Rest in Peace escrita por Barcellos


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal!Essa é minha primeira história em toda vida que realmente me empenhei para escrever, foi um sacrifício totalmente gratificante, então espero não estragar algumas expectativas.Já escrevo essa história há um ano e passara a mesma por muitas alterações, espero que gostem, se puderem espalhar para os amigos será realmente muito bacana! Bem, vou parar de falar aqui... Boa leitura!



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08:00 – 05/05/2015 – Weekstreet – Casa de Miguel

O alarme tocava. Assim se iniciava a rotina de demasiado exaustão depois de uma noite de enfadonhas pesquisas com feixes de luzes entrando por entre os véus artesanais brancos bordados à mão das cortinas modestas da suíte gentil do quarto de um dos presidentes de uma das maiores redes de laboratório do mundo. Ritmados aos ventos suaves que sopravam das colinas trazendo o aroma doce dos pêssegos plantados nos pomares bem longe só fazia com que fosse mais confortável ficar repousado em uma cama macia coberto por um edredom grosso de algodão egípcio.

No calor de seu corpo, encolhido na posição fetal, negava sair debaixo de tão conforto e mordomia, resultado de muito trabalho e noites como anteriores mesmo que não levara ao seu sucesso repentino. Suas mãos continuavam por baixo dos lençóis deixando soar aquele tão desaconchegado som agudo que era posposto à ser desligado daqui a décadas se dependesse do tão combalido por estresse, o doutor.

Quiçá sua sorte maior era possuir uma tão afável esposa que o apoiava mesmo nas mais estultas decisões que seu marido adotava para sua empresa que estava caminhando para um colapso financeiro que poderia comprometer seu emprego, senão está pesquisa tão admirável, – mesmo que não esteja chegando em lugar algum – quem sabe o doutor Miguel já não teria tal título de respeito e glória mesmo com o laboratório mais debitado e menos patrocinado pelo fundador de tal.

Falo das empresas especializadas em vacinas, os laboratórios M.O.O.N que por hora não estava se apresentando numa das melhores situações financeiras e de maior credibilidade da população depois do nem tão recente fracasso que acabara tirando a vida de pessoas que serviram de cobaias, tão esperançosos eles eram... Como é ruim relembrar.

Com as solas dos pés pisando sobre o azulejo liso e encerado por suas criadas, caminhava Jéssica pelo chão gelado ainda de camisola quando acabara de sair da suíte já feito suas higienes básicas da manhã. Curvou-se um pouco sobre o cabeceira da cama estalando as vértebras de sua coluna, jogo as mechas de cabelo que caíam ao seus olhos para trás da orelha e em seus movimentos tão suaves, desligou o despertador quando já havia passado três minutos de insistentes apitos, ainda curvada começou a cutucar seu marido, doutor Miguel.

Retrucou feito um adolescente que se enraizava nas cobertas, era um compromisso ir para seu trabalho não tão amado assim, principalmente hoje que seria uma data relativamente importante para ele. A persistência da moça era mais irritante que quem sabe o alarme se tornara um conforto para Miguel, foi preciso jogar o edredom no chão para tentar despertar o homem que só assim começou a abrir os olhos piscando rapidamente e contraindo os músculos de queixo à testa incomodado com a luz forte do dia que já tornara a brilhar nos céus de Weekstreet, uma cidade pacata de pouquíssimos habitantes.

–Amor, acorda... – disse Jéssica com palavras doces e baixas – Hoje é um dia importante para compensar todas as noites de pesquisa que você sofreu.

Miguel não falava nada, continuava a piscar com a mesma expressão contraída até que depois de um bocejo longo que o fez morder sua própria língua no final, o estimulou a pelo menos se levantar todo molengo feito um zumbi esfregando o rosto meio descoordenado. Depois de obtido êxito em sua missão, Jéssica deslocou à cozinha deixando-o a sós procurando o melhor terno para o dia que se estendia há tempos. Ao closet fora achado um belo terno de tecido fino não muito formal e nem mesmo tão adequado, porém seu predileto, conjuntado com uma gravata vermelha e uma calça negra lisa. Seus sapatos foram pretos, de couro genuíno e costurados com linha à mão.

Feito um gargarejo com antisséptico bucal, penteado os fios comportados de um cabelo curto e liso, ajeitou o nó torto e ergueu o queijo com um desdém orgulhoso de sua vaidade, de seu sucesso nada invejado, mas sua arrogância era algo alucinadamente intenso e não era lá suas muitas coisas para ser tão egocêntrico e, com grande parte de pessoas que vivia ao seu arredor, ignorante. Partiu à cozinha no andar de baixo.

O cheiro da omelete com queijo e bacon feito por Jéssica quase todas as manhãs já invadia os cômodos de toda a casa, enquanto descia ás escadas abotoando a fivela do cinto enquanto a televisão pendurada ao canto da cozinha estava ligada num volume baixo que passava o telejornal local. Ele sentou-se à mesa ocupadas por papéis espalhados pertencentes à sua pesquisa, começou a acomodá-los dentro de uma pasta cinza enquanto ouvia os repórteres falando sobre um assunto desinteressante sobre a queda da bolsa de valores, o chiado dos ovos eram mais envolvente que o jornal.

– Você parece bastante cansado, ficou até que que horas acordado ontem? – perguntou Jéssica sem olhar para trás concentrando-se na frigideira.

– Até ás quatro, estou tentando entender a organização multicelular que seria formado se mapeássemos o DNA com uma estrutura radiotivamente... – dizia Miguel quando fora interrompido por risos.

– Miguel, eu não entendi nada do que você disse, é melhor você comentar esses assuntos com seu assistente – disse Jéssica revirando a frigideira num prato de porcelana.

Quando ouvira a palavra assistente seus olhos reviraram e seu sorriso abriu, mas não era um sorriso de felicidade, era desprezo, tamanha aversão era que ele sentia pelo seu assistente que o acompanhava em suas pesquisas desde o início delas e pareceu que Jéssica só falara isso para instigar a pequena raiva que ela estava ciente que ele tinha dos mesmos. O prato com o café da manhã fora levado ao pequeno espaço desocupada pelas folhas e Miguel não podia perder por esperar e devorou-a em poucos minutos, se levantou arrastando a cadeira e arranhando o seu piso.

– Melhor se aguentar em pé – disse Jéssica acompanhando seu marido até a porta. – Hoje tem coletiva de imprensa.

– Ah, nem me fale... Mas sabe... – disse Miguel se aproximando bastante quase que englobando Jéssica. – Tem uma coisa que vai me manter bem, a coisa que eu mais amo na vida.

– É? E o que é? – perguntou Jéssica com um sorrisinho.

Miguel descolou um beijo curto de Jéssica, pegou as chaves do carro no chaveiro, abriu a porta e antes de fechá-la para sair ele respondeu a dúvida de sua mulher:

– Café – e fechou a porta.

Por um momento Jéssica arregalou os olhos enquanto sua sobrancelha arqueou até o extremo superior de sua testa enquanto soltava uma risada anasalada, caminhou até a janela, abriu um pouco a cortina e viu o carro dirigido pelo infectologista fazendo a curva na esquina. Soltou mais uma risada com um sorriso sincero que fazia seus pés-de-galinha no canto do olho enrugarem.

– Café – repetiu Jéssica a resposta de Miguel e saiu de perto da janela.

Dali ao laboratório MOON da franquia de Weekstreet não demoraria mais que dez minutos de carro pela serena pista onde os galhos das árvores eram soprados pelos ventos fortes que chacoalhavam fazendo folhas tão verdes caírem, naquele esguio túnel escuro consequente da falta de poda das árvores – o que mostra a precariedade nos serviços públicos do munícipio – que de um canto da pista ao outro se fechavam encima e era necessário mesmo usar o farol em plenas luz do dia. A movimentação dos carros eram poucas, uma vez ou outra se via algum destes passando por ali, apenas moradores frequentavam a cidade sem nenhuma atração impressionante.

Alguns não tantos quilômetros de um pequeno passeio pelo trecho da cidade com aspectos ainda rurais, chegara a uma estrada um pouco mais movimentada que a de antes transitava Miguel, onde já podia ver os três grandes prédios cobertos pela segurança de um grande muro de concreto fazendo do laboratório um lugar seguro. Havia uma quantidade consideravelmente pequena de jornalistas e repórteres esperando dar o horário da coletiva de imprensa para os portões se abrirem.

Repórteres, pensou Miguel cerrando os dentes enquanto estacionava seu carro nas vagas dos funcionários quase todas preenchidas, ele odiava a imprensa e para isso seu truque era colocar o óculos escuro e seguir de fininho, assim o fez. Bateu a porta do carro sem chamar muita atenção e seguiu para o portão dos empregados onde era escoltado por dois seguranças, mas eis que se ouve um grito que faz o doutor xingar mentalmente.

– Olha ali gente! – era um repórter – É o doutor Miguel Ferreira!

Toda a equipe da imprensa de diversos jornais e telejornais começaram a correr e a fazer mil e umas perguntas para o doutor que apertou o passo, apertou o botão de alarme só então e entrou. Os seguranças contiveram a multidão de curiosos que tentavam a todo o custo entrar, os flashes eram disparados por tudo quanto é canto tentando tirar uma mísera foto.

O doutor entrou e já era recepcionado pelos seus companheiros que eram poucos e por algumas secretárias que, mal tratadas por ele, cumprimentavam apenas pela boa e santa educação. Andava olhando para o relógio de pulso, parecia um pouco aflito, logo já teria a coletiva de imprensa, mas não podia deixar de ver o andamento das experiências e começava a criar expectativas para qual resultado havia dado em sua tentativa mais recente.

Apertou o botão do elevador que vinha do sexto andar e viu de longe seu assistente chegando com o jaleco branco carregando alguns papéis que se derramavam ao chão enquanto andava, todo atrapalhado era e Miguel passava a mão no rosto sentindo-se aviltado por padecer uma pessoa tão ínfima que era seu assistente Pablo que depois de descair sobre os papéis, continuou seu rumo ao elevador junto ao seu chefe, se pôs ao lado dele esperando que a porta abrisse.

– Bom dia, chefe – disse Pablo.

– Bom dia... – Miguel fitou-o dos pés a cabeça e falou num ar de repugnância – Pablo...

A porta se abriu, meia dúzia de pessoas saiu cumprimentando Miguel e depois eles entraram, o botão foi apertado pelo doutor que os levava ao quinto andar, onde se desenrolavam as pesquisas e experimentos em animais.

– Que tal irmos ao laboratório? – perguntou Pablo ajeitando os óculos.

– O que acha que estamos fazendo? – rebateu Miguel sem olhar para o assistente que se desculpou temendo o ar de arrogância.

E a porta se abriu novamente, desta vez quem saiu foram eles à caminho do laboratório de pesquisas, local onde os exames da vacina em estado pré-experimental situavam-se sendo testados em ratos e coelhos.

Você deve estar se perguntando que diabos é essa vacina de que tanto falo e pouco digo. OTeleophelis viral conhecido popularmente como Teleopódio é fruto de muita pesquisa após o simples infectologista descobrir um fungo Teliolêzio Placadium capaz de produzir anticorpos em seu hospedeiro para sobreviver em mútua sobrevivência com o corpo em troca de um percentual insignificativo para a sobrevivência humana de glicose. Depois de estudos, Miguel chegou a uma hipótese de que na produção de anticorpos essa suposta vacina poderia ser a imunização de todas as doenças e poderia ajudar na cura de câncer já que tal fungo poderia ser eficaz ao ato de englobar tais células cancerígenas funcionando como um kamikaze, morrendo logo depois de mata-las e tornando seu hospede saudável.

Chegado ao laboratório, a pasta de Miguel fora colocada encima de sua escrivaninha pelo o próprio que começara a ligar os computadores enquanto os interruptores das luzes climatizadas eram acesas por seu assistente que pegara sua prancheta com as anotações e resultados de exames de sangue e partira ao encontro das jaulas dos animais, em sua maioria mortos. Esperou abrir o programa de seu computador enquanto arrastava a cadeira com rodas até a máquina de café expresso, pegou um copo de isopor e o encheu de café, voltou sem se levantar apenas se arrastando na confortável cadeira executiva, bebericou da bebida e levou o copo à mesa, estalados os dedos projetou sua voz.

– Muito bem, Pablo, me dê a análise das últimas trezentos e sessenta horas.

– Aplicamos o vírus H1N1 no grupo A e depois o Teleopódio, de dez, oito foram mortos e dois correm riscos de morte. – disse Pablo virando a prancheta e verificando o próximo grupo de jaulas – Aplicamos H1N2 no grupo B e depois o Teleopódio, de dez, nove foram mortos e um está instável – caminhou até a próxima jaula virando novamente as folhas da prancheta enquanto os teclado era brutalmente usado por Miguel – O H2N2 reagiu mal ao Teleopódio e de dez, apenas um está vivo, mas sem risco de falecer embora a vacina não tenha causado efeito algum e...

Miguel interrompe a leitura dos resultados batendo o teclado com força sobre a mesa e quase derramando o seu copo. Assustado, Pablo dá um pulo pra trás deixando cair os papéis e com os olhos arregalados observava seu patrão acalmando-se aos poucos puxando a raiz de seus cabelos com o cotovelo apoiado na mesa.

Bebeu um pouco do café e disse com os dentes trancafiados:

– Aplique a vacina das respectivas doenças nos ratos que resistiram, tenho que ir à coletiva de imprensa.

08:55 – 05/05/2015 – Weekstreet – Laboratório MOON

A sala estava pronta com duas câmeras apontadas de dois ângulos opostos à poltrona posicionada beira à mesa com um copo d’água e a plaquinha cujo o nome registrava o do próprio que entrava, no momento alguns flashes foram disparados. Seu “bom dia” gerou uma balbúrdia por entre os membros das empresas que tentavam a todo custo ser ouvidos pelo homem que lhes renderia um dinheiro com suas respostas, a algazarra foi tanta e o único que poderia conter isso era Miguel que apontara para um repórter aleatório e todos apaziguaram-se permitindo que o escolhido falasse.

– Saudações. Faz cinco anos e meio que o laboratório MOON investiu cerca de 50 milhões na cura do HIV que foi um fracasso e que então, matou muitas pessoas que tomaram tal vacina. Sua vacina terá o mesmo fracasso, ou você vê um futuro para ela? – perguntou o repórter.

– Vejo, um futuro para ela sim. Vejo um futuro para todos nós. Eu sonho que todos fiquem bem, passem suas noites tranquilas e em paz. Nada de remédios, nada de xaropes, nem mesmo médicos – disse Miguel bebendo seu copo d’água.

Se prossegue o falatório desordenado que fizera o ouvido de Miguel zunir por um momento, fechara os olhos com força para sustentar sua paciência, pois naquela hora gostaria ele de gritar revirando a bancada para cima de todos ali presentes. Mas apenas fecha o olho e quando abre aponta novamente para um jornalista aleatório, ou melhor uma jornalista situada ao fundo da sala cujo seu próprio câmera-man registrava o momento. Volta o sossego.

Emily Devis, bom dia! – cumprimentou a bela moça de pele morena – O doutor, já está trabalhando nessa pesquisa faz três anos. Nesse tempo, houve andamento ou alteração?

– Bom dia. Sim houve alterações grandiosas e significantes. – mentiu – Mas é bem possível que eu precise de mais seis anos ou quem sabe até doze, para a vacina estar totalmente pronta.

– A população mundial, anda tendo uma taxa de mortalidade muito alta. Com a evolução das indústrias, contaminação do ar e das águas e até mesmo erros em curas como essa. Alguns anos tínhamos oito bilhões de pessoas, atualmente temos seis bilhões. Se a possível imunização para as doenças demorar mais anos, o mundo perderá mais e mais pessoas – rebateu Emily Devis afincando sua ideia.

– Desculpe-me, a culpa não é minha, é de vocês. Vocês e eu, como pessoa. Nós que poluímos, nós que nos matamos, desmatamos e secamos. Eu, como médico, estou aqui apenas para tentar melhorar nossa situação. A culpa é de todos nós, como pessoa. – disse Miguel já se estressando.

Novamente volta um burburinho, dessa vez mais alto e agudo. Miguel começa a ter leves tonteiras tenta beber um pouco mais de sua água, mas deixa cair no chão. Levantou-se da cadeira, e saiu cambaleando. Os jornalistas mais mal-educados vaiaram, a outra parte apenas se perguntou o que teria acontecido com eles. Sem respostas, os seguranças começaram a despachar a galera da imprensa.

– Você está bem, senhor? – perguntou Pablo, medindo sua temperatura com os punhos.

– Está tudo bem Pablo, está tudo bem. – depois de um tosse prosseguiu – Vamos à sala de experiências... Eles querem a cura para o planeta? A eles darei.

20:45 – 05/05/2015 – Weekstreet – Laboratório MOON – Sala de mutação genética

As horas se passaram dentro da cabine escura e sombria iluminada por uma lâmpada laranja que não produzia tanta luz assim, servia apenas de climatização para o ambiente das bactérias e fungos, necessários para as experiências. Devia se tomar bastante cuidado naquele ambiente, a quebra de qualquer vil frasco poderia ser resultado de uma epidemia que na pior das hipóteses, teria a chance de se propagar pelo mundo extinguindo parte da raça humana.

Mas os movimentos eram cuidadosos, tinham de ser assim, mesmo o Pablo com todo seu jeito atarantado tinha de arranjar um jeito para ter uma postura descente dentro dali. Com o conta-gotas pingava um líquido esverdeado dentro de um pequeno frasco que acabara de sair da centrífuga, tampara e o balançava levemente com firmeza.

– Senhor, já tripliquei a adrenalina, aumentei os leucócitos e acrescentei o vírus – disse Pablo.

– Certo, o Teliolêzio Placadium está no nível um? – perguntou Miguel.

O assistente fez que sim enquanto chacoalhava o tubo que começava alterar sua cor de verde para amarelo, parecia examinar aquela substância que depois de um tempinho colocou dentro de uma maleta de alumínio especial junto com outros vinte tubos, fechou e entregou nas mãos de Miguel com a máxima precaução em até mesmo no seu simples modo de respirar. O doutor pegou a maleta e acomodou-a dentro de uma gaveta de ferro numa estante que ao ser aberta deixou sair um vapor que em seus aspectos parecia ser frio, pois havia ido para o chão, no caso do ar quente iria se espalhar ao teto em gotículas até que se desintegrasse.

– Agora vamos deixar aí, sofrendo a mutação, quanto tempo você acha que isso vai custar? – perguntou Miguel fechando a gaveta.

– Um ano? – estimou Pablo.

Na verdade o líquido no tubo é o Teleopódio, a vacina.

Ainda pensando em uma resposta, o doutor organiza a papelada que, como sempre se via espalhada pela mesa, prestes a ir embora. Seu assistente faz o mesmo com suas folhas que em maioria estava no chão, desligam os interruptores das luzes e o clima começa a ficar bem mais quente que antes e antes de sair Miguel se põe a dizer:

– Seja como for, vai ser mais rápido.

Um apartamento miúdo com móveis de terceira mão num prédio com um estado relativamente ruim, essa era a moradia de um assistente, totalmente diferente da de Miguel, um contraste assustador. A renda da família dependia do simples salário de sua esposa, Lauren, que trabalhava como telemarketing quase todo o dia deixando o filho do casal à só na maior parte do tempo com a babá, ou melhor, a vovó adotada por eles que passava horas de seus dias entretendo e alegrando o tão pequeno e dócil Daniel.

Pablo abre a porta de seu apartamento, quando chega da maneira mais sútil possível tira seu jaleco e pendura-o na cabideira com alguns de seus suportes quebrados e seu verniz descascado de tão desgastado fora. A TV passava um desenho de um canal infantil, a cabeça de Daniel estava recostada ao sofá, ele mal percebera que seu pai estava já em casa e só notou sua presença depois que Pablo repousou seus cotovelos na cabeceira do sofá e ficou assistindo desenho junto a ele.

– Eu amo esse desenho – comentou Pablo.

– Papai! – exclamou o menino se levantando e pulando do sofá para Pablo que o pegou e levantou no ar – Você demorou de mais hoje, eu e a senhora Foster fizemos alguns bonecos de argila, foi muito divertido.

Ao seu lado viu umas formas malfeitas que ele o apelidava de bonecos de argila, coisa de criança, mas que encantava Pablo porque assim como todo pai, não via defeito em tudo que viesse de seus filhos:

– Que legal, filhão!

A senhora Foster vinha pelo corredor às tosses, com uma tigela de mingau de aveia. Ela podia ser velha, mas era muito prestativa. Sua pele nem era tão enrugada, seus olhos eram verdes e seus cabelos eram grisalhos. Cláudia Foster, era bem lúcida e saudável, acordava pela manhã para caminhar pela praia, faz compras e até mesmo dirige – e muito bem.

– Olá, senhora Foster. – cumprimentou Pablo.

– Oh, não me chame assim, Pablo. Eu gosto do meu nome, Cláudia. – disse ela, dando um leve tapa carinhoso nos ombro de Pablo.

Pablo ri.

– E esse pestinha aqui, se comportou bem? – disse Pablo, acariciando sua cabeça sem cabelo.

– Sim, e muito. Fizemos umas artes com argilas. – disse Cláudia, tossindo um pouco.

– Uhum, eu vi. Tem algum recado? – perguntou Pablo, indo com Cláudia ao sofá onde tirava seu sapato apertado.

– Não, ficou tudo em ordem. – disse Cláudia, tossindo, agora uma tosse encatarrada

Sim, sem cabelo. Daniel tinha câncer. Fazia quimioterapia no laboratório MOON mesmo, como o tratamento era muito caro, Pablo decidiu prestar serviços para pagar o tratamento de seu filho. Daniel às vezes perguntava ao seu pai, qual o motivo dele não ter cabelo e ter que ir no médico de vinte a vinte dias e seu pai perdia as palavras ao ar quando essa pergunta lhe era lançada quase todos os dias.

Visto Pablo que a senhora Foster não passava bem, despediu-se.

Cláudia morava no mesmo prédio, em um dos andares a cima. Vivia sozinha. Viúva, sem filhos. Seu marido, dez anos mais velho, morreu de infarto quando a moça ainda tinha 50 anos, o único filho que tiveram, morreu atropelado em seus treze anos de idade. E então viveu assim, sem família biológica, mas com tantos amigos envolta que isso se tornava o menor de seus problemas.

Momentos depois o sono começara a chegar sobre a energia do pequeno menino tão agitado que fora para cama minutos depois, claro que tinha que ter uma boa história contada por Pablo para seu dia se encerrar com chave de ouro e enfim ter bons sonhos com a luz do pequeno abajur acesa.

Os minutos se passavam e só mais tarde quase ás nove horas da noite Lorena chegara enquanto na TV exibia a reprise do jogo de futebol que acontecera mais cedo, a porta foi batida com tremenda força pela mulher que entrou, no mínimo, irrequieta. Tirou as sapatilhas e as deixou num canto, selou os lábios de Pablo com um beijo e sentou ao lado dele bufando enquanto desabotoava o uniforme apertado.

– Já vi que hoje não foi um dia bom – disse Pablo vidrado na tela da TV.

– Não mesmo, eu tive que faze hora-extra para compensar uma colega de trabalho que saiu e acabei tendo que chegar mais tarde – disse Lorena agora ficando apenas de regata – e você teve um dia bom trabalhando com Miguel?

Pablo riu sarcasticamente, ela sabia da antipatia dos dois e só falava isso para provocar.

– Trabalhar com Miguel é você morrer e ir direto para o céu, Lorena... – brincou Pablo – A coletiva de imprensa foi um fracasso e as pesquisas estão indo de mal a pior, talvez achemos a solução com uma mutação à base de radiação, mas irá demorar mais um ano ou mais.

– Estou começando a perder as esperanças que Daniel ficará vivo só por causa dessa vacina – disse Lorena.

– Não, Lorena! – exclamou Pablo com um ar de reprovação – Perder as esperanças é que não, temos que persistir e resistir, nosso filho irá ter uma vida melhor.

Lorena cortou o contato visual cabisbaixa e disse numa voz suave:

– Estamos muito cansados, não é mesmo? – se levantou – Venha, – puxou as mãos de Pablo – vamos dormir.

Certificaram que Daniel estava dormindo bem. Estava feito pedra. Desligaram o abajur para economizar energia, não tinham o sustento de pagar muito por uma simples conta mensal de luz embora o pequeno abajur nem gastasse tanto assim. Lorena e Pablo vestiram seus pijamas para aquela noite abafada, ligaram o ventilador barulhento de teto que parecia mal instalado ao ponto de cair e cortar cabeças. Se cobriram com um cobertor fino e rasgado e ao fechar os olhos logo já estavam dormindo.

21:20 – 05/05/2015 – Weekstreet – Casa de Miguel

O escuro do quarto do casal fazia da noite mais bonançosa e conveniente ainda que o dia tenha sido um malogro das gafes de Miguel em plena rede local e do fiasco que ia caminhando suas pesquisas que também não estavam tendo muito apoio nem patrocínio do fundador da empresa que não tinha uma mísera crença do sucesso da mesma.

– Você não anda muito bem, né? - perguntou Jéssica preocupada.

– E como andar bem, amor? Sabendo que a qualquer hora você pode perder ser cargo na empresa? Sabendo que as pessoas confiam em mim e que eu posso tornar essa vacina como a do...

– Melhor não tocar neste assunto.

– Mas é a verdade, Jéssica!

– Você acha que vai ser um mau investimento? – perguntou Jéssica, com um ar assustada.

– Não sei amor. Nossa empresa, em Weekstreet, está devendo quase 200 milhões só por causa daquele fracasso da cura do HIV de Marlon. Aquilo afundou a empresa completamente. – disse Miguel.

– E hoje aquele vexame Miguel... Aquilo só vai ser mais um argumento pra você perder o cargo de diretor... Aquilo não foi nada legal... – disse Jéssica, sem jeito.

– Pois é eu não quero perder meu cargo... Só quero fazer um mundo melhor, sem dor, sem sofrimento.

– É porque ninguém está acreditando muito nisso, desde o deslize do doutor Marlon, a empresa perdeu toda a credibilidade. Mas anota o que eu estou falando, quando a vacina for testada e algum paciente ser curado, isso vai render muito para o laboratório. Anota aí!

– Tomara que sim, amor... Tomara... – disse Miguel, virando de lado e fechando os olhos, afim de não conversar mais.

Não só o mundo, mas em especial Weekstreet, contava com o sucesso da vacina. A falta de turistas e a economia local não apresentava o glamour, do auge dos Laboratórios MOON de décadas atrás quando produziam remédios que beneficiavam toda aquela cidade distante da capital, que na qual, hoje era esquecida.


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Notas finais do capítulo

Prometo que os próximos capítulos teremos mais ação e menos papo!



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