Eny me deu um tapa e tanto, mas não foi o tapa que deixou os cinco dedos da mão dela em meu rosto e sim o tapa que suas palavras me deram. Eny esta certa eu me tornei um ser humano desprezível e agora sei por que estou sendo castigado. Já faz uma semana desde que recebi a noticia do médico, eu estou morrendo. Os médicos não sabem o que tenho, apenas que é rápido e mortal. Meu organismo não consegue absorver as vitaminas e nutrientes necessários para que eu possa continuar vivo e saudável. Meus pais estão em uma viajem de negócios e ainda não sabem e nem tenho a mínima vontade de contar a eles. Não quero que a minha doença seja o único motivo que nos aproximará. Se eles quiserem passar um tempo comigo que não seja por saberem que estou morrendo. Nem um dos meus amigos percebeu que nesses dias andei quieto e calado, apenas continuaram seguindo suas vidas fúteis. Eny esta certa, amigos de verdade teriam percebido algo de estranho comigo.

Quando conheci Eny, tínhamos a mesma idade, onze anos. Ela estava linda, com seu longo cabelo preto, solto, e a brisa o balançando. Sei que parece clichê, como aquelas cenas de romances baratos, mas Eny era a garota mais linda que eu já havia conhecido. Nós não nos desgrudávamos um do outro. Ela sempre foi uma garota impulsiva, fazia tudo o que dava na teia e não media as consequências. Éramos a dupla do mal do bairro. Ela tinha uma irmã doente a Erry. Ela tinha leucemia e morreu quando tínhamos treze anos, dede então Eny se afastou de mim e de todos, trancando-se em seu mundo triste. Sem Eny fiquei sozinho na escola, depois de vê que não teria minha amiga de volta, decidi mudar. Cresci, entrei para o time de basquete e me tornei capitão, levando o time há várias vitorias. Tornei-me popular. Briana, a garota mais gata da escola ficou interessada em mim, e pouco tempo depois começamos a namorar. Como meus pais vivem viajando, minha casa se tornou o ponto perfeito para as melhores festas.

Hoje estava dando mais uma delas, talvez a última. Optei por não tentar qualquer tipo de tratamento. O médico queria contar aos meus pais, mas lhe dei uma boa quantia para que fique de bico fechado, assim espero. Sei que a vida de Eny não é fácil e mereci o tapa. Mas ela também sabe que estou certo. Mas creio que o beijo a machucou mais, eu quis fazer aquilo, quis feri-la. Eu fui o primeiro beijo dela, e isso a deve ter feito lembram não só de nos e nosso tempo de arteiros, mas de Erry, do tempo em que ela estava viva.

Coloquei minhas roupas e desci para encerrar esta festa, que já esta mais encerrada que nunca. Algumas pessoas ainda estão na casa, mesmo sem a música e depois do furacão Eny ter passado.

_Pessoal! A festa esta oficialmente terminada! _Grito do auto da escada.

Assim que mando todo mundo embora, mais expulso do que mando. Fecho as portas, ativo o alarme e me jogo no sofá. Que droga! Essa garota é tão irritante. E devia era te dado uns sacode nela. Sinto algo cai em minha mão. Observo minha mão, é um líquido avermelhado. Mais sangue começa a escorrer pelo meu nariz, parece até que abri uma torneira. Cubro o nariz com a mão, respirando pela boca, em quanto subo escada a cima em direção ao meu quarto. Vou até o banheiro, assoar, lavando o sangue. O sangramento em fim cessa. Assim que saio do banheiro, reparo que a luz do quarto de Eny ainda esta acessa. Essa abusada deve esta fazendo o dever de matemática. Sei que ela e todos pensam que obrigo os nerds a fazerem meus deveres, mas sempre fiz todos. Só uma vez o Kyle, meu amigo, também joga no time. Obrigou o Adrian a fazer meu dever de química. Isso aconteceu apenas uma vez e todos ficaram sabendo, por isso acreditam que ainda faço isso.

A janela do quarto da Eny fica de frente a do meu. Antes, quando éramos amigos, conversávamos escrevendo em pedaços de papeis e mostrávamos um por outro. Uma vez até fizemos telefones de copinhos, lembro que Erry brincou com a gente nesse dia. Ela parecia ter melhorado. Assim que abro as cortinas, do outro lado, vejo Eny chorando. O ar fica preso em meus pulmões, meu coração trava e posso ouvi-lo rachar, como um vidro se quebrando. Esse agora sou eu. Egoísta, me importando apenas com o que quero e com mais ninguém. Eny se vira, me encarando por alguns segundos, antes de fechar as cortinas.

Essa noite eu não consegui dormir. Um filme de péssima qualidade ficou passando em minha mente, contando a história do garoto bad boy. Mas hoje é outro dia, e nada disso importa mais, nem Eny, meus pais ou meu prazo de validade que se aproxima cada vez mais. Vou curtir meus últimos dias como ninguém. Irei aproveitá-los ao máximo. Glória, a nossa empregada chegou cedo, e já esta a limpar a bagunça da festa. Posso escutar o som do aspirador. Tomo um banho e coloco minhas melhores roupas, tenho que andar bem, não é?

_Bom dia Glória! _Cumprimento-a ao descer a escada.

_Bom dia menino Thomas. _Me cumprimenta, como sempre, com um de seus sorrisos maravilhosos.

_Desculpa pela bagunça, juro que assim que voltar te ajudo com a limpeza. Mas nada de contar isso a alguém ou esta demitida. _Digo sério.

_Menino Thomas, se fingindo de levado, quanto não consegue nem esmagar uma flor. _Dar uma de suas gargalhadas, das quais amo ouvir. Sempre brinco com ela, jurando um dia demiti-la. Glória é nossa empregada desde que minha família veio morar aqui.

_Mande essa flor tomar cuidado, não hesitarei em pisá-la caso minha reputação esteja em jogo. _Dou um beijo na testa dela e saio indo direto pra garagem.Em quanto saio com minha moto, vejo Eny mais a frente, andando. Subo na moto, seguindo ao lado de Eny.

_Me atropele de uma vez ou sai do meu lado e vai logo encontrar seus amigos sem cérebro. _Diz mais como um rosnado.

_Bom dia pra você também! Ainda não me decidi, acho que a primeira opção me fará gastar muito tempo, sabe... Sumindo com o seu corpo, limpando o sangue da moto e do chão. Não, dá muito trabalho.

_Se eu fosse filha mesmo do demônio abriria um buraco agora nessa rua, só para te ver cair lá no inferno. _Dar um pequeno sorriso.

_Que pena, mas ainda acho que seja filha do demônio. Ia ser divertido andar de moto no inferno. Bem... Como hoje estou de bom humor, vou te dá uma carona até perto da escola, não estou tão feliz assim para te levar até a escola e correr o risco de ser visto com você. _Ela para, bruscamente.

_Olha aqui! _Diz me encarando.

_Eu prefiro ser atropelada por um ônibus a aceitar essa sua carona.

_Realmente Eny, você precisa de tratamento psiquiátrico. Hoje esta com muitos pensamentos suicidas envolvendo automóveis. Te certeza que tomou seus remedinhos?

_Seu filha d....

_Ou! Eu só estou dizendo pra deixar de ser rabugenta e aceitar a carona, mas se quer ir a pé. Boa sorte na sua caminhada. _Digo colocando o capacete, pronto pra partir.

_Espera! Eu aceito a carona, mas se dizer um ai, se quer, tenho uma lata de spray de pimenta na mochila. _Dou um sorriso, entregando um capacete pra ela. Assim que ela sobe, acelero ao máximo, só para que ela possa se segurar a mim. Paro a moto a um quarteirão, longe da escola.

_Nem um obrigado? _Digo, assim que ela me entrega o capacete.

_Claro, como poderia me esquecer. _Ela fecha a mão, dando um soco bem forte em meu braço. Que tenho que admitir esta doendo.

_Droga Eny! Não pode agradecer como as outras meninas e me dá um beijo? _Tiro o capacete, sorrindo.

_Pode deixar e obrigada por me lembrar do obvio. É claro que sou uma menina.

_Às vezes duvido.

_Não me teste Thomas, ainda mais quando tenho uma lata de spray de pimenta.

_Anda logo com esse beijo. _Faço biquinho. Ela se aproxima, mas ao invés de me dá um selinho ou um beijo decente, ela me morde e na sequencia me recebo um tapa na cara.

_Droga Eny! _Grito, cuspindo o sangue.

_Explica isso pra sua namorada sem cérebro e da próxima vez em que me pedi um beijo te deixo estéril.

_Da próxima vez te deixo vim a pé filha do demônio! E pode apostar que terá volta. _Coloco o capacete indo a toda velocidade para a escola.Essa rabugenta estranha vai ver só. Terá volta.