Ava & Os Bluebirds escrita por NB Munaro


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

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terça-feira, 4 de agosto de 2010, 14h43 da tarde.

Era uma tarde calma e como todas as outras daquele verão em Newport Beach, em que as praias estavam cheias e os protetores solares estavam em falta nos estoques. A ausência de ventos constantes – uma característica do local nas outras estações do ano – deixava tudo um pouco mais insuportável quando entre quatro paredes, o que, de fato, acontecia naquele instante com Angus e Theo, que tentavam de todas as formas passar aquele dia sem ceder aos prazeres de ter a areia quente entre os dedos.

E enquanto Theo, o ruivo de olhos verdes que apoiava os cotovelos nos joelhos magros em total impaciência, tentava amenizar aquela situação torturante com suas falas paralelas e completamente secas, Angus nem se dava ao trabalho de prestar atenção nele, mantendo-se atento ao movimento que se fazia logo à sua frente.

— Angus, cara, dá pra você prestar atenção no que eu tô falando? – Theo esbravejou de repente, cansando-se de ser o único ali com vontade de manter-se em casa. O que a falta de um ar-condicionado não faz?, ele pensou.

Gus bufou alto, sem deixar de desgrudar os olhos da sua janela. Theo teria que esperar.

— Espera um pouco – murmurou ele quase sem piscar – Tem alguma coisa acontecendo.

— Pensei que ninguém morasse aí – Theo apontou para a janela onde Angus se prendia, sentando-se à beira da cama baixa do amigo, posicionada bem ao meio do quarto de paredes brancas e piso revestido com o carpete marrom que tanto lhe causava alergia quando ele resolvia dormir ali.

— Até ontem, ninguém morava – respondeu o garoto de quinze anos ao ajoelhar-se no chão. Seu tamanho exagerado não o ajudava em situações como aquela, em que ele tentava enxergar o movimento da casa ao lado, que era separada da sua por apenas um trecho coberto pela grama sintética. Tinha uma boa visão da janela em frente à sua, e um vulto pequeno passava de um lado para o outro, contribuindo para que Gus se exaltasse a cada vez que aquela mancha resolvia desaparecer de sua vista. – Para de se mexer!

Um riso brotou nos lábios de Theo, e ele meneou com a cabeça.

— Já sei o que você vai fazer pelo resto da noite.

Gus ignorou o amigo, franzindo as sobrancelhas castanhas ao tentar enxergar além do que sua persiana e o vidro sujo da janela do seu mais novo vizinho deixavam. Não era de sua natureza bisbilhotar a vida das pessoas alheias, mas há mais ou menos um ano e meio que ninguém sequer entrava naquela casa, e todos da Riverside Avenue já estavam começando a ter certa convicção de que havia algum problema ali.

Bem, talvez não.

— Cale a boca – ele resmungou – Só quero saber quem é.

Theo se levantou da cama, indo ajoelhar ao lado do amigo, que parecia não saber o significado da palavra “privacidade” naquele momento. Forçou seus olhos verdes na direção do cubículo mal iluminado, que ficava a poucos metros dele e de Angus, tentando, sem nem ao menos querer, enxergar o que se passava ali.

— Se for uma tia velha, eu juro que te mato – murmurou, desemperrando a janela lentamente, e tentando não fazer barulho. Angus encarou Theo por alguns instantes, sem realmente ter algo para dizer, voltando a prestar atenção na casa vizinha.

Ficaram em silêncio por alguns instantes, e aquilo só fez Theo ficar ainda mais raivoso. O amigo de Angus não planejava ficar ali por muito tempo esperando pelo alguém que tiraria o melhor amigo de frente daquela janela. Queria ir para casa e comer a torta de abóbora que a mãe fizera para ele e para a irmã, o que seria bem mais divertido do que ficar espiando a chegada dos mais novos cidadãos de Newport Beach diante daquele buraco estreito.

— Cara, esquece – ele bateu a mão na borda da janela, levantando-se em um salto. – Quem quer que seja essa pessoa, ela não vai parar pra te dar um tchauzinho pela janela. Você não é bonito.

— Como se você fosse – replicou Angus, revirando os olhos negros involuntariamente. Qual era o problema em ter curiosidade pelo menos uma vez na vida? Ele era humano, oras, queria ter vizinhos tão legais quanto ele mesmo.

Ok, não tão legais.

— O Owen disse quando ia voltar da Costa Rica? – perguntou Theo, percebendo que não estaria livre tão cedo para voltar para casa. – Tô com saudade da bateria daquele retardado ecoando na minha rua, é como se tivesse faltando alguma coisa.

— Eu não tenho a mínima saudade da bateria dele nas minhas Ações de Graças – respondeu Gus em um riso sem humor, sabendo muito bem sobre o que estava falando. Ele e Owen Keller eram primos, e só Angus e o resto de ambas as famílias entendiam a vontade absurda de Owen de ser o mais novo Keith Moonda sua geração. Pena que ele não parecia estar tão perto de atingir seu objetivo, e para demonstrar a “evolução” de seu talento, tocava para a família em datas comemorativas, e Angus era obrigado a ouvir os pratos dourados sendo estremecidos pelas baquetas frenéticas do primo. – É uma merda, literalmente uma merda.

— Ele não é tão ruim assim – bufou o outro, colocando as mãos nos bolsos dos jeans e olhando para o teto branco do quarto – Até que manda um som legal.

— É, se você for surdo.

— Cala essa boca – Theo tirou os cabelos amorangados do rosto e passou-os para trás. Sua mãe vivia enchendo seus ouvidos de exclamações sobre o seu cabelo, que estava sempre bagunçado em um topete arrepiado, sempre o atrapalhando e tampando sua visão já muito falha, mas ele odiava a ideia de cortá-lo acima dos olhos, simplesmente não parecia certo. Seu cabelo ruivo era a sua identidade, sempre foi e nunca deixaria de ser. Os fios acobreados exclamavam Theodore Goodman por onde ele passava, e eles nem estavam tão compridos assim. Seu corte undercut ainda estava acima de suas bochechas, a Sra. Goodman que era uma mulher de exageros.

— Cacete!

Ele olhou na direção de Angus, que literalmente caía para fora da janela com tanta empolgação. Voltou a ajoelhar-se ao lado do amigo, lutando para ter uma fresta do que ele conseguia ver.

— O que foi? – piscou diversas vezes na direção da janela, antes de finalmente poder enxergar o que Angus também enxergava. Ele sabia que eram mechas de cabelo castanhas e claras, mas eram tão ordinárias que não entendeu o motivo de tanto alvoroço por parte de Gus, que mal conseguia respirar diante dele.

— Grande coisa – deu um sorriso amargurado.

— Shh – Angus exclamou em um sussurro –, ela vai nos ver!

Theo revirou os olhos, balançando a cabeça em negação e voltando a prestar atenção na cena à sua frente. Os cabelos amassados e brilhosos balançavam de um lado para o outro, como se a garota estivesse se encolhendo das cócegas provocadas por alguém, e provavelmente era isso o que ela fazia, pois ele e Angus conseguiam ouvir as gargalhadas doces ecoando por todos os lados.

— Ok, é uma garota – Theo falou impacientemente, erguendo as sobrancelhas – Posso ir embora agora?

Gus nem mesmo se lembrava de que Theo estava ali com ele. Estava tão curioso com a cena que se repetia diante de seus olhos que nem mesmo se importava se o amigo continuaria ali também observando o que estava acontecendo. O ruivo poderia sair a qualquer momento, ele só notaria três horas depois.

— Angus? – Theo insistiu – Pelo amor de Deus, cara... –

E ao voltar a olhar para a janela, paralisou.

Ela tinha o rosto oval e pálido, e seu jeito desajeitado era visto a metros de distância com a maneira que a garota se mantinha em pé diante de outra pessoa, espremendo seu próprio tronco com os braços finos. Os cabelos ondulados cobriam seus ombros magros, e a garota sorria abertamente por trás do vidro que dificultava a visão dos garotos diante de algo mais aparente do que o sorriso largo e tímido.

Seria alguém completamente normal, se não fosse pelos olhos.

Deus, aqueles olhos. Theo poderia se afogar neles de tão azuis e cristalinos. Brilhavam por trás da sujeira da janela como se fossem feitos de vidro. Ele nunca havia visto nada igual.

Ouviu Gus suspirar pesadamente ao seu lado, e engoliu em seco.

— Uma garota – repetiu, então.

— É – Angus sorriu torto – Uma garota.


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