida. Olhei por cima do seu ombro para ver que tipo de fotografia era e também estaquei, confuso.

– Nee, Isao-kun… – Sussurrou a designer, como se estivesse com medo de que fosse ouvida – Evan-kun e Ichiro-kun… Estão mortos, certo? Absolutamente… Definitivamente… Mortos. Nee?

Engoli em seco.

– S-Sim, é verdade. E Suzuki nunca… Nunca tiraria uma foto dessas. – Completei.

A fotografia era Suzuki e Evan, sorrindo e fazendo caretas engraçadas para a câmara, como se fossem dois bons amigos. Não havia nada de especial na foto, exceto o facto de serem eles os dois. Pior ainda – eles estavam com o uniforme de Hope’s Peak. Eles se conheciam antes…? Era muito improvável. Ainda assim, aquela foto…

– Tem mais… E essa foto até tem Takane! – A designer pareceu ficar absurdamente irritada – O QUE É QUE ISSO SIGNIFICA? TAKANE NÃO ESTÁ ENTENDENDO!

Me assustei com a situação, dando um passo para trás. Takane não estava assustada, muito pelo contrário. Estava completamente enfurecida por algo não estar correndo como ela esperaria. Até então, ela nunca havia se preocupado com nada, mas a partir do momento em que ela aparecia numa foto e que ela percebeu que havia algo que estava completamente fora do seu controle que a envolvia diretamente… Ela não aceitava bem a situação.

– HEY, MONOKUMA. – Chamou a piromaníaca com um tom ameaçador. – APAREÇA AGORA, SEU URSINHO DE MERDA, E EXPLIQUE ISSO IMEDIATAMENTE. TAKANE JURA QUE PEGA FOGO NESSA MERDA! ELA ESTÁ SE CONTROLANDO, MAS SÓ PRECISA DA PORRA DE UMA RAZÃO PARA CAUSAR UM “ACIDENTE”!

Monokuma não apareceu. Eu conseguia imaginar a sua risada ao longe, desobedecendo e debochando de KT do seu cadeirão, demonstrando ainda mais o quão impotente e insignificante ela era para ele. Uma veia palpitou na testa da designer, mas eventualmente inspirou fundo e se acalmou.

– Takane… Se recusa a ser humilhada desse jeito. Ara ara, kawaii, Monokuma-kun. Tão, tão, tão, TÃO KAWAII! – Deu uma risada desprovida de vida, completamente insana. E pensar que eu, no passado, achava que ela era só uma moça inocente e estranha… Vi-a a afastar-se de mim e dei-me por satisfeito o facto dela não ter ficado muito mais tempo.

Voltei a observar as fotos que tinham sido jogadas descuidadamente sobre o pequeno balcão. Eram imensas fotos, todas elas muito bem tiradas e bonitas, por sinal. Pormenores desde o ângulo à iluminação contribuíam para que as pessoas parecessem praticamente mais belas ali do que na vida real. Eram várias fotografias nossas. Takane e Chiyeko. Suzuki e Evan. Eu, Ai e Eufrat. Connor no cosplay de uma personagem de dragon ball. Havia pelo menos uma foto com todos, e em grande parte delas estávamos com o uniforme de Hope’s Peak.

Certamente, não nos ajudaria a sair dali. Mas era algo importante a reportar.

Quando nos reunimos, conseguimos perceber que, mais uma vez, não havia forma de sair. Akatsuki ainda acrescentou que estivera testando pessoalmente todas as janelas – ou, melhor dizendo, placas de metal – daquele andar, e como sempre nenhuma delas se movera minimamente.

– Mas eu notei uma coisa mó estranha – Comentou ela, pensativa – A quantidade de janelas no andar de baixo é maior que nos andar de cima.

– Oh, sério que vamos ficar pensando nesses pormenores? – Inquriu Reiko – Vai que o arquiteto era um besta ou algo assim. Isso não nos ajuda nada.

Akatsuki não respondeu, aparentemente um pouco irritada com o pouco caso que fizeram da sua pequena descoberta. Quando eu falei das fotografias e as mostrei, também não recebi a reação que esperava. Apesar de inicialmente surpreendidos, Eufrat logo apressou-se a dizer que aquilo deveria ser uma das várias formas de Monokuma tentar nos fazer desconfiar uns dos outros, e que seriam com certeza montagem. Os outros pareceram aceitar isso como certo sem grandes questões. Mordi o lábio inferior. Seria mesmo isso que se passava…?

– Se quer que lhe diga a verdade – Murmurou Satoru depois de nos dispersarmos, parecendo estar falando mais para ele mesmo do que para mim – Não acredito no que Eufrat sugeriu. E acho que ninguém acredita nisso também.

– Então… Porque…?

– Porque todos concordaram? Porque é mais fácil negar do que aceitar as coisas.

Os dias passaram lentamente. Isso porque, apesar de tudo, já sabíamos perfeitamente o que ia acontecer a seguir. Em breve, receberíamos um novo motivo. Um motivo que, de algum jeito, ia conseguir levar alguém a cometer assassinato.

Era uma verdade. O facto de eu aceitar isso como dado… Era puramente desesperante.

Tal como todos esperávamos, em poucas semanas fomos reunidos por Monokuma na sala comum.

– Ohhh, o que se passa? – Inquiriu Monokuma, aparentemente sem compreender porque estávamos todos com um ar tão pesado – Vamos, vamos! Alegrem-se! O vosso diretor está aqui especialmente para vocês, para vos dar mais um glorioso e desesperante motivo! É hora para festa! Uhuuuuuu!

E dito isto, caíram alguns confettis sobre ele enquanto tocava uma trompete sem grande sucesso. Não sei se esperava que começássemos a dançar e a gritar quando ele falou isso, mas o urso pareceu meio constrangido com a nossa falta de entusiasmo.

– Ai, que chatos! Assim os leitores dessa maravilhosa história sobre vocês que eu estou escrevendo nem vão achar graça! – Cruzou os braços, completamente desiludido – Que personagens mais rasas… Não aceitando uma única brincadeira…

Elevou a pata num gesto triunfante.

– De qualquer forma! O vosso motivo da vez é “coisas sobre vocês que nem vocês sabiam que envolve a vida de vocês!”… Ficou um pouco repetitivo, esse título, não? Não interessa, aqui têm!

Dito isso, jogou um monte de envelopes para nós. Cada um deles tinha o nosso nome, pelo que não me demorei a encontrar o que dizia “Isao Kimoto – SHSL National Hero” e a pegá-lo. Por um lado, eu não queria abrir aquele envelope. Mas por algum motivo, não conseguia me obrigar a conter-me. Eu sabia que alguns de nós não iam abri-lo, provavelmente iam jogar o envelope no lixo assim que pudessem. Eu deveria fazer o mesmo. Deveria, mas não o fiz.

“Isao Kimoto é adotado.”

Era essa a única frase que estava escrita no papel branco. Pisquei os olhos algumas vezes, sem saber bem o que absorver daquilo. Parecia uma mentira completa, até que percebi que havia outro papel atrás do primeiro. Quando fui a abri-lo, percebi…

Aqueles papéis eram os documentos da adoção. Tinham até o carimbo do orfanato onde fui acolhido. Engoli em seco. Aquilo… Não era verdade, pois não? Primeiro destroem a minha família, e depois dizem que ela nem era minha família para começar.

– N-Não pode… Ser… – Murmurei para mim mesmo, engolindo em seco. Ao meu lado, vejo Kobayashi rasgando furiosamente o conteúdo da carta e saindo para o seu quarto. Ai se encolheu no seu canto murmurando “não… isso não pode ser verdade…” e Reiko parecia ter gelado no seu canto.

De algum jeito, eu sabia.

Eu sabia que um assassinato estava próximo de novo.


Que desesperante.


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Notas finais do capítulo

Comentários? Quem acham que serão os assassinos e vítimas da vez? Digam as vossas opiniões!

Até ao próximo! c: