American Horror Story: Dark Circus escrita por Annabel Lee


Capítulo 3
O Show de Tenébres, 1986 - Primeira Parte


Notas iniciais do capítulo

"Um sonhador é aquele que só encontra seu caminho à luz da lua e seu castigo é ver o amanhecer antes do resto do mundo".

Oscar Wilde



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Heaven City - 30 de outubro, 1986.

Maryse nunca tinha visto algo como aquilo.

Mesmo de noite, sob o manto escuro e estrelado do céu de outubro, o rubro daquelas tendas de circo tenebrosas era vivo e chamativo. Nunca um circo aparecia por aquela cidade esquecida por Deus (muito menos na véspera do Halloween!) e, não importa o que acontecesse, ela tinha que visita-lo.

Sentou-se nos degraus de madeira da varanda e continuou encarando-o; lindo, imponente. Suspirou. Sua mãe jamais deixaria que ela saísse quando já havia escurecido. O jeito “selvagem” de May sempre atraiu a desconfiança dela, mesmo sendo sua própria filha.

Ela bateu os pés algumas vezes na madeira, depois enrolou a ponta de sua blusa de xadrez nos dedos magros e então mordeu a língua umas cinco vezes para finalizar. Estava inquieta. Queria sair. Não havia mãe certa que conseguisse contra aqueles impulsos adolescentes doentios e insistentes.

Maryse sabia disso. E sorriu.

Olhou para si mesma. Não sabia se uma calça jeans larga e uma blusa que mais parecia um tabuleiro de damas era um traje apresentável para uma visita ao circo, mas não se importou depois. Apenas faria o seguinte: entraria lá, viria uma ou duas apresentações e sairia como se estivesse com dor de barriga.

Puxou o cabelo loiro para trás e o prendeu em um rabo de cavalo alto. Okay. Nada dentro da moda, mas era um “quebra-galho”.

Olhou para trás, onde a luz do quarto da mãe dela apagara. Dormindo. Ótimo, nada de ruim pode acontecer em míseros cinco minutos.

Maryse pulou dos degraus e seguiu a longa rua de paralelepípedos, sempre olhando para o circo. Deu alguns “boa noite” para os vizinhos, sorriu para cachorros que passavam, olhou para o céu algumas vezes. Sentia-se bem. Nada de arrependimentos ou culpa. Isso era o primeiro sinal de que as coisas dariam certo na sua pequena “fuga”.

Quando passou da padaria do seu tio, Phill, foi notando uma aglomeração de pessoas. O circo estava há alguns metros de distâncias – grande e assustadoramente bonito – e o falatório até seria incômodo se aquela visão não fosse atrativa como era.

– Não é possível! – uma mulher com cabelos crespos e óculos em forma de coração reclamou perto dela – já devem ter fechado isso daí!

– É um circo noturno – alguém explicou, em algum lugar da multidão.

Uma ave piou em algum lugar. Só fez as pessoas reclamarem mais, maltratando os pobres ouvidos de Maryse e dos que continuavam pacificamente calados.

– E esse pássaro? – foi a voz de uma criança.

– Mau agouro é o que eu digo – a voz de um velho (provavelmente o pastor da única Igreja de Heaven City).

– Conversa fiada! – a mesma mulher brandiu.

Maryse revirou os olhos. Talvez tivesse mesmo sido uma má ideia. A fraca iluminação alaranjada só aumentava o calor da noite, juntando-se com o calor corporal de todas aquelas pessoas juntas. May tinha que admitir, porém, que nunca viu uma coisa atrair tanto a atenção de Heaven City! Tinha pessoas de todos os tipos ali: crianças, idosos, pastores, mulheres barraqueiras, nerds calados, deslocados selvagens como ela... Simples e incrível!

– Veio ver o circo? – uma voz reservada e rouca perguntou ao pé do ouvido dela.

Maryse se arrepiou.

Virou-se e viu que havia um homem ali. Tinha, pelo menos, vinte e um anos. Os cabelos eram pretos como carvão, os olhos azuis como um céu no verão e o sorriso era malicioso e fofo ao mesmo tempo.

– Ér... acho que sim – ela respondeu com o cenho franzido.

Ele sorriu mais.

Acha que sim?

Ela olhou para diversos lugares diferentes em um milésimo de segundo, provavelmente tentando sair do foco daqueles olhos azuis incrivelmente intrigantes.

– Quis dizer que sim – ela se explicou, finalmente olhando o rosto dele – vim ver algumas apresentações.

Ele mordeu o lábio inferior. Maryse não deixou de pensar que o gesto parecia... Que palavra usar?

– Só algumas? Dizem que o melhor é o que fica para o final...

O que seria...?

– Talvez – ela deu de ombros – mas minha mãe está me esperando.

O sorriso largo se diminuiu em um meio sorriso malicioso. E ela descobriu.

A palavra era, simples e definitivamente, sexy.

– Compreendo – ele disse, estendendo a mão – meu nome é Louis Cypher. Sou o proprietário do circo.

Maryse teve um ataque de tosses, enquanto apertava a mão dele.

– Perdão, o que disse?

Louis deu um risinho.

– Todo mundo tem essa reação. É por que sou jovem, correto?

– Acho que deve ser – ela riu – eu só tenho dezesseis e bebo vodca, mas ser proprietário de um circo deve ser muito mais louco!

– Certamente que é – fez uma pausa – você não me disse seu nome.

– Oh – ela ruborizou – desculpe. Meu nome é Maryse, mas as pessoas costumam me chamar de May... Hã, deixa pra lá... Meu nome é Maryse Wood. E, hm, pode me chamar do que quiser.

– May é muito bonito, assim como Maryse.

Ela ficou mais vermelha.

– Obrigada. Hm, você...

Um barulho. De ferro rangendo. Talvez portões se abrindo. Maryse esqueceu o que quer que iria dizer para o Louis Perfeição e ficou na ponta dos pés para ver além da multidão de pessoas e maior que o bafafá que acontecia. Os portões de ferro negro que marcavam a fronteira entre o circo e os habitantes de Heaven City se abriram.

Ninguém estava ali para recebê-los.

Ao lado de Louis, e ela ainda não sabia o que ele estava fazendo ao lado dela ao invés de, talvez, na sala de “administração do circo” (se é que existia). Ela deu um passo, depois outro, e outro... Foi sendo arrastada pela vontade vibrante que a fazia seguir o resto da maça de pessoas, um impulso que vinha do fundo de seu peito.

Nem notou quando passou pelos portões. Havia entrado. Só saiu da espécie estranha de transe ao ler a grande placa preta com letras vermelhas na entrada. Dizia: LE CIRQUE DES TENÉBRES.

Maryse era pobre, vivia com a mãe numa cidade praticamente fora do mapa, na escola as únicas matérias que contavam eram de alfabetização e religião; ela não conhecia francês. Não fazia ideia do que aquele nome significava.

Mas a tradução lhe veio aos ouvidos, como que sussurrada.

O Circo do Medo.

Parecia estranho, medonho e até sinistro para um local onde o objetivo é divertir as pessoas... Mesmo com todas as razões, ela não deu um passo para trás. Amava desafios. E aquele grandioso circo vermelho e branco não tinha significado melhor para ela do que isso. Um desafio.

Assim que entrou, procurou um lugar na fileira perto da porta para se sentar. Seria mais fácil para sair de fininho se ficasse por ali. Ao seu lado havia um casal – provavelmente casados – que olhavam um para o outro sorrindo. A mulher parecia elétrica.

E, ela deu por notar, Louis havia sumido.

E quando esse pensamento se formou, tudo ficou escuro.

Uma voz surgiu no breu total.

– Senhoras e senhores...

O Circo do Medo estava, finalmente, pronto para sua apresentação inesquecível.


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Notas finais do capítulo

A Parte 2 virá amanhã, porque está tarde e eu to com soninho ;)

Por volta das 16h, eu postarei, então fiquei calmos!

Ah, também responderei os DIVOOOOS e PERFEITOS comentários de vocês, okay? Só não o fiz antes porque tive que postar um novo capt, considerando que vocês pediram tanto.

Obrigada, gente.