Literatura escrita por LiKaHua


Capítulo 8
Capítulo 08 - Confusa


Notas iniciais do capítulo

Não tenho nada a declarar. Não estou bem, não quero falar sobre isso, atualizo quando der.



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O dia seguinte eu passei no quarto. Uma estranha letargia tomou conta de mim, não consegui levantar, não conseguia comer, não consegui me mover. Meu peito doía tão insuportavelmente que parecia que eu estava me desfazendo, as lágrimas vinham, paravam, vinham de novo. Minha mãe apareceu no quarto e perguntou por que eu estava daquele jeito, virei às costas pra ela e disse que estava com dor de cabeça, o que veio depois disso foi a enxurrada de reclamações de sempre que eu bloqueei colocando o travesseiro na cabeça. Permaneci assim o resto do dia até o fim da tarde quando eu inevitavelmente teria de voltar para a faculdade, a última coisa que eu queria era aguentar as reclamações e sermões da minha mãe quando chegasse e me visse do mesmo jeito que me deixou, ela já era suficientemente insuportável quando reclamava por prazer, eu não queria aguentar ela reclamando por raiva.

Eu andava, mas me sentia um morto vivo, os passos eram lentos e provavelmente meu rosto estava assustador, fiz questão de não me olhar no espelho porque sabia que nada que eu fizesse poderia ajudar em nada, era dentro o problema. Uma vez, em um caderno na oitava série, veio uma frase muito verdadeira: “Se houver luz na alma, haverá beleza na pessoa.” Não havia luz na minha alma, eu estava completamente tomada pela tristeza e pela escuridão. Tomei meu lugar e, pela primeira vez, não peguei o livro que trazia comigo, fiquei ali, parada, completamente aérea a qualquer saudação ou as famosas perguntas “O que houve?” e “Tudo bem?”. É incrível a capacidade prolixa das pessoas quando a última coisa que você quer é falar com alguém. O primeiro tempo foi de Estudos Gramaticais II, acreditem quando eu digo que não escolhi o bacharelado em Letras por causa da gramática, não foi. Eu detesto a gramática e seu conjunto de regras discriminadoras e repressivas. Foi mais pelos livros. Para mim, livros são a primeira maravilha do mundo, eu escolhi o curso pelos livros que eu leio e pelos que eu sonho escrever e porque o meu sonho é ser editora.

Pausa para o intervalo. Eu e meu livro saímos para um banco fora da sala, eu precisava de ar e me desconectar daquele monte de olhares furiosos em minha direção, queria imergir naquele mundo ficcional que me permitia ter uma pausa dos meus pensamentos e sentimentos confusos e conflitantes, como eu não havia conseguido decidir o enigma da minha personagem porque não conseguia resolver o meu próprio enigma, eu estava lendo como uma desesperada, quando piscava os olhos o livro já tinha terminado e eu logo buscava outro para suprir o vazio dentro de mim. Enquanto meus olhos passeavam pelas linhas e meu cérebro me transportava para o filme daquele universo criado por uma mente brilhante como eu nunca viria a ser, eu me peguei chorando a morte de um personagem, já haviam me alertado sobre aquele famoso livro, mas eu tive que tirar minhas próprias conclusões e a perda dele fora demais para o meu coração sensível e, antes que eu me desse conta, eu estava chorando de verdade. Meus pensamentos foram trazidos de volta para a realidade quando alguém sentou no banco ao meu lado no meio de um trânsito de alunos que ia e vinha graças a Deus me ignorando completamente, quando ergui o rosto lá estava ele: O estranho do blogo G.

– Ei... Tudo bem? – Ele quis saber e eu passei as mãos pelo rosto incapaz de responder. Ele baixou o olhar para o livro. – Ah, entendi... Ele morreu não é? Eu sinto muito...

Antes que eu pudesse esboçar qualquer reação ele me abraçou carinhosamente afagando minhas costas, o gesto me deixou completamente desnorteada e acabou me fazendo chorar ainda mais, coloquei para fora a dor que vinha reprimindo durante muito tempo, a confusão e a frustração que me dominavam, ele me apertou levemente e eu mal me importei de estar ali nos braços de um estranho. Quando me acalmei ele me olhou calmamente e sorriu passando a mão pelo meu rosto, ele tinha cabelos claros, não era loiro nem moreno, os fios eram claros em um tom mais puxado para o dourado, eram ondulados e caíam pela testa de maneira descontraída, os lábios eram finos e rosados, os olhos por trás dos óculos eram verdes puxados para o malva. O Estranho do bloco G era realmente bonito, mas sem exageros. Ele sorriu ainda me olhando e mostrou dentes alinhados e brancos:

– Está melhor? – Quis saber. Assenti. – Eu já li esse livro, não chorei, mas fiquei em choque quando ele morreu, eu também não esperava... Posso? – Ele falou pegando o livro das minhas mãos. – Tem algo que eu possa fazer para que se sinta melhor?

– Por favor, não zombe de mim... – Pedi. – Não consigo imaginar nada mais idiota que chorar por causa de alguém que nem existe. – Sussurrei me sentindo ridícula.

– Ei... Isso não é idiotice, mostra que você não apenas é humana, mas é sensível. E isso é muito bom se quer saber.

Dei um leve riso incrédulo. – Sabe, toda vez eu nunca pergunto o seu nome... Como você se chama?

Ele riu. – Daniel. É um prazer, Laura.

– Como sabe o meu nome? – Eu perguntei arregalando os olhos.

– Porque você escreveu bem aqui. – Ele sorriu apontando para a primeira página do livro.

– Ah... – Falei sem jeito, sentindo meu rosto queimar.

Não, agora não! Eu não acredito que estou corando na frente dele, que mico!

Um sorriso maroto brotou nos lábios de Daniel quando ele devolveu o meu livro e tocou na minha mão de propósito falando em seguida com uma voz baixinha e suave.

– Que bom que está mais tranquila, Laura. Você fica ainda mais bonita quando está coradinha desse jeito. Espero vê-la logo.

Ele colocou a mão no meu ombro e apertou-o levemente desaparecendo no corredor. Enquanto eu permaneci inerte, incapaz de entender o que havia acontecido e tomada por tantas sensações intensas que não fazia ideia do que de fato estava sentindo.

No segundo tempo tive Latim II, e lá estava ele novamente com uma camiseta preta de mangas curtas que realçava seus bíceps torneados e acentuava o tom bronzeado da sua pele, os óculos de armação transparente que davam a ele um ar intelectual e charmoso, os jeans claros de sempre, tênis e a mochila que parecia altamente pesada. Ele era uma visão para qualquer garota com olhos e um cérebro em funcionamento; prendi a respiração por um minuto e tentei procurar qualquer lugar para olhar, mas por alguma artimanha do meu cérebro, meus olhos não conseguiam desviar dele. Rafael sorriu e eu senti meu corpo desfalecer, mas por alguma razão aquele charme começou a competir com Daniel, eu passei naquele momento a comparar os dois e a forma como cada um me afetava. Só então eu percebi que pela primeira vez em muitos livros estava apaixonada pelo meu professor de Literatura e pelo belo estranho do bloco G, o que me restava saber era se isso era uma coisa boa, mas pelo menos agora eu sabia o que fazer com a minha personagem, ela tinha depois de semanas um lugar para onde ir.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a quem estiver lendo.