Catarse escrita por M bittersweet


Capítulo 1
Capítulo Único - Catarse




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Era um dia comum. Londres estava num daqueles dias cinzentos e com chuviscos incessantes, tão normais para seus habitantes que não era necessário praguejar contra forças divinas pela chuva inesperada que certamente molharia as roupas que secavam esquecidas num quintal no fundo de casa.

Os automóveis se deslocavam como de costume. Com pequenos engarrafamentos em locais pontuais, mas nada de realmente extraordinário. Os pedestres caminhavam apressadamente, trajavam seus longos casacos para manterem-se aquecidos e protegerem-se da água gelada.

Comum. Normal. O cotidiano permanecia inalterado.

Abigail Poirot nunca diria que um dia como aquele teria qualquer impacto significativo em sua vida, afinal, nada era anormal no curso em que as horas passavam. Nada extraordinário acontecera até às dezessete horas e treze minutos daquela quarta-feira fria de início de novembro.

A jovem fez exatamente o mesmo percurso do orfanato em que morava (por pouco tempo, graças ao incessante esforço da Irmã Eustace de retira-la de lá uma vez que com 18 anos as freiras não precisavam mais ser as responsáveis pelo futuro e bem-estar da garota) para o trabalho em uma loja de doces no centro da cidade. Transpassara as portas de vidro intensamente coloridas pontualmente às oito da manhã.

O dia transcorrera sem grandes acontecimentos. Os clientes iam e vinham e Abigail os atendia quase como se estivesse no modo automático. Mantinha um sorriso forçado no rosto e um olhar animado, afinal, aquela era a política da loja: um sorriso feliz para uma vida mais doce. A garota ainda tivera tempo de travar mais uma de suas batalhas com Sean, seu colega de trabalho, e ela se orgulhava por finalmente conseguir convence-lo de que a as nuances da interpretação de Mads Mikkelsen como Hannibal Lecter era muito satisfatória e que o ator havia demonstrado um sentimento de calma calculada em situações pertinentes, quando qualquer homem certamente teria entrado em pânico. Ambos chegaram à conclusão de que o Hannibal defendido por Mikkelsen era um dos melhores serial killers já interpretados em um programa de televisão.

Bem, talvez não fosse um dia tão normal assim. Certamente, Sean e Abigail chegarem a um acordo no que dizia respeito a qualquer coisa não era uma coisa corriqueira. Mas, ainda assim, não era algo que ela poderia afirmar que mudaria sua vida.

– Hey, Abby. – a morena estava distraída, organizando pelas cores (da mais clara até a mais escura) alguns bombons que estavam na prateleira de sortidos. Ela simplesmente não conseguia aturar aquela confusão de cores. – Abby? – Sean a chamou novamente e a garota o escutou dessa vez.

– Hm, oi! Desculpa Sean! Eu estava ocupada aqui. – apontou para a prateleira que instantes antes recebia seus cuidados.

– Não, tudo bem! É... – a reticência do rapaz fez com que Abigail achasse que o chateara um pouco com sua total falta de atenção. – Eu queria... – diante do olhar questionador da garota, Sean ficou completamente ruborizado. – É... Já deu o horário! Pode ir embora se quiser, eu fecho a loja. - ele parecia constrangido com algo e a garota não era exatamente perceptiva. Limitou-se a dar de ombros e retirar o pequeno crachá abotoado na blusa azul escura que usava.

– Bem, se você diz... - sorriu verdadeiramente alegre. Odiava ter que fechar a loja, pois sempre ficava com receio de ter esquecido alguma janela aberta ou de ter feito as contas erradas no caixa. Não era como se tivesse como bancar um provável assalto da loja por pura desatenção de sua parte. – Pode pegar minha bolsa ai embaixo? – apontou para o balcão no qual Sean estava apoiado. Seu pedido foi prontamente atendido. – Então, acho que é tudo. Vou indo. Até amanhã, Sean! – acenou e deixou a loja sem pensar duas vezes.

Abigail teve a impressão de escutar um “Se cuida” vindo do garoto, mas não voltou a olhar para trás. Se tivesse feito isso, teria visto o olhar intenso que Sean dirigia a ela.

–-

Seus passos eram bem mais lentos do que o normal. Procurava dentro de sua bolsa o celular e os fones de ouvido para que o caminho até o orfanato fosse melhor. Bem, pelo menos teria uma trilha sonora de músicas escolhidas por ela até chegar lá. Um pouco de liberdade nesse quesito era sempre bem-vinda, afinal, crescera escutando cantos de glória ao Senhor. Uma batida diferente e mais agitada era sempre uma grata surpresa.

Instantaneamente sorriu ao ouvir as primeiras palavras de Bohemian Rhapsody. A banda Queen certamente figurava entre as suas preferidas e aquela música a animava porque com certeza traria o mais completo horror às Irmãs do orfanato e tal feito bastava para alegrá-la. Havia algo em quebrar regras, mesmo que pequenas, que a deixava extasiada.

O simples pensamento de cantar àquela canção no coral ao qual fora obrigada a frequentar durante toda a infância, como atividade de lazer, era libertador. Bem, a verdade era que não via a hora de sair daquele lugar que por tanto tempo chamara de casa e explorar o mundo. Mas não era como se tivesse condições financeiras para uma façanha do tipo no momento.

Quando começou a ouvir uma batida mais pop, agarrou o telefone procurando o botão para passar a música. Conseguiu escutar os primeiros instantes de Roar, mas sorriu contente consigo mesma ao visualizar “All My Loving-The Beatles” na pequena tela do aparelho.

Close your eyes and I'll kiss you…

Ergueu a cabeça para voltar a prestar atenção a seu caminho e evitar esbarrar em algum transeunte e, então, naquela ação cotidiana e nada extraordinária, naquele pequeno instante que poderia ser igual a qualquer um dos zilhares pelos quais o tempo na Terra já havia passado, Abigail teve a vida transformada para sempre. Poderia ser qualquer um, mas foi justamente ela. Abigail poderia ter continuado seu trajeto alheia a tudo, mas, então, ela o viu.

Ela o viu andando em sua direção. A expressão compenetrada, como se buscasse algo em meio à multidão. A garota registra tudo: ele usava um belo terno listrado marrom, com uma camisa azul claro, uma gravata vermelha e um all star também vermelho. Arrematando, trajava um longo casaco sobretudo marrom. O vestuário não poderia estar mais impecável.

Abby ainda teve tempo de registrar o cabelo. Aquele era, com toda a certeza do mundo, o cabelo mais legal de todos os tempos. Era absolutamente, fantástico.

Quando encontrou os olhos daquele homem, soube que também era observada com vívido interesse. Era quase como se ele tivesse encontrado o que procurava.

Abigail desvia o olhar rapidamente, constrangida por ter sido pega o encarando. Pensava quão estúpida deveria parecer, observando um desconhecido tão descaradamente...

No instante seguinte, sentiu uma mão em seu braço e enquanto tentava fazer seu cérebro funcionar para mandar o resto do corpo reagir foi girada. Agora, Abigail andava ao lado dele, ombro-a-ombro. A mão do estranho afagava bondosamente seu braço, como se mandasse um sinal de que estava tudo bem.

– Olá. Não pareça alarmada... Apenas continue andando. – a garota seguiu as instruções. Por mais louco que parecesse, aquele completo estranho parecia absolutamente confiável. - Sou o Doctor e preciso da sua ajuda.


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Notas finais do capítulo

Bem, acho que todo whovian sonha que algo do tipo aconteça consigo.
Usei o 10th porque, bem... Ele é, definitivamente, o meu Doctor. :D

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