A Maldição do Tigre escrita por Catarina


Capítulo 19
XIX


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura!



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Ren

 

Antes de terminar de descer os degraus, Kelsey parou e releu a profecia de Durga:

Para proteção, busque seu templo

E apodere-se da benção de Durga.

Vá para oeste e procure Kishkindha,

Onde os símios governam a terra.

Um golpe de gada no reino de Hanuman;

E procurem o galho que está confinado.

Perigos espinhentos estendem-se acima;

Perigos deslumbrantes acham-se embaixo,

Estrangulam, capturam aqueles que você ama...

E os aprisionam em correntes salobras.

Lúgubres fantasmas frustram seu caminho

E guardiões aguardam para barrar sua passagem.

Cuidado quando eles começarem a perseguir

Ou aceitar seu estado de deterioração.

Mas tudo isso pode ser repelido

Se serpentes encontrarem o fruto proibido

E a fome da Índia satisfizerem...

A fim de não ver todo o seu povo perecer.

Ela também leu alguns recados que o Sr. Kadam anotou para nos lembrar que deveríamos seguir sempre juntos, e se nos separarmos, não deveríamos confiar em nossos olhos e sim em nosso coração.

Kelsey começou a falar sobre animais e perigos que poderíamos encontrar, falou quase o trajeto inteiro. O túnel de pedra logo se transformou em um caminho de terra, com árvores em volta. Eu fui à frente como tigre, abrindo caminho para ela. Pensando em tudo o que aconteceu. Lembrei-me novamente de nosso beijo no hotel. Seus toques... Seu beijo sem dúvidas era antídoto para qualquer ferida no coração. Sua pele, tão macia, parecia que eu estava tocando em nuvens. Nuvens muito saborosas, com sabor de pêssego. Seus cabelos...

De repente Kelsey grita me tirando totalmente de meus devaneios:

— Ren, pare! Os galhos estão nos arranhando. Eles têm agulhas na parte de baixo que seguem nossos movimentos. Logo pensei na profecia. São eles os perigos espinhentos.

No momento em que parei, um galho veio em minha direção e se enrolou em meu pescoço, mas consegui arrancá-lo rápido. Como não pude perceber esses galhos mortais? Escrevi uma nota mental de nunca mais cometer este erro.

— Precisamos correr ou eles vão nos enredar! – gritou.

Segurei os braços de Kelsey e a puxei. Corremos o mais depressa possível. Mas depois de uns quinze minutos correndo, Kelsey foi diminuindo o ritmo.

— Ren, não posso ir mais rápido. Continue sem mim. Ultrapasse a linha das árvores. Você pode conseguir. - Disse arfando.

Não irei deixá-la. Não sei como ainda pode dizer isso depois de tudo. Corri de volta a ela. Mas os galhos se enrolaram em mim, lutei contra eles e consegui arrancá-los tempo suficiente para chegar a Kelsey. Quando cheguei até ela, havia galhos agarrando seus braços e pernas. Ela estava muito cansada. Mas eu irei tirá-la daqui nem que seja no meu colo.

— Ren, vá. Por favor, vá sem mim. - Implorou.

Transformei-me em homem.

— Temos que ficar juntos, lembra? Não irei deixá-la, Kelsey. Eu nunca vou deixar você. - Afirmei.

Ela me olhou triste e assentiu. Removi todos os galhos que a prendiam.

— Venha.

Enquanto corríamos, batia nos galhos com a gada, mas parecia que eles nem sentiam. Foi então que eu avistei um tronco enorme, era dali que vinham os galhos, pensei. Fui até ele e bati com força com a gada. Os galhos se encolheram tempo suficiente para fugirmos. Eu estava sangrando muito, mas sabia que logo os ferimentos estariam cicatrizados.

Assim que chegamos a um lugar distante da floresta espinhenta deixei meu corpo cansado cair no chão. Kelsey pegou uma garrafa de água e me ofereceu, bebi de uma só vez. Pegou uma camisa e a molhou com água. Assim, começou a limpar meus ferimentos e todo o sangue de meu corpo. Ela começou nos braços, depois o rosto e as costas. Nesse momento, eu esqueci completamente minhas dores e ferimentos, ela me confortava somente com um toque. Foi então que ela se lembrou de algo.

— Ren! Você está na forma humana a muito mais tempo do que 24 minutos. Você está bem... Sem contar os arranhões? – Perguntou.

Com tudo, não percebi o tempo passar. 

Eu disse-lhe que me sinto bem e não sinto vontade de voltar ao tigre. Mas só pra comprovar, me transformo em tigre, e claro, ele ainda está aqui. Devemos seguir em frente. É só a magia desse lugar que deve me manter assim.

Quando eu olho para Kelsey, vejo que ela está com um abatimento no rosto. Rio para ela e pego sua mãos, levando-a até meus lábios.

— Não se preocupe, Kells. Logo serei totalmente humano, mas por ora aceito esta dádiva pelo máximo de tempo que puder tê-la. - Acrescentei.

Ela sorriu para mim. Foi então que vi que ela também tinha arranhões e um pouco de sangue no pescoço. Puxei-a para mais perto e comecei a limpá-los com a camisa molhada. Limpei seus braços e pernas. Ela tinha um arranhão feio no pescoço, mas parecia que ia cicatrizar facilmente. Umedeci mais a camisa e fiquei nesse local por um tempo. Então puxei a gola de sua camisa delicadamente para examinar outros lugares.

Ela deu um tapa em minha mão.

— Esses outros lugares eu mesma posso examinar. – Disse.

Sorri bastante bem humorado e a puxei para se levantar. Seguimos por um caminho com mais árvores de espinhos, mas havia espaço suficiente para passar sem se machucar. Depois seguimos por um caminho de terra. Eu entrelacei meus dedos nos de Kells. Era tão bom poder ficar assim ao lado dela, sem ter hora para mudar de forma. Agora eu iria me esforçar ainda mais para quebrar esta maldição.

Após minutos andando, entramos num lugar cheio de túneis de pedras, com tochas acesas por todo lugar. Avistamos algo se movendo ao nosso lado, mas quando nos viramos para ver, já havia sumido. De repente ouvimos várias vozes, eram as nossas vozes. Olhei para Kelsey e a segurei mais firme. Escutamos mais vozes e barulhos diferentes. Então resolvi tirar a gada da mochila só por precaução. Mas no momento em que tirei a mão do ombro de Kelsey, para pegar a arma, me vi sozinho.

Olhei para todos os lados e ela havia sumido. Coloquei as mãos na cabeça entrando em desespero. Continuei andando com agada na mão. E quando cheguei frente a um dos túneis vi alguém. Um homem estava parado. Quando me viu soltou uma gargalhada que eu infelizmente conhecia.

— Meu príncipe preferido. Achei você! - Disse a voz.

Era a voz de Lokesh, era como ele havia dito no dia em que me prendeu. Não pode ser ele, não aqui. Ainda mais com Kelsey desaparecida.

Corri para o outro lado e parei.

— Dhiren! Venha aqui meu filho, mamãe está com saudades. - Mais uma voz.

Mamãe? Mamãe está aqui?  Virei-me para o outro túnel. Ela não estava lá. Meu desespero continuava.

— Estou aqui meu filho! - Continuou.

— Mãe? Onde você está? - Gritei.

— Aqui meu príncipe, aqui. - Disse a voz.

Dei alguns passos a frente e então parei. Minha mãe nunca me chama de príncipe, e sim de guerreiro. Não era a minha mãe. Alguém estava brincando comigo. Corri para longe dali e parei quando vi Kelsey. Ela estava no chão, caída. Corri até seu corpo e me desesperei, ela não estava respirando. Não...

— Kelsey? É você? Kelsey, por favor. Fale comigo. Preciso saber se é mesmo você. – Implorei.

Lágrimas começaram a correr pelo meu rosto. Eu não podia perdê-la, não suportava que isso acontecesse. É minha culpa, não devia ter trazido ela pra cá, não devia ter saído do seu lado. Ajoelho-me ao lado do corpo e toco sua face, está fria. Não, ela não pode morrer. Não aqui! Eu prefiro morrer a viver com este fardo.

—Não me deixe Kells. – Disse, perdendo as forças.

Nesse momento ouço uma voz, como se sussurrasse no meu ouvido. Uma voz familiar.

— Ren? Estou aqui. Não desista.

Ergui a cabeça.

— Kelsey? Eu estou ouvindo você, mas não posso vê-la. Onde você está? – Questiono confuso. Deito o corpo de Kelsey no chão. Ele desaparece.

— Feche os olhos e sinta seu caminho até mim. – Ela me disse.

Fechei meus olhos, enxuguei as lágrimas e me levantei.

Com os olhos fechados, escuto os batimentos do coração de Kells, sinto o aroma de seu cabelo, o aroma que tanto amo. Ainda com os olhos fechados, me viro para o lado e ando devagar com os braços estendidos.

Vou seguindo e, após alguns segundos, sinto a mão de Kelsey tocar as minhas. Então ela me puxa de encontro a si.

Abri meus olhos e a olhei. Toquei seu rosto com os dedos.

— É você mesma desta vez, Kells? - Perguntei recuando.

— Bom, eu não sou um cadáver cheio de larvas de varejeira, se é o que você quer dizer. - Provocou.

Neste momento percebi que era ela sim, com seu senso de humor inconfundível. Minha Kells.

— Que alívio. Nenhum cadáver cheio de varejeiras seria tão sarcástico. - Concordei.

— Bem, e como eu sei que é você de verdade? - Indagou.

Considerei sua pergunta. Puxei-a de encontro ao meu peito e a beijei profundamente. Minhas mãos passearam por seus braços e ombros, reconhecendo sua pele. Ela agarrou minha cintura com os braços e respondeu com avidez ao meu contato. Quando me afastei, ela estava sorrindo.

— Mesmo que não seja você de verdade, eu fico com esta versão. - Provocou.

Rimos e nos sentimos aliviados.

— Kells, acho melhor você segurar minha mão pelo resto do caminho.

Eu sorri para ela e segurei sua mão com firmeza, afim de não nos perdermos novamente. Agora que seguimos nossos corações e estávamos juntos novamente, pudemos ignorar as vozes.

Descansamos um pouco e continuamos novamente. Disse que seria melhor seguir a beira do rio, que provavelmente ele nos guiaria até a cidade de Kishkindha. De longe, na água, avistei os seres que um dia ouvi minha mãe contar a história. Resolvi não falar nada, para não assustar Kelsey.

Ela então se abaixou para pegar uma pedra no fundo do rio, uma pedra que parecia de rubi. Mas rapidamente a envolvi com os braços e a puxei de volta.

— Olhe ali, adiante, use sua visão periférica. – Sussurrei.

Aqueles macacos que contam em lendas, chamados Kappa estavam nos olhando.

— Ele estava tentando te pegar. - Contei.

Ela perguntou o que são Kappa, e eu expliquei sobre o que minha mãe sempre contava para meu irmão e eu. Eles eram demônios da Ásia, que ficavam a espreita nas águas pegando crianças e para sugar seu sangue. Contei mais sobre o que minha mãe dizia: que muitos se curvavam diante deles, pois assim, eles também se curvariam, fazendo a água de sua cabeça cair, os matando.

— Gostaria de conhecer mais sobre sua mãe. Parece ter sido uma mulher muito interessante. - Interrompeu Kelsey.

— E era – concordei. – Eu também gostaria que ela tivesse conhecido você. – Sorri por dentro, certamente ela se daria muito bem com Kelsey. E com certeza está feliz por mim.

Fiquei entre Kells e o rio, e nos afastamos um pouco, também evitando as árvores. Caminhamos por mais algumas horas. Deparamos-nos com uma árvore enorme, ela nos atacou, mas pulei diante dela para atacá-la. Ela me engoliu de imediato, eu estava dentro do tronco dela. Bati com toda força no tronco de dentro pra fora, com a gada, a árvore se encolheu o bastante para que eu conseguisse sair. Lá fora Kells estava boquiaberta com o que eu fizera. Ao me aproximar dela, sorrindo, ela olhava para frente. Quando me virei, vi o céu cinzento de Kishkindha. Havíamos chegado.


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Notas finais do capítulo

CADÊ OS COMENTÁRIOS?! Ou todos meus leitores morreram ou vocês estão com preguiça de comentar! Que vergonha! To escrevendo vários capítulos atoa? Não mesmo! Bora comentar, tão pensando o que?
Até a próxima!



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