Olho para o relógio no meu pulso mais uma vez. Faltam 5 minutos para as nove, daqui a pouco o jantar iria terminar. Queria ir para o quarto, tomar um banho, quem sabe conhecer minha colegas de quarto, e depois correr para o refeitório e ver se tinha alguma comida sobrando. No exato momento que entro no quarto a porta do banheiro se abre e sai de dentro dele uma menina alta, esbelta, com longos cabelos pretos e olhos azuis claros. Encaro ela por um segundo e vejo que há uma outra menina sentada no beliche de cima, na cama oposta a minha, ele está com cara de assustada, seus lábio grossos estão semi abertos e seus cabelos marrom escuro desarrumados.

– Olá! – falo alegre – Meu nome é Ren e aparentemente sou a última colega de quarto que vocês esperavam.

– Oi – fala a menina que havia acabado de sair do banheiro – eu sou a Charlie – ela acena com a cabeça amigavelmente e olha para a outra menina sentada na cama.

– Katherina – ela fala.

Um silêncio meio constrangedor se instala no quarto, não sei se havia achado que ficar amiga das minha colegas de quarto iria ser fácil, mas essa situação realmente me incomodava.

– Então – começo quebrando o gelo – vocês já jantaram?

Charlie acena negativamente, Katherina por outro lado coloca seus fones de ouvido e posiciona o computador novamente eu seu colo.

– Eu já jantei – ela responde friamente.

Encaro Charlie e vejo em seus olhos a apreensão por ter que dividir o quarto com alguém como a garota, mas eu não culpo ela, Katherina não parece o tipo de pessoas que se lida facilmente.

Decidi deixa-la com seus pensamentos, talvez fosse a melhor coisa a se fazer.

– Charlie, você gostaria de ir jantar? – pergunto a menina morena parada perto a porta do banheiro, ainda encarando Katherina.

– Claro, humm... Ren certo? – ela parece constrangida e se embaralha com a pronuncia certa do meu nome. Decido ignorar as tentativas falhas dela e me contento com a sua pronuncia inglesa do meu nome.

Aceno com a cabeça e abro a porta gesticulado para ela sair na frente, Charlie passa por mim e segue corredor acima em direção as escadas. Fecho a porta atrás de mim e tranco-a com minha chave. Acredito que Katherina queira ficar sozinha e organizar os pensamentos, o que também me dava uma boa chance de conhecer Charlie melhor. Não queria passar o resto do ano me dando mal com minhas colegas de quarto.

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O refeitório estava praticamente vazio, apenas alguns atrasados estavam sentados nas mesas comendo em pequenos pratos de porcelana branca. Pego um dos pratos e percebo que eles tem desenhado no centro o brasão da escola. Uma silhueta do castelo em branco, que era a construção da escola, no centro com um dragão vermelho encrustado em cima e um leão dourado embaixo colocando sua cabeça pela porta de entrada. Era realmente um brasão bonito. Percebo que Charlie já está na fila enchendo o prato de comida. Me junto a ela e logo nos sentamos em uma mesa, permanecendo em silêncio por um tempo, mas não um silencio constrangedor, eu precisava pensar e claramente ela também.

Precisava pensar no que tinha acontecido hoje e no que aconteceria de agora em diante. Nova escola, nova cidade, nova vida. Tanta coisa em mente e tanta coisa mudando. É eu realmente tinha que colocar algum plano de fundo no meu celular.

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Quando voltamos ao quarto as luzes estão apagadas uma respiração calma e constante emana do beliche de cima. Katherina já estava dormindo. Tomando cuidado para não fazer nenhum tipo de barulho Charlie senta na cama dela e abre uma das gavetas pegando um pijama.

– Ren, você quer tomar banho ou eu posso me trocar antes? – ela pergunta sussurrando.

– Pode ir, eu ainda tenho que desfazer minha malas.

Charlie acena com a cabeça e fecha a porta do banheiro. Abro as cortinas levemente por medo de acender as luzes e acordar Katherina. Uns poucos raios de luz entram no quarto, não muito, mas o suficiente para desfazer uma mala.

Começo a tirar meus pertences de dentro da mala, algumas roupas, uma bota de frio e uma pequena neceser. Quando termino de desfazer a mala vejo Charlie saindo do banheiro e deitando em sua cama se aconchegando debaixo dos cobertores.

– Boa noite Ren – ela sussurra.

– Boa noite Charlie.

Pego meu pijama e fecho-me dentro do banheiro. Giro a torneira e espero a água ficar quente. Quando ela fica entro debaixo dos jatos. Embora estivesse calor nunca consegui me acostumar a tomar banhos frios.

Sento no chão do banheiro e apoio a cabeça nos meus joelhos os abraçando em seguida. Tinha tanto para pensar e o box me parecia muito confortável para ser abandonado, levanto a cabeça e deixo a água quente me atingir bem no rosto, queria que essa água pudesse lavar o sentimento de culpa que tinha, ou sentimento de pena que sabia que iria demonstrar toda vez que olhasse para Katherina.

Pena era algo ruim, não queria ter pena, queria ter compaixão ou ser generosa com ela, não queria pena. Katherina tinha olhos tristes e abatidos, olhos de quem passou por algum trauma, já vi gente como ela antes, inclusive no meu espelho. “É Ren você com certeza vai entrar para aquela aula de tiro” penso comigo mesma.

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Quando saio do banheiro escuto respirações leves e continuas, que bom que nenhuma delas roncava. Fecho a porta do banheiro e subo na minha cama tomando cuidado em prestar atenção nos degraus da escada. Charlie havia fechado a cortina, provavelmente por causa da luz, o que tornou minha subida até o, incrivelmente alto, andar de cima do beliche, emocionante.

Me aconchego em baixo dos cobertores e encaro o teto esperando o sono chegar, odiava essa parte de ir dormir. Odiava encarar o teto relembrando tudo que aconteceu no dia, odiava principalmente a parte em que o dia acabava e eu começava a lembrar de memórias mais velhas e não tão agradáveis.

“Nova escola, novo estado, nova vida, hora de deixar o passado para trás” penso, “é... como se eu pudesse um dia deixar o passado para trás”.