Pretty Hurts escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 1
Pretty Hurts


Notas iniciais do capítulo

Boa noite, leitores!
Sei que muitos estão querendo me matar por não postar "Signal Fire" e nem "Everlasting"...
Mas, novamente, estou com problemas com minha inspiração :/

Porém, como oferta de paz, trago essa one-shot motivada por uma música da Queen B que, para mim, em muito está relacionada com a Quinn...

Espero que gostem, boa leitura!



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Mama said: “You’re pretty girl what’s in your head doesn’t matter.”

Brush your hair, fix your teeth.

What you wear is all that matters.

Não era a primeira vez que chegava chorando em casa. As razões que levaram as lágrimas caírem de seus olhos eram conhecidas, eram as mesmas, afinal. Lucy Quinn Fabray não era a menina mais bonita, fisicamente, da escola... Mas ela tinha doze anos de idade.

Era muito jovem para que a “ditadura da beleza” começasse a torturá-la.

Mas os xingamentos, principalmente o “Lucy Caboosey”, que não era somente usado na escola como, também, era secretamente usado em casa pela sua linda e loira irmã mais velha, machucavam-na. Porque ela ainda era muito jovem para ser capaz de entender.

Afinal, por que um rosto bonito era mais atrativo do que um belo e sincero sorriso? Por que alguns quilos acima da média deveriam ser abolidos se a deixavam com um aspecto mais inocente e gentil? Qual era a diferença que ela possuía, em relação às outras crianças, que impediam que elas se aproximassem e, até mesmo, que a impedia de possuir amigos?

Lucy Quinn Fabray era uma menina perdida, perdida em julgamentos que começavam em casa e eram sacramentados com o desprezo que sentia na escola. Ela realmente não entendia. Ela preferia não entender aquele mundo.

– Por que ela está chorando, Frannie?!

A voz grossa e imperiosa de Russell Fabray ecoou no hall de entrada da Mansão dos Fabray, assim que ele recebeu Francine Fabray em seus braços e olhou de lado para a pequena figura de Lucy que soluçava enquanto pendurava a pequena mochila de estrelas amarelas nos ganchos do armário de casacos. Francine riu nos braços do pai quando ele fez cócegas em sua barriga.

Lucy soluçou mais uma vez, olhando com certa inveja para a interação que sua irmã tinha com seu pai. Ela jamais fora tratada daquela forma.

Judy Fabray veio de dentro da cozinha e Quinn pode, finalmente, parar de soluçar. A pequena correu até a mãe e abraçou os joelhos da mulher, escondendo o rosto neles. Ali, naquele pequeno e seguro abrigo, ela conseguia até se achar bonita. A mãe se ajoelhou, ficando na mesma altura da filha e segurou o rosto gorducho e cheio de espinhas, olhando-a nos olhos verdes e lindos da filha, Judy perguntou:

– Lhe xingaram de novo, Quinnie?

Lucy não conseguiu responder, mas o cair de sua expressão e as lágrimas que ela deixou jorrarem de seus olhos falaram por si só. Judy abraçou a filha apertado, ela sabia que a filha não era bonita e queria poder mudar tudo, até mesmo a aparência dela. Russell bufou, impaciente e bronqueou:

– Ela tem que saber se defender.

– Ela só consegue chorar, papai. Por isso que as pessoas conseguem atingi-la. Ela demonstra suas fraquezas e usam isso contra ela. - Francine respondeu com desprezo antes de subir as escadas em direção ao próprio quarto. Russell observou o caminhar da filha mais velha com orgulho, antes de virar-se, decepcionado, para a caçula.

Judy afastou Lucy de si com um empurrão de leve. Observou o rosto gorducho cheio de espinhas, os cabelos castanhos sem vida e o corpo totalmente desproporcional... Aquilo lhe doeu os olhos, ela sabia que não deveria agir daquela forma, mas ficou em pé novamente e caminhou para junto do marido. Lucy se encolheu ainda mais.

A pequena se sentiu desprotegida. Era a primeira vez que a sua mãe a abandonava.

Judy continuou a observar a filha... As roupas totalmente fora do contexto contrastavam fortemente com o uniforme de cheerio que a filha mais velha usava, as duas nem mesmo pareciam irmãs. Ela se perguntava quando fora que a filha se tornou aquilo ali. Um pouco cansada e muito decepcionada, disse:

– Você é uma menina bonita, Quinn. Talvez, se mudasse as roupas, as pessoas parassem de mexer com você.

– Nós dois sabemos que ela precisa mudar muito mais do que as roupas para que as pessoas a respeitem. - Russell não media as palavras para falar com a filha, Lucy olhou ofendida para ele. Mais lágrimas brotaram em seus olhos. - E não chore, as pessoas não tem culpa de você ser o que é.

Um silêncio pesado e opressor tomou o hall de entrada. Lucy olhou chocada para os pais, tentando entender o que aqueles julgamentos mudavam dentro dela. Ela estava feliz com o que era e queria que fossem feliz junto dela. Seus pais pareciam cansados e, pior... Pareciam decepcionados.

Lucy era, literalmente, um peso na vida dos dois. Demorou certo tempo para que ela compreendesse, mas agora ela entendia. Os dois jamais se orgulhariam dela se ela ficasse daquela forma.

Gorda, cheia de espinhas, estranha... Feia.

Foi, naquele momento, sob os olhares decepcionados dos pais que Lucy Quinn Fabray deixou de se amar.

Just another stage.

Pageant the pain away.

This time, I’m gonna take the crown without falling down.

Depois daquele dia, Lucy desapareceu da escola. Pediu aos pais que a enviassem para um acampamento para reeducação alimentar e passou os próximos dois anos lá, estudando e tentando mudar o que todos achavam estar errado nela.

Os primeiros dias foram dolorosos. Lucy não tinha amigos e nem mesmo os queria, por mais que os outros jovens, tão gordos e tão complexados quanto ela, se aproximassem... Ela não estava ali porque queria e sim, porque precisava.

Tinha que emagrecer, ela tinha que ter o corpo de Francine... Tinha que ser capaz de ser uma cheerleader, um dia.

Parou de comer besteiras, exercitava-se até a exaustão e seguia a dieta imposta pelos nutricionistas como se fosse uma bíblia. Estava disposta a emagrecer e perdeu muitos quilos conforme seguia em seu objetivo, suas roupas começavam a afrouxar, até mesmo no espelho, seu rosto estava mais fundo e angulado...

Porém, em determinado momento de sua estadia no acampamento, Lucy parou de emagrecer. Melhor, ela acreditava que parara de emagrecer.

Ainda era muito nova para entender que seu corpo estava acostumando-se com a rotina de exercícios e com a nova dieta e que, a partir daquele momento, as perdas seriam mais gradativas e mais lentas... Também, não tinha ninguém que pudesse lhe explicar isso.

Não que ela fosse entender, não que ela pudesse entender... Lucy estava obcecada, estava doente.

Corria na esteira todos os dias até a exaustão e não mais se alimentava. Várias foram suas crises de hipoglicemia pela falta de alimentação, Lucy machucou os tornozelos várias vezes. E seus pais não atenderam a nenhum dos chamados que o diretor do acampamento fez diante do descontrole da adolescente.

Ninguém conseguia entendê-la. Lucy realmente não se importou, não era a primeira vez que não a compreendiam.

– Todos estão comentando a sua força de vontade, Fabray.

Lucy quase tropeçou em seus próprios pés quando escutou a voz de uma garota interromper sua corrida na esteira. Ela era magra, tinha um corpo muito bonito e um sorriso ainda mais belo, eram um daqueles sorrisos que chegavam aos olhos. Lucy não estava acostumada que sorrissem para ela daquela forma, também não estava acostumada que olhassem para ela com admiração. Era tudo muito estranho.

Estava acostumada com o desprezo, a decepção e a humilhação. Só conhecia aquele lado das pessoas. Só conhecia o julgamento e a imposição, mas não conhecia o interesse e nem a curiosidade. Por isso, ignorou o comentário da garota e apanhou a toalha, enxugando o rosto enquanto caminhava para longe.

Lucy escutou os passos apressados da garota que tentava acompanhá-la. Quando, enfim, as duas caminhavam lado a lado e Lucy parecia cansada demais para tentar fugir da outra, enxugou o suor do rosto com um movimento brusco e parou no meio do caminho entre a academia e seu alojamento. Encarou a garota que lhe devolveu o olhar desafiador. Suspirou e, arqueando a sobrancelha, perguntou:

– O que raios você quer aqui, garota? Você nem precisaria estar aqui.

– Estou aqui por causa de pessoas como você, Fabray. - A garota respondeu com um sorriso felino e Lucy olhou confusa para ela. Aquela garota não era nem mesmo gorda para estar ali. - Não está conseguindo mais emagrecer como antes, não é? Eu tenho a solução para isso.

Lucy tentou parecer desinteressada, mas não conseguiu. Suas expressões a entregaram. Seus olhos brilharam diante da possibilidade de perder mais alguns quilos e ela aprumou a postura para escutar melhor.

Foi, naquele momento, que Lucy foi apresentada às anfetaminas.

Um comprimido por dia e, magicamente, os quilos desapareciam. Lucy estava felicíssima com os resultados de suas pílulas mágicas. Ignorava completamente os efeitos adversos do que usava e nem percebia que não era somente seu corpo que estava mudando.

Com o passar dos dias, percebeu que um comprimido não era mais o suficiente. Aumentou a dose por conta própria. Dois comprimidos foram suficientes para que as mudanças logo se tornassem claras a todos.

Os quilos desapareceram. Porém, outras coisas apareceram.

Pensamentos obscuros reforçaram a já negativa ideia que Lucy tinha em relação ao próprio corpo. A obsessão aumentou proporcionalmente a sua perda de apetite. Os defeitos em seu corpo que já estava perfeito pareciam mais avassaladores do que eram quando ela era gorda.

Lucy, aos poucos, foi percebendo que não adiantava nada emagrecer. Parecia que os olhares sobre ela eram ainda mais decepcionados, quando, na verdade, todos estavam preocupados com seu emagrecimento rápido e com a sua solidão. A paranóia a fazia enxergar todos de forma distorcida. Em uma das poucas vezes em que seus pais foram visitá-la a pedido do diretor, Judy lançou um olhar preocupado a ela e tudo que Lucy enxergou foi à reprovação.

– Tem alguma coisa errada com ela. - Judy comentou preocupada com o marido enquanto os dois observavam Lucy olhar para o nada. Os três estavam no quarto da filha e tentavam conversar com ela, mas ela só os afastava com silêncios e olhares chorosos. Russell bufou, impaciente e comentou:

– Ela que teve a ideia de vir para cá, não vamos tirá-la daqui enquanto ela não quiser.

– Eu sou mãe, Russell. Eu consigo enxergar quando há algo errado com as minhas filhas. - Judy respondeu amargurada, colocando-se em pé e caminhando até a filha que apenas se encolheu quando a sentiu perto. Diante de mais uma negativa, Judy passou a mexer nas coisas da filha em busca de respostas e as encontrou escondidas na gaveta da escrivaninha próxima à janela.

Uma cartela de comprimidos, em muito amassada, usada até a metade.

Judy não precisou ler a bula para descobrir do que se tratava. Lucy finalmente saiu de seu torpor, no mesmo instante em que Russell se colocava em pé e apanhava a cartela das mãos da mulher para, finalmente, virar-se em direção a filha e acertá-la com um tapa no rosto, enquanto esbravejava:

– Agora, além de tudo, é uma viciada?!

– Nós podemos reverter isso, Russell. - Judy sugeriu friamente, olhando para a filha com decepção. Lucy não entendera da onde viera aquele olhar, estava magra, não era o que os dois queriam? Ela não entendia porque os dois discutiam e falavam tão mal sobre ela se fizeram tudo que eles queriam... - Vamos tirá-la daqui e dar a ela as cirurgias, ela vai superar.

Russell Fabray acenou negativamente com a cabeça, olhando para a filha. Judy suspirou aliviada e observou Lucy colocar-se em pé, ebriamente, antes de voltar a mesma posição de torpor que se encontrara antes.

Na cabeça de Lucy, nada mais fazia sentido. Somente aquela ânsia para que, finalmente, todos a olhassem de forma diferente.

Lucy nem sabia mais o que buscava. Só sabia que deveria alcançar o que a esperava, de alguma forma.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Perfection is the disease of the nation.

A última coisa que Lucy se lembrara antes de entrar na cirurgia era de que mostrara uma foto de Frannie, agora com dezoito anos e mais bela do que nunca, e dissera que queria se parecer com ela. Cabelos loiros, corpo magro, olhos claros e ausência total de acne.

Logo, a anestesia geral lhe fora aplicada e agora, ela encontrava-se adormecida em cima de uma maca em uma clínica de cirurgia plástica.

Lucy não sentiu absolutamente nada, mas o bisturi cortava muito mais do que apenas a sua pele enquanto percorria as linhas pontilhadas previamente traçadas em seu corpo que denotavam o que, aparentemente, estava errado. Os cortes eram mais profundos e afetavam a sua alma.

Conforme mexiam em seu corpo, removiam aquilo que não era o “certo” e mudavam seu nariz de lugar... Algo dentro dela era mexido. Aquelas mudanças sacramentariam para sempre que Lucy Quinn Fabray seria escrava da própria beleza. Não que fosse diferente antes...

Mas, agora, Lucy era bonita e seria a sua obrigação manter-se daquela forma. Teria que pagar um preço muito alto para manter-se no topo.

E não precisou acordar da anestesia e nem sentir dor dos cortes para compreender o que sempre estivera a sua frente, mas ela nunca entendera.

A beleza dói.

Era uma máxima, era real. E havia muito mais do que dores físicas envolvidas. Lucy não deixara ninguém ver e escutar seu choro na calada da noite...

Mas ela não se reconhecia mais no espelho.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Tryna fixa something but you can’t fix what you can’t see.

It’s the soul who needs a surgery.

Com uma mala em mãos, o táxi deixou Lucy em frente a Mansão Fabray, a qual não via há exatos dois anos. Não conseguiu reconhecer a casa, não porque alguma coisa mudara no jardim, mas sim porque jamais reparara na construção e porque não tinha muito que lembrar dali.

Aliás, não queria lembrar o que se passara ali, naquela casa. Muito menos pelo que passara nos anos anteriores. Decidira que, a partir do momento em que fora colocada em uma maca para consertar os defeitos que fora obrigada a possuir, era uma vida nova.

Aquela era a forma dela de lidar com tudo o que lhe acontecera. Lucy distorcera a realidade apenas para parecer que nascera a partir do momento em que o primeiro bisturi cortara a sua pele. Antes de suas cirurgias, era não era nada. Não era a mesma pessoa, era apenas um espectro do que agora estava destinada a ser.

E não pouparia esforços para conquistar o que estava destinado a ser dela.

Decidida, atravessou o jardim e tocou a campainha da casa. Quem lhe atendeu foi a sua irmã Francine que demorou alguns minutos para reconhecê-la. Ela, que sempre jogara em sua cara quão feia era antes, era a primeira a provar um pouco da sua nova eu. Lucy lhe deu um sorriso falso que denotava toda a sua satisfação diante da expressão surpresa da irmã.

No minuto seguinte, Russell caminhou através do hall e paralisou chocado ao ver a filha, ou melhor, sua nova filha parada na soleira da porta. Lucy só conseguia sentir seu interior explodir diante daqueles olhares de choque, os quais ela sabia que logo se transformariam em admiração. Em seguida, Judy saiu da porta da cozinha e olhou para a filha, com um sorriso nos olhos ao dizer orgulhosa:

– Você está linda, Lucy.

– Não me chame de “Lucy”. - A garota respondera com um olhar ameaçador e um tom de voz frio. Os três Fabrays olharam confusos para ela. - “Lucy” era o nome daquela gordinha ridícula que morreu há dois anos. Eu sou Quinn agora e quero que vocês me chamem dessa forma agora.

Ninguém a questionou, mas todos permaneceram chocados e Quinn não teve os olhares orgulhosos que esperava receber. Percebeu que, naquele instante, seus pais e sua irmã pareciam amedrontados pelas suas palavras.

Quinn percebeu, naquele momento, que o medo era tão ou mais atrativo que a adoração. Sua beleza era ainda mais poderosa se todos a temessem.

Blonder hair, flat chest.

TV says: bigger is better.

South beach, sugar free...

Vogue says: thinner is better.

A figura alta e esbelta que caminhava pelos corredores do McKinley atraiu olhares a cada passada. Era a primeira vez que a viam como Head Cheerio. A notícia correra a escola nos últimos dias e a maioria dos alunos do primeiro ano estava com inveja da nova capitã das líderes de torcida.

Ninguém sabia muito bem o que acontecera no teste, tudo era mantido em sigilo pela Coach Sylvester. Mas rolava a informação de que Quinn Fabray arrancara elogios da treinadora mais exigente da escola. E todos acreditavam nisso, Quinn Fabray chegara na cidade a menos de um ano e já surpreendera todos com a confiança e a sua beleza.

Silenciosamente, a maioria das garotas do colégio parecia invejá-la. Algumas até mesmo pareciam querer matá-la com as próprias mãos... Quinn somente sorria para todas elas. Porque o seu sorriso era a sua melhor arma, assim como seu próprio corpo. Aprendera que essas duas coisas, aliadas a sua inteligência, poderiam fazê-la conseguir qualquer que fosse seu desejo sem que sujasse as mãos.

Antes de ser capitã das Cheerios, os garotos já jogavam-se aos seus pés para que pudessem atender aos seus pedidos. Quinn tinha um exército de vassalos a sua disposição e, agora, como capitã, tinha toda a escola a sua disposição.

Seu reinado apenas começara e ela já queria fazer novas vítimas. Os banhos de raspadinha nos losers do colégio já eram tradição, mas jamais foram coordenados por uma caloura e Quinn queria marcar época.

Não precisou pensar muito ao escolher quem seria a sua vítima.

Rachel Berry a incomodava muito. Não havia motivo claro, apenas a autoconfiança da garota a tirava do sério. Rachel também era caloura, estava na base da pirâmide do colégio apenas por pertencer ao fracassado Glee Club e, mesmo assim, não se deixava abalar por sua presença.

Rachel não tinha medo de Quinn.

Portanto, a sua primeira ação como Ice Queen foi coordenar um ataque. Encheu um copo de raspadinha de uva e interceptou Rachel no meio da manhã.

Caminhou rapidamente pelo corredor, aproximando-se de Rachel que recolhia seus materiais no chão, algum jogador orientado por ela esbarrara em Rachel, dando-lhe tempo para se aproximar. Conforme caminhava, foi como se tudo parasse e como se Quinn escutasse tudo de forma mais clara que antes. Percebeu que conforme caminhava, todos se calavam e a observavam. Perto o bastante de Rachel, sorriu maldosamente quando os olhos castanhos a encontraram e disparou:

– Volte para o útero, ManHands!

Tão rápido quanto falara, Quinn jogou a raspadinha em Rachel. Observou quando o gelado líquido roxo manchou as roupas de Rachel Berry. Também observou o sorriso inabalável desaparecer dos lábios da pequena morena.

Quinn sentiu falta do sorriso dela, também sentiu falta de toda aquela aura otimista que a rodeava porque tudo aquilo desaparecera por razão de meras palavras e uma pequena e malvada atitude. Sabia que acabara de destruir algo dentro de Rachel, também sabia que a marcara de uma forma que ela jamais esqueceria.

Algo dentro de Quinn remexeu-se com desgosto e ela teve ânsia de vomitar. Quinn enxergou a si mesma no lugar de Rachel.

Passou por ela rapidamente e virou no corredor seguinte que se encontrava vazio. Olhou para trás, verificando se estava sozinha e respirou fundo, encostando-se na parede.

Era o primeiro insulto que disparava. Era a primeira vez que era o agressor e não a vítima.

Os olhos castanhos, atordoados e confusos, de Rachel chegaram a sua mente. Sabia que ela não remoeria as palavras naquele exato momento e sim, quando chegasse em sua própria casa e ficasse sozinha. Porque era daquela forma que sempre acontecia quando a chamavam de “Lucy Caboosey”.

Quinn conhecia aquela dor e justamente por conhecê-la, sufocou as lágrimas e retomou suas passadas pelo corredor.

Não queria ser motivo de chacota novamente e, motivada por essa razão, resolveu que não daria mais voz aos arrependimentos dentro de si.

Just another stage.

Pageant the pain away.

This time, I’m gonna take the crown without falling down.

“Você só pode estar gorda para conseguir cair do alto dessa pirâmide, Fabray!”

Mesmo naquele lugar, Quinn conseguia lembrar perfeitamente da voz de Coach Sylvester gritando ao megafone. Realmente percebera que ganhara um pouco de peso nos últimos dias, mas acreditava que fosse massa muscular e não gordura.

Bem, se fosse massa muscular, ela não teria caído da forma que caíra do alto da nova pirâmide que usariam no próximo campeonato nacional.

Porém, tinha muito em mente... Seu relacionamento com Finn Hudson estava estranho, aliás, o quaterback estava esquisito nas últimas semanas e Quinn tinha quase certeza que a culpa daquilo tudo era de Rachel Berry. Aquela garota estava perseguindo seu namorado nos últimos dias... Quinn não estava preocupada em perdê-lo, afinal, quem trocaria Quinn Fabray por Rachel (nariguda) Berry?

Observando-se no espelho do vestiário, Quinn puxou um pouco de pele na região da barriga... Talvez, aumentara de peso mesmo. E talvez, Finn tivesse percebido e, por isso, estava dando bola para Rachel Berry.

A queda e o desinteresse de Finn eram culpa dela, afinal.

– Você não está gorda, hottie.

Quinn sobressaltou-se ao escutar a voz masculina atrás de si. Virou-se rapidamente, apanhando uma toalha no mesmo ato e cobrindo-se, estava com a saia das Cheerios (que não cobriam muita coisa) e um top esportivo e, pelo que sabia, havia trancado a porta do vestiário quando a última cheerleader saiu.

Noah Puckerman a observava com um sorriso malicioso nos lábios, escorado em um dos armários, de braços cruzados. O rapaz era conhecido pela fama de conquistador no colégio e não poupava elogios quando se encontrava com Quinn, mesmo sendo o melhor amigo do namorado da cheerio. Todas queriam ficar com Noah, menos Quinn, aliás, ela sequer queria ficar com o próprio namorado.

Vermelha e escondendo-se atrás da toalha, Quinn endireitou a postura e, autoritária, perguntou:

– Como entrou aqui, Puckerman?

– Woaah, para que tanta agressividade, Q? - Noah perguntou brincalhão, dando um passo em direção a Quinn que se afastara na mesma proporção, o rapaz abriu uma careta. - Realmente deveriam reforçar as fechaduras do McKinley High, elas são muito fáceis de abrir.

Quinn suspirou aliviada quando entendeu que realmente trancara a porta. Era apenas Noah Puckerman sendo desagradável, como sempre. A loira olhou por cima do ombro e o espelho refletiu suas costas, ela achou que tinha ganhado um pouco de peso ali atrás também. Quinn pensou que Noah fosse embora, mas ele não foi. Contrariada, a cheerio perguntou:

– E por que diabos você arrombou a porta do vestiário feminino?

– Pergunta idiota, Q. - Noah comentou brincalhão e se aproximou mais do que um passo, passou a circundá-la enquanto a avaliava. Quinn se sentiu estranhamente envergonhada e, ao mesmo tempo, lisonjeada. O olhar que Noah tinha sobre si era diferente de todas as vezes em que Finn a observara. - Mas se quer a resposta, invadi o vestiário apenas para lhe admirar. Você é muito mais bonita do que pensa.

Quinn fixou seus olhos em Noah que não se deixou amedrontar-se por ela, ele era diferente da maioria dos garotos do colégio. Por mais que Quinn soubesse que era desejada, nenhum deles fora capaz de dizer abertamente que ela era bonita e que a queriam. Algo em Finn os impedia de fazer isso.

Quinn abriu um sorriso sedutor que surpreendeu Puckerman. Ela deixou a toalha cair e se aproximou do rapaz, os dois corpos se tocaram e Noah foi mais atrevido ao segurar-lhe a cintura e puxá-la para seu colo, enquanto sentava-se em um dos compridos bancos de madeira do vestiário. Quinn sorriu quando sentiu o volume nas calças dele e, sedutora, pediu:

– Por favor, repita isso.

– Você é muito mais bonita do que pensa. - Noah respondeu hipnotizado pela boca de Quinn que continuou a sorrir, a cheerio agitou a cabeça negativamente e arranhou o bíceps do rapaz, com um olhar selvagem. Quinn aproximou-se do pescoço de Noah e o mordeu, Noah apertou-lhe a cintura e a mão dele desceu mais um pouco, em direção a sua bunda. Quinn suspirou e disse-lhe ao pé do ouvido:

– Não isso, Puckerman. Pense um pouco, você é inteligente.

– Você não está gorda, Q. Você é quente, muito quente! - Noah respondeu excitado, apertando a mão que envolvia a carne de Quinn e puxando-a para um beijo descontrolado.

Quinn não soube aonde aquilo a levaria até que aconteceu. Muito menos se importou quando terminou. Nem entendeu. Apenas estava feliz consigo mesma. Puckerman era capaz de trair o amigo porque a amava e aquilo bastava.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Perfection is the disease of the nation.

No começo, Quinn se desesperou e procurou odiar aquela “coisinha” que crescia dentro de si. Aquilo estava desfigurando seu corpo e levando tudo o que realmente importava para ela.

Pelo menos, tudo que ela achava importar.

As coisas mudaram quando ela se viu sem casa e sem Cheerios, sem família e sem amigos, somente com o Glee Club a apoiá-la. Aquela “coisinha” era a sua filha e estava, aos poucos, mostrando um lado da história que Quinn jamais conhecera.

Finn estava com ela porque confiava em sua palavra e não pela popularidade. O Glee a acolhera mesmo quando Santana e Brittany a deixavam de lado para permanecer nas Cheerios. Quinn não conhecia aquele sentimento, mas julgava que tudo fosse amizade.

Porém, agora, Rachel Berry vinha e destruía a sua vida novamente.

Finn descobrira que não era o pai da criança e saíra da sala do Glee, chutando cadeiras e esmurrando Puck. Quinn ficara sozinha enquanto todos no coral olhavam para ela com pena e... Nojo.

Quinn estava escondida naquela sala enquanto os olhares de todos os membros do Glee passavam e repetiam-se em sua mente como se fossem cenas de um filme com defeito. Aquela sensação lhe era familiar, sentia-se da mesma forma toda vez que era ofendida e que chegava em casa para amargar suas lágrimas e deixar que seus demônios a devorassem.

Quinn afagou a barriga com carinho e uma lágrima caiu de seus olhos, manchando o tecido azul de sua roupa. A criaturinha dentro de si mexeu-se satisfeita ao sentir o toque carinhoso da mãe e arrancou um sorriso tristonho de Quinn que suspirou. Não doía tanto, afinal. Pela primeira vez em sua vida, não estava sozinha.

Aquela coisinha que se agitava dentro de si parecia decidida em alegrá-la porque ela jamais sentira aqueles chutes e todos aqueles movimentos. Quinn pensou com emoção que aquele bebê estava dando-lhe tudo agora porque, naquele momento, ela não tinha nada.

Seu sentimento por aquela criança cresceu ainda mais.

No silêncio daquela sala escura, Quinn percebeu que amava aquele bebê. Amava-o mais do que a si mesma porque ele, mesmo diante de todas as circunstâncias, ele crescia perfeito dentro de si. Quinn sabia que ele seria lindo, podia fechar os olhos e enxergá-lo sorrir sem dentes, com os seus olhos verdes (que era a única coisa que amava em si) enquanto tinha cabelos castanhos arrepiados e, quem sabe, em um moicano como o pai...

Quinn riu para, depois, irromper em mais um acesso de lágrimas. Puck jamais seria um bom pai, por mais que estivesse ajudando-a agora, a perda da amizade de Finn o abalara. Realmente estava sozinha naquela situação, fruto dos erros em suas próprias escolhas. Quinn não queria abrir mão daquela criança agora, mas parecia inevitável.

As luzes se acenderam e Quinn se virou abruptamente em direção ao interruptor da sala. Rachel Berry estava olhando para ela em um misto de choque e medo. Quinn bufou, impaciente e abaixou a cabeça. A onda de fúria que ela esperava sentir quando visse Rachel de novo, nunca chegou. Não odiava a morena, mesmo depois de tudo que acabara de acontecer.

Rachel pigarreou e Quinn pode sentir o desconforto dela conforme caminhava. A morena sentou-se ao seu lado e Quinn sentiu o cheiro de baunilha que vinha dela, o bebê em sua barriga agitou-se novamente e a ex-cheerio colocou a mão sobre ele, como se pudesse bronqueá-lo por ficar tão feliz diante da presença de Rachel Berry. A morena respirou fundo e, suplicante, disse:

– Eu realmente me arrependo do que aconteceu e sei que você está brava comigo. Não farei objeção alguma se você quiser me bater.

– Eu não estou brava com você, Berry. Você só teve coragem de dizer o que eu não consegui. - Quinn respondeu sôfrega e colocando-se em pé antes de caminhar para fora da sala, sentindo seu coração reclamar diante de cada passo.

Pode sentir o olhar de Rachel, preocupado, acompanhando cada movimento para fora da sala do Glee até que fechou a porta atrás de si e correu pelo corredor. Não teve coragem de dizer que admirava Rachel.

Admirava a coragem, a força de vontade e a força dos sonhos dela. Porque era disso que Rachel Berry era feita e era isso que ela possuía e que a fazia tão inabalável. Quinn jamais teria isso.

Quinn só tinha algumas plásticas, uma reputação que desaparecera por causa de suas fraquezas e uma máxima que acabara de se despedaçar...

A beleza não era tudo, mas machucava, afinal.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Tryna fix something.

But you can’t fix what you can’t see.

It’s your soul who needs a surgery.

O renascimento era mais difícil do que a subida ao topo.

Depois que tivera Beth e a entregara a adoção, Quinn percebeu que jamais seria a mesma. A cicatriz, um pouco abaixo de seu umbigo, não a incomodava por ter maculado seu corpo intocável e sim, por ser a prova física de que algo tão bonito e perfeito estivera dentro dela e que ela fora obrigado a abandoná-lo.

Justamente ela que fora talhada em perfeição e beleza, teve que abandonar Beth.

Quinn voltou à sujeira de sua família e não precisou de muito para voltar ao topo do colégio. Mais uma vez, o que lhe era exigido por ser a Ice Queen do colégio a corrompia. Quinn chegou ao topo, mas seus fantasmas do passado e seus demônios do presente a consumiram.

A ditadura fora, novamente, instalada no colégio.

E Quinn percebeu que precisava ser coroada. Ser a Rainha do Baile seria a mais perfeita prova, para si mesma e para todos naquele colégio, de que ela era a garota mais bela que já pisara no McKinley High.

Quinn fez a sua campanha da melhor forma, até que os esqueletos em seu armário foram postos em exposição pública. Lauren Zizes mostrou para todo o colégio quem fora Lucy Caboosey e Quinn viu que nada do que fizera até aquele dia apagaria quem ela fora.

A gordinha, a estranha, a cheia de acnes, a grávida... Todas elas ainda coexistiam dentro de si. Oprimidas pela Ice Queen que agora governava suas atitudes, mas elas sempre apareciam embaixo de sua frágil superfície. Quinn teria que abraçá-las, ou enlouqueceria.

Surpreendentemente, as pessoas a abraçaram. Quinn viu sua porcentagem estimada de votos crescer somente pelo fato de que agora a enxergavam como um exemplo por ter conseguido ficar bonita. Quinn não poderia ficar ainda mais arrogante. Uma coisa que fizera, de forma egoísta, agora poderia ser usada novamente em benefício próprio...

Mais uma vez, a beleza corrompeu Quinn. Ela não entendeu que as pessoas admiravam a sua força e seu empenho, não a sua busca alucinada pela beleza que ela achava ser perfeita.

Diante disso, a vitória no baile era certa até o anúncio. Kurt Hummel foi anunciado “rainha do baile” e Quinn viu-se, novamente, imersa em sua escuridão.

Ain’t no doctor or pill can take the pain away.

The pain is inside and nobody’s free you from your body.

It’s the soul who needs a surgery.

It’s my soul who needs a surgery.

Plastic smiles and denial can only take you so far.

And you break when the paper signs you in the dark.

You left a shattered mirror and the shards of a beautiful girl...

O som do tapa ainda parecia ecoar dentro do pequeno banheiro. Quinn estava de costas para o espelho, não podia mais olhar para si e achar que ainda existia algo bonito diante da prova que tivera, há poucos instantes, de que não era boa o bastante e nem mesmo bonita para ser coroada.

Quinn voltou a sentir-se feia. Olhando para seu reflexo na superfície metalizada do secador de mãos, enxergou seu rosto distorcido... Suas bochechas gordas, suas espinhas e até mesmo seu aparelho dentário. Tudo podia estar lindo em sua superfície, mas seu interior era feio.

– Por mais que eu aprecie o drama, realmente devo admitir que levar um tapa no rosto não é uma das melhores experiências. - Rachel Berry disse com um ar preocupado, enquanto observava o pequeno hematoma que se formava logo abaixo de seu olho direito. Quinn engoliu em seco e escorou-se na pia, as lágrimas a surpreenderam e mancharam sua maquiagem.

Atenta, Rachel caminhou até as toalhas de papel e apanhou algumas. Quinn observou a leveza natural dos movimentos dela, não havia nada falso em Rachel, era tudo legítimo e real. A morena era feliz e acreditava no que era e no que poderia ser. Quinn desejou ser como ela ou, pelo menos, ter um pouco da coragem que ela possuía. Amargurada, Quinn disse:

– Ao menos, você não precisa viver com medo, Rachel.

Rachel aproximou-se de Quinn com a expressão confusa e, sem pedido prévio, começou a limpar os olhos da loira com delicadeza. Uma delicadeza que Quinn jamais sentira vinda de ninguém. A morena afastou-se para molhar um pouco o papel em suas mãos, e perguntou:

– Do que você tem medo, Quinn?

– Do futuro... Algum dia, tudo isso vai embora. - Quinn respondeu amarga e apertando as mãos na pia de mármore. A dor estava impressa em cada tendão que se contorcia diante do aperto, em cada lágrima que caía e molhava o vestido de Quinn e, principalmente, no olhar perdido que ela destinava à parede naquele momento.

Era a primeira vez que Quinn admitia, não somente para si mesma como para outra pessoa, que a beleza a amedrontava. Aliás, que a sua aparência a amedrontava e a fazia temer o que a vida e a sociedade esperavam dela. Quinn sabia que esperavam algo dela e que continuariam a esperar mesmo que ela fracassasse.

A beleza tinha um preço alto.

Com ela vinha a cobrança de sempre permanecer imortalmente bela. E pior do que isso, a beleza a corrompera de tal forma que Quinn só conseguia enxergar isso nela, nada além. Afinal, fora exigido desde o começo que ela fosse bela, era uma obrigação vinda de uma família de mulheres bonitas. Aproximavam-se dela por sua beleza e seu poder. Ela mesma amedrontava todos com o poder que adquirira através de sua beleza... Quinn não conhecia uma vida em que enxergassem o que ela tinha de mais profundo em si.

Não tinha compreendido as suas inseguranças, muito menos a protegeram de seus medos. Ninguém a vira chorar quando a chamavam de feia e muito menos não viram quando ela passou a usar anfetaminas para emagrecer. Nas poucas vezes que a enxergaram de guarda baixa, Rachel Berry fora a primeira a se atrever a se aproximar e a tentar entender a complexidade em seu interior. Ela estava lá quando Quinn desabara após a revelação do verdadeiro pai de Beth, era Rachel quem cantara com ela a respeito de aceitação e compreensão e era Berry quem estava secando suas lágrimas quando, finalmente, seus conceitos a respeito da beleza se desintegravam.

Rachel Berry era a pessoa bela ali.

A beleza que não doía e nem machucava. A beleza natural que brilhava e iluminava todos somente por existir. A beleza fina, digna dos poetas, que não escravizava e muito menos, destruía. Rachel era um lado da beleza que Quinn jamais conhecera.

– Você não precisa ter medo, Quinn... Você é uma garota linda, a garota mais linda que eu já conheci... - As palavras de Rachel trouxeram Quinn de volta a realidade, focou-se nos olhos castanhos pela primeira vez desde que jogara uma raspadinha nela. E, naquele momento, Quinn enxergou os olhos mais lindos que vira em vida. Lindos por serem comuns e castanhos e, ao mesmo tempo, repletos de tanta energia e de tanto calor que logo consumiram e iluminaram a escuridão que envolvia Quinn. - Mas você é muito mais do que isso.

Quinn observou curiosa enquanto Rachel se aproximava e limpava seus olhos delicadamente. A morena sorriu de lado e o tom levemente vermelho tomou suas bochechas. Uma mecha castanha soltou-se do penteado de Rachel e Quinn, inconscientemente, colocou-a atrás da orelha da morena que corou ainda mais. Quinn abriu a boca para falar algo que nunca saiu.

Quinn não teve coragem de, naquele momento, dizer que Rachel era a mulher mais linda do mundo para ela.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Perfection is the disease of the nation.

Pretty hurts.

Shine light on whatever’s worse.

Tryna fix something.

But you can’t fix what you can’t see.

It’s your soul who needs a surgery.

Formatura. Depois de três anos, Quinn Fabray terminara o ensino médio como “Lucy Quinn Fabray”. Era assim que estava em seu diploma. Também terminava com uma aprovação no curso de Artes Cênicas de Yale, fora das Cheerios, campeão nacional pelo Glee Club e, principalmente, amiga de Rachel Berry.

Quinn observava atentamente cada um de seus colegas que se formavam enquanto esperava a hora certa de tirar a sua beca e poder ir até o baile de formatura. Finn estava brigando com a mãe para poder tirar a gravata ou pelo menos afrouxá-la, Kurt estava todo choroso com Mercedes, Puck estava jogando um flerte para cima de uma das cheerios recém-formadas e Rachel... Bem, Rachel estava em algum lugar com os pais. Quinn diria que ela estava tirando todas as fotos que pudesse daquele momento.

– Ora, ora... Quem diria que Quinn Fabray finalmente voltaria a usar o “Lucy”.

Quinn voltou-se incrédula em direção a voz. Russell Fabray a olhava com um sorriso sarcástico. Ele estava com os cabelos grisalhos arrepiados e a roupa mal passada, os olhos estavam vermelhos e ele não parecia estar muito sóbrio. Quinn puxou-o pelo antebraço até um local afastado dos outros e perguntou furiosa:

– O que você está fazendo aqui?

– Vim prestigiar a colação de grau da minha querida filha que teve a audácia de não convidar o papai aqui. - Russell respondeu irritadiço e, como estavam próximos, Quinn sentiu o cheiro de álcool em seu hálito e afastou-se enojada. Olhou para o pai com pena e respondeu séria:

– Eu, mamãe e Frannie não devemos mais satisfação alguma para você.

– Você sempre vai me dever alguma coisa, assim como a vadia de sua mãe e a puta da sua irmã! - Russell esbravejou alterado, empurrando Quinn que bateu com as costas na parede do corredor. A loira olhou assustada para o pai deu um passo cambaleante para trás, enquanto sorria maldoso. - Aliás, você me deve a sua vida, Lucy! Eu que te coloquei nessa porra de formatura, eu paguei a sua beleza, eu te fiz bonita!

Quinn engoliu em seco e não conseguiu responder. Há muito tempo não pensava mais daquela forma, Rachel a obrigara a esquecer várias coisas do passado, inclusive aquela, especificamente... Mas Russell voltava a sua vida, trazendo toda a feiúra consigo e toda a insegurança de Quinn de volta. Ele sorriu diante da fragilidade da filha e continuou:

– Ou acha que conseguiria tudo sendo a feia, gorda e esquisita que era quando pequena? Eu paguei suas operações, eu financiei a sua beleza nesse tempo todo! Você me deve a sua vida, a sua alma, o que for, Lucy! Você pode conquistar o mundo, mas jamais deve esquecer que eu te fiz assim!

– Você me fez doente! Você me humilhou, foi você que me destruiu! - Quinn esbravejou, corajosa, pela primeira vez na vida. Russell inclinou a cabeça e sorriu maniacamente antes de bater, novamente na filha. Quinn caiu ao chão, encolhida. - E não importa quantas vezes você me bata, você não vai mais me atingir!

Russell riu escandalosamente diante da coragem da filha. Ele agachou-se de cócoras ao lado de Quinn que agora encolhia-se em direção a parede. Ele cuspiu aos pés da filha e disse maldoso:

– Vamos ver se você vai continuar forte quando eu tirar aquilo que lhe dei, Lucy Caboosey.

Quinn observou a mão de seu pai fechar em punho e vir em sua direção, sentiu a dor em seu rosto, assim como o sangue que saiu de seu nariz. Russell colocou-a em pé, ela debateu-se, mas ele era muito mais forte do que ela. Mais uma vez, o punho ergueu-se no ar e antes que ele pudesse chegar ao belo rosto de Quinn, alguém empurrou o corpo de seu pai para o lado e ele caiu debilmente ao chão.

Quinn ergueu os olhos do chão e encontrou sua mãe sendo segurada por Finn e Puck enquanto um dos seguranças do colégio levava seu pai. Judy tentou se aproximar da filha, mas Rachel surgiu atrás dos garotos e pediu para que a levassem para longe.

Rachel olhou para Quinn, com lágrimas nos olhos e a expressão chorosa. Pelo reflexo nos orbes castanhos, Quinn viu-se descabelada, vermelha e sangrando. Engoliu em seco e deu às costas a morena.

Rachel não era obrigada a ser arrastada para a feiúra que transitara, desde sempre, a sua vida.

When you’re alone all by yourself and you’re lying in your bed... Reflection stares right into you. Are you happy with yourself?

It’s just a way to masquerade.

The illusion has been shed.

Are you happy with youself?

Quinn apoiou-se na parede e abaixou a cabeça, o sangue escorreu ainda mais de seu nariz e ela procurou estancá-lo com o tecido da beca. Estava difícil respirar, ainda mais chorando silenciosamente. Não sabia sequer se Rachel ainda estava no corredor.

Quinn observava o sangue escorrer por dentre seus dedos da mesma forma que via suas esperanças desintegrarem-se diante de si. Ela nunca conseguiria abandonar todo aquele peso que carregava... Ela sempre teria, em sua beleza, a sua maior ameaça. Jamais seria capaz de enfrentar tudo se a beleza ainda a machucasse e ainda a amedrontasse.

Quinn era fraca, seu pai estava certo, todos estavam certos.

Se não fosse fraca, não teria mudado tudo em si, teria enfrentado seus medos da mesma forma que Rachel fazia todos os dias. Jamais teria pisado em tantas pessoas apenas para se provar bela e intocável. Assim, a superficialidade das pessoas jamais seria o mais importante para ela.

Aquilo estava encravado em Quinn. Era uma herança genética, vinda do seu pai. Jamais seria capaz de mudar.

O sangue continuava a escorrer e Quinn continuava perdida. Retirou a mão do nariz com brutalidade e esmurrou a parede do corredor, manchando-a com o próprio líquido vermelho. Seus olhos encontraram seu próprio reflexo em um vidro que protegia o quadro de avisos. Naquele momento, Quinn enxergou como era feia e como seu pai estava certo...

Quinn esmurrou o quadro de avisos e os cacos se partiram em muitos. Apanhou um com as mãos e observou como o vidro brilhava sob a luz, aproximou-o do rosto e estava prestes a cortar-se quando braços pequenos e trêmulos envolveram a sua cintura. Quinn parou em meio ao movimento, confusa, enquanto sentia a respiração pesada na altura de sua nuca. O corpo atrás de si remexeu-se e, trêmulo, disse:

– Por favor, pare com isso.

Quinn virou-se e encontrou Rachel com os olhos brilhando. A morena estava sem a beca e, do bolso da saia que usava, tirou um lenço branco. Sentou-se no chão e obrigou Quinn a deitá-la em seu colo antes de colocar o lenço delicadamente sobre o nariz da loira. Quinn fechou os olhos, envergonhada demais para olhar para Rachel. A morena afagou-lhe os cabelos com carinho e disse:

– Nada do que ele discursou é verdade, Quinn. Você sabe disso.

– Ele realmente me comprou, Rach... Ele me fez assim. Eu sou o que sou por causa dele. - Quinn respondeu chorosa e abrindo os olhos, apenas para enxergar Rachel balançando a cabeça efusivamente em negação. As duas se olharam nos olhos mais uma vez e Rachel afagou o rosto de Quinn, respondendo:

– Você é o que é por sua própria causa, Quinn. Você conquistou Yale porque passou horas estudando na biblioteca, ganhamos as Nationals porque ensaiamos por horas a fio e se você diz que a sua beleza a fez conquistar tudo... Ele não comprou a sua beleza, ela esteve sempre aí. Você a perdeu, mas foi capaz de encontrá-la.

– O que...? - Quinn sentou-se confusa, embolando-se em sua própria beca enquanto tentava entender o que Rachel dissera. A morena revirou os olhos e sorriu, aquele sorriso de 1000 watts que Quinn tirara dela um dia, mas que agora, parecia pertencer-lhe. Rachel aproximou-se e segurou a mão de Quinn entre as suas ao dizer:

– Lembra do que eu lhe disse aquela vez no banheiro? Você é muito mais do que a sua beleza exterior, Quinn. Você é essa fragilidade diante da própria aparência e, ao mesmo tempo, toda essa força avassaladora que derruba todos os obstáculos diante de você e seus objetivos. Você é essa loucura toda, em busca de uma beleza que já lhe pertence e é perfeita, ao mesmo tempo, em que é essa inocência infantil que lhe faz acreditar sempre nas pessoas... Quinn, você é esse poço todo de contradições. De feiúra e beleza, de fracasso e de vitória. É justamente essa contradição e essas coisas dentro de você que lhe tornam linda. Você pode ser a garota mais linda que eu conheço, mas também é a mais incrível e isso importa muito mais para mim do que a sua aparência. Isso lhe torna mais perfeita do que qualquer plástica que você tenha realizado.

Quinn refugiou-se em um mar de rubor que a cobriu da cabeça aos pés. Escutou a risada de Rachel diante de sua vergonha ecoar no corredor vazio. Olhou de lado para ela, sorrindo meio triste e Rachel retribuiu-lhe, puxando para um abraço. Quinn a envolveu em seus braços com tanta força que Rachel achou que fosse ser partida ao meio.

As duas refugiaram-se em seus cheiros e em seus calores, ambas fecharam os olhos e Quinn até mesmo escondeu-se nos cabelos castanhos. Ali era o mais seguro que ela conseguira de um abrigo. Rachel era capaz de lhe fazer feliz mesmo nas piores situações... Mesmo quando desfiguravam não só sua aparência, mas também sua alma.

Rachel afastou-se de Quinn lentamente e juntou as testas de ambas, o sorriso brincava em seus lábios e um leve rubor tomava suas bochechas, seus olhos também brilhavam e Quinn jamais esqueceria como a achara bonita naquele momento. Observou a mão de Rachel envolver seu rosto, o polegar dela contornou desde sua testa até seu queixo, o toque delicado e sutil fez Quinn fechar os olhos. Rachel pigarreou e, com a voz enrouquecida, disse:

– Responda a primeira coisa que vem a sua cabeça: qual é o seu maior desejo da sua vida?

– Ser feliz. - Quinn respondeu sincera, inebriada em seus próprios sentimentos e com a sinceridade da ânsia que tinha dentro de si. Felicidade era a única coisa que procurara desde o começo.

Procurara a felicidade na beleza que buscara quando pequena. Procurou-a quando estava sentindo-se sozinha e precisou de Puck. Procurou-a quando voltou ao topo... Usou da sua beleza para tentar alcançá-la quando, na verdade, ela estivera trancafiada dentro de si justamente pela sua própria busca. A extensão do que queria era muito maior do que imaginara, a beleza era apenas a base que a impulsionou cada vez mais longe do que realmente queria.

Sentiu a respiração quente de Rachel em seu rosto, também sentiu as pontas dos dedos dela afagarem sua mandíbula e respirou profundamente quando sentiu um longo beijo na altura de seu nariz. Sentiu dor, mas não reclamou, sentiu outro beijo em sua bochecha e um sob suas pálpebras. Rachel afastou-se e baixinho, disse:

– Deixe-me tentar fazê-la feliz, então.

Depois, Quinn sentiu um beijo próximo ao seu lábio, ela virou a cabeça para alcançar os lábios de Rachel, mas aquilo não foi necessário porque, no instante seguinte, seus lábios finalmente colidiram com os dela. As mãos de Quinn puxaram Rachel ainda mais para perto e a morena sento-se sobre suas pernas, encaixando os corpos enquanto dedicava tudo que possuía e muito mais, naquele tocar de lábios.

A força de Rachel reconstruiu as fraquezas de Quinn, ao mesmo tempo em que a fragilidade da loira tocou e, lentamente, derrubou a autoconfiança da morena. Naquele beijo, Quinn finalmente encontrou o que tanto buscava.

Are you happy with youself? Yes.

Da sua feiúra chegou à beleza. Da beleza, alcançou a loucura e a partir dela chegou a Rachel que, desde o começo, era a sua resposta. A sua felicidade.

FIM


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Notas finais do capítulo

One bem longa, não? Hahahahaha

Agradecimento especial a Tuany Nascimento que, mesmo não pertencendo a nenhum dos meus loucos fandoms, sempre tá disposta a me ajudar a escrever. Obrigada, sua linda *-*

Bem, é isso! Aguardo comentários...

Beijos e até a próxima,
FerRedfield