Primeiro ano escrita por Lyttaly


Capítulo 2
Dois




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Karol

Esse ano vai ser cansativo. Pegar ônibus 6h da manhã não é legal. Sempre lota e ninguém abre a janela porque o vento fica gelado. Daí o ônibus fica abafado e se alguém espirra a chance de pegar uma gripe aumenta. A única coisa boa é que eu pego o ônibus na garagem e assim posso sentar até chegar à escola. São 40 minutos de viagem.

Quando entrei, sentei em um banco da janela no meio do ônibus e no mesmo lado do motorista. Minha mãe diz que esse lugar é mais seguro e eu concordo: fica longe da frente, o que me protege caso o ônibus bata; em caso de acidente, a reação natural do motorista será se proteger, então ficar do mesmo lado me protegerá; fica relativamente longe do cobrador, o que me protege se um assaltante o render; fica entre a porta do meio e a porta de trás, o que me protege de ser a primeira vitima de um ladrão que entre por uma das portas e me dá tempo de bloquear meus aplicativos do celular e esconder parte do meu dinheiro em baixo da perna. Sempre deixo uma parte do meu dinheiro em um bolso e o restante, em outro. Também não mecho no celular com a janela aberta porque alguém pode puxá-lo.

Acho que é tudo paranoia minha, mas eu faço automaticamente.

Alguns minutos depois de a viagem começar entrou um garoto no ônibus que me chamou atenção. Ele estava com o mesmo uniforme que eu.

Fiquei com dó, pois ele ficou em pé e ninguém se ofereceu para segurar sua mochila e ele estava muito longe de mim para eu me oferecer. Ele estava com cara de sono e não parecia nada animado com o primeiro dia de aula.

Olhei para a janela e vi que começou uma chuva leve, mas suficiente para esfriar ainda mais a manhã.

Apesar de acordar mais cedo, o trânsito atrasou a viagem. Quando desci do ônibus a chuva tinha engrossado. Fiquei feliz de ter sempre um guarda chuva na mochila.

O menino que vi antes estava sem. Não consegui evitar sorrir quando ele saiu do ônibus em disparada e bateu tanto o pé, que com certeza molhou toda a calça.

Quando o vi passando pelo portão notei o guarda fazendo um sinal. Demorei perceber que era pra mim. Ele apontava para o relógio e me chamava. Comecei a correr, tentando não bater muito o pé. Quando passava pelo portão tropecei em algo e quase caí. Alguém me segurou e soltei guarda chuva. Me soltei dos braços que me seguravam e corri para pegar.

Quando me voltei para agradecer vi o mesmo garoto de antes. Mais molhado e me olhando. Não entendi porque ele me olhava e continuava na chuva.

–O-obrigada – falei meio sem graça.

–Não precisa agradecer senhorita – ele disse, fazendo uma reverência e começou a correr em direção ao segundo andar. Antes de subir as escadas se virou, me olhou e sorriu.

Diego

Depois de acordar tão cedo e pegar um ônibus lotado em que eu tive que ficar em pé segurando minha mochila, começou a chover. Pior que isso, a chuva engrossou e eu não tinha um guarda chuva. Por que isso sempre me acontece?

Comecei a bolar uma estratégia para me molhar menos no caminho do ponto de ônibus até o portão da escola: ficaria na porta e assim que colocasse os pés na calçada correria o mais rápido que conseguisse. Era a única opção. Esse caminho não tinha onde se esconder. Tentei visualizar o caminho mais curto até a marquise do prédio da escola. Repassei tudo em minha cabeça varias vezes.

Quando o ônibus parou coloquei meu plano em prática.

Quando passei pelo portão vi que a marquise ficava a apenas um passo e me protegi. Reparei que não adiantou nada correr mais rápido, pois bati muito forte o pé e minha calça ficou toda molhada.

Estava me preparando para atravessar o pátio para ir para a minha sala que ficava no segundo andar quando escutei o porteiro gritar para alguém fora, na rua e uns instantes depois vi uma garota de guarda chuva correr e tropeçar ao passar pelo portão. Meu corpo se moveu sozinho para segurá-la.

Durante um segundo olhei pra ela e notei duas coisas: ela era linda e tinha os olhos mais azuis e sinceros que já vi.

Ela rapidamente se desvencilhou de mim e correu para pegar o guarda chuva. Não conseguia me mexer nem desviar o olhar dela. Quando ela se virou nossos olhares se cruzaram e notei que ela estava confusa com alguma coisa.

–O-obrigada – ela disse, parecendo sem graça.

–Não precisa agradecer senhorita – eu disse fazendo uma reverência. Não entendi o porquê de fazer isso. Meu corpo mais uma vez tinha agido sozinho.

Me dei conta de que ainda estava na chuva e comecei a correr em direção às escadas. Queria olhar mais uma vez para ela, então me virei e a vi me olhando, com um sorriso que a deixava ainda mais bela.

Sorri de volta e subi as escadas, mais molhado do que nunca.


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Notas finais do capítulo

Se você leu até aqui #obrigada^^