Meus pés não tocavam o chão de Lima, em Ohio, desde que eu havia conversado com um certo Finn Hudson pela última vez (cara a cara) na estreia do musical “Grease”. Depois daquilo só nos falamos por telefone algumas vezes. Da última vez, telefonei apenas para contá-lo que havia conseguido o papel de Fanny Brice na Broadway, e ele disse que se eu estivesse feliz, ele também estaria. Talvez a emoção não tenha sido transmitida via telefone, mas eu fiquei parecendo um arco-íris naquela hora. Mas aquela havia sido a última vez para todo o sempre.

No dia seguinte, Carole ligou para Kurt revelando a terrível notícia de que ele havia morrido. Quando ele repassou a informação para mim, ainda tentei desacreditá-lo, mas depois que caí na real não teve outra: desabei em lágrimas e até faltei a um dia de aula em NYADA. Estava fraca demais para fazer qualquer tipo de coisa. Finn havia sido o meu primeiro amor. O meu primeiro grande amor. E eu nunca o esqueceria facilmente. Suas memórias estavam guardadas dentro de mim como um pirata esconde muito bem o seu precioso tesouro.

Retornei ao McKinley High School depois de um bom tempo, para ver o pequeno memorial coberto de flores e velas que alguns estudantes haviam preparado no corredor principal do colégio. Muitas lembranças vieram à minha mente quando passei por ali de novo. Os melhores anos da minha vida se firmaram aqui, é impossível olhar e não lembrar de todos os momentos inesquecíveis que todos nós passamos. Entreguei ao (eterno) Mr. Schue uma placa com a célebre frase racional do grandão: “O show tem que continuar em algum lugar… Ou algo assim”. Pelo que me lembre, foi uma de suas únicas frases coerentes em todo o tempo que passamos juntos. Finn era esperto, só que de um jeito não tradicional.

Mas antes de voltar para minha corrida rotina em New York City, precisava visitar alguém em especial primeiro. Carole Hudson.

— Rachel, querida! — Ela me abraçou quando abriu a porta de sua casa. — O que faz aqui?

— Precisava visitar a mãe da pessoa mais importante da minha vida.

— Pensei que Barbra Streisand fosse a pessoa mais importante para você. Finn havia me dito isso.

— Isso foi antes de eu conseguir o papel de Fanny Brice na Broadway.

— Parabéns, Rach! Você merece mesmo. — Ela apontou para o sofá, me convidando para sentar.

— Eu não teria conseguido adicionar este fato ao meu currículo se não fosse pelo seu filho. — Comecei a me lembrar de uma de nossas últimas conversas por telefone. — O Finny me encorajou a cantar algo que me fizesse voltar às raízes da descoberta de meu talento, e quando eu fiz a audição, lembrei-me de todos os momentos que passamos juntos como parte do New Directions. Fui chamada de volta para uma nova audição e então passei de novo.

— E você falou com ele depois disso?

— Sim, nós conversamos por telefone. Ele me parabenizou e disse que, se eu estivesse feliz, ele também estava.

— Era de se esperar. Meu Hudson sempre se alegra pelos outros.

— Pena que isso foi um dia antes de… Você sabe.

— Sei. Ainda é difícil lembrar do toque de telefone que mudou o meu dia.

— Também me lembro de quando Kurt me contou pessoalmente.

Algumas lágrimas foram teimosas em sair descontroladamente. Eu oficialmente havia começado a chorar, e Carole veio até mim e me deu um abraço, mesmo eu estando sentada. Baixei todas as minhas defesas, a favor de uma dor que só nós duas sabíamos como era. Finn era o seu filho e também uma grande parte de mim. Junto com ele, foram-se também coisas que eu jurava não serem dolorosas.

Depois de alguns minutos, nos separamos, enxuguei minhas lágrimas e acabei soltando:

— Posso ir até o antigo quarto dele?

— Claro, aposto que você quer saber o que ele fazia para se lembrar de você.

— Com certeza.

— É a segunda porta à direita. Pode ir.

— Obrigada, Carole.

Levantei-me do sofá e então fui caminhando até a porta do quarto de Finn. Coloquei minha mão direita na maçaneta, e pensei comigo mesma se seria saudável para mim girá-la e entrar no mundo incompreensível do Hudson. Espantei maus pensamentos, abri a porta e liguei as luzes.

Nossa, como o quarto dele era grande. Talvez seja por conta do seu tamanho, daí algumas alterações poderiam ter sido feitas. Só uma hipótese. Sua cama era tão grande quanto o guarda-roupa, e algumas caixas ainda estavam encostadas ao redor da mesma, com diversas coisas do grandão preenchendo-as. Analisei cada uma delas, e de repente acabei notando um papel largado debaixo da cama. Estiquei meu braço para pegá-lo, e felizmente não estava tão amassado. Desdobrei e acabei me deparando com algo que aparentava ser uma carta escrita por ele. Afastei algumas das caixas que estavam apertando o espaço; sentei-me no chão, com as costas apoiadas na madeira e comecei a ler a tal carta. E a grande surpresa: o texto havia sido escrito para mim! Não contive um leve sorriso quando li as primeiras linhas.

Não vou começar esta carta com um “Cara Rachel” ou “Querida Rachel”, pois são inícios bem clichês. Em se tratando de Rachel Barbra Berry, preciso escrever algo excepcional. Então, lá vai.

Minha sempre amada Rachel Berry,

você me telefonou hoje e contou sobre a grande chance de sua vida. Meus parabéns, você conquistou o que queria. Interpretará a eterna Fanny Brice no remake de “Funny Girl”! Não tente imaginar o tamanho de minha felicidade com tal coisa. Eu sempre soube que você conseguiria isso, e aqui estou eu, com um enorme sorriso estampado no rosto e relembrando de todas as vezes em que você citava a célebre Barbra em cada uma de suas frases. Lembro-me que no início do New Directions, enquanto ainda nos preparávamos para as Regionais devido à forte pressão do Vocal Adrenaline, comecei a elaborar uma teoria onde uma certa Rachel Berry era completamente paranoica e com alguns parafusos soltos na cabeça. Depois, nossa relação como namorados foi solidificando, e eu fui percebendo que você nunca foi, não era e nunca teria paranoias quanto a isso. Era apenas você o tempo todo.

Em nosso último ano como estudantes do McKinley, você começou a se preparar para entrar na grande Academia de Artes Dramáticas de Nova York e acabou deixando todos de lado por um tempo. Por fora eu até poderia parecer chateado. Mas deixe-me contar um segredo: por dentro eu pulava de felicidade, pois pelo menos não teria mais conversas sobre Funny Girl por um bom tempo; e eu também sabia que você precisava se dedicar ainda mais para os testes, então cheguei a compreender. Mesmo assim ainda me lembro de quando meu pedido de casamento finalmente fora aceito, mesmo sabendo que no fundo você só estava com medo de que não entrasse para a faculdade e achou que se casar comigo fosse uma espécie de 'plano B'. Detalhe: eu era o indeciso da vez.

Quando eu te deixei na estação de trem para seguir seus sonhos, eu sabia claramente o que estava fazendo. Por um lado, meu sonho de ser feliz ao seu lado para sempre acabaria naquele instante; mas por outro, eu tinha certeza de algo que sempre faço desde sempre: se você estivesse feliz, eu também estaria. E foi pensando nisso que acabamos nos despedindo por um tempo.

Isso mesmo, por um tempo. Pois acabamos nos reencontrando em NY. Ainda lembro de quando você tentou encontrar algo em NYADA para que eu pudesse me inscrever, e depois daquilo veio uma crise entre nós, e terminamos definitivamente. Você retornou para lá, e eu fiquei em Ohio, ajudando os New Directions nas Seletivas e enquanto o Mr. Schue estava fazendo o impossível para reimplantar as artes nas escolas. Foi lá que eu encontrei a minha verdadeira vocação: ser professor. Então ingressei na Universidade de Lima e acabei relaxando demais, mas acabei levando uns puxões de orelha tanto do Puck como de uma Rachel que conheço mais do que ela mesma. Ajudei-te a decidir o que cantar em sua audição para Funny Girl, e não fiquei tão surpreso quando descobri que você havia sido chamada de volta para uma última audição. Sempre soube que quando Rachel Berry quer algo, ela vai atrás e ninguém tira sua atenção. Depois que o Glee Club venceu as Regionais, minha felicidade já estava do tamanho de toda a América. E quando você conseguiu Fanny Brice, então, eu não pude me conter. Saí pela rua gritando “Minha ex-namorada vai se apresentar na Broadway, e eu ainda a amo por isso!”. E acredite: eu não me arrependo nem um pouco de ter feito isso, pois milhares de aplausos invadiram o recinto.

Rach, eu quero que saiba que eu estarei sempre contigo, nos bons e maus momentos. E quando você menos perceber, eu estarei ao seu lado e olhando para você. Olhando por você. Sempre e sempre. E eu quero que o mundo inteiro saiba disso, porque você é especial. Pode não ser a garota mais talentosa do mundo, mas será a melhor para mim.

Com as maiores taxas de amor e paixão possíveis,

Finn Hudson.

P.S.: Você me perdoa por todas as nossas brigas fúteis? Pode me perdoar por aquela discussão no auditório? Pode me perdoar por nossa pequena briga depois da apresentação do musical? Espero que continuemos a ser amigos, porque você é uma grande parte da minha vida. Rachel, você é a minha pessoa. E eu ainda quero te ouvir me chamar de “Finny” outra vez.

Ao fim daquela carta, eu já estava chorando novamente. Sempre soube do grande amor que o Finny sentia por mim, mas não imaginei que fosse enorme desse jeito. Perdoei-o mentalmente por todas as nossas discussões fúteis, e em seguida procurei uma caneta por perto. Encontrei uma a poucos centímetros dali. Peguei-a e escrevi logo após as últimas palavras da carta algo que cheguei a pensar em dizer a ele no dia em que contei sobre a Broadway. Precisava de coragem para escrever.

Finny, você também é a minha pessoa. Queria ter tido mais tempo para estar ao seu lado, para te perdoar por todas as nossas brigas. E agora eu sei que você está ao meu lado e olhando para mim. Olhando por mim. Está perdoado.