Eu respirei fundo.

-Vim aqui te dar um aviso. –aquele sorriso irônico parecia estampado em sua face. –Saia de perto do meu irmão, Seth pode ser um babaca por te seguir, mas não quero que ninguém o magoe, principalmente você, Renesmee Cullen.

Estreitei os olhos e fiquei de pé, para encarar a mulher cara-a-cara. Sempre senti uma inimizade por Leah, mas desde aquela cena com ele, o sentimento havia se tornado uma repulsa inigualável, que eu jamais havia sentido por alguém. Dava nojo pensar nela.

-Ta ficando louca, Leah? Seu irmão não está fazendo nada que não queria. –rebati, com a voz áspera.

-Louca, eu? Você é quem perdeu a cabeça porque viu o Jacob comigo. Deixe de ser egoísta Renesmee. Está tratando meu irmão como um cachorrinho, pra ficar te dando atenção o tempo inteiro. Seth é uma pessoa boa e ainda por cima gosta de você, não sei como consegue, mas gosta, e por isso não consegue dizer não. Você vai destruir os sentimentos dele magoando-o dessa forma.

-Para sua informação, eu não implorei ao Seth que fizesse isso, ele escolheu que fosse assim, porque ao contrário de você, ele não guarda rancor das pessoas, e nem acha que elas estão abusando dele, como você está me acusando, Leah. Na verdade, Seth está muito feliz por ser meu namorado.

Ficamos alguns segundos nos encarando nos olhos. Não posso negar que o clima ali estava muito pior que pesado, na verdade, péssimo era até elogio. Os sentimentos horríveis que pairavam entre eu e Leah eram indescritíveis. Rivalidade é algo incontrolável.

-Sua mimada, atrevida! Eu vou estar na mente do Seth, e prometo que qualquer mínima dor que ele sinta, vou fazer você pagar em dobro!

-Não se preocupe com isso, Leah, você está me fazendo sofrer muito mais do que pode imaginar. Seu irmão é a melhor pessoa do mundo, a mais maravilhosa que eu já conheci, a última coisa que eu quero é magoá-lo. Eu seria hipócrita ao dizer que estou 100% feliz ao lado dele, pois o... J-Jacob –dizer aquele nome foi terrível. –me faz uma falta imensa. Não sei se você sabe, mas eu tive algo por ele, algo inexplicável, é como um imprinting dos lobisomens. É como se o sangue dele fosse perfeito para mim, foi exatamente isso que Edward sentiu pela Bella. E no final, se tudo der certo e a pessoa viver, o amor é incomparável.

-Rá! Um monstro como você não sabe o que é amor! Olha só o que você acabou de falar. -ela afinou a voz para me imitar. –“Se tudo der certo e a pessoa viver...” tem noção do que é isso Renesmee? Isso não é amor, isso é desejo de sangue. Vocês tratam as pessoas como alimento, jamais poderia nascer um amor sincero disso!

-Está insinuando que meu pai e minha mãe não se amam então? –apertei os olhos, enchendo o peito de ar, talvez num intuito de parecer pouco mais impotente, pois Leah era bem mais alta que eu. –Você presenciou o amor deles, garota! Como pode negar o que sentem um pelo outro?

-Tudo bem, Edward é uma exceção, mas olha só, sua mãe virou vampira no final. Não foi? Ela teve que se transformar para viver ao lado dele, pois tenho certeza que ela seria infeliz de envelhecer ao lado de alguém que seria jovem eternamente.

-Ela se tornou vampira por minha causa, sabe disso... –senti a culpa me invadir completamente. Leah estava mexendo comigo.

-Você quase matou sua própria mãe. Você é um monstro Renesmee, uma aberração!

-Aberração é você, mal amada! Você desconta nos outros a inveja que sente por Emily, por Sam ter tido a impressão por ela e não por você! Pudera, com esse humor horrível quem conseguiria conviver com você?

Minhas palavras foram cuspidas em meio a rosnados, tanto meus, quanto dela. Eu não consegui segurar a língua, ela havia me chamado da pior ofensa que eu poderia receber, pois eu realmente me sentia essa tal aberração.

-Rá! –ela debochou com uma gargalhada nervosa. –Pergunte ao Jake e veja se ele está pensando a mesma coisa.

Eu rosnei, e ela também. Aquilo estava fugindo de nosso controle, e em breve se tornaria muito pior do que qualquer uma de nós poderia imaginar.

-Pode dizer essas coisas, mas você sabe que Jacob vai voltar pra mim, ele está imprinted por mim! Nem você e nem ninguém podem fazer nada quanto a isso!

-Acredite, eu já fiz! Não me lembro dele ter procurado você depois que me beijou.

-Eu o mandei ficar longe!

Estávamos gritando sem perceber. Por sorte não havia viva alma na praia para ver aquela cena medíocre.

-E você acha mesmo que ele está longe porque você mandou? Acorde garota, o mundo não gira em torno de seu umbigo. Por mais que Seth e Jake deixassem você pensar isso, eles nunca foram tão seus quanto você acha que são! Nunca se perguntou por que Jacob não quer falar do passado? Por que ele evita tanto comentar sobre isso perto de você?

Eu congelei, não tinha resposta para essa frase. É obvio que eu me perguntava isso a cada instante da minha vida. Saber o passado era a coisa que eu mais queria desde que comecei a entender que havia algo escondido nessa linha do tempo.

-Ah. –mais uma vez aquele tom sarcástico me arrancou um rosnado. –Pelo visto sua mãe não foi mulher suficiente para contar o que aconteceu não foi, Renesmee?

-Não coloque minha mãe nessa história! Ela não tem nada a ver com nossa briga!

-Com a briga não, mas tem a ver com todo o resto.

Meu sangue ferveu e eu comecei a gritar ainda mais alto.

-Chega! Cale essa sua boca imunda Leah! Suma daqui e me deixe em paz de uma vez por todas, sua cobra, mal amada e invejosa!

-Sumir? Você que está invadindo meu território sua aberração! Monstro! Você não existe, Renesmee Cullen, não é nem vampira e nem humana! Ninguém nunca será capaz de sentir realmente algo sério por alguém como você! Aberração!

Meu corpo perdeu o controle, bom, não só o meu. Por mais que Leah fingisse não se sentir ofendida com minhas palavras, seu corpo tremulava, mostrando que ela não iria demorar muito para perder a cabeça.

Eu fui mais rápida. Voei na direção dela, literalmente com garras e dentes.

Burra. Que chance uma meia vampira teria contra uma transformista como ela? Leah tinha uns vinte centímetros a mais que eu, era mais forte, mais rápida, mais velha, e ela foi treinada para lutar desde que começara a virar um lobo. Além disso, estava acostumada com lutas. Enquanto eu, o que tinha contra?

Ainda assim, ataquei, e tive a vantagem da primeira mordida, cravei meus caninos pontiagudos no pescoço de um lobo gigantesco. O gosto era simplesmente horrível! Cuspi na mesma hora que o sangue brotou em meus lábios. Deixando que escorresse por seu pelo macio.

Agora ela partiu para cima de mim. Desviei, mas não por muito tempo, segundos depois a arcada dentária enorme estava cravada em meu ombro. Aquilo deixaria uma marca, tive certeza. Senti meu sangue quente escorrer pelo corpo.

A boca dela era cerca de quatro vezes maior que a minha. A mordida era muito mais letal para mim, do que a minha para ela. Percebi que ia perder ali, no instante que senti a dor em meu ombro esquerdo.

Deus, onde eu fui me meter?

Era tarde demais para lamentar.

Corremos na direção uma da outra. Deixando vestígios da luta pelo chão, roupas, pelos e sangue... Muito sangue. O encontrão foi tão forte que nossos corpos pareceram passar por dentro uma da outra. Caindo na direção oposta de onde viemos. Parei com joelhos e a mão direita no chão, repuxando os lábios para mostrar os dentes. Ela fez o mesmo, com uma espécie de latido de puro ódio.

Nos atacamos outra vez.

Cravei as unhas em suas costas, rasgando a pele que havia ali, e os dentes em seu ombro, com a maior força que poderia morder. Não era tão fácil como lutar contra animais selvagens comuns. Lutar com um lobisomem cheio de raiva era simplesmente impossível, doloroso, e terrível.

Eu já estava ofegante, e Leah não mostrava um pingo de cansaço. Mais um ataque dela, e eu estaria perdida. Infelizmente minha velocidade havia sido reduzida por conta da dor. Tentei desviar de outra bocada, e ela simplesmente afundou os dentes no mesmo lugar de antes.

A dor era lancinante. Parecia que meu coração estava pulsando no lugar. Soltei um grito horrível, parecia de alguém morrendo... Não posso negar que isso aconteceria em breve, caso continuássemos essa luta sem sentido.

Ouvi um ladrar estranho.

Uma risada vindo de Leah. Meu sangue ferveu de novo, eu não pararia até que estivesse morta. Acho que esta reação é por culpa da adrenalina. Eu simplesmente voei para cima dela, me agarrando em suas costas, com os braços em torno do pescoço largo.

Focinho, como os cães, ali deve ser o ponto fraco!

Mordi o nariz de Leah com tanta força que ela grunhiu. Um grito fino de dor. Percebi que ela ficou tonta. Mas eu também estava. Saltei de suas costas, para longe, com a respiração totalmente irregular, o cansaço estava me tomando.

Um vento gelado bateu contra meu corpo. Eu estava ensopada de sangue. Minha visão começava a vacilar, escurecendo e voltando, conforme eu piscava com força. Ela se manteve longe por um tempo, mas percebeu que eu estava caindo e aproveitou para atacar.

Me encolhi quando o enorme lobo corria na minha direção, saltando sobre meu corpo pálido e quente. Seria o fim? Eu morreria dessa forma ridícula? Numa luta sem sentido com a namorada do homem que eu amava, e irmã do meu namorado?

Que mundo injusto.

Os pensamentos transbordaram minha mente em menos de meio segundo, ela ainda corria na minha direção quando longe, bem longe, um lobo uivou.

Caí de joelhos, de frente para minha assassina, esperando o ataque que arrancaria minha cabeça com uma bocada. Apenas fechei os olhos, para não ver a cena e carregá-la comigo quando me tornasse um fantasma.

Era incrível a velocidade que eu conseguia pensar quando estava prestes a perder a vida. Morte é uma palavra muito forte, no entanto, morrer era simples, fácil. Talvez eu sentisse um pouco de dor antes, mas em breve tudo aquilo sumiria.

Pensei em Jacob, o quanto eu o amava, e em Seth também. Por mais que os ferimentos latejassem constantemente, nenhuma dor jamais poderia superar a de perder o amor da minha vida, o meu “sangue perfeito”. Pelo menos, quem estava morrendo era eu. Talvez as pessoas sofressem um pouco, mas todos superariam, afinal. Jake tinha Leah, Mamãe tinha Edward, e toda a família tinha alguém com quem contar.

Abri um pequeno sorriso quando senti um cheiro inconfundível. Amadeirado e almiscarado. Meu peito se encheu de calor. Eu nasci pensando nele, e morreria pensando nele, a pessoa que eu mais amei em toda a minha curta vida. A sensação era boa, de deixar este mundo com aquele cheiro gostoso em minhas narinas...

Ouvi um barulho, pareciam duas pedras se chocando, rosnados, mordidas, dentes trincando...

Abri os olhos.

Um enorme lobo castanho-avermelhado estava parando de forma imponente, enquanto o lobo fêmea, estava deitado a seus pés, imóvel, como um bichinho de estimação que se submetera ao dono.

Tive que piscar umas quatro vezes até entender a cena direito. Foi aí que meu coração disparou, tive o impulso de pressioná-lo, de tanta força que batia contra meu peito. Chegava a doer.

Era ele.

Era o meu Jacob, vindo me salvar mais uma vez.

Todo o incômodo, e a dor gerada pela sua ausência estava se esvaecendo. Escorrendo por meu corpo como o sangue que pingava no chão, dando lugar a uma tranqüilidade. Meu interior estava cheio de paz. Eu estava voltando a mim.

Continuei naquela posição por mais algum tempo, de joelhos, com o corpo parado, parecendo uma estátua. Sem respirar, sem piscar. Apenas parada, observando cada milímetro que o pelo dele mexia com o vento. Não queria perder nenhum momento.

Algo me distraiu, barulho de patas batendo contra o chão e levantando a terra conforme corria. Olhei para trás e vi um lobo cor de areia vindo em minha direção. Ele parou ao meu lado, me cutucando com o focinho, emitindo um som engraçado e fino, parecia um choro... Parecia estar me chamado.

Meus lábios se esticaram num pequeno sorriso. Meus olhos desviaram dele, procurando o lobo ruivo que reconfortava minhas dores emoções, ainda com aquele risinho bobo. O outro chorou outra vez ao meu lado. Desculpas? Toquei seu rosto levemente, com o braço que ainda funcionava, pois o esquerdo estava completamente dormente, frio, e ainda mais pálido do que o normal.

Vi outro lobo, agora um negro e tão grande quanto o ruivo.

O ruivo. Meus olhos correram por sua busca, até que o vi se aproximar. Sorri mais uma vez, esticando os braços, sim, os dois. Forcei o outro a ponto dele cair sozinho por insistência. Tocando o pelo macio enquanto aqueles enormes olhos negros me fitavam com tristeza.

Tudo ficou escuro outra vez.

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