(The Next) Generate: The Endless Game escrita por thesecretwriter, The Next


Capítulo 2
O Teste


Notas iniciais do capítulo

Capítulo explicativo.



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Confesso que o local começara a ficar um tanto quanto perturbador. Me pareceu uma boa ideia reduzir as cores deixando apenas tons de cinza, roxo e marrom. Porém, as árvores retorcidas, os dinossauros negros, os relógios tortos e a tempestade que viria; tornaram o que era legal em monotonia, e esta tomaria conta em minutos.

Escalei a montanha de neve sem dificuldade e com botas não apropriadas; o coturno não ficou se quer úmido e isso era o que eu mais gostava no fato de poder criar. Quanto mais tempo eu dedicava ao meu treinamento, mais evidente era o fato de que eu não lembrava quem era o garoto russo que vivia praticamente sozinho em um quarto pequeno na casa dos avós. Não me lembrava muito bem o que eu costumava fazer nas férias ou em que série eu havia parado de estudar. Acho que passar tempo de mais aqui me fez desligar do pacato mundo que as pessoas chamam de mundo real. Sei que cheguei aqui com dezessete anos e acho que não passou tanto tempo assim.

Recriei o frio da montanha da maneira que me lembrava dos invernos rigorosos da Rússia. Eu poderia ter deixado um clima inexistente, mas muitas coisas já não faziam sentido naquele lugar e às vezes eu sentia falta do “mundo real”. Fitei o vácuo abaixo da montanha, nada além de um espaço sem cor, minha criatividade já estava falhando e eu tinha que admitir que eu sentia falta da minha antiga vida. Talvez fosse hora de voltar. Mas,voltar ao mundo chato onde eu teria que seguir a massacrante rotina de regras estabelecidas por alguém que acha que manda era desestimulador; ao menos... Ao menos que eu pudesse me divertir por lá. Estava na hora de voltar, não para ser controlado; era pra controlar.

O caminho não era muito certo, tive que deixar de lado tudo o que havia criado, o apego não facilitava o caminho de volta. Aos poucos, vi o meu mundo se distanciar, eu precisava saber onde queria chegar, a Rússia não seria uma boa opção, eu poderia me apegar, iria querer rever minha família o que estava fora de cogitação. Dinamarca foi a escolha.

_______________________________________________

[Dinamarca, 2013]

A rua era inutilmente larga já que não passavam muitos carros por ali. Eu não sei como as pessoas conseguiam morar naquele local. As casas eram antigas, pelo menos no centro e um rio cortava a cidade. Caminhei pelas ruas à procura de um local propício ao meu teste. Muitas casas da região pareciam abandonadas, ou era a cultura local manter a cidade como era no século XV, ridículo já estávamos em 2013.

Seguindo a linha do trem na rua de paralelepípedos encontrei uma casa feita de pedras antigas. Era grande, com dois andares e de aparência abandonada. Se não fosse a torta na janela eu diria que não havia ninguém. A vila toda parecida desabitada. A propriedade não tinha muros nem cercas e parecia indicar que a vila terminava ali.

Contornando a casa, vi pela janela uma menina que aparenta ter doze anos. Ela brincava sozinha com um jogo de tabuleiro. Ali estava a minha chance para um teste, brincar com a crença das pessoas dali. Atrás da casa havia um bosque, adentrei o local correndo, eu sabia que conseguia modificar penas coisas no mundo real, mas poderia eu fazer algo maior?

Sentado em uma pedra, fitei o rastro no meio da clareira. Havia um círculo feito de gravetos, parecia resquícios de uma fogueira. Ao fechar os olhos me concentrei no que viria a criar. Cada traço foi milimetricamente pensado, foi difícil criar uma personalidade. Anotações breves foram feitas em um pedaço velho de papel que eu sempre carregava comigo.

A energia corria por todo o meu corpo enquanto a ansiedade me dominava, o começo da criação é sempre mais emocionante. A fumaça tomava forma em cima dos gravetos empilhados, mas as coisas aqui não funcionavam como no meu mundo, tudo neste “mundo real” demora a se materializar. Passei várias noites escondido na clareira, comendo frutas das árvores, até que minha criação estivesse pronta para o teste.

Uma semana depois eu ainda estava lá, contei os dias, andei pela cidade novamente sempre mantendo o foco ao voltar para a clareira. Na última noite da semana eu senti a energia daquilo que criei crescendo no local. Analisei a menina várias vezes e finalmente eu veria se funcionou. Fiquei do lado da janela, a lua cheia iluminava o céu e as poucas famílias da região já estavam dormindo.

O grito ecoou por toda a vila, a garota parecia assustada ao julgar pelo grito agudo e estridente. Sorri satisfeito, pelo menos o início do teste parecia satisfatório. Escalei pela escada externa da casa para olhar pela janela do quarto dela, tudo parecia calmo, a mãe dela já estava sentada ao lado na cama, pareciam conversar. Provavelmente minha criação estava adormecida esperando o momento certo para agir.

Durante dois dias me posicionei ao lado da janela da sala, alternando entre me esconder e analisar o interior da casa. Muitos barulhos estranhos surgiram ali, copos quebrados, portas ou janelas batendo. A mãe dela já estava desesperada, saia e entrava várias vezes da casa, isso fez com que eu não acompanhasse o progresso durante todo o dia. Fiquei na clareira observando de longe, escondido para ninguém me ver, até que o vidro das janelas da casa estourou. Aproximei-me correndo para ver. Objetos pairavam no ar, a menina segurava uma faca e havia sangue em sua roupa.

—“ Husgen s ar guarnat keshier missan ko nu ya est”

A garota gritava sem parar antes de desmaiar. A mãe saiu correndo segurando-a nos braços em busca de ajuda para levá-la a cidade. E eu não podia conter o meu sorriso.

“Fase 1: Done!”

Corri atrás delas até o hospital. Como era previsível, examinaram a garota várias vezes, usando diferentes métodos. Lá eu nada poderia fazer, minha criação continuava esperando. Depois de passar duas horas no hospital elas voltaram para casa.A mãe a colocou na cama e foi para o quarto.

—“ Husgen s ar guarnat keshier missan ko nu ya est”

A garota repetia gradativamente mais rápido enquanto dormia. A frase era boba, uma língua nova que eu tinha inventado; era a língua que minha criação falava- criar Callhum falando Latim ou Hebraico era comum de mais- dentre as outras tantas que já existiam. A sombra de Calhum era visível na parede. Grandes asas negras, ele se sustentava por dois pés, o tronco era musculoso e lembrava um touro. Eu não podia ver Callhum da forma que eu gostaria, mas pela sombra eu tinha certeza que eu poderia manipular coisas no mundo real.

Meu demônio acordou, fazendo a garota gritar de dor, ela se contorcia na cama enquanto continuava repetindo a mesma frase, cortes apareciam no corpo dela —estava funcionando—algo criado por mim tinha vida no “mundo real”, ninguém me pararia agora.


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Notas finais do capítulo

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