O país secreto. escrita por Apenas eu


Capítulo 52
Myafa Clevius


Notas iniciais do capítulo

Bom, gente. Eu tenho duas coisas importantíssimas para dizer:
Primeiro: Obrigada a todos vocês por acompanharem a história, e por todo o carinho que me dedicaram! Milhões de beijos!
Segundo: Essa história já está concluída ( D: ) portanto, postarei mais de um capítulo por dia. Infelizmente, estamos perto do fim :'(



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Encontramos o restante do grupo arrumando as coisas para partir, num silêncio pesaroso. A notícia de que Stive morrera ainda paira no ar denso, sufocando-nos. O único que parece perfeitamente normal é Drafe, o guardião mais seco de todos os tempos.

Avanço ao lado de Larm, contendo um suspiro ao observar meus amigos. Quando os olhos prateados de Myafa me flagram, ela larga os pedaços de pano que enrolavam os peixes e vem em minha direção, desmontando em meus braços.

Fico sem reação, mas acabo abrançando-a. Escuto seus soluços incessantes com um apertado nó na garganta. Os outros interrompem para nos olhar e, nesse meio tempo, espio alguns rostos. Primeiro vejo Dianna, com suas bochechas e nariz vermelhos; seus olhos castanhos estão marejados, seus cabelos escuros estão emaranhados... Depois vejo Hellena, que já começa a ficar pálida como quem acaba de atravessar o Alasca de biquini. E, só então, meus olhos encontram Will. Seu rosto está tomado de raiva, seus punhos cerrados aos lados do corpo, e seu maxilar sobe e desce. Eu, mais do que ninguém, posso entendê-lo... Afinal, Will pode ler pensamentos. Agora, provavelmente, ele já sabe a respeito do meu sonho com Birc.

Myafa se separa de mim e seca algumas lágrimas com as costas da mão.

– Emma - Sussurra. - Será que eu posso falar com você antes de irmos?

Relanceio o olhar para Larm, que assente gravemente. Torno a fixá-la; a garota está mais vermelha que um pimentão maduro, e as lágrimas descem desenfreadas de seus olhos inchados... É incrível. Ela mal conheceu Stive, por que está tão abalada? Deve tê-lo amado muito.

– Certo. - Concordo. - Mas, por favor, não chore tanto.

Myafa me guia pela floresta, e posso ver facilmente os constantes solavacos que ela dá por conta do choro. Concentro-me em sua cabeleira verde desgrenhada, que parece muito com um monte de capim. Myafa passa por muitas árvores e plantas espinhosas que me arranham os braços - trato de manter meu braço machucado fora do alcance dessas plantas.

No caminho, me pego pensando em momentos que tive com Stive. Lembro-me do dia em que eu entrara na casa abandonada e acabara presa; Stive estava lá, lutando para me libertar. E aquele abraço desesperado que demos quando eu estava livre, foi com certeza o abraço mais confortador de toda a minha vida. Me lembro de quando eu joguei Luize no rio, quando éramos pequenas, graças a uma crise de ciúmes, mas depois pulei para salvá-la. Eu não sabia nadar. Se Stive não estivesse lá, certamente eu não estaria viva hoje. Então uma memória mais antiga ainda me vem à cabeça.

Eu tinha apenas cinco anos, Will estava com três e Stive possuía oito. Ia dar meia-noite e minha mãe, naturalmente, nunca permitia que ficássemos acordados depois das nove. Eu era muito obediente, é claro, mas obediência nunca foi o forte dos meus irmãos. Eles apareceram no meu quarto e ficaram lá, conversando comigo, esclarecendo suas teorias e comentando assuntos da escola. Stive tinha uma lanterna; seu rosto sob a luz fosforescente não exibia sequer uma sarda, e ele parecia uma criatura de filme de terror.

– Como deve ser morrer? - Eu tinha perguntado. - Eu não quero morrer. Deve ser muito estranho. Porque você fecha os olhos e nunca mais abre...

Will, que surpreendentemente foi uma criança magra algum dia, revirou os olhos para minha tolice.

– Ai, meu Deus, eu mereço ouvir uma coisa dessas... - Resmungou.

Dei um tapa na sua cabeça, e ele caiu deitado na cama.

– É, Emma - Falou Stive, futucando no botão da lanterna, fazendo-a apagar e acender a todo instante. - Você é muito boba. Todo mundo morre. Mas eu só fico pensando nas pessoas que ficam vivas depois que algum parente ou amigo morre. Isso sim deve ser horrível.

– Ficar vivo? - Franzi o cenho.

– É. - Ele assentiu. - Imagina como você vai se sentir quando eu morrer?

Eu tampei a boca, me sobressaltando.

– Credo, Stive. Vire essa boca pra lá!

Os olhinhos curiosos de Will iam de mim à ele, e sob a penumbra, pareciam-se com duas estrelas brilhantes. Stive desistiu de ligar e desligar a lanterna e iluminou seu próprio rosto.

– Eu sou mais velho que você - Falou. - É claro que eu vou morrer primeiro.

Sacudi a cabeça em incredulidade.

– Não fale isso, seu bobo!

– Só que quando eu morrer - Continuou ele. - Não quero que você fique chorando. Isso é uma ordem. Ou então eu vou puxar seu pé à noite.

Sou arrancada de minhas lembranças quando Myafa pára de andar. Estamos em uma clareira, com uma linda nascente. O sol está em seu auge, mas o vento alivia um pouco o calor. Sento-me de pernas cruzadas, e Myafa faz o mesmo. Olhar suas lágrimas faz meus olhos inundarem.

Stive não queria que eu chorasse. Ele queria que eu ficasse firme. Mesmo que ele fosse apenas um garotinho quando disse isso, eu tenho certeza de que sua opinião não mudou. Ele morreu dizendo meu nome... Ele morreu me chamando...

Inspiro profundamente, para impedir-me de chorar. Minha boca está seca; as lágrimas que não desceram fazem meus olhos doerem.

– Emma - Diz Myafa. - Você deve saber que Stive e eu nos amávamos. Deve saber que passamos muito tempo juntos.

– Eu sei - Afirmo, tristemente. - Mas, Myafa... Você fala de amor com tanta facilidade. Você pode me explicar o que exatamente é amar?

Myafa sorri, apesar de estar destruída. Ela é tão bonita, mas está tão frágil e acabada...

– O que é amar? - Ela dá uma risadinha. - Emma, amar é quando você olha o sorriso dele e sorri interiormente. É quando, com uma simples troca de olhares, seu coração bate mais rápido. - Ela desvia seu olhar melancólico, mas sonhador, para algum ponto acima de mim. - É quando você fica tímida com um toque dele... Quando não consegue imaginá-lo afastado. É quando você passa a tarde ao seu lado, pensando em como seria um futuro com ele. Quando ama, simplesmente, ignorando quaisquer obstáculos, quaisquer diferenças e quaisquer oposições... - Ela suspira. - Isso é amar.

Não consigo me conter - as lágriamas transbordam em uma quantidade espantosa. As palavras de Myafa tocam fundo no meu coração, me fazendo pensar na minha vida inteira... Em como eu nunca vou poder pedir desculpas ao Stive por todas as vezes que fui rude com ele. E em como eu nunca saberei expressar o amor como ela o expressa.

E assim ficamos por longos minutos: eu chorando e ela me observando. Quando termino de chorar, sinto que um peso muito grande saiu das minhas costas.

"Me desculpe, Stive", penso. "Eu não fiz o que você queria"

Myafa solta um profundo suspiro cansado. Seus olhos prateados normais agora estão tranquilos...

– Eu sou uma protetora - Ela diz. - E, naturalmente, como um mecanismo de proteção do meu corpo, eu sei exatamente como anda minha saúde. Quando algo de diferente acontece dentro de mim, eu rapidamente descubro.

Franzo o cenho, olhando-a com curiosidade.

– Aonde quer chegar?

– Stive morreu - Ela abaixa a cabeça, brincando com seus dedos. - Mas algo dele ficou. Um pedaço dele mora dentro de mim.

Minha boca se abre aos poucos até estar escancarada. Será que...? Não. Espere, não! Isso não pode estar acontecendo.

– Eu espero que você esteja dizendo "dentro do seu coração".

Ela ergue o olhar para mim, e outra vez seus olhos estão inundados.

– Não, Emma, não apenas no coração - Sua voz está abafada pelo choro. - Eu... Eu...

– Você está... Grávida?

Ela assente, enquanto seu rosto se contorce em uma careta. Suas mãos tremem... Meu coração dá um salto, e eu finalmente entendo a dor que ela sente. Eu sei que Myafa e Stive passaram muito tempo à sós, mas daí a ter um bebê... É estranho imaginar. Agora ela vai para uma guerra, de onde provavelmente não voltará viva e, assim, outro Bouringor morrerá, antes mesmo de conhecer o mundo. E se viesse a nascer... É triste pensar que não chegaria a conhecer o pai. Stive ficaria tão feliz...

Myafa cobre o rosto com as mãos, e eu apoio a mão em seu ombro, consolando-a.

– Ele não sabia! - Lamenta-se ela. - Ele morreu sem saber!

Mordo os lábios, já com os olhos marejados. Me sinto péssima por ser tão fraca. Eu queria ser forte, ao menos para poder consolá-la. Para dizer que ela vai ficar bem - que seu filho vai ficar bem. Que eu estou ali, e que sempre vou estar ali para ela. E que estou feliz, ao menos por ter algo que me fará lembrar de quem foi Stive Bouringor - um guerreiro e um herói, que só queria me proteger. Entretanto, assim como ela, eu me desmancho em lágrimas. Acabamos ali, chorando juntas, e pensando no quão incerto é nosso futuro. Eu vou morrer; ela vai morrer; seu filho vai morrer... Todos nós morreremos.


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Notas finais do capítulo

:'(



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