As Cicatrizes Mentem escrita por Sereia Literária


Capítulo 22
Capítulo 22 - Uma Morte




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(Alex)

Quando ouço a sua voz e sinto a sua presença, meus pelos se arrepiam e sinto meu corpo se retesando. As lembranças das horas de tortura voltam a minha mente, me enchendo de pavor.

–Seu... Covarde...–ouço Nove sibilar.

(Marina)

Nove caminha na direção de Cinco com uma postura séria e fatal. Mas Cinco, ao contrário do que todos esperávamos, não foge. Ele quer isso. Tudo isso, toda essa encenação, crueldade e tortura foram com intuito de ele ter esse momento. Oito e eu nos entreolhamos e eu começo a esfriar o local ao mesmo tempo que Oito começa a assumir a forma de Narashima.

–Tsc, tsc tsc...-diz Cinco, em um tom quase amigável, e nesse segundo Oito cai no chão, se contorcendo de dor e voltando ao normal.

–Oito!-corro para o seu lado, ele agonizando enquanto Cinco continua.

–Ah sim, um novo Legado. Incrível o que o poder de controlar as mentes pode fazer...

(Nove)

–Deixe-os em paz... Isso é entre mim e você.

Ele sorri com o canto da boca levando uma das mãos ao sobretudo, relando um punha comprido que brilha com uma luz vermelha.

–Concordo plenamente...

Em menos de segundos, empunho meu bastão e estamos lutando. Não fosse o bastão ser parte de meus Legados, ele teria se partido no primeiro golpe. Ele é forte e rápido, mas eu sou mais.

Lutamos freneticamente, mas eu não vou o matar. Ele vai sofrer antes, passar pelo o que Alex passou, e essa fúria, esse ódio e essa certeza começam a fazer diferença quando ganho vantagem sobre Cinco.

(Oito)

Explosões. Gritos. Guerra. Um tiro na cabeça. Escuridão.

O ar não quer entrar em meus pulmões, e quando finalmente consegue, vem com cheiro de enxofre, sangue e morte. Abro os olhos. O sol não é mais que uma fraca luz coberta pelas cinzas. As poucas árvores que continuam de pé estão carbonizadas e uma chuva ácida e fina queima minha pele. Não há sinal de vida... Nenhum tipo de vida. Uma dor lancinante me perfura as costelas e sinto como se mãos de aço tentassem esmagar meu crânio. Ouço o som de risadas malévolas em minha cabeça. Grito de dor e me encolho a ponto de pensar que meus ossos vão se partir. Meus dentes rangem e o chão começa a me engolir, como um piche, mas me levando para o fundo. A gosma preta é quente e me imobiliza a medida que sou submetido e meus membros vão parar debaixo da terra... Que vai se tornando cada vez mais pesada e densa, e eu não consigo mais respirar.

(Marina)

–Oito! Oito!-digo, enquanto ele se contorce. Solto as minhas mãos de seu corpo e passo nervosamente os dedos pelos cabelos. Se Cinco o houvesse ferido fisicamente, eu poderia dar um jeito. Mas assim... Me pego em desespero quando ele para de respirar e parece segurar o ar.

Poder da mente... Controlar mentes... Eu sabia o que fazer, mas não sabia como nem se deveria. Entrar no inconsciente de alguém é algo muito sério. Qualquer dano ou pequeno erro pode alterar a vida e a maneira de agir de uma pessoa pela vida inteira.

Olho na direção de Nove, lutando com Cinco, que já demonstra cansaço... A fúria e o desejo de vingança são muito poderosos, eu bem sabia disso. Olho para Oito, ele perdeu a consciência e tem leves convulsões.

Mordo o lábio até sentir o gosto de sangue. Fechos os olhos. Tinha de tentar.

Deito-me ao lado de Oito, seguro sua mão e, antes de fechar os olhos, murmuro.

–Volte...

Quando torno a abri-los, meus pés estão mergulhados em piche. O cheiro do local, de morte, carne podre e queimada me dão náuseas, e uma chuva ácida toca minha pele, queimando como fagulhas de fogo meus braços e rosto. Olho em volta.

–OITO!-grito, mas não tenho resposta. Então, braços de piche se erguem e se agarram as minhas pernas e braços, me puxando para dentro dele. Fecho os olhos quando a gosma chega aos meus lábios, e sinto-me virar de cabeça para baixo. Quando volto a abri-los, o piche se transforma em uma água escura e escorre pelo meu corpo. Estou flutuando sobre um mar desolado, cheio de lixo, dor e sofrimentos humanos. Olho em volta e só vejo um punhado de cachos boiando. Corro até eles e descubro Oito praticamente morto. Nesse momento, pego seu pulso e o beijo, tirando seu tronco da água...

(Oito)

–Volte... Por favor, volte...-dizia uma voz doce e distante, como o canto daquela que vem do mar.

Sinto um toque no pulso e em minhas costas... Ela me acolhe...

–Isso é uma ilusão... Livre-se dela, ele pode ter esse Legado, mas a mente é sua...

(Nove)

Com um golpe traiçoeiro, Cinco enfia a adaga em minhas costas e a puxa até os quadris. Uma dor aguda me corre pelo corpo quando ele me chuta para um tronco próximo, rindo de meus esforços.

Alex vem até mim.

–Nove-diz ela, arrastando-se para o meu lado. Ela toca meu ombro e seus dedos seguem diretamente pela linha de sangue. Ela os detém e os afasta, e mesmo cega, ela capta tudo exatamente como é.

–Sangrando...-ela diz, soltando o ar. Seguro seu rosto com as minhas mãos por um breve segundo e me levanto com dificuldade, voltando para lutar com Cinco.

A dor da adaga me impede de ser mais rápido, e Cinco tem vantagem. Ele me dá um gancho e me segura com o pé sobre o meu peito, abrindo mais um feixe de sangue nas costelas. Ouço o grito de Alex.

(Alex)

Eu sabia que ele o iria matar. Eu tinha que fazer alguma coisa.Fui tateando o chão ao redor procurando alguma coisa – qualquer coisa – que eu pudesse usar contra ele. De repente, uma mão fina me segura pelo ombro, me ajudando a levantar.

–Vamos embora, rápido- disse uma voz feminina, me puxando.

–Não! Não vou deixá-los!

Então, enquanto me debatia para que ela me soltasse, caí em algo e cortei meu braço. Na mesma hora me lembrei; aquela era uma planta, composta quase que somente de espinhos, sendo que o maior e mais grosso deles ficava na ponta, e podia alcançar até 8 centímetros. Cortando o que havia sobrado de minhas mãos, arranquei um deles e me apoiei nas árvores ao redor, seguindo o som de Cinco e Nove. Uma voz dentro de mim gritava que eu poderia matar o lorieno errado, mas o meu coração dizia que se eu não o ajudasse, Nove morreria.

(Nove)

Estou completamente submetido agora. Cinco tem a adaga e eu tenho os corte e perfurações que em minutos me matariam por hemorragia. Ele continua me prendendo no chão, mas quando ergue a adaga, ele a solta e se curva de dor. Quando ele se vira, tenho tempo de ver Alex segurando a metade uma planta, que se encontra com a outra ponta enterrada debaixo no braço de Cinco. Ele dá um soco nela, que se choca contra uma árvore com um estrondo horrível. Então, pego a adaga do chão e a cravo em seu peito. Seus olhos vão perdendo o brilho a medida que eu vou me levantando e ele vai caindo a meus pés, os dedos agarrados aos meus pulsos, tentando se soltar. Um leve grunhido e ele cai morto, no mesmo instante que uma cicatriz queima em meu tornozelo e minhas lágrimas de fúria escorrem pelo meu rosto. Assim que o solto, corro até Alex.

Ela está inconsciente e sangue novo escorre de sua cabeça no lugar em que bateu na árvore, mas ela ainda está viva. A seguro no colo e embalo seu corpo, lágrimas de dor, carinho, felicidade e tristeza minhas molhavam seu rosto a medida que eu murmurava seu nome. Seus lábios se mexeram mas não houve som; mesmo assim compreendi que se tratava de meu nome. Passei as mãos pelos seus cabelos e meus lábios tocaram os seus.

(Marina)

Dor. Ferro em brasa... Uma cicatriz. Abro os olhos chocada e verifico tudo ao redor, primeiro Oito, depois Nove... Quem morrera fora Cinco. Um sorriso que eu não pensei conseguir estampar após a morte de alguém se forma em meu rosto. Sinto a mão de Oito se mexendo, mas seus olhos continuam fechados. Saiu do transe.

–Marina...-ele murmura, desespero e angústia na voz.

Ele pensa que fui eu.

–Shhh... Estou aqui, estou bem... Você também...

–Quem então?...

–Cinco.

Um leve sorriso se estampou um pouco antes de Nove chamar meu nome. Corro até ele.

–Ah meu Deus... Alex...-digo, me abaixando. O trabalho de cura será longo, muito longo. Começo pelo mais recente. Fratura no crânio. Incrível ela ter sobrevivido. O frio convencional emana de meus dedos e se estende pelo corpo dela, curando seus ferimentos e a deixando com a pele clara e sem cicatrizes... Os olhos parecem melhorar, mas não sei dizer se ela voltará a enxergar. Costelas, pulsos e fêmur quebrados. Tornozelos e rádio trincados sem contar nos dedos; foram destruídos. Pobre garota... Unhas arrancadas... Depois do que parece ter sido quase uma hora, abro os olhos, e, fora o cabelo, a roupa rasgada e a sujeira, ela parece nunca ter sido tocada. Olho para Nove; ele mal respira, e acho que está fraco, quase morrendo pela quantidade de sangue que perdeu. Está pálido, mas não a solta. Passo para ele, e levo bem menos tempo.Depois de curá-la, foi até fácil. Sinto as mãos de Oito em meus ombros; ele está me passando energia, pois o processo de cura é realmente exaustivo.

(Luna)

Estou apreensiva, mas mesmo assim me aproximo. Ela a curou, de verdade, e eu me sinto uma covarde. Logo, o moreno se vira e me vê.

–Eu... Sei quem vocês são e de onde vieram... Quero ajudar...

–Você viu o que aconteceu com ela? Ela também queria a mesma coisa-diz ele, a voz gentil, porém séria.

Engoli o seco e olhei a moça ruiva, Alexandra Vancouver... Depois, fitei novamente os incríveis olhos verdes do que eu pensava ser um alien.

–Eu estou ciente- digo.

Ele inclina um pouco cabeça. Logo, a moça está de pé ao lado dele.

–Qual seu nome?- pergunta ela, com a voz suave.

–Luna.

–Luna, precisaremos de pessoas infiltradas. Precisamos de pessoas que apaguem nossos passos e ajudem a nos encobrir. Pode fazer isso?-pergunta ela. Isso não era bem o que eu esperava, mas fiz que sim. Sentia que com eles não havia muito o que discutir.

–Podem me chamar sempre que precisarem. Pra qualquer coisa- emendei.

Os dois trocaram olhares e ela se aproximou do corpo do morto, colocou a mão em seu sobretudo e tirou de lá uma espécie de rubi, comprido e pontudo, o prendeu em uma corrente e o passou pelo meu pescoço.

–Chame a Garde e nós a chamaremos. Qualquer novidade entre em contato. Não confie em mais ninguém, entendeu? Não deixe que vejam isso.

(Marina)

Sabia o que Oito estava pensando. Que não podíamos confiar nela... Ela era só uma menina rica de 16 anos passando férias no Caribe, que acabou esbarrando em alienígenas... Mas com meu novo Legado, sabia quem ela era e suas intenções. Sabia que ela nos acompanhara durante um ano. Ela queria ajudar.

–Você vai sair daqui e impedir que as pessoas descubram o que aconteceu. Não vai comentar sobre isso, certo?

Ela balançou a cabeça freneticamente, tocando com encanto o rubi em seu pescoço. Dou mais uma olhada no corpo de Cinco enquanto um sorriso se forma em meu rosto e dou a mão para Oito, que entrega para Nove – recém acordado – a Xitharis com uma réplica de seu poder. Nos teleportamos logo em seguida.

Agora, estávamos mais perto de vencer, e naquela noite, dormindo em um hotel de beira de estrada no México, tive um sonho que poderia decidir o destino da Terra, de Lorien e o curso da história. Essa era a única alternativa. Iria ser difícil, envolveria sacrifícios – de ambos os lados – mas iria funcionar.

Irá funcionar.


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