In Memory escrita por Peter
Apertada.
Sem dúvida alguma a gravata estava apertada, qual era o problema da minha mãe?
O salão ao lado do cemitério não poderia estar mais melancólico, afinal, um corpo estava sendo velado. De quem é o corpo? Bem, é difícil falar. Claire era uma pessoa intrigante. Muitas vezes fechada, com tantos mistérios, conseguia me prender ao ler suas poesias favoritas. E seu sorriso, ah! O sorriso...
Afastei a gravata com os dedos mais uma vez. Era um dia quente, de sol forte. Parecia que o universo estava alegre com a morte dela. Ao esperar a fila de pessoas que prestavam seus pêsames para a família de Claire, pelo menos o que sobrou dela, pude ver pela janela a minha esquerda que pássaros cantavam, borboletas voavam entre as flores das sepulturas e pessoas passavam em frente ao portão do cemitério sem ao menos olhar para o lado, como se não se importassem. E porque deveriam? O salão estava cheio de pessoas que nem eu mesmo sabia existir na vida de Claire, quiçá se importar com ela. Mas agora todos choravam. Todos soluçavam. Todos lamentavam e sentiam muito pela perda da Senhora Verna, avó de Claire. Minha família e eu seguimos salão adentro. Sra. Verna quase não conseguia falar. Não sei como seria sua vida a partir de agora, sem a neta, sem o marido.
Meus pais a cumprimentaram com beijos no rosto e palavras consoladoras.
- Ah! Querido, você veio também – Disse Verna esticando os braços para me abraçar. Sua maquiagem estava borrada e ela segurava um lenço azul bebe encharcado na mão direita. Abaixei-me para abraça-la.
- Sra. Verna, eu sinto muito, sinto muito mesmo – Fechei os olhos. Não sabia o que dizer, exatamente. Mas acho que ninguém sabe o que dizer em situações de pós-morte.
Ela me soltou e dei um breve sorriso em agradecimento, e então dirigiu o olhar para o caixão ao lado. Estava aberto. Desatou a chorar.
Respirei fundo. Três passos foram o suficiente.
Claire estava exatamente como eu imaginara, porém um pouco mais inchada. Os lábios em um tom de violeta, uma tentativa falha de esconder o roxo causado pela pressão do sangue. Puseram-na com um vestido negro que usava para suas sessões de fotos góticas pessoas. O fotógrafo? Eu.
O salão já estava esvaziando-se, em minutos ela seria enterrada. Pude ver, mais ao longe, um parente que já não me lembrava do nome, conversar com os funcionários da funerária para fecharem o caixão.
O calor ainda incomodava, lentamente, algumas gotas de suor começam a aparecer em minha testa. Passei a mão para limpá-las. Maldito seja este animado sol.
Meu pai deu um passo à frente:
- Harold? – Então esse era o nome do parente. – Quer ajuda com isso? – Papai gesticulou para a tampa do caixão.
Harold apenas assentiu. Os dois levantaram do chão a tampa marrom envernizada do caixão e baixaram com dificuldade sobre Claire. Dei uma última espiada. Os olhos começando a arder. Não. Não posso. Contive-me. Alívio. Nenhuma lágrima, graças aos céus.
Fixei o olhar no caixão fechado sendo carregado e a multidão de pessoas que seguiam a marcha dolorosa da despedida. Depois de alguns metros à frente e eles a desciam cova adentro. Rosas vermelhas, brancas, azuis e amarelas eram jogadas no buraco. Gritos desnecessários, suspiros falsos, hipocrisia descontrolada e descarada. Senhora Verna já não ficava mais em pé. Minha mãe já não abria os olhos. Meu pai sem saber o que dizer. E eu, bem, eu já não podia mais ver.
Então, adeus, Claire.
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