Ben saiu para comprar comida e deixou Jenny se acomodar, mas não tinha muito que fazer. Ela iria dormir na sala, mais precisamente no sofá da sala e não tinha lugar para guardar suas coisas, então deixou a mala debaixo da escada, tirou uma muda de roupa e entrou no banheiro.

Para um homem ele até é limpinho e organizado.

Jenny observou a água caindo em sua cabeça e descendo por seus ombros trilhando um caminho desregular até a ponta dos dedos de seus pés. Ela observou suas mãos e as marcas que elas traziam, eram cicatrizes de um destino que ela estava começando a mudar.

– Preciso ligar para o papai... – Ela pensou alto – para avisar que cheguei bem.

Lavou o cabelo com um shampoo cinco em um de Ben e deixou que seu sabonete líquido com cheiro de orquídeas afastasse aquele cheiro de viagem. Saiu do box, embrulhou-se em uma toalha limpa e parou na frente do espelho observando seu rosto. Antes ele era mais cheio, as bochechas redondas e rosadas como um porco, seus olhos sem as lentes eram de um azul claro, igual ao da falecida mãe. Agora Jenny se via mais velha, mais madura, sua postura rígida parecia incomodar, mas não incomodava, seus olhos pareciam cansados - e estavam -, ela precisava dormir um pouco.

Vestiu-se, secou o cabelo com a toalha e saiu do banheiro. Pegou o celular na mochila e foi para a “cozinha” beber mais um copo de água. Apoiada na bancada, procurou no celular o número de seu pai e ligou.

Um toque... Três toques... Cinco toques... Ela contou.

– Pensei que não ia ligar. – A voz rouca e lenta do pai fez com que Jenny apertasse a beira da bancada com tanta força que os nós de seus dedos ficassem brancos. Ela não queria que ele tivesse atendido.

– Falei que ia ligar.

– E como ele está te tratando?

– Como acha? Olha, preciso ir, liguei por que prometi que ligaria. Além disso...

– Não desligue sem que eu mande...

– Mande Joshua não me incomodar mais. Pus Budd no comando e dei ordens claras para que todos se esquecessem de mim. Próxima vez que Joshua me procurar mandarei explodir metade do crânio dele. Espero ter sido bastante clara agora.

– Filha...

– E tente não morrer. Soube que Charles Mae mandou seu capanga número um atrás do senhor ainda de madrugada. Fique de olhos bem abertos. Tchau.

Jenny encerrou a ligação antes que ele falasse algo, e ele iria falar alguma coisa, ela sabia disso. Enfiou o celular no bolso de trás do short e andou até o sofá, deitou-se, abraçou uma das almofadas e ligou a TV, assistiu How I Met Your Mother até Ben voltar com uma sacola com desenhos chineses.

– Gosta de comida chinesa? – Ele perguntou tirando vários pacotes de dentro da sacola. Não, nem um pouco ela pensou em responder, mas só pensou. Comeu três pacotes de chow mee hoon que lembrava yakisoba, mas não era yakisoba, e dormiu no sofá enquanto Ben -que tentara assistir MMA- dormiu na poltrona ao lado com uma lata de cerveja na mão e a outra mão enfiada em uma tigela de Cheetos.

Aquilo era mais que perfeito para ela e pela primeira vez em muitos anos pôde dormir se sentindo segura e em casa.