A Gentleman and a Slut escrita por Senjougaha


Capítulo 1
De repente noiva




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/506720/chapter/1

Estava correndo e me faltava tanto ar, tanto ar que pensei que se parasse pra respirar acabaria com o oxigênio do mundo. E prazer, esta sou eu: exagerada.
Meu nome é Afrodite. Não tenho nada a ver com mitologia grega, minha mãe simplesmente ficou grávida e decidiu que seria uma menina e vírgula, seu nome seria Afrodite. Pois como uma dama da alta sociedade e herdeira de uma fortuna, deveria ser bela.
Estou pouco me lixando pra o que minha mãe esperasse que eu fosse quando ainda nem tinha nascido. Nem tinha nascido e tinham expectativas em mim! Bufei enquanto me lembrava disso e esbarrei em alguém que também corria. Eu não era a única louca a correr por Veneza afinal.
O cara me lançou inúmeros palavrões em italiano, mas fiz questão de desligar minha mente daquela língua. Não precisava de mais um problema no dia. Olhei pra tras para ver se meus guarda-costas continuavam me seguir e gelei. Eles estavam a poucos metros.
Agarrei o cara sem nem ter olhado para sua cara e o arrastei para uma viela, me escondendo atras dele. Pensei que estava fazendo um fvor a ambos, já que o bendito corria também.
- O que caralhos você tá fazendo, menina? - ele sibilou olhando para os lados freneticamente.
- Só me esconda - respondi rangendo os dentes.
Ele franziu o cenho e pela primeira vez, reparei nele. Tinha olhos escuros, um piercing na ponte do nariz e era um gibi humano. Ele finalmente notou os guardas procurando algo e deduziu que era eu.
- Criminosa mirim? - ele perguntou baixinho.
O encarei sem entender.
- São meus guarda-costas - respondi franzindo o cenho.
Ele ficou tenso na hora. Com certeza estava pensando que se o pegassem me escondendo, seria preso. Revirei os olhos. O criminoso ali definitivamente era ele.
- Relaxa, já tô indo - murmurei e desatei a correr, chamando a atenção dos guardas.
- Senhorita, por favor, volte! - eles imploravam.
Gelei quando o guarda mais novo conseguiu agarrar minha jaqueta e me puxar, mas pensando rápido devido à adrenalina, tirei a jaqueta num movimento brusco e a deixei com ele, disparando novamente.
- Diga à minha mãe pra não me esperar acordada! - gritei sem olhar pra tras.
Senti vontade de dizer "ei, digam à mamãe que nunca mais vou voltar!", mas isso só a faria desatar a chorar e entrar em contato com as autoridades. Ela sempre inventava uma história: eu era raptada, eu me perdia, eu tinha sido assaltada... Na perfeita imagem que ela forjava, Afrodite nunca fugia de casa, dos jantares cheio de pessoas petulantes ou da etiqueta. Afrodite era uma filha tão perfeita! Elegante, pontual, frágil mas ao mesmo tempo corajosa, bela... Todas deveriam ser igual.
Parei para respirar e me dei conta de que estava em frente à um jardim familiar. Aliviada, pulei o portão minúsculo e bati à porta branca de madeira.
"Por favor, esteja em casa, por favorrrr".
Alguém abriu a porta. Era Julian e meu suspiro de alívio e satisfação era inevitável. Ele estava de pijama, como sempre.
- Mas que droga, LeBlanc - ele murmurou, frustrado.
Ele sempre me chamava pelo sobrenome e aquilo era maravilhoso pra mim, só aquele ato o era o suficiente para que fosse meu melhor amigo. Sempre que fugia da minha casa, acabava na dele. Dei um sorriso de desculpas e o empurrei para entrar.
- Será só até a madrugada - prometi.
- O que a bruxa aprontou agora? - ele perguntou achando graça, pegando sua caneca de cappuccino e se jogando no tapete felpudo de 10 cm de espessura.
Daria tudo por um tapete daquele no meu quarto. Suspirei.
- Casamento arranjado - respondi e balancei a mão como se não fosse importante.
Afinal, não era. Eu me recusava e pronto. Não era a primeira tentativa que minha mãe tinha de me arranjar um marido. Por algum motivo ela valorizava mais esse ultimo e insistia mais, mas isso de nada bastaria.
Julian engasgou com cappuccino e derrubou algumas gotas no tapete perfeito.
- Demente! - gritei erguendo a cabeça dele para que o surto passasse - não suje meu tapete assim.
Ele me olhou completamente apavorado.
- Casamento arranjado? - ele perguntou incrédulo - com quem?
- Não sei - dei de ombros - não é importante, já que eu NÃO vou me casar.
- Você devia levar isso a sério, Afrodite - ele se levantou segurando meu braço - sua vida não vai ser pra sempre assim, fugindo.
- De que lado você está agora? - perguntei magoada.
- Ouça, você é bonita e rica - ele começou - devia valorizar a vida que você tem e mais ainda o que poderia ter...
Aquilo foi como levar uma bofetada. Ele queria que eu me tornasse uma garota que usasse sapatos neon e gloss labial como se tivesse acabado de comer frango frito? Queria que eu me tornasse uma garota que se preocupava em se tornar a mais famosa, a mais rica, a mais bonita e que me esquecesse dele?
Engoli em seco. Nunca tinha parado pra pensar antes se Julian queria minha amizade. Eu sempre aparecia de supetão e simples assim: ele era obrigado a ser meu amigo.
- Certo - sussurrei e me dirigi à porta - boa sorte tentando limpar seu tapete.
Ele só percebeu como havia me magoado quando me referi ao tapete como DELE. Se levantou correndo com um olhar suplicante, mas eu já havia fechado a porta.
"Mas que droga. Quando foi que Julian ganhou o poder de me magoar?", pensei enquanto arquejava com o vento frio e as gotas de chuva que começaram a cair.
Ou eu voltava pra casa, ou ficava ao relento. Nenhuma das duas opções eram atraentes. Esfreguei meus braços nus. Que guarda maldito! Eu poderia aguentar a noite ao relento se ainda tivesse minha jaqueta de couro. Minha preferida. Ele não seria um novo recrutado por muito tempo.
Alguém colocou um moletom sobre meus ombros e quando olhei pra tras, me deparei com os familiares piercings na ponte do nariz.
- Obrigada... - comecei, mas parei sugestivamente.
- Garoto anônimo - ele sorriu amarelo.
- Certo, carinha-gibi - assenti e vesti o moletom adequadamente.
Tinha cheiro de menta e chocolate.
- Carinha-gibi? - ele perguntou confuso.
Cutuquei uma tatuagem em forma de escaravelho em seu braço esquerdo. Quem tatuava um escaravelho?!
Amei. Totalmente original.
Ele acompanhou meu gesto e riu alto. Levantei as sobrancelhas e ele fez um gesto com as mãos, sinalizando "deixa pra lá".
- Qual é o seu nome, menina fugitiva? - ele perguntou zombeteiro.
Trinquei o maxilar. Se eu dissesse meu nome, ele me evitaria ou me trataria diferente e eu odiava essa reação.
- Garota anônima - respondi desviando o olhar.
- Certo, fugitiva - ele concordou virando a cabeça de lado, curioso - mas eu ainda descubro.
- Digo o mesmo pra você - murmurei.
- ... Afrodite! - Julian gritou sem fôlego.
Gelei, trinquei o maxilar, fiquei tensa na hora.
- Por favor, me escuta - ele disse me alcançando e segurando meu braço.
- Não acho que a moça quer ouvir você - o garoto-gibi disse, soltando meu braço das mãos dele de forma educadamente ameaçadora.
- Afrodite LeBlanc, se você não me ouvir eu... - ele começou.
- CALA A BOCA! - gritei com a voz rouca puxando meus cabelos - CALA A BOCA, JULIAN!
- LeBlanc? - perguntou o garoto, se afastando desconfiado.
- Eu não quis dizer aquilo - Julian insistiu - eu não quis dizer que não gosto de você como é, não quero que você mude, mas você devia ouvir sua mãe às vezes, quem sabe não encontra a felicidade assim? Deixa de ser egoísta, para de fugir de casa, me perdoa...
Os olhos azuis dele eram suplicantes e chorosos. Engoli em seco. Quase o perdoei, mas logo guardas surgiram atras e eu soube na hora que ele que os chamara. Pensava estar fazendo o melhor pra mim. Estava mesmo era me matando por dentro.
Coloquei o cabelo atras da orelha e mordi o lábio inferior na tentativa de não chorar. Funcionou, embora eu sentisse gosto de sangue.
- Le... - ele começou mas eu o interrompi:
- Não fale comigo por tempo indeterminado. No momento eu odeio você - sussurrei e deixei os guardas me escoltarem.


Suspirei e alisei o vestido que me apertava. Acho que meus pulmões não funcionariam por muito tempo se minha vida fosse usar espartilhos. Quem, em sã conciência usaria espartilhos nesse século?
- Tire essa cara amarrada - fungou Alexia - está me contagiando.
Direcionei um sorriso à ela. Alexia era o mais próximo que eu tinha de amiga naquele maldito casarão. Ela era tão fútil quanto qualquer garota no mundo, mas era completamente compreensiva e sempre sabia o que dizer. Publicamente, também era uma dama perfeita, assim como nos bastidores, mas também era uma viciada em games e adrenalina, assim como eu. Esse era o nosso vínculo.
Era um trato secreto: ela participaria de qualquer evento maluco comigo e eu agiria como uma dama perfeita ao lado dela.
O resultado era: minha mãe convidava Alexia para todas as ocasiões formais e a colocava pra se sentar ao meu lado.
Arquejei quando ela deu um tapa ardido nas minhas costas.
- Fique firme - ela mandou - coloque sapatilhas, não está em condições de usar saltos altos.
- Obrigada - suspirei aliviada.
- Não estou fazendo um favor pra você - ela retrucou - eu só não quero andar ao lado de uma garota que caminha tão graciosamente quanto um avestruz.
E aquela era Alexia. Seu jeito sarcástico e rude de cuidar de minha imagem pública era maternal apesar de tudo. Ela e eu tínhamos a mesma idade: 19. Mas ela era uma senhorita até os ossos.
- E então? - ela perguntou enquanto passava rímel pela milésima vez.
- E então o quê? - retruquei fingindo tirar o excesso de batom quando na verdade, tirava tudo discretamente.
- Vai perdoar Julian quando? Sempre pensei que formariam um casal perfeito - ela riu.
- Não crie lesões cerebrais pensando nisso - murmurei - já disse que não sei, não somos um casal.
Ela beijou o espelho, satisfeita com o resultado. Para mim, estava a mesma coisa.
- Falando em coisa séria agora - ela se virou com semblante severo - esteja perfeita esta noite.
Eu já não estava?
- Seu pretendente estará aqui, neste jantar - ela continuou avançando em minha direção com o batom em mãos.
Soltei um gemido. Tanto pelo fato de ela ter percebido que tirei o batom, quanto pelo tal noivo estar presente. Pensei em pular a janela, mas aquele vestido era grande demais e entalaria.
- Dizem que ele é gato, então não se preocupe - Alexia disse passando batom em mim com cuidado e passando as mãos nos meus cabelos.
- Você não deveria dizer "seja você mesma?" - perguntei sarcástica e esperançosa.
- No seu caso, definitivamente não! - ela bateu o pé fazendo um som oco no tapete felpudo, sem conseguir segurar a risada.
Alguém bateu na porta e a abriu sem esperar resposta. Suspirei.
- Oh deuses, estás tão linda - minha mãe se abanou com um leque e seus olhos lacrimejaram.
- Pare com toda essa porcaria medieval, mamãe - revirei os olhos.
Ela deu uma piscadela e pegou minha mão direita, me obrigando a girar. Desnecessário dizer que fiquei zonza e precisei me sentar.
Suspirei. Tinha que concordar que eu estava bonita. O vestido azul (minha cor favorita) acentuava minha palidez de forma positiva, valorizava meus cabelos cor de cobre e a maquiagem feita por Alexia destacava meus olhos negros.
- Por que você sempre faz isso comigo? - gemi - eu não quero me casar...
Suzan, minha mãe, adquiriu um olhar severo ao mesmo tempo em que eu disse aquilo. Fechou a porta depois de olhar para os lados, conferindo se alguém nos ouviria além de Alexia. A coisa era séria.
- Querida - ela começou umedecendo os lábios e ajeitando a saia do meu vestido - me perdoe, mas estamos em momentos difíceis.
- Momentos difíceis? - perguntei confusa - o país vai entrar em guerra?
- NÃO! - ela se desesperou com minha incompreensão - seu pai e eu vamos nos divorciar.
Ela disse a ultima frase num sussurro hesitante. Mas não triste.
Não era uma novidade que meus pais não se amavam. O casamento fora arranjado e forçado, os dois se davam bem. E era só isso: se davam bem. Mas essa convivência boa foi sendo desgastada: meu pai arranjava amantes e minha mãe chorava sozinha, sem saber o que fazer.
Então por que ela tentava me obrigar a me casar da mesma forma que ela?
- Mas... - comecei.
- Ele vai nos dar apoio financeiro - ela interrompeu - porque te ama e a lei ordena isso, mas é só um apoio. Vamos ter que nos virar com o resto.
- Você só não quer deixar de ser uma das mulheres mais ricas da Itália, isso sim! - exclamei vermelha de raiva e me afastando dela - não se preocupa com minha vida, não leva em consideração o que eu quero! E se eu estivesse apaixonada?! Você faria o mesmo comigo!
- Não é isso - ela disse num muxoxo envergonhado - eu amo você, mas não quero jogar fora tudo o que EU construí ao longo da minha vida. Não para pra pensar em mim também, querida?
Sua voz era tão doce e triste, que me irritei ainda mais.
- Você só quer ser a porra duma milionária. Quer que eu vá à esse jantar ridículo conhecer meu noivo? Tudo bem então. Eu vou conhecê-lo e ele vai me conhecer também, ah se vai. - sibilei e arrastei Alexia pra fora do quarto.
O salto dela ecoava no corredor enquanto eu dava passos rápidos e ágeis para o salão do jantar. Se era aquela a droga da vida que eu levaria pela droga da mãe que eu tinha, eu faria o que sabia de melhor: comer até quase estourar. Pouco me importava se aquilo seria vergonhoso pra Suzan! Se papai não a queria mais, era culpa dela!
Faria com que esse cara percebesse que eu não era a dama da mídia, faria com que ele notasse quem eu realmente era e ele daria o pé na minha bunda, louco pra sumir e pronto: a vitória seria minha. Sorri de lado para Alexia enquanto ela me olhava assustada.
- Afrodite - ela me chamou parando e me fazendo parar também.
- O quê? - perguntei impaciente.
Ela abriu a boca mas fechou de novo. Estava hesitante. Alexia nunca era hesitante.
- Eu preciso admitir que concordo com você agora - ela disse baixinho - sua mãe está sendo egoísta te usando como escada desse jeito.
Ela olhou para o lado. Sempre que ela concordava comigo em algo, eu ficava feliz da vida e fazia alguma besteira e pronto: Alexia já era contra minhas ideias de novo. Ela estava hesitante porque tinha medo que eu fizesse alguma revolta e instigasse a mídia. Tinha medo que eu destruísse a carreira e imagem dela, e ainda assim continuava ali comigo. Que droga de boa amiga! Senti vontade de abraçá-la, mas apenas assenti.
- Obrigada - sussurrei apertando a mão dela e voltando a andar.
O salão estava tão iluminado que custou às minhas vistas para se acostumar. Haviam tantas mesas e cadeiras dispostas tão irritantemente perfeitas por todo canto, que me deu vontade de virar todas de cabeça para baixo. A maior era composta de 50 lugares, com Suzan numa cabeceira e Adam (meu pai) na outra. Eu deveria me espremer em qualquer lugar ali, mas daria de tudo pra sentar na menor mesa. Alexia estaria ao meu lado. Grande consolo! Me beliscaria todas as vezes que achasse que comi demais.
Nos sentamos com alívio contido. Ainda não tinha acabado. Suspirei e a lancei um olhar a ela. Um dos Olhares.
- Sim, seu cabelo está bom - ela sorriu tensa.
Assenti e mordi o lábio inferior.
As portas principais se abriram e uma manada de mulheres pomposas ao lado de seus maridos velhos, gordos e tarados adentrou o salão. As filhas cochichavam animadas. Era a primeira vez que a família LeBlanc permitia a entrada de todos os familiares em um de seus jantares famosos. Revirei os olhos e Alexia beliscou meu antebraço.
- Sorria, você é a anfitriã - ela disse entre um sorriso e outro.
Obedeci. Era uma droga, mas obedeci.
- Senhorita LeBlanc? - uma conhecida voz grave chamou.
Arquejei e sorri, surpresa.
- Levi! - exclamei tentando soar menos esganiçada e mais graciosa, o apertando num abraço.
- Creio que sua mãe já a notificou de que o noivo sortudo é meu sobrinho - ele disse sorrindo.
Claro que ela dissera algo do tipo, e claro que eu não ouvira. Mas pelo sorriso sacana do homem de meia-idade à minha frente, ele sabia muito bem disso.
- Ah... Claro - gaguejei, o fazendo rir.
- Sempre graciosa - ele disse tomando o assento ao meu lado.
Alexia torceu o nariz. Ela achava Levi informal demais e também jurava que ele tinha uma queda por minha mãe.
- Conte-me as novidades... - ele pediu - ...depois de receber os convidados, claro - ele emendou depois de perceber o olhar fuzilante de Alexia atras de mim.
Ri nervosa e me levantei. Hora de abraçar senhoras gordas metidas à moças e velhos loucos por um decote à vista. Felizmente, meu vestido era elegantemente comportado.
- Sejam bem vindos - eu dizia a todos com uma taça de champanhe em mãos, fingindo beber e adorar aquilo.
Eu odiava champanhe.
- LeBlanc? - uma voz hesitante chamou.
Eu sabia quem era e mesmo assim, me virei. Devo ter feito alguma cara bizarra de surpresa, porque mesmo nervoso, Julian riu.
- Quem convidou você? - perguntei direta.
- Alexia - ele deu de ombros.
- Garota venenosa - murmurei.
Ele riu e se aproximou, ainda hesitante. Me afastei.
- Seja bem vindo - lhe direcionei o mesmo sorriso que direcionava aos visitantes comuns e voltei à minha mesa.
- Perdi algo? - Levi perguntou segurando o riso.
Ele e suas manias de prestar atenção em tudo. Revirei os olhos e recebi mais um beliscão de Alexia, que permanecia serena bebericando vinho. Fiz uma careta contida.
- Julian também quer que ela se case - ela respondeu por mim.
- Tenho certeza de que sim - Levi pigarreou - que Afrodite se case com ele.
Estanquei.
- Mas vamos falar do que importa no momento, querida - ele se voltou a mim - você quer se casar com meu sobrinho?
- Nem sei quem ele é - respondi sorrindo docemente e pegando um canapé.
Alexia me olhou feio. Nas festas, ela não permitia que eu comesse das minhas comidas favoritas por motivos que eu entendia. Discretamente, lhe mostrei a língua e ela engasgou.
- Ele é... diferente - Levi comentou baixinho me olhando pelo canto dos olhos.
- Diferente como? - perguntei curiosa.
Ele hesitou e disse - Você vai ver mais tarde.
Suspirei desapontada.
Levou horas pro fulano chegar. A cada minuto parecia que eu era mutilada e sentia claustrofobia naquela mesa gigante cheia de risadinhas e pessoas beliscando a petiscos com o garfo. Pegue tudo com a mão, seus vermes! Senti vontade de gritar. Arquejei e não aguentando mais, levantei.
- Preciso tomar um ar - me desculpei com um sorriso angelical e todos assentiram, sorrindo de volta.
"Que sorriso!", era o que as velhotas sussurravam se abanando com o leque, sem perceber que seus maridos encaravam Alexia. Me senti culpada por abandoná-la.
Virei para tras e movi a boca num mudo pedido de desculpas.
"Que seja", ela respondeu fungando discretamente.
Segurei uma risada e a vontade de sair correndo em direção ao jardim. A passos lentos e quase pacientes, cheguei lá. Alexia sentiria orgulho de mim. Me deixei rir e saí correndo para me sentar no meu banco preferido, debaixo da minha árvore preferida.
Suspirei e relaxei. Até tirei a sapatilha e senti a grama com a ponta dos dedos, embora fosse arruinar o possível elogio de Alexia sobre eu não ter corrido salão àfora.
Ouvi uma risada feminina, totalmente assanhada. Calcei minhas sapatilhas de novo e segui o som. Havia um casal deitado em um dos bancos. Se eu chamasse os guardas, seria apelação. Pensei em ser legal e avisar pra procurarem um quarto.
- Ei - cutuquei as costas do cara - meu jardim não é lugar pra vocês se pegarem.
Ele virou pra tras, visivelmente irritado e... Oh meu Deus. Era o Garoto Misterioso.
- O que DIABOS você tá fazendo aqui? - surtei.
Ele xingou em italiano e droga, eu nunca sabia xingar em italiano. E droga de novo, ele estava quase sem calça. Levantou correndo e tropeçando para vesti-la de novo enquanto a garota com o vestido erguido até a cintura me lançava um olhar mortífero.
- Por qual motivo você está me encarando assim, sua bugada? O jardim é meu, o banco é meu - bati o pé - vão fazer isso na calçada se quiserem, mas não aqui.
Devia estar vermelha de raiva. E o carinha estava pálido.
- Ei, você está bem? - perguntei reparando nele direito.
O terno preto escondia suas tatuagens e a única que visível era um "whatever" escrito em garrancho no pescoço. Quem em sã consciência tatua "whatever"???!
- Quem é você? - ele perguntou abobalhado, passando a mão no cabelo.
A garota soltou um gemido mimado e puxou a manga do terno dele. Ele afastou o toque dela. Revirei os olhos.
- Tá drogado? - perguntei e ele negou - sou Afrodite LeBlanc, e sou legal o suficiente pra tirar vocês daqui eu mesma, ao invés de chamar os guardas então... De nada!
A garota soltou um gritinho assustado e tapou o rosto com as mãos. Provavelmente estava pensando que eu estragaria a imagem dela. Devia ser alguma das filhas dos gordos e gordas no salão. Saí pisando fundo. Ele e ela eram escrotos e ponto.
- Ei, espera! - ele chamou tentando me alcançar aos tropeços.
- Devolvo seu moletom depois - respondi trincando o maxilar.
- Moletom? - ele perguntou confuso olhando para os lados - ahhhh, esquece isso, fica pra você.
Entrei no salão e ele continuava na minha cola.
- Ah! Aí estão os noivos - minha mãe exclamou para todo mundo ouvir, radiante e meu pai abriu um sorriso orgulhoso - parece que já se conheceram.
Alexia me encarava petrificada.
- Noivos? - perguntei tentando respirar como meu professor de canto me instruiu.
Eu tinha dificuldades em respirar quando ficava nervosa, ou no caso, entrava em pânico. Quase entrei em coma por isso.
- Querida, está emocionada? Respire - minha mãe correu em minha direção e Alexia apareceu ao meu lado segundos depois.
- Mantenha a calma, Afrodite - Alexia sussurrou em meu ouvido, autoritária e preocupada.
Assenti discretamente e encarei o meu... "noivo". Tinha certeza de que se eu dissesse a palavra em voz alta, faria alguma cara estranha. Engoli em seco.
- Afrodite LeBlanc e Pietro diAngelo agora são noivos! O casal mais perfeito que já vi! Isso precisa sair na revista... - ouvi uma garota gritar animada e batendo palmas no fundo.
Senti vontade de esgoelar seja quem fosse.
- Afrodite, não. - Alexia notou meu desejo assassino.
O tal Pietro me encarava tão chocado quanto eu. Semicerrei os olhos e o avaliei. Era lindo e atraente e tudo mais, mas ainda assim era um escroto. Senti vontade de dizer em voz alta e Alexia, a leitora de mentes me beliscou.
- Não diga nada estúpido - ela sibilou.
Pigarreei e estendi minha mão na direção dele.
- Prazer em conhecer você - murmurei forçando um sorriso.
Ele me olhou confuso e perdido. Olhou nos meus olhos e viu a ameaça silenciosa: "se comporte ou eu te ferro". E definitivamente eu tinha minhas formas de ferrar alguém, principalmente ele. Então ele apertou minha mão com um sorriso de lado.
- O prazer é todo meu, noiva - ele disse malicioso.
Pietro sabia do efeito que aquilo teria em mim. Fiquei vermelha na hora, mas não foi de timidez como o público pensou e achou fofinho, tirando milhares de fotos. Foi de raiva. Alexia segurou meus braços num gesto que aos olhos das pessoas parecia uma amiga super protetora que não queria perder a companheira pra ninguém, mas eu sabia que a intenção era me impedir de estapear aquele estúpido ou arrancar sapatos dos pés de alguém pra furar o olho de Pietro com o salto agulha.
Ele estava tão sorridente. Difícil acreditar que estava se pegando com uma garota na festa do próprio noivado. Revirei os olhos, me lembrando tarde demais que Alexia não perdia um movimento meu. Beliscão na certa.
- Esse doeu, Alexia - grunhi.
- Damas não reviram os olhos - ela sibilou.
- Não sou a droga de uma dama - sibilei de volta.
Pietro riu.
- E você - Alexia se dirigiu à ele - seja um cavalheiro com a minha amiga, não a magoe.
Ela não se referia à imagem na mídia ou por obrigação. Falava sério. A encarei confusa, piscando feito retardada.
Os dois ficaram se encarando, sérios. Pareciam ter uma conversa telepática, onde competiam pra ver quem fazia ameaças piores. Alexia venceu.
- Pode deixar - Pietro sorriu com as mãos nos bolsos, tenso.
Suzan bateu palmas para chamar a atenção do povo e quando não conseguiu, bateu uma colher de prata numa taça de champanhe. O barulho estridente melhorou meu dia, obviamente.
- Quero agradecer pela atenção e presença de todos hoje em minha humilde residência - ela começou com a mão no peito, emocionada - é um evento diferente de todos os que já aconteceram na família LeBlanc, e com certeza, o mais importante.
Todos assentiam, solenes e devotos. Que pobo babaca!
- Hoje é o dia em que minha filha dá mais um passo, sobe mais um degrau na escadaria gloriosa de sua vida e encontra o amor... - ela continuou, enxugando as lágrimas com um lenço fino.
Engasguei e Pietro me ajudou, batendo de leve nas minhas costas e segurando o riso.
- Encontra o amor? - sussurrei indignada e triste, olhando para Alexia.
- Afrodite... - ela me alertou - ela pensa estar te ajudando.
- Está arruinando minha vida - grunhi.
- Não sou tão ruim assim - Pietro deu um sorriso sem jeito.
- Vá se ferrar - sussurrei enquanto ele enlaçava seu braço com o meu.
- Gostaria de desejar à você, filha, em nome de todos os presentes, toda felicidade do mundo... Um brinde aos noivos! - ela bradou animada e emocionada.
Forcei um sorriso e Pietro fez o mesmo, apertando meu corpo contra o dele. As garotas olhavam com admiração e inveja e eu só queria dizer "TOMA, PEGA ELE E LEVA PRA VOCÊS!". Alexia nos estendeu duas taças de champanhe, forçando um sorriso também.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Gentleman and a Slut" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.