A Sina de Kael escrita por Flicts, LUCAS EMANUEL


Capítulo 1
Capítulo Único...




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Miguel sorriu arrogantemente de seu trono quando seus soldados jogaram um homem de joelhos no chão de seu palácio e seu sorriso só aumentou ao ver as marcas vermelhas no pulso do homem, onde correntes grossas o prendiam, impedindo-o de fugir.

- Kael, filho de Zuriel - disse o Arcanjo descendo de seu trono e caminhando ao redor do homem - Você foi acusado de conspiração e traição, por "atentar" uma Ophanim proibida.

Uma intensa dor atingiu o anjo ao lembrar-se da Ophanim, não algo físico e sim algo mais profundo, o fazendo abaixar a cabeça e encarar o chão enquanto seu carrasco falava.

- Como punição por seu sacrilégio, serás condenado ao exílio eterno. - ao dizer isso uma espada dourada surgiu na mão de Miguel, ele colocou-a no peito de Kael, apontando direto em seu coração - Alguma última palavra? - disse o Arcanjo arrogantemente.

- O que você chama de "sacrilégio", foi o simples ato de amar, e por isso serei condenado. - disse com a voz embargada, sua cabeça pendendo em seu pescoço - Mas creio que anjos não tenham nascido para amar.

- Você foi um tolo garoto - disse Miguel fincando sua espada no coração do anjo, que foi se deteriorando até se tornar cinzas e espalhar-se ao vento.

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Kael acordou em meio à escuridão. Ele não podia ver nada ao seu redor, mas sentia que estava deitado. Tentou levantar-se, mas bateu a cabeça e deitou-se novamente. Tateou ao redor de seu corpo, encontrando paredes de madeira que o impediam de se mover. Apavorado, ele percebeu que estava preso em uma caixa, seus instintos gritando para que ele saísse dali, o ar parecia escasso, o que o assustou ainda mais, porque ele não devia sentir falta de ar, anjos não precisam respirar.

Sem saber exatamente onde estava, foi pelo caminho mais óbvio e, sendo guiado por seus instintos, deu um soco na tampa da caixa, fazendo um buraco e, para sua surpresa, terra começou a vazar pelo orifício, enchendo o pequeno espaço em que ele estava.

Percebendo que logo seria soterrado, começou a esmurrar a parede, quebrando a madeira e aumentando o buraco nela. Em seguida, começou a cavar, saindo da caixa em que estava e se afundando na terra.

Alguns minutos depois ele conseguiu chegar à superfície, passando o braço inteiro para fora da terra e se impulsionando para fora. Sentou-se ao lado do buraco que acabara de cavar, sua respiração estava ofegante, seus pulmões imploravam por ar. Terra cobria todo seu corpo e suas mãos estavam em carne viva.

Assim que se acalmou, vasculhou os arredores com os olhos.
Estava tudo coberto por uma espessa névoa, mas ele podia ver algumas árvores ao seu redor, negras e sem folhas, além da grama podre que cobria o chão.

Ele suspirou cansado e virou-se, dando de cara com uma lápide enorme, com uma cruz em cima. Aproximou-se e observou-a melhor, uma plaquinha feita de bronze estampava para quem quisesse ver o nome do falecido enterrado ali.

Assustado constatou que era seu nome estampado na lápide.

Então era isso, este era o exílio para os anjos traidores. Esta era sua punição. Ele foi enterrado, estava em um cemitério.

Estava morto.

Kael levantou-se depressa, não queria ficar nem mais um minuto naquele lugar, então correu, passando por outras centenas de lápides de outros anjos que assim como ele foram banidos.

E ele caminhou, por três dias seguidos, ou quase isso, porque o sol não nascia ali, só existia escuridão. Até seus ossos ficarem doloridos, e, mesmo assim, ele não parou, nem por um minuto, sempre em frente, ignorando a dor física e sofrendo com a dor que pulsava em sua alma.

Entretanto, mesmo com todo seu esforço, ele não achava uma saída. Ele só via um infinito de lápides à sua frente, mas, mesmo assim, ele continuou caminhando.

Seis dias depois, seus pés descalços sangravam, mas ele não sentia mais dor, ou ao menos não se importava mais com ela. Ele simplesmente caminhava, sem se importar com nada a sua volta.

Quinze dias se passaram. A esperança havia fugido de seus olhos, sua alma estava dilacerada, ele sentia que sua natureza, suas virtudes, haviam ficado no caminho. Esquecidas nessa estrada tortuosa ao qual caminhava.

Um mês se passou. Ele não sente mais nada, seu único desejo era a morte, mas sabe que sua imortalidade o impede de realizar esse simples desejo.

Ele finalmente para. Não pela dor ou sofrimento, mas sim porque finalmente ele descobriu onde está. Ele sabe que labirinto é esse e onde ele fica. E sabe que não pode fugir tão fácil assim dele, ninguém pode.

Porque não existem saídas fáceis no Inferno.

Ele senta-se ao pé de uma árvore, suas costas descansam no tronco negro e podre da mesma.

Suspira e encara o horizonte negro à sua frente.

Somente dor é visível em seu olhar, não tem amor ou até mesmo ódio. Simples e puramente dor. Por ter sido tão cego, todas as coisas boas em sua vida foram ceifadas para fora da mesma e, mesmo assim, ele foi um tolo, tentando se enganar, mentindo para si próprio, dizendo que estava tudo bem quando, na verdade, sua vida descia uma ladeira íngreme rumo a esse relicário de sombras, o qual foi aprisionado. A chave perdida em meio à chuva do crepúsculo.

Realmente um tolo. Por pensar que algo em sua vida medíocre pudesse dar certo, por sequer supor que encontraria finalmente o amor.

Esse ceifeiro invisível e onisciente o perseguia escondido nas profundezas de sua alma, vigiando. O ceifeiro que o impedia de ter uma vida normal, sempre o afastando de todos os quais já teve a petulância de amar.

Outro suspiro e ele se levanta.

Seus músculos doem, suas pernas tremem quando ele retoma a caminhada. O frio cortante da noite assolava suas entranhas, começara a nevar e suas roupas desgastadas foram cobertas por uma fina camada de gelo.

Cruzou os braços em frente ao peito para se proteger do frio.
Ele estava mancando e a neve que cobria o chão dificultava ainda mais seu caminhar.

Em sua mente a certeza de que se caísse ali nunca mais levantaria, dormiria eternamente no chão daquele cemitério angelical, sem poder morrer, apenas inconsciente. A morte era um sonho distante demais para ele, mas a inconsciência lhe parecia bastante acolhedora insuportavelmente atraente.

E assim ele continuou, caminhando por dias, pela neve, pisando em pedaços de gelo tão afiados quanto vidro, sentindo o frio corroer seus ossos e sua alma sucumbir em meio ao seu tormento. Até que, finalmente, avistou no horizonte um portão bem antigo, negro, pendendo sobre as dobradiças. Ao se aproximar mais ele pode observar esculturas de Querubim talhadas no metal.

Lentamente ele atravessou o portão, saindo do Cemitério dos Anjos.

Caiu no chão segurando a cabeça, uma enorme agonia o atingindo, sua cabeça latejava e sangue começou a escorrer de seu nariz. Seu organismo estava entrando em choque por todo o esforço a que fora submetido.

Ele contorceu-se no chão, ficando em posição fetal.

Então desmaiou.

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Kael acordou desorientado, ele estava deitado de costas no chão, o céu estava escuro, mas a neve havia desaparecido e as estrelas iluminavam a noite.

Levantou-se e vasculhou o lugar com os olhos, o cemitério desaparecera, só havia uma estrada escura e deserta.

Voltou a caminhar, seguindo o caminho estreito que a estrada tinha, quando ouviu um som estranho, como se cavalos galopassem em sua direção.

O som ficava cada vez mais próximo de si, então ele se virou bem a tempo de ver a carruagem.

Lançou-se para fora da estrada, saindo do caminho da carruagem e caindo no chão com um baque.

A carruagem parou e um homem desceu.

Kael gemeu de dor ao tentar se levantar, provavelmente quebrara uma ou duas costelas, por isso permaneceu deitado.

O homem ajoelhou-se ao seu lado e virou-o para que pudesse ver seu estado.

- O senhor está bem? - perguntou. Kael gemeu em resposta. - Creio que não - concluiu o homem.

- George, traga-o para dentro! Está frio ai fora! - gritou uma voz feminina de dentro da carruagem.

- Sim querida. - disse e virou-se para o garoto semiconsciente no chão a sua frente - Está tudo bem, vou tirá-lo daqui.

George pegou-o, cuidadosamente, no colo e o levou até a carruagem. Colocou-o deitado em um dos assentos e voltou para a condução dos cavalos.

A carruagem voltou a andar.

- Cuide dele Elizabeth - disse uma senhora sentada no assento em frente ao garoto.

Ao seu lado, uma garota, bem mais nova que ela, assentiu tristemente e começou a limpar suas feridas com um pano húmido.

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Kael acordou assustado, a lembrança dos últimos dias assolavam sua mente.

Confuso percebeu que não estava mais na estrada, estava deitado em uma cama e suas feridas não mais o incomodavam.

Ao levantar a mão viu que a mesma estava coberta por bandagens.

- Não faça esforço, por favor - disse uma voz feminina ao seu lado.

Ele virou-se instantaneamente em direção à voz e seus olhos arregalaram-se ao ver a dona da mesma.

Uma jovem de cabelos negros, pele alva, com feições delicadas, como um anjo. Sim, foi exatamente o que ele pensou ao deparar-se com as duas orbes azuis da garota o observando, ela era um anjo.

Sua Ophanim.

- Léia... - murmurou Kael incrédulo, lágrimas ameaçavam cair de seus olhos - É você?

A garota olhou-o confusa.

- Não, me chamo Elizabeth - disse gentilmente.

- Elizabeth... - disse o garoto encarando a parede do quarto em que estava.

- Quem é Léia?

Ele fechou os olhos com força e respirou fundo algumas vezes antes de responder.

- Foi... O amor da minha vida - disse com a voz embargada.

Elizabeth sentou-se na borda da cama.

- O que aconteceu com você?
Ele sorriu tristemente.

- Eu duvido que você vá acreditar em mim se eu contar.

- Não saberemos a não ser que me conte. - disse sorrindo.

Ele fez um leve aceno com a cabeça, concordando.

- Pois bem - começou - Eu sou um Anjo...

- Um o que? - disse Elizabeth cética interrompendo-o.

- Deixe-me continuar, quando eu terminar responderei suas perguntas. - pediu e ela assentiu - Pois bem, eu sou um Anjo...

Então ele lhe contou toda sua história, desde que ele se apaixonou por uma Ophanim proibida, chamada Léia, até seu exílio no Cemitério dos Anjos.

Ao fim da história Elizabeth estava perplexa, não sabia se acreditava ou não no que acabara de ouvir.

- E por que você pensou que eu fosse a Léia? - perguntou.

- Porque você é idêntica a ela. - ele levantou-se com um pouco de dificuldade, ficando sentado em frente a ela. Seus olhares se encontraram, ele passou os dedos carinhosamente em sua bochecha e foi aproximando-se gradativamente dela, até seus lábios se encontrarem.

Elizabeth ficou estática, confusa sobre o que estava acontecendo, sem saber o que fazer. Kael pediu passagem com a língua e ela cedeu, passando os braços em volta de seu pescoço e cedendo ao beijo.

Ele colocou a mão em sua cintura, quando Elizabeth o empurrou, afastando-se dele bruscamente e se se encostando à parede do quarto.

- Eu sou comprometida - disse horrorizada - Não posso.

- Eliza... - começou Kael levantando-se.

- Não! Não se aproxime! - gritou saindo do quarto e batendo a porta atrás de si.

Ele caiu no chão de joelhos. A dor de uma segunda rejeição o corroendo, o olhar de horror que ela tinha o apunhalara profundamente em seu coração.

- Me desculpe. - sussurrou e se arrastou até a janela do quarto, que ficava no segundo andar. Ele a pulou, caindo de costas no chão. E, mesmo com toda a agonia que sentia física e mentalmente, ele saiu dali caminhando.

Após ser abandonado por Elizabeth, Kael não viu mais nenhuma opção a não ser a morte, mas mesmo este pequeno desejo era impossível de ser realizado por sua, agora maldita, imortalidade a qual ele amaldiçoava, pois ela faria com que ele continuasse a sentir esta dor, mas não uma dor física, pois estas já estavam amortizadas em comparação a que ele sentia agora.

A que ele sentiria por toda a eternidade.

Assim como não poderia morrer, Kael resolveu se isolar do mundo e escolheu logo o lugar ao qual ele ficaria mais perto da morte, ele escolheu o antigo cemitério da cidade a qual tinha sido abandonado pelos moradores há décadas, e lá escolheu o telhado um mausoléu que ficava no centro do cemitério como sua nova residência e não importava se chovia, nevava ou ate mesmo fazia sol, ele permanecia ali mesmo que seu corpo fosse ferido depois de alguns anos a dores foram sumindo já que ele se acostumou com ela menos uma que era a dor em seu coração, a dor da rejeição...

Ele passou a ter alucinações com um jardim onde no centro havia uma rosa e esta rosa era a Elizabeth, sendo cuidada por um anjo, a sua Ophanim. E este jardim sendo cercado por um muro alto a qual ele não consegue ultrapassar e quando tenta voar por cima um anjo negro aparece e impede que ele consiga ate que não lhe resta mais força para desafia-lo.

Um dia porem ele sente uma dor diferente e sente que tem que fazer uma pessoa pagar por isso, então sai do cemitério a noite vai à cidade onde encontra esta pessoa. Seu nome era Henrique Suam, e por algum motivo ele sabia que suas dores eram culpa dele e por isso ele pagaria.

Ele o encurralou na rua o fez sofrer por tudo o que estava sofrendo o torturou de uma maneira que nem seria imaginada ate que no final, por misericórdia, o matou lentamente e pôs o corpo na praça da cidade para que quando todos passassem vissem aquele corpo mutilado e soubessem o que acontecia a quem o fazia sofrer.

Passou-se anos e Kael esqueceu como era viver, esqueceu o que era realidade e o que era fantasia, agora ele se perdia em seus próprios pesadelos, mas de uma coisa não mudava ele ficava no topo do mausoléu, a vigiar a lua e numa noite escura de sexta feira treze suas assas se rebelaram por não serem mais usadas e saíram de suas costas causando uma dor tão terrível quanto a que ele sentia no peito que ele não aguentou e soltou um grito, um grito tão horripilante e alto que toda a cidade ouviu, e as pessoas acharam que um novo anjo negro acabava de nascer o que não era de todo mentira.

Anos se passam ate que uma noite ao olhar para lua, como sempre, Kael não percebe que suas dores passaram e que ela começa a sumir. Começa pelas suas pernas que ele para de sentir, depois vem o tronco, os braços, a audição, o paladar e por ultimo a visão e foi ao começar a perder a visão que ele percebe o que aconteceu e não teme pela escuridão que está por vir, na verdade ele agradece e a aceita com gratidão, pois percebe que o céu teve misericórdia dele e lhe concedeu o seu ultimo desejo e ao olhar para a lua, a sua única companheira que via todo o seu sofrimento e sua ultima visão, ele entra na escuridão da morte que agora e possível sem a imortalidade que o deixou.

Em seu lugar aparece uma estatua de pedra formada pelo seu corpo já sem vida que ficou como um guardião do mausoléu a vigiar eternamente a lua.

Muitos anos tinham se passado desde que Elizabeth encontrara aquele estranho que ela não lembrava o nome e nem mesmo o rosto ou ate mesmo o ocorrido, mas ela lembrava que algo aconteceu só não sabia o quê. Ela continuou com a sua vida e estava para se casar com Henrique Suam, seu noivo, até que descobriu que ele a traia e não só isso como a humilhara, ficou muito feliz ao descobrir o seu cadáver mutilado e torturado na praça da cidade no dia seguinte a esta descoberta, mas não foi de todo feliz, pois descobriu que sua mãe estava doente e não lhe sobraria muito mais de vida.

Após anos de sofrimento sua mãe veio a falecer, mas, antes de morrer, fez um estranho pedido. Pediu para ser enterrada no mausoléu da família, que ficava no antigo cemitério, o cemitério que agora diziam ser assombrado por um anjo negro à noite, mas como fora o ultimo desejo de sua mãe assim foi feito.

Ao chegar ao mausoléu ela percebeu um anjo de pedra acima dele, mas o que a assustou foi que ele parecia conhecido e sua posição estranha. Quando saíram já estava ficando escuro e Elizabeth se virou e viu o que o anjo vigiava, pois neste momento a lua acabava de nascer e era isso que o anjo vigiava a lua.

Após muitos anos Elizabeth envelheceu e veio a falecer, mas antes de morrer fez um estranho pedido, um pedido que tinha sido feito anteriormente por sua mãe, ela desejou ser enterrada no antigo mausoléu da família sobre a guarda daquele anjo que a deixava com medo, mas que ao mesmo tempo a trazia a sensação de proteção.

E assim foi feito e, no final, esta foi a sina de Kael, se apaixonar e não ser correspondid. Sofrer todas as tormentas possíveis e não ter um alivio. Morrer esquecido por todos e, mesmo depois de morto, ser guardião daquela que ama, mas sem nunca poder se aproximar dela.

Este é meu destino.

Esta é minha sina.


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Notas finais do capítulo

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