Criança Domesticada escrita por AneenaSevla


Capítulo 9
A Explicação da Raiva


Notas iniciais do capítulo

"Compara-se muitas vezes a crueldade do homem à das feras, mas isso é injuriar estas últimas."
Fiodor Dostoievski



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Durante aquela semana, aos poucos Thomas se recuperava das dores, e Alicia, dos sustos. Os tentáculos do jovem Slender vagarosamente deixavam de apenas tremer para se movimentar de acordo com os comandos dele, e a garota percebia que às vezes eles se comportavam como caudas, demonstrando expressões. Thomas brincava com seus novos membros, ondulando-os ou brincando de tocar alguma coisa com eles, e ele se surpreendia quando aprendia algo novo.

Licia olha o que eu descobri! Ele chegou perto da escrivaninha onde ela estava, e mostrou-a seu novo truque: encolher os membros a ponto de praticamente fazê-los voltar a serem aquelas marquinhas de nascença nas costas. Pelo jeito que funcionavam, pareciam se comportar como aquelas antenas de rádio antigas, só que com inúmeras secções. Ela nunca deixava de se impressionar com isso.

– Uou! Isso é muito legal! - Ela olhou para as costas dele, no lugar só tinha a camisa furada cuidadosamente nas costas para os membros saírem - não doi mais?

Ele balançou a cabeça. Não, pelo contrario, me sinto ótimo! Até consigo sentir as coisas melhor do que antes.

– Como assim?

Bem… eu antes não conseguia ver texturas, só sentir com as mãos… Agora eu vejo isso. Também consigo saber qual material é…

Alicia sorriu. A unica coisa que ele não sabia distinguir eram cores, e explicar isso para ele se tornou uma tarefa árdua, então depois de um tempo ela desistiu da ideia.

Thomas puxou uma das cadeiras da mesa e se sentou, em seguida observando o que ela fazia. Papéis, lápis e anotações estavam por toda a parte do móvel. Ele conhecia isso muito bem. Vai ter prova? Perguntou.

– É, tou revisando… - Alicia olhou para ele - eu já lhe ensinei isso, são equações de primeiro grau…

Ah, encontrar o xis criminoso com algumas pistas…

– É… - ela riu. Ele podia ter nove anos, mas as comparações que ele dava a problemas de matemática eram geniais. Tudo para ele era uma brincadeira. E isso até ajudava ela a melhor encarar as coisas.

Thomas sem aviso prévio virou a cabeça para a porta e calmamente se levantou e foi para o closet. Alicia perguntou que foi e ele se escondeu, fechando a porta.

Na mesma hora Clarice apareceu, batendo de leve na porta. Alicia olhou para a porta. Como você faz isso, Thomas?

Você não escutou ela vindo? Você tem mesmo um ouvido de pedra.

– Oi - disse Clarice - eu vim te visitar, e estudar também.

– Ah, oi… vem, eu já tinha começado, mas… e aí, como tem passado?

– Bem desde ontem, quando me perguntou - ela riu - minha mãe viajou ontem de novo, ela disse que tinha achado novas pistas sobre os Slenders. Ela disse tambem que tinha um alto índice de desaparecimentos por lá perto da floresta negra, a maioria das vitimas são jovens e os próprios agentes…

– Sério isso? E o que acha que eles fazem com os desaparecidos?

– Eles são monstros, Licia - Clarice falou com um tom de autoridade que fez a garota se sentir burra - lógico que eles matam. E provavelmente os comem…

– Eca! - ela fez careta com o asco, e ela ouviu o monstro fazer o mesmo no pensamento dela - que nojo…

– Mas é assim, eles são assassinos sanguinários, e eu duvido que matem para jogar carne fora…

Eu não, eu nunca matei ninguém… E eu como coisas já mortas, nunca comi humanos. Disse Thomas, mas como de costume, só Alicia ouvia.

– Eu não acho isso, Clarice… - Alicia contestou receosa – Eles devem apenas mandar pra outro lugar, sei lá…

– Eu não acho que eles sejam inteligentes o suficiente para isso – com essa Alicia conseguiu sentir a raiva de Thomas, o que fez a menina arrepiar os pelos da nuca – Eles vivem em florestas, não têm sociedade… pelo menos os investigadores não descobriram isso ainda.

– Tudo bem, se você diz… - e elas começaram a rever as lições. Thomas ainda escondido brincava com um bonequinho de pano, daqueles parecidos com os de vodu, que a menina guardava de sua tenra infância. Meio descosturado, mas dava para mexer sem desmanchá-lo. Com as sobrancelhas franzidas, se ele tivesse lábios, estaria fazendo bico.

Agora é de verdade, o monstrinho grunhiu de raiva, eu não gosto dessa garota.

Ela só não sabe sobre você Thomas, Alicia suspirou, talvez se um dia você se mostrasse…

Nem morto! Ela ainda cheira a perigo, e duvido que eu mostrando minha cara vá fazê-la cheirar melhor.

Ela não conseguiu prender o riso, e Clarice notou.

– Alguma coisa, Licia?

– Eu só me lembrei de uma piada de um colega… achar o xis criminoso… - ela estava ficando boa em arrumar desculpas. Clarice não viu graça nenhuma.

Na verdade, Alicia pensou, deixando Thomas ouvi-la, tem horas que eu não gosto muito também. Ela nem tem senso de humor!

Não sei como você a suporta.

Ela é minha amiga de infância, eu teria sido muito solitária sem ela.

Ah… tá explicado.

Uma nota de concordância surgiu entre os dois. E, Alicia tinha de admitir, era uma sensação muito boa.

Esse é o ultimo. Disse Sean, carregando o jovem humano desacordado para fora da floresta. Segurava-o pelo tronco com um dos tentáculos, sem muito cuidado de sufocá-lo. Podia realmente matar esse, mas era necessário não fazê-lo: quanto mais ele fazia, mais deles apareciam.

E isso estava se tornando insuportável.

Interessante como essa praga corre para o perigo como mariposas à luz. E ainda se dizem as criaturas mais inteligentes.

Por isso ele resolveu usar a tática de desmaiar os intrusos “fritando” a mente deles, depois levá-los para o mais longe possível, de preferência fora da floresta. A sua telepatia não os deixava loucos - bem que queria – mas pelo menos lhes retirava a memória de sua localização e existência. Sean sabia que muitos desses filhotes idiotas que faziam apostas de coragem para invadir seu território eram logo depois interrogados por aqueles que se armavam para enfrentá-lo. Ele tinha percebido que os seus disparadores de metal eram inúteis para matá-lo, e se valia desta vantagem para assustá-los e mantê-los longe, bem como fazer a mesma coisa na mente deles como fez com esse que estava carregando.

Pelo menos tem dado certo, os humanos diminuíram nos últimos meses, mas ele não podia relaxar, pois a qualquer momento eles poderiam voltar a desmatar, caçar, fazer mais daquelas atrocidades que ele conhecia muito bem… além de montar aquelas armadilhas cada vez mais difíceis de desarmar. Ele tinha achado algumas delas há alguns anos, uma delas desarmada, mas não por ele. Era uma velha armadilha para ursos, e ao lado e não muito distante tinha restos de um atirador com drogas para dormir…

E, mesmo distante e quase imperceptível, o cheiro dele estava lá…

Um surto de adrenalina o percorreu por causa da lembrança, quase esmagando o humano no tentáculo, que gemeu no desmaio.

Ah… Du… Hurensohn! Ele praguejou. Vou ter de esconder essa pancada. E criar provas para isso.

Trazendo-o para frente, ele usou suas garras para fazer alguns cortes em regiões perto das pernas e outras cicatrizes parecidas com as que eles ganhavam ao cair de uma árvore. E quebrou alguns galhos de uma na orla, colocando um deles em cima do garoto e espalhou outros no chão. Observou o trabalho. É, parece verídico. Caiu da árvore, quebrou alguns galhos, se machucou… Examinou o garoto, verificando o estrago que ele mesmo fez. … estatelou-se no chão, bateu a cabeça e quebrou umas três costelas… Perfekt.

Então que ele percebeu: era tarde da noite, quase amanhecendo. Ele sentia que Hellen ainda estava dormindo, mas os animais diurnos já estavam acordando, os pássaros inclusive começando a se comunicar aqui e ali.

E ele estava ficando cansado.

Usou o resto de sua energia para dar um último Andar Esguio antes de finalmente guardar os tentáculos nas costas, sentar-se numa poltrona – não queria incomodá-la, ela tem demorado muito para pegar no sono nos últimos tempos – e desabar, exausto.

Se ele não tivesse patrulhando a floresta todas as noites, ele também demoraria a dormir, por justamente não conseguir saber nada, nem ao menos conseguir sentir seu filho à distância… como ela.


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Notas finais do capítulo

O nome desse capítulo deveria ser "Eles são Monstros, Licia!" mas eu combinei comigo mesma para evitar colocar frases da história no título. Fica muito estranho pra mim.
Bem, mais um capítulo nessa bagaça. Bjos, xau!



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