Escudo escrita por Melzinha


Capítulo 6
Capítulo VI- "Pedacinhos da Alma"




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Escudo

Capítulo VI

Por Mel

Pedacinhos da Alma

“Syaoran, precisamos ir”

A voz de Takashi parecia um sussurro ao vento, como uma lembrança estranha quase despedaçada. Tudo estava embaçado, sufocado, morto. E ali estava ele, de joelhos, às margens do rio, tentando assimilar o que acontecia, tentando simplesmente sobreviver ao choque. Preferiria morrer mil vezes do que perdê-la. Sentia-se zonzo, impotente.

Sentia-se morto.

Levantou-se em silêncio, os âmbares quebrados pela dor, e seguiu o amigo que levava a prima nos braços. Apertou tão forte o pingente entre os dedos que chegou a machucar sua pele. A raiva e a tristeza novamente inundaram seu coração. Faria a rainha pagar...Nem que fosse a última coisa que fizesse, nem que isso custasse seus anos, sua juventude...a faria pagar.

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“Syaoran?”- A voz doce invadiu seus ouvidos- “O que você está fazendo?”.

“Bom dia, princesa”- O pequeno rapaz sorriu ao ver a menina se aproximar. Corou de leve pensando para si mesmo como uma menina de apenas onze anos era capaz de possuir tamanha beleza.- “Eu estou afiando a espada”.

Ela colocou a mão do queixo, achando aquilo divertido.

“Para quê?”- Sentou-se ao lado dele. O vestido de renda rosa espalhado pela grama- “Já não está afiada o bastante?”.

“Uma espada nunca é afiada o bastante”- Comentou casual, enquanto continuava o trabalho.

“Entendi”- Permaneceu quieta olhando de forma sonhadora para o horizonte. Os olhos verdes brilhantes como sempre.

“Não tem aula de dança agora?”- Perguntou observando a garota por cima dos ombros. Era impressionante como apenas a presença dela se fazia suficiente para iluminar seu dia.

“Não. A professora está indisposta. Minha tarde está livre”- Levantou-se e se aproximou dele. – “E eu decidi passá-la inteirinha com você”.

O adolescente arregalou os olhos e corou com o comentário. O coração aos saltos. Ele largou a espada e encarou a princesa, que permanecia com um sorriso terno nos lábios desenhados.

“E o que quer fazer?”- Perguntou tentando conter a vermelhidão das bochechas. Intrigou-se ao vê-la colher algumas flores silvestres que se espalhavam pela grama.

“Casar com você”- Respondeu divertida enquanto imitava uma noiva com um buquê. Ele piscou duzentas vezes olhando para a menina- “Oras Syaoran, é apenas uma brincadeira. Vai...”- Estendeu o buquê- “Você é a noiva, e eu sou o noivo”.

“Não seria o contrário?”- Perguntou divertido segurando desajeitadamente as flores.

“Depende”- Ela sorriu entusiasmada dando alguns passos para trás em seu corredor imaginário da igreja.- “Quando casarmos de verdade, você vai ser o noivo e eu a noiva”- Comentou inocentemente sem ter ideia do que aquela frase causara no pequeno coração. – “Agora, segura essas flores e caminha na minha direção”.- Ordenou, arrancando um lindo sorriso dos lábios do menino.- “Essa árvore será o sacerdote”.

E naquele bosque, diante de um carvalho atrás do grande rio, juraram amor eterno em uma brincadeira inocente.

“Até que a morte nos separe”- Ele jurou com a mão no peito.

“Não gosto dessa frase”- Ela comentou o encarando- “Vamos mudá-la”- Colocou a mão no queixo esperando por uma ideia brilhante.

“Já sei”- Syaoran disse em um meio sorriso- “Por toda a eternidade”.

Viu os olhos verdes brilharem em deleite.

“Gostei!”- Posicionou-se- “Você jura primeiro”-

“Por toda eternidade”- mesmo não sendo um casamento de verdade prometera a si mesmo que aquilo seria uma perpétua verdade em seu coração.

SSSS Fim das Lembranças SSSS

Por toda eternidade... Apertou mais uma vez o pingente entre seus dedos. Tão quebrado, quanto sua alma.

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“Eriol!” A voz melodiosa ecoou pela pequena vila às margens do rio.- “Eriol? Já está perto do jantar, querido...Ainda está estudando as flores?”.- Suspirou- “Eriol Hiragisawa! Eu estou falando com você”.

A bela jovem de cabelos negros balançou a cabeça descrente. Havia duas horas que Tomoyo chegara em casa, depois de sua jornada de trabalho na vila, e nenhum sinal do marido. Deveria estar acostumada com esses sumiços do médico, mas não conseguia. Memórias vinham a sua mente o tempo todo relembrando-a de todas os perigos que o rapaz passara para estudar mais profundamente a ciência da vida. Enfrentara cobras, escorpiões, aranhas, passara por doenças exóticas e alergias estranhas apenas para ajudar pessoas. Suspirou pesado, sabia que o marido fazia isso pelo coração de ouro que tinha, mas não conseguia conter a preocupação.

“Eriol?”- Chamou novamente. Estava pensando em chamar a ajuda dos vizinhos para procurá-lo quando de repente a voz abafada do marido soou entre as árvores.

“Tomoyo! Aqui!”-Era impressão dela ou havia urgência em sua voz? Correu mais rápido até a margem.

“Meu amor?”- Ela parecia aflita- “Você está bem?”.

Ele se virou para ela.

“Veja que maravilha”- Mostrou uma planta azul de aspecto estranho- “Uma rara ‘flor do céu’”.- Ajeitou a lupa que construíra com cristal e madeira para observar os detalhes brilhantes daquela exótica flor.

Tomoyo revirou os belos olhos violeta em descrédito, encarando o marido, logo em seguida- “E eu achando que estava em perigo”- Levou as mãos as têmporas.- “Você ainda vai me deixar com os cabelos brancos antes do tempo”.

“Perigo? Ora minha cara”- Aproximou-se da mulher depositando-lhe um carinhoso beijo na testa, sem deixar de segurar a planta- “Você se preocupa demais”.

“É que você, meu querido...Se arrisca demais”- Completou sorrindo pelo toque carinhoso. Hiragisawa era um marido acima de todas as suas expectativas. Nunca imaginou que um jovem médico de terras longínquas iria se instalar na vila mais distante da capital, parte do pequeno reino de Osaka, divisa com a grande terra de Tomoeda.

Quando ela, uma costureira de dezenove anos, fora pedida em casamento pelo rapaz, pensava que acordaria a qualquer momento de um lindo sonho, mas os dois anos ao lado do marido, de agora vinte e três lhe mostraram que muitas vezes Deus fazia as coisas mais simples da vida virarem experiências extraordinárias, só não imaginava que essa sede por conhecimento do rapaz a faria quase viuvar todos os dias.

“Não consigo evitar”- Confessou puxando-a para um abraço.- “E hoje valeu a pena enfrentar o crocodilo de-”.

Ela se afastou o encarando assustada.

“Um crocodilo?”-Cobriu o belo rosto com as mãos.

Ele riu.

“Eu só estou brincando...”- Riu mais ainda vendo o rosto branco se avermelhar de raiva- “Queria ver sua reação...”- Protegeu-se de um tapa- “Mas o que eu estava falando seria verdade. Uma ‘flor do céu’ valeria o esforço...”.

“O que há de tão extraordinário nessa planta estranha?”- Perguntou emburrada, ainda chateada pela brincadeira de mau gosto do rapaz.

“Ela é capaz de curar graves infecções...O estranho é que em todos esses anos aqui, eu nunca havia visto uma flor dessas nascer no meio da margem. Normalmente essas flores gostam de terras áridas para desabrocharem...”.

“Às vezes essa é diferente”.- Deu os ombros.

“Pode ser”- Ponderou intrigado- “Acho que vou levar a terra em volta dela para ver se há algo diferente, algum mineral ou algo assim”.

“Querido...acha mesmo necessário?”- Suspirou- “Quer dizer, a nossa casa já está cheia de coisas ‘extraordinárias’ que você encontra por aí”.

“Tudo em nome da ciência da vida, minha violeta...”- Sorriu ao ver as bochechas da esposa corarem. Ele sabia que mexia com ela ao chamá-la dessa maneira, se bem que os olhos da esposa lembravam mais ametistas escurecidas pelo tempo...

“Está certo”- Balançou a cabeça- “Vou buscar um vaso para guardar a terra”.

“Não precisa, eu tenho algo que-”

De repente o coração do médico perdeu um batimento. Piscou algumas vezes para ter certeza que estava com os olhos funcionando corretamente. Tomoyo seguiu a direção em que o marido olhava com tamanho horror e deu dois passos para trás ao ver um corpo esguio repousando sobre as margens.

“Meu Deus!”- Levou a mão a boca- “Será que está mor- morta?”.

Ele se aproximou com receio. Virou a pequena figura que estava de bruços. Era uma menina! Não deveria ter mais do que dezoito anos. Estava ferida, fraca, desidratada... Sentiu o coração doer, verificando receoso a pulsação no pescoço delicado.

“Não...”- Suspirou aliviado- “Mas os batimentos estão muito fracos. Vamos”- Olhou para a esposa- “Me ajude a tirá-la daqui”.

E mais do que prontamente Tomoyo ajudou o médico a carregar a menina, sem ter ideia que naquela noite, em sua humilde residência, a beira da morte, repousaria a única herdeira legítima de Tomoeda.

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“Como ele está?”- Takashi perguntou seriamente observando Li calado, sentado em uma pedra. Desde o incidente, Li permanecia calado. Chorara por quase duas horas depois que saíram das margens. Chegara ao ponto de pegar uma espada e tentar cometer uma loucura contra a própria vida, mas os gritos desesperados de Meyling o fizeram desistir. O que adiantava viver, quando a alma já estava morta?

“Calado...Desde que chagamos aqui, ele não fala...ou come”- Meyling comentou com pesar sentindo o coração fisgar.

“Se continuar desse jeito vai acabar morrendo”- O amigo falou preocupado, observando as olheiras profundas nos belos e tristes olhos do ex-comandante de Tomoeda.

“Acho que é isso que ele quer”- Uma lágrima escorreu pelo canto dos olhos rubis, agora menos inchados. Virou-se para o primo- “Vamos, Syaoran...Você precisa comer alguma coisa”.

Ele não respondeu, apenas resmungou mostrando que não queria falar. Quando chegaram onde Shang estava, o ex-soldado não precisou perguntar o que acontecera, os olhos de seu filho falavam tudo. Aqueles olhos gelados e doloridos mostravam que falhara em proteger aquilo que mais presava em toda a vida. Sofreu ao imaginar o sofrimento ao qual seu menino estava passando. Sempre soube dos sentimentos do rapaz pela herdeira de Tomoeda.

O quanto ele a adorava...

Syaoran o carregou nas costas até uma pequena vila chamada Chiba, onde uma médica os recebeu na madrugada, reconhecendo o velho senhor como o conselheiro direto do rei de Tomoeda, terra de sua mãe. Era difícil ver mulheres exercendo essa profissão, mas Kaho Misuki parecia saber muito bem o que fazia. Fora as plantas milagrosas daquela mulher misteriosa que em tão pouco tempo trouxera formas reconhecíveis novamente para o rosto de Meyling, e curara em grande parte a ferida do ancião.

“Dê tempo a ele”- A médica começou a falar, trocando a bandagem de Shang. – “O tempo é o melhor remédio para um coração ferido”.

“Tempo...”- Meyling bufou contrariada- “Quanto tempo uma pessoa aguenta sem comer?”.

“Ele vai comer...Primeiro ele precisa digerir a informação de que perdeu o amor de sua vida para sempre...”- A médica continuou sem encarar a morena.- “E isso não é fácil de aceitar”- Suspirou- “Experiência própria”.

Sentiu os olhos rubis repousarem sobre ela, ia responder alguma coisa quando um grupo de soldados invadiu a casa do vizinho a procura do grupo de traidores de Tomoeda, fazendo um barulho tão estrondoso como de um trovão ao meio de uma tempestade.

“Como nos encontraram?”- Takashi perguntou baixinho observando a milícia matar um dos moradores da casa vizinha.- “Deus do céu, eles vão matar todos...”.

“Devem ter seguido o nosso rastro...”- Meyling comentou sussurrando.- “O que faremos? Se nos acharem aqui nos matam, e aí sim acabam com a vila toda”.

“Eu tenho uma ideia. Preciso de alguma coisa pessoal de vocês, como espada...roupas...qualquer coisa que estavam usando. Atrás do templo há um cemitério farto. Acreditem, Chiba já participou de guerras terríveis...Colocarei os objetos sobre as tumbas, e direi que morreram”.

“Acha que vão acreditar nisso?”- Foi a primeira coisa que Syaoran falou em dias. A voz soara seca, quase falha. Suas cordas vocais doeram.

“Podemos tentar. Direi que chegaram feridos há alguns dias e que não pude salvá-los”.

“Por que está fazendo isso?”- O guerreiro voltou a perguntar. Desde que chegara não entendia o porquê aquela mulher os estava ajudando tanto, sem sequer cobrar. Escutara quando o pai contara toda história a ela, mas não teve forças para brecar o ancião.

“Considere uma dívida de honra com uma das minhas amigas mais querida...”- Sorriu enigmática encarando o rapaz que aceitou a explicação, ligando os pontos. Agora tudo fazia sentido. Talvez o fato de uma mulher ter se tornado médica tivesse um dedo da falecida rainha por trás.

“Se descobrirem ou desconfiarem você morrerá. Tem certeza de que quer fazer isso?”- Meyling perguntou hesitando continuar.

“Sempre tive”- Levantou-se abrindo uma porta subterrânea- “Esse túnel os levará para perto da clareira leste, fora das terras reais. Agora depressa, fujam pelo bosque...Ueda fica há dois dias de caminhada pelas margens do rio. Procurem ser discretos. O preço por achar vocês está perto das cem mil moedas”. Falou por fim. Não passou um segundo depois que fechara a passagem secreta para que os soldados arrombassem a sua porta.

Fechou os olhos e orou para que eles não fossem descobertos. Devia isso a Nadeshico. Olhando suavemente para o soldado a sua frente, a médica fez reverência reparando que os objetos pessoais ainda estavam na casa. Droga! O que faria agora? Precisaria usar toda sua persuasão para convencer que as tumbas eram de fato dos ‘traidores da coroa’.

“Em que posso ajudá-los, meus senhores? Há algum ferido entre vocês?”.- Perguntou ainda de cabeça baixa. Quanto mais tempo demorasse na conversa, mais chances eles teriam para fugir.

“Procuramos por três jovens e um velho manco. Por acaso a senhora não os viu?”.

Ela respirou fundo.

“Vi sim... Se quiser posso levá-los para onde estão”.

O soldado adentrou a casa de supetão a fazendo dar dois passos para trás. Reparou nos objetos sobre a mesa e apontou a espada para a médica chegando a milímetros da sua garganta.

“Está mentindo mulher... Por que as coisas deles estão aqui?”.

“Eu...bem...”- Bateu na própria cabeça em busca de uma ideia brilhante- “As estava limpando para um funeral decente”.

“Funeral?”- O homem levantou uma sobrancelha.- “Explique”- Encostou a lâmina tirando algumas gostas de sangue da pele delicada. Fez uma careta sem perceber.

“Eles chegaram muito feridos e em estado deplorável...aqui. A moça chegou morta...o velho não resistiu a flechada”- Sua voz era fria tentando passar o máximo de verdade possível- “O rapaz menor estava gravemente ferido na perna e a febre o levou”.

Analisou a mulher de perto. Lembrava-se de ter esmurrado Meyling e não seria difícil não sobreviver a tantos golpes. O velho fora realmente ferido nas costas e o idiota do arqueiro sempre subia em árvores altas, poderia facilmente ter caído. Agora...era sobre o comandante que estava preocupado.

“Havia um outro rapaz junto com eles...”.

“Ah sim” –Os olhos castanhos mostrando nítida tristeza- “O jovem comandante...”.

“Ele mesmo. O que aconteceu com ele?”.

Ela estendeu a espada suja de sangue, sangue esse que pertencia a outro soldado que enfrentaram na entrada do vilarejo, mostrou-lhe e com a expressão calma disse por fim.- “Tirou a própria vida...Dizendo que falhara ao proteger a princesa, mas creio que a morte do velho também teve a ver, eles pareciam ligados”.

“Era pai dele”- Comentou engolindo a história e em seguida a encarou- “Quero os corpos para levar como troféu para Tomoeda”.

“Eles estão enterrados, meu senhor...no cemitério do templo”.- Sem querer tremeu de medo. De acordo com sua versão eles morreram há no máximo dois dias, e os mortos de sua vila foram da última guerra há anos atrás. Deveriam ser apenas ossos.

“Do templo?”- Um outro soldado perguntou arregalando os olhos- “Mas...isso é heresia. Não podemos desenterrar corpos do templo, sabe muito bem disso capitão”.

A médica agradeceu mentalmente pela superstição do menino.

“Se são traidores da Coroa, porque raios os enterraram no templo?”- Perguntou nervoso apertando a lamina mais uma vez sobre a pele branca.

“Não há outro lugar para enterrar mortos em Chiba, meu senhor, mas...”- Estendeu os objetos a ele- “Leve os objetos pessoais...Será mais do que suficiente, ou por acaso”- Engoliu seco- “Toda vez que o senhor volta de uma guerra leva corpos consigo?”.

O homem olhou para os subordinados.

“Desenterrem os corpos”.- Ordenou fazendo os rapazes recuar três passos, fitando-se confusos. Um benzeu-se quatro vezes. Misuki tentou manter a calma, mas sua respiração ofegante a traia.

“Não vamos fazer isso, senhor”- O mais baixinho disse- “Isso trará maldição para nossas famílias e nossas terras”.

“A mulher tem razão. Esses objetos são mais do que suficientes”.- Outro disse complementando a afirmação.- “Além do mais, depois de dois dias debaixo da terra, devem estar fedendo”.

Ele cerrou os punhos encarando a mulher.

“É bom estar falando a verdade, vadia...”- Puxou a espada.

“Eu não teria porque mentir, meu senhor”- Falou com a ‘cara lavada’, encarando o homem firmemente.

O homem pegou os objetos e saiu da casa, seguido por seus soldados.

“Coloquem fogo na casa”- Ordenou. Essa seria a sua prova final. Se eles tivessem escondidos sairiam de lá, se não tivessem, menos uma ‘curandeira’ para se preocupar e a certeza de que estavam realmente mortos.

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“Ela vai sobreviver?”- Tomoyo perguntou com os olhos aflitos olhando a bela figura deitada sobre a cama de penas de ganso.

“É difícil dizer...”- Ele respondeu após um longo suspiro. Uma das coisas que mais odiava na profissão era perder para o anjo da morte.

“Ela é tão bonita”- A morena comentou ajeitando os cabelos agora secos de Sakura- “O que será que ela fez para merecer tantos ferimentos?”.

“Não tão bonita como você”- Beijou o cabelo da morena- “Mas...Talvez isso...ser bonita...há muita inveja nesse mundo, minha querida. Não são todas as pessoas que são bondosas como você”- Levantou-se.

Levaram Sakura até a pequena casa o mais rápido que puderam. Enquanto Tomoyo a limpava, despia e lhe colocava roupas novas e secas, o marido preparava o unguento com a ‘flor misteriosa’ que encontrara pela manhã. Não sabia quem era aquela menina, ou o que tinha acontecido com ela, mas com certeza alguém no céu zelava por ela aqui na terra e a prova era aquela flor no meio das terras úmidas de sua vila.

“Talvez...”- Olhou para o marido. Algo em seu coração lhe dizia que aquela menina de alguma forma precisava deles- “Esse unguento poderá curá-la?”.

“Espero que sim”- Suspirou pesado.- “É a única chance dela...”.- Colocou a mão na testa branquinha- “Pelo menos a febre abaixou. Isso já um ótimo sinal”.

“Que bom”- Sorriu fracamente- “Espero que ela fique boa...”.- Falou sinceramente observando a chama da vela iluminar o quarto de hóspedes.

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“Mortos?”- Tentou conter o sorriso- “Tem certeza?”.

“Absoluta...”- O capitão começou de forma triunfante como se tivesse sido o grande responsável pela morte do grupo de traidores.

“Como foi isso?”.

“Meyling Li morreu de tantos golpes, Shang Li com uma flechada nas costas... Takashi Yamasaki caiu de uma árvore durante a fuga quebrou a perna e a febre o levou e Syaoran Li tirou a própria vida ao saber da morte da princesa”- Relatou triunfante.

“Syaoran Li se matou?”- Ergueu uma sobrancelha desconfiada. Pensara em tudo, até que o rapaz viria matá-la durante a noite, mas tirar a própria vida? Isso jamais passara pela sua cabeça.- “Ora ora...então o ‘duquezinho’ era mais fraco do que eu imaginava”.- Comentou alto- “Pegue as moedas e divida entre seus homens. Fizeram um excelente trabalho...”.- Viu o grupo fazer reverência e se retirar.

Assim que a porta se fechou, levantou sorrindo.

“Finalmente...”- Dirigiu-se ao balcão- “Essa terra é toda minha, e não há ninguém forte o suficiente para tirá-la de mim”- Gritou para os céus- “Espero que esteja me assistindo Nadeshico...O dia da minha vitória”- Riu histericamente e em seguida chamou um dos monges que compunham o conselho para adentrar em sua sala particular– “Quero dar um festa, mais grandiosa do que a festa do meu casamento. Os assassinos do meu marido estão mortos...”.- Disse sorrindo de forma charmosa. Sabia que aqueles velhos castos não passavam de hipócritas que se deitavam com prostitutas escondidos, seria fácil ter aqueles homens comendo em suas mãos.

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“Quietos”- Syaoran falou firmemente observando alguns soldados bêbados andando pela estrada.

“São soldados de Ueda”- Takashi comentou observando o uniforme- “Talvez eles possam ajudar”.

“Talvez”- Shang ponderou mancando logo atrás. – “Mas acho melhor não arriscar...Até chegarmos ao rei”.

“Acha que o rei vai acreditar na gente?”.- Meyling perguntou preocupada.

“É a nossa única esperança...”.- Shang comentou encarando a sobrinha.

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“Seu bisavô é rei em Ueda?”- Meyling perguntou surpresa olhando para a amiga que comia casualmente uma maçã enquanto observavam Li e Takashi lutarem.

“Sim...”- Deu outra mordida na maçã- “Mas faz muito tempo que não o vejo. Desde meu aniversário de nove anos”.- Sorriu- “Nem no funeral de mamãe ele apareceu. Papai disse que seria muito doloroso para ele...”.

“Perder uma neta não é algo natural”- A morena comentou penteando os cabelos.

“Mesmo assim, eu gostaria muito de vê-lo. Quem sabe no meu aniversario de 18 anos ele não me faz uma surpresa?”.

“Pode ser”- Sorriu- “Já tem planos para comemorar? Há alguma coisa que você gostaria muito de ganhar?”.

A princesa olhou sonhadoramente para o belo rapaz. Os cabelos mais bagunçados do que o de costume. O suor desenhando o abdômen definido e corou, sem conseguir se conter.

“O que eu quero ganhar infelizmente não está a venda”- Comentou em meio a um sorriso triste deixando a amiga confusa ao observar o rubor repentino no rosto da princesa.

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“Alto lá!” – Uma voz grossa ecoou pela estrada.- “Quem são vocês?”.- Perguntou observando o estranho grupo que se dirigia para as muralhas da cidade.- “Vamos! Fale o seu nome”- Apontou a espada em direção do ex-comandante.

“Syaoran Li”- O guerreiro falou altivo encarando o homem que tinha pelo menos o palmo a mais que ele de altura. O viu estreitar os olhos sobre eles e em seguida abrir um estranho sorriso.

“O herói que salvou a bisneta do rei de Ueda?”- O velho sorriu contente mostrando que lhe faltava um dente- “Ora! Mas que honra recebê-los aqui... Vamos! O Rei Masaki ficará muito feliz em conhecê-los”.- Virou-se para a escolta- “Vamos, o que estão esperando? Deem-lhes alguns cavalos. Parecem exaustos e são quatro quilômetros até o castelo”.

E pela primeira vez em tantos dias o que o coração do rapaz sentiu foi paz.

Finalmente...

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O calor era tão grande dentro do túnel que por um momento Misuki pensou que não iria sobreviver. As roupas cobertas de cinzas mostravam que tivera sorte ao sair ilesa da casa. Talvez voltassem para procurar o seu corpo... Tinham que achar que ela estava morta, aliás que todos estavam mortos.

Quando os soldados deixaram a vila, a médica correu ao templo e sem pensar nas consequências começou a cavar um túmulo qualquer. Quase vomitou quando o cheiro da decomposição inundou suas narinas, mas prendendo a respiração, voltou pelo túnel arrastando o cadáver consigo.

“Deus...me perdoe”- Disse, olhando para cima, antes de abrir a porta e proteger-se do calor com o defunto. Com a adrenalina circulando em suas veias, teve força para jogar o corpo para cima que queimou rapidamente. Seus braços foram comprometidos pelas chamas, mas depois pensaria nisso, a única coisa que conseguia realizar que naquele momento é que estava viva e havia ajudado Nadeshico de alguma forma.

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“Por que está chorando, Misuki?” – A princesa Nadeshico de Ueda sentou-se ao lado da garota com os olhos verdes-olivas preocupados - “Uma menina linda como você não deveria estar com rosto banhado pelas lágrimas”.- Estendeu um lencinho.

“Estou triste, alteza”- Fungou- “Meu pai disse que uma mulher jamais poderia se tornar médica...”.

“Com todo respeito ao seu pai, pequena”- Afagou os cabelos ruivos- “Mas esse pensamento é pré-histórico...Uma mulher pode ser o que ela quiser...”.- Sorriu- “Eu por exemplo serei uma bailarina um dia”.

“A senhorita?”.

“Sim! E por que não? Princesas não precisam ser fúteis e desinformadas. Eu quero aprender a arte da dança de todos os países...E provavelmente as ensinarei para minha filha”.

“Acha que a senhorita um dia terá uma menina?”.

“Não sei explicar, mas sinto que terei uma menina muito especial...”- Sorriu sonhadoramente- “Mas para isso preciso me casar”- Piscou divertida enquanto limpava uma lágrima teimosa do rosto pequeno.

“Acha que um dia eu serei uma médica?”.- Perguntou esperançosa.

A princesa no auge de seus dezesseis anos, encarou a garotinha de oito, filha do duque Kaho de Ueda. O mundo não era fácil para mulheres. Nem para as da corte.

“Tenho certeza...Mas enquanto esse dia não chega, estude bastante...”.

...

Lágrimas banharam os olhos castanhos quando em cima de sua escrivaninha, oito anos depois a carta de admissão na escola real de medicina repousava com a assinatura da rainha de Tomoeda.

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Respirou fundo aspirando o ar puro de fora do túnel. Precisava correr para longe dali, e sabia para onde iria... Para casa do meio-irmão. Eriol Hiragisawa.

Continua...


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Notas finais do capítulo

Ela está viva!!! Yupiiii!!! Mas o Syaoran não sabe…. Ainda, coitado né??? Fiquei chateada também, mas eu queria dar mais emoção a trama… e pensem só quando eles se reencontrarem, isso é … Se eles se reencontrarem opsss!! Obrigada pelos comentários! Isso me anima a continuar ;)



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