Não Sou Quem Você Imagina! escrita por Gilraen Ancalímon
Notas iniciais do capítulo
Olá meninas como vão? Obrigada pelos comentários deixados para a minha pessoa, espero que gostem do capítulo, att
[RECAPITULANDO]
— Não sei quando os outros irão para seus aposentos. E meu escritório está aberto aos homens a qualquer momento. Eu irei ao seu quarto. Espere por mim.
Ela assentiu e abaixou a cabeça.
Charles soltou-a e a viu voltar ao salão.
Teria de tomar cuidado para não tocá-la. Não podia aproximar-se a ponto de ver o fogo em seus olhos ou sentir o aroma excitante da pele e dos cabelos.
Mesmo quando estava zangado, mesmo depois de Anne ter permitido que a mãe o humilhasse, apesar de ser capaz de identificar suas táticas de manipulação, ela o incendiava. Permitir esse tipo de fraqueza seria um terrível engano.
Sim. Teria de ser cuidadoso.
***
Depois de um dia de trabalho e uma noite tão agitada, Charles sentiu-se exausto muito antes dos convidados manifestarem o desejo de ir dormir. Finalmente eles o deixaram e recolheram-se, e ele abriu as cortinas e as janelas do escritório para arejar o ambiente abafado.
Os homens o acompanhariam a Hampshire na manhã seguinte, e teria de se levantar muito cedo. Subiu a escada, disposto a resolver a questão com Anne sem prolongar a discussão.
Levando um grande envelope, bateu na porta e foi recebido imediatamente.
Charles entrou no quarto, sentiu seu perfume no ar e censurou-se por ter ido procurá-la em seu território.
Não! Não havia nenhum território dela ali. Estavam em sua casa, e cada centímetro daquele chão pertencia a ele. Anne teria apenas o que ele quisesse dar.
Culpado, deu um passo à frente. Ela era esposa de Fitzwilliam. Tinha tanto direito à casa quanto ele. Afirmar o contrário era apenas uma maneira tola de alimentar sua confiança.
— Importa-se se eu me sentar? — ela perguntou.
O rosto pálido revelava cansaço.
— Não.
Ela se acomodou em uma poltrona e apoiou as pernas no banco.
Charles abaixou a cabeça e, ao fazê-lo, notou que ela usava os dois sapatos. Não havia percebido nada antes.
— Tirou o gesso — comentou.
— Sim, há alguns dias.
Era possível ver as meias sob a saia e os saiotes e constatar que um tornozelo estava muito maior que o outro.
— Seu pé está inchado.
— Isso sempre acontece quando passo o dia todo em pé.
— Devia ter tirado os sapatos.
— Sabia que viria.
Prevenira-a para que o esperasse, e ela não se despira. Sentia-se o pior dos homens. Deixando o envelope de lado, inclinou-se para desamarrar os sapatos de solas macias e segurou um de seus pés. Ela deixou escapar um gemido.
— Sente dor? Eu a machuquei?
Anne negou com a cabeça, os lábios apertados numa linha fina. Charles concluiu a operação.
— Devia ter posto gelo sobre a área inchada.
— Mandei os criados para a cama. Eles terão de se levantar muito cedo amanhã.
Deixara gelo no balde do estúdio, e estava certo de que ainda encontraria algumas pedras.
— Voltarei em um minuto.
Pouco depois ele entrava com o balde, colocava o gelo em uma toalha e envolvia o tornozelo inchado com ela.
— Melhor?
Ela fechou os olhos e reclinou a cabeça.
— Vamos falar sobre o assunto que o trouxe aqui.
— Podemos deixar para amanhã, se estiver muito cansada.
Ela o encarou.
— Primeiro me faz esperar até esta hora, e então diz que o assunto pode esperar?
— Estamos cansados, Anne. Talvez seja melhor deixarmos essa conversa para outra ocasião. A propósito, cumpri minha palavra. — E entregou o envelope. — Os papéis que me pediu.
— Oh, eu... Obrigada.
Mal podia manter os olhos abertos. Devia ter cuidado da mãe, amamentado Helena e mandado os criados para a cama desde a última vez em que a vira. E depois ficara acordada esperando que ele fosse insultá-la.
Determinado, toma-a nos braços para levá-la até a cama, e o perfume que tanto apreciava assaltou seus sentidos. O aroma misturava uma fragrância floral a um toque de madeira, compondo uma mistura feminina... e perigosa.
Deixou-a sobre a cama e recuou, sentindo que o corpo começava a reagir.
— Vá dormir. — E saiu do quarto sem olhar para trás.
Jane removeu o gelo do tornozelo, abriu o envelope e espalhou os papéis sobre a cama. Todos os fatos da vida de Anne estavam ali, alguns manuscritos, outros impressos em letras uniformes e claras. Ele contratara a Agência Pinkerton, a melhor de todas, e as informações foram registradas com detalhes e uma lista de fontes para confirmação.
De acordo com o que lia, Caroline já bebia antes do marido morrer. O casamento fora um desastre desde o início, e Anne tivera um irmão que havia sido assassinado em uma briga de rua.
Esforçando-se para manter os olhos abertos, Jane leu sobre os três homens com quem Anne se relacionara antes de conhecer Fitzwilliam. Ela vivera em um bairro muito pobre e trabalhara em uma fábrica cujo dono explorava os empregados. Depois conhecera um homem envolvido com o teatro e transformara-se em figurinista e costureira dos atores.
Cansada demais para se preocupar com trajes e acessórios, Jane tirou o vestido, soltou os cabelos e foi para baixo do cobertor vestindo apenas as roupas íntimas.
Desafiada a pedir aquilo que desejava, solicitara o relatório. E Charles concordara em cedê-lo. Mesmo depois de tudo que acontecera com Caroline, mantivera a palavra. Por quê? Não conseguia imaginar a resposta.
Fechando os olhos, rezou para que Helena não acordasse muito cedo. Mas, apesar da exaustão, não conseguia dormir. A culpa e a auto-recriminação a perturbavam mais que a dor na perna.
Naquele dia havia revelado a verdade a uma pessoa. Caroline conhecia sua identidade, e por isso teria de redobrar os esforços para impedir que Charles descobrisse a farsa.
Em pouco tempo, poderia partir com a filha. Afastar-se de Charles e suas suspeitas e escapar da teia de mentiras que tecera em torno de si mesma seria um alívio. Mas não sabia como procederia.
Iria embora, deixando uma carta onde explicaria tudo?
Mary amava Helena e fora boa e compreensiva com ela.
Como poderia deixá-la sozinha para lidar com a dolorosa verdade? Saber que a esposa e o filho de Fitzwilliam também estavam mortos, e que Jane não fizera nada para ajudá-los!
Caroline também devia considerá-la monstruosa por ter permitido que o corpo de Anne se perdesse.
Deitada de costas, olhou para o teto. Como uma Bingley, dispunha de todos os recursos. Os Bingley moveriam céu e terra para encontrar o corpo de Anne, o que significava que nada a impedia de agir em nome deles.
O sono era para aquelas com a consciência limpa.
Sentada na cama, acendeu a lamparina sobre o criado-mudo. Examinou os papéis e encontrou o nome do investigador contratado por Charles. Sabia que o gesto não compensaria as mentiras, mas serviria para amenizar o sofrimento de todos os envolvidos quando a verdade fosse descoberta.
Carregando a lamparina, seguiu pelo corredor até o quarto onde estivera horas antes.
A cabeça de Caroline podia ser vista acima do encosto de uma das cadeiras.
— Está acordada?
— Sim.
Jane foi sentar-se no banco diante da cadeira.
— Tomei uma decisão — anunciou.
— Qual?
— Amanhã cedo enviarei um telegrama a Agência Pinkerton e tomaarei todas as providências para que descubram o que aconteceu com o corpo de Anne.
— Acha que vai sentir-se melhor por isso?
— Esperava poder fazer com que você se sentisse melhor. É o mínimo que posso fazer. Na verdade, é só o que posso fazer.
A mulher encolheu os ombros, um gesto que, Jane esperava, devia servir para encobrir seus verdadeiros sentimentos.
— Só queria que soubesse.
— Agora já sei.
— Por que não vai dormir?
— Irei dentro de alguns minutos.
— Boa noite. — Jane deixou o quarto e voltou ao dela. Tudo que fazia afetava muitas outras pessoas. Ir até ali tivera consequências incalculáveis, e partir provocaria resultados ainda mais vastos e desastrosos.
Mary seria a maior prejudicada. Helena era a grande alegria de sua vida, o bebê que ela julgava ser sua neta e descendente direto do filho e do marido que perdera. Quanto mais cedo pusesse um fim na mentira, melhor. A cada dia seu amor por Mary se tornava maior.
E a cada dia o amor por Charles assumia proporções mais intensas e assustadoras. A inabilidade para resistir, mesmo sabendo que ele a desprezava, era vergonhosa. Afastar-se seria a resposta para mais de um dilema.
Assim que as autoridades soubessem o que deveriam procurar, não levariam muito tempo para encontrar os restos de Anne. Os convidados de Charles passariam mais alguns dias em Mahoning Valley, e Jane tinha o dever de cuidar de tudo para que a estadia fosse um sucesso.
Talvez em uma ou duas semanas tivesse as informações sobre Anne. Até lá, seria capaz de permanecer mais tempo em pé e caminhar sem dificuldade, e o prazo teria terminado. Até lá, teria de manter Caroline calada.
Voltou para a cama e apagou a lamparina. Ficaria feliz quando se afastasse de Charles. Nunca conhecera um homem capaz de enfurecê-la, excitá-la e confundi-la como ele fazia. De todas as coisas que podiam ter acontecido, acabara por entrar em um trem que a levara ao encontro de Fitzwilliam, Anne, Charles e Mary.
O destino entrelaçara seus caminhos.
E o desespero ainda a levava a tomar medidas espantosas e extremas.
Esperava que os recursos de que dispunha fossem suficientes para as primeiras semanas, e rezou para encontrar um emprego, um lugar para viver e um meio de cuidar da filha.
Jane cobriu-se e se esforçou para dormir.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!