A Garota do Cabelo Lavanda escrita por Chibieska


Capítulo 29
Capítulo 29


Notas iniciais do capítulo

Faz tempo que eu não apareço por aqui: Sim ou claro? Desculpem a demora, eu tinha meio capítulo pronto, mas o resto não saia de jeito nenhum. A verdade é que eu mesmo me enfiei numa sinuca na história e como não quero apelar para o bom Deus Ex Machina, tá difícil achar argumentos plausíveis para que a história não desande justo nesse ponto.
Enfim, perdoem a enrolação e vamos lá

Tema: Retorno

Boa leitura!



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LA NOCHE - Parte 1

O grupo chegou ao Digital World no mesmo local que no dia anterior. O portal no vilarejo de Coela Beach era o mais próximo da floresta e mesmo assim, eles teriam que andar um bocado.

O pequeno vilarejo já estava mergulhado no silêncio noturno. As construções estavam todas destruídas, mas boa parte dos escombros tinha sido removida. O céu estava anil e bem ao horizonte podia se divisar o resquício de laranja. Ventava, mas não muito e o dia estava frio e sem graça.

O silêncio no vilarejo era assustador, o que fazia cada passo contra o cascalho soar absurdamente alto. Miyako seguia na frente, acompanhada de Hawkmon e Wormmon. Takeru e Hikari vinham logo em seguida acompanho de seus parceiros e Daisuke fechava a fila, com a cara emburrada.

O ruivo estava chateado por ter perdido a liderança e por ter brigado com Miyako, mas sua preocupação com Ken era tão grande que ele não teria forças para contestar as decisões da menina, mesmo que quisesse.

Decisões essas, aliás, que tinham deixado Iori seguro em casa, mesmo com a possibilidade de uma Torre Negra. O menor argumentou e bateu o pé, mas Miyako foi irredutível em sua decisão. Não importava se no final apenas Silphymon tivesse que segurar a bronca, ela não colocaria o mais novo no meio do campo de batalha, apenas para ser algo a mais para se preocupar.

O grupo atravessou rapidamente o vilarejo até atingir a orla da floresta. A débil luz do dia, que tentava em vão, vencer a noite que avançava rápida, ainda iluminava as copas das árvores e reluzia no semblante preocupado de Palmon que os aguardava ali.

“Que bom que vocês chegaram.” A Digimon planta se aproximou. “Apemon está destruindo tudo.”

“Apemon?” Takeru questionou, não se lembrava de ter encontrado com o tipo antes.

“No geral, é um Digimon gentil. Gosta de pregar algumas peças em seus companheiros, mas sempre teve boa índole. Mas este está descontrolado, vários Digimon fugiram da floresta. Disseram que ele está destruindo tudo pelo caminho.” Informou.

“Precisamos nos apressar.” Miyako ajeitou os óculos lançando um olhar para a floresta. “Você tem alguma ideia de onde podemos encontrá-lo?”

“Um grupo de Gomamon disse que o avistaram próximo a um riacho que corre pelo meio da floresta. Não é difícil de encontrar.”

“Certo.” A menina confirmou. “Vamos pessoal.” Anunciou aos amigos e se embrenhou na floresta, acompanhada de Hawkmon, enquanto carregava Wormmon sobre os ombros.

Hikari e Takeru a seguiram, acompanhados de seus Digimon. V-Mon foi logo em seguida, mas Daisuke parou antes de desaparecer na mata fechada e se voltou para Palmon.

“Alguma notícia do Ken?” Mas teve como responda apenas um aceno negativo de cabeça.

O avanço pela floresta foi lento e difícil. O chão estava lamacento, as árvores eram muito próximas umas das outras e grossas raízes serpeavam para fora do solo, fazendo-os tropeçar a cada minuto. As copas densas permitiam o mínimo de luminosidade e a visão podia apenas distinguir contornos e formas.

Não demorou para que em meio a xingamentos e reclamações pudessem ouvir o som da água correndo acelerado. Aumentaram o passo, até se tornar uma corrida e finalmente chegaram a uma clareira na floresta. Ali, onde o riacho dobrava de tamanho e corria menos caudaloso, um gigantesco Apemon balançava seu tacape de osso sobre a cabeça, enquanto uma massa irreconhecível jazia aos seus pés.

Miyako pode divisar um casaco escuro e emaranhado de cabelos negros e o coração parou no meio batida. Ela reconheceria aquele casaco em qualquer lugar, e não era a única. Porque Wormmon saltou dos seus ombros e correu na direção da pessoa caída, gritando o nome de Ken. Apemon girou o tacape e se preparou para desferir um golpe no ser caído aos seus pés. Pela velocidade com que o Digimon inseto avançava o garoto caído não seria o único a ser atingido no ataque. A garota deu um passo a frente, com o Digivice em punho, Hawkmon teria que evoluir muito rápido para impedir que algo acontecesse. Mas antes que a garota pudesse reagir e que o golpe fosse completado, XV-mon cruzou o espaço rapidamente, arremessando seu corpo contra o do símio e o fazendo se chocar contra uma árvore.

Inoue estava tão apreensiva, que nem percebera que Daisuke evoluira seu parceiro e partira para o ataque. Não demorou para que Takeru e ela mesma evoluíssem seus parceiros e dessem suporte ao monstro azulado do líder.

A garota aproveitou que o monstrengo estava afastado, ocupado com o trio alado e correu na direção de Ken. Quando se aproximou, constatou que a despeito da cabeleira negra e do casaco, aquele não era seu namorado. O garoto desconhecido, muito menor e mais jovem do que ela, estava mergulhando em uma poça do próprio sangue e parecia ter vários ossos quebrados.

Wormmon encarava o menino sem entender, aquele não era o seu Ken. Miyako se ajoelhou ao lado do menino, enfiando os joelhos na grama ensanguentada e removeu parte do cabelo do rosto. O maxilar estava fora do lugar, assim como o osso occipital estava afundado no rosto e a despeito de como a face estava arruinada, ele se parecia muito com Hanamizuki Karin.

A veterana se inclinou sobre ele e checou seus sinais vitais. Os dedos se mancharam de um sangue escuro e grosso, mas pode constatar que o menino ainda estava vivo. A respiração era imperceptível e o pulso quase inexistente, mas ainda havia uma pequena centelha de vida a qual o menino desesperadamente se agarrava.

“Miyako-san, você está bem?” A voz fininha de Wormmon se sobrepôs ao som da batalha que se desenrolava há metros dali.

Só então a menina percebera como suas mãos tremiam. Não queria admitir, mas havia tanto sangue que isso começou a apavorá-la. Sua mente tentava arrastá-la para o dia do ataque contra Iori. Em como ela ficara com o garoto ensanguentado deitado em seu colo, vertendo sangue enquanto Takeru dava conta do Digimon descontrolado. Ela havia sido forte e valente daquela vez, mas havia prometido que nunca mais se colocaria em uma situação como aquela.

Mas ali estava Kariya, tingindo a grama de vermelho e colorindo os cabelos negros com o próprio sangue. Era culpa dele mesmo, afinal era ele quem descontrolava os Digimon. Mas mesmo assim, Inoue não desejava tal destino para o garoto apoiado em seus braços.

“Miyako-chan.” Hikari se aproximou dela. A mão instintivamente cobriu os lábios ao ver o garoto apoiado no colo da mais velha.

“Precisamos tirá-lo daqui.” As mãos tremiam e o olhar desviou para Apemon, que se mostrava um páreo duro de derrubar. O tacape de osso girava e balançava em todas as direções, de forma que Aquilamon e seus companheiros não podiam se aproximar muito.

A garota do cabelo lavanda se perguntava quantas vezes o pobre garoto fora atingido por aquele porrete e se surpreendia por ele ainda estar vivo. Kariya era mesmo um lutador, era a segunda vez que entrava em conflito direto com Digimon (a primeira contra o Tyrannomon descontrolado) e ele ainda estava vivo, mesmo que em péssimas condições.

“Eu posso fazer isso.” Yagami ofereceu, se abaixando ao lado da amiga. “Aquilamon está em batalha, precisará do seu apoio e comando. Eu posso levar Kariya de volta ao nosso mundo.”

“Mas...”

“Eu o levarei e volto o mais rápido que puder para ajudar vocês.” Sorriu. Não era um sorriso confiante ou bonito, servia apenas para confirmar suas palavras. “Além disso, você ainda precisa encontrar o Ichijouji-san.”

Fora Inoue quem prometera a Hanamizuki que encontraria e recuperaria o irmão caçula, por isso sentia-se impelida em levar o garoto de volta. Mas Hikari tinha razão, ela precisava dar apoio a seu parceiro na batalha e Kariya podia esperar muito por tratamentos médicos.

“Está certo.” Concordou por fim. “Mas se acontecer algo e precisar de ajudar, nos contate.”

A castanha concordou. Delicadamente pegou Kariya no colo e ajeitou o melhor que pôde. Com um aceno, chamou Tailmon e pediu que esta fosse na frente, abrindo e facilitando a passagem.

Miyako pode ver a amiga se afastando na maior velocidade que conseguia carregando alguém machucado e inconsciente, seguindo a parceira e se afastando do campo de batalha. Torcia para que a menina chegasse até o portal sem maiores percalços.

“Miyako-san, onde está o Ken-chan?” Wormmon questionou ao ver a garota se levantar. Grande parte da roupa e as mãos estavam impregnadas com o sangue de Kariya, mas a veterana não se limpou.

“Eu não sei.” Respondeu sombriamente. E realmente não sabia. Se o garoto Hanamizuki estava com o casaco de Ichijouji isso significava que em algum momento eles estiveram juntos. Mas não seria da índole de Ken abandonar um garoto tão pequeno em uma floresta como aquelas, muito menos deixá-lo para morrer. Se Ken não havia feito nada para impedir o ataque de Apemon, isso poderia significar que ele estava em condições piores do Kariya, talvez até mesmo morto. E um frio percorreu sua espinha diante do pensamento. “Mas agora, temos que dar um jeito nesse Digimon descontrolado.” Respondeu mais para si mesmo, tentando afastar os pensamentos ruins.

=8=

Já estava completamente escuro, a noite havia caído e a clareira na floresta era iluminada por uma enorme lua cheia. Miyako não sabia há quanto tempo estavam lutando, mas a batalha contra Apemon estava terrivelmente demorada.

O símio conseguia manter o trio alado a distância e nenhum dos golpes tinha surtido muito efeito. XV-mon, Angemon e Aquilamon já mostravam sinais de cansaço e nenhum dos planos que Takeru ou Inoue sugeriram surtiu algum efeito. Talvez eles devessem esperar a energia do Digimon acabar, para que naturalmente ele voltasse ao normal, mas isso poderia demorar um dia todo.

“Temos de dar um jeito de tirar aquele tacape dele.” Takeru gritou para os outros. Apemon o usava para manter os Digimon distantes, o usava para repelir golpes e lançá-lo, como uma espécie de bumerangue, para tentar derrubar algum dos monstrinhos.

“Eu sei.” Daisuke gritou em resposta. Estava terrivelmente mal-humorado. Queria que aquela luta fosse rápida para poderem ir atrás do Ken, mas o símio era resistente e não desistia. Nenhuma ideia de como derrubar o bicho lhe surgia e todas as outras que haviam tentado tinham sido queimados a toa.

“Que tal uma formação em V, o da frente funciona como chamariz enquanto os de trás atacam.” Gritou o loiro, mas mal teve tempo de por o plano em ação. Apemon lançou o osso e atingiu Angemon bem no meio do peito. O Digimon caiu como uma mosca atingida por um jato de inseticida.

“Aquilamon, Blast Ring.” A menina ordenou, um pouco mais afastada. Ela se mantinha longe para poder cuidar de Wormmon.

Seu parceiro fez o ataque, mas este foi repelido pelo tacape de osso. Takeru tinha razão. Eles não conseguiriam nada enquanto Apemon não se livrasse do objeto. O que eles poderiam fazer?

“Parece que os vermes não conseguem dar conta de um Digimon tão patético.” Uma voz ecoou pela clareira. Miyako a reconheceu de imediato e se virou na direção oposta da batalha, apenas para ver Ichijouji Ken sair do emaranhado de árvores.

Ele estava sem o casaco e o cabelo estava displicentemente bagunçado, como ele usava como Kaiser. As mãos nos bolsos, o olhar cínico o sorriso rasgado.

“Ken-chan.” Wormmon correu na direção do parceiro com entusiasmo. “Eu estava preocupado com você...” Mas a frase foi morrendo ao se aproximar e ver que seu parceiro não mostrava metade do entusiasmo.

“O que aconteceu com o seu cabelo?” Miyako balbuciou débil. Daisuke e Takeru a distância assistiam a cena, mas estavam ocupados tentando derrotar Apemon.

“Você não gosta?” E puxou uma mecha com a mão.

“Você só usava o cabelo desse jeito quando...” Mas não teve coragem de terminar, não queria citar o Kaiser.

Miyako não era ingênua ou alienada. Nesses últimos meses, enquanto ela e Ken não conseguiam se acertar, ela via vários vislumbres do Kaiser no garoto. No meio de uma discussão, um lampejo no olhar, algo que por muitas vezes desconfiava que nem o próprio se dava conta. Mas mesmo vendo-o ali, acreditava que Ken nunca o deixaria voltar à tona.

“Você não deveria ficar fazendo essa cara estúpida. Deveria estar preocupada com a surra que aquele verme que chama de parceiro está tomando.” Completou ao ver o olhar confuso que a menina lhe lançava.

“Ken-chan.” Wormmon se fez ouvir.

Pela primeira vez, Kaiser pareceu dar atenção ao inseto aos seus pés. Sorriu de soslaio e se abaixou, até ficar na altura do Digimon.

“Wormmon, ah? Ele põe muitas expectativas em você...” O Digimon não entendeu. “Talvez não esteja de todo errado. Vejamos quão útil você pode ser.”

“Do que está falando?” Miyako interviu, mas foi prontamente abandonada.

O Kaiser se levantou e tirou o Digivice do bolso, girando o dispositivo entre os dedos.

“Lealdade. É uma das suas maiores características, não? Se eu ordenar para que você evolua, se tornará o Stingmon de sempre ou se descontrolará?”

“Ken-chan...”

“Então, você está comigo?” Um enorme sorriso sugestivo surgiu no rosto do adolescente.

Wormmon encarou o parceiro. Conhecia Ken melhor do que ninguém. Conhecia seu sorriso doce, seu jeito delicado, por vezes até tímido e receoso. Sabia como ele preocupado com o grupo e extremamente bondoso. Mas também conhecia aquele sorriso largo, aquele olhar maníaco. Aquela entonação na voz que dava até arrepios, conhecia seu egoísmo e sua crueldade. Sabia que Ken podia reunir dentro de si os dois lados da mesma moeda.

“Sim, eu estou com você, Ken-chan.” Fez questão de enfatizar o nome do parceiro.

“Wormmon, não!” Inoue gritou, não podia acreditar no que estava presenciando.

“Eu estive com você por todo aquele tempo que você só me maltratava e nunca sai do seu lado, mesmo quando você me pediu isso. Por que eu te deixaria agora, que você está me pedindo para ficar?” A voz fininha proferiu.

Sabia que era Kaiser, sabia que aquilo seria um erro, sabia que aceitar o pior lado de seu parceiro poderia ser um caminho sem volta. Mas era o Ken, seu Ken e ele nunca iria abandoná-lo.

“Sábia escolha.” E girou o Digivice na mão.

Uma luz forte e intensa envolveu o inseto e segundos depois, Stingmon apareceu majestoso.

“Bem, nada mal.” Kaiser constatou com um olhar comprido para o Digimon. “Stingmon, acabe com aquele Apemon.”

O Digimon pareceu vacilar diante da ordem seca e dura, mas após um olhar significativo de Kaiser, o inseto alçou voo e partiu para o campo de batalha.

“Moon Shooter.” Miyako não conhecia esse golpe, não se lembrava de ter visto Ken usá-lo uma única vez.

Se voltou para Apemon e viu Stingmon voar sobre ele, em círculos, com grande velocidade. O ar começou a distorcer e o cheiro de fumaça impregnou o ambiente. Não demorou que o vórtice se incendiasse, prendendo o símio em uma grande coluna de fogo.

Apemon gritou desesperadamente de forma apavorante, enquanto Stingmon finalizava o golpe.

“Pare com isso!” A menina se voltou para o gênio. Aquilo não era apenas um golpe para tirá-lo de combate, mas uma tortura lancinante. “Pare.”

Kaiser não mostrou reação, ficou com as mãos enfiadas no bolso, vendo a cena que desenrolava.

Stingmon finalizou o golpe e a coluna de fogo desapareceu. As árvores próximas estavam chamuscadas, mas não havia mais sinal algum do Apemon. Era como se ele tivesse sido reduzido a cinzas em uma velocidade assombrosa e essas cinzas se decomposto tão rápido que não deixaram vestígio nenhum. Quase como algo passar do estado sólido para o gasoso sem o menor esforço.

Takaishi e Motomiya ficaram encarando o local chamuscado, num misto de sentimentos indecifráveis. Mas antes que o cérebro de Takeru pudesse processar todos os acontecimentos daquele último minuto, Daisuke se pôs a correr na direção de Inoue.

“Ken, que bom que você está bem.” Falava animado.

Emparelhou com a menina e não entendeu porque seu semblante permanecia duro e impassível. Só então percebeu o sorriso rasgado no rosto do amigo e o cabelo atípico.

“Ken...?”

“Eu tenho muitos planos para o Digital World, vocês devem imaginar.” Kaiser começou dando um passo a frente. “Mas definitivamente, não estou a fim de interrupções e sei que vocês serão uma pedra no meu sapato, então... Stingmon, acabe com todos eles.” A voz ecoou pela clareira.

O trio alado se virou para o companheiro, que flutuava alguns metros acima, na esperança de vê-lo recusar a ordem.

“Eu sinto muito.” A voz insectoide lamentou. “Mas eu não posso virar as costas para o Ken.”


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Notas finais do capítulo

N/T: La Noche dona Chibieska? Sim, eu não curto nomes não nacionais, mas eu estava revendo Bleach e encanei com o Las Noches, o castelo do Aizen. Mas como a história se passa numa noite só, fica no singular.

Kaiser is back!!!! Não me matem por isso.

Comentários, críticas, sugestões, teorias da conspiração, receitas fáceis de bolo, são muito bem-vindos.