Let Her Go escrita por Nancy Boy


Capítulo 1
Capítulo Único.


Notas iniciais do capítulo

Surpresinha no fim, coisa boba, mas não quero falar antes da hora -q



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Eu estava ficando louca. Mas não do jeito certo.

Absolutamente não do jeito certo.

A transformação de Riley era visível. Durante o resto do primeiro dia, nós nos escondemos dos militares e de outros possíveis infectados em um prédio dois quarteirões longe do shopping, mais um local de que Riley teve conhecimento através dos Vagalumes.

Nós nos deitamos sobre caixas de papelão e ficamos em silêncio. E incrivelmente, estava tudo bem calmo.

Já consegue sentir alguma coisa? — ela perguntara.

Não sei... você consegue?

Não sei. Como a gente sabe se estamos ficando piradas ou só assustadas?

Eu suspirei, sem responder por um momento. Então senti a mão dela segurar a minha, e sorri.

Tem diferença? — acabei por falar, ainda encarando o teto. — No fundo, acho que os infectados só estão assustados.

Foi a vez dela de suspirar.

É, e logo seremos como eles.

Apertei a mão dela e me virei, encontrando-a já olhando para mim.

O que quer fazer até lá?

Sei lá, quer dar uns amassos?

Riley! — eu ri, corando imediatamente e desviando o olhar.

Que foi, uma infectada é muito nojenta pra você? — ela sorria abertamente, tentando me fazer fitá-la de novo. — Prometo que tento não babar.

Eu ri de novo e a empurrei de leve, mas ela voltou para a posiçao inicial, e fez uma forcinha para ficar mais perto. Lentamente, eu fiquei em silêncio, e ela também.

Foi ela quem começou, dessa vez. Aproximou o rosto devagar, mas eu já havia fechado os olhos. Senti os lábios dela sobre os meus novamente, e era melhor do que a primeira vez, mesmo que ainda fosse só um selinho. Sentia uma de suas mãos sobre o meu ombro, e um arrepio percorreu minha coluna.

Então ela começou a chorar.

Eu não me lembrava de ter visto Riley chorar antes, e ela era bem mais contida do que eu. Só soube do que estava acontecendo quando senti o gosto salgado na minha boca, e me afastei para vê-la virando-se de costas.

Hey... — murmurei, aproximando-me de novo e abraçando-a de costas, só um pouco. — Que foi?

Ela deu uma risada curta e seca, e eu percebi o quão estúpida a pergunta saiu.

Por que você tem que ser tão... você? — ela perguntou, sua voz embargada, mas relativamente firme.

Não consigo ser outra pessoa. Eu sei, é chocante.

Ha, ha. — ela se virou e me encarou de baixo, comigo ainda flutuando sobre ela. Seus olhos ganharam um tom sério, assim como sua voz. — Não, é sério. Você é a melhor amiga que eu poderia querer, Ellie. Isso... isso não é justo com você...

Hey, hey — eu a cortei, levando uma mão para seu rosto, para limpar as lágrimas que haviam caído. — Isso não é justo com ninguém. Merda, Riley, olha a porra de mundo que a gente tá! Não é nenhuma surpresa que isso aconteça com a gente.

Ela sorriu, triste.

Eu sei. Eu só estou puta.

Somo duas, companheira.

Eu a observei por mais alguns segundos, e então caí de volta no papelão e fechei os olhos. Senti sua mão se entrelaçando com a minha mais uma vez, e acho que tive a melhor noite de sono que poderia ter, naquelas condições.

Foi aí que tudo começou a desmoronar.

No dia seguinte, acordei e vi Riley em frente à janela, aparentemente imóvel. O sol fazia com que eu só pudesse ver seu contorno, e eu ainda estava atordoada pelo sono.

Riley, sai daí, algum militar pode te ver — falei, emendando em um bocejo. Mas ela não se moveu; ou, pelo menos, não muito. Pude perceber que sua mão estava tremendo, os dedos se fechando e abrindo levemente. Levantei-me, devagar. — Riley?

Os dedos pararam de se mexer, e ela virou. Dei um passo para trás. Foi algo automático ao ver seus olhos, mas tão rápido quanto fiz isso, me arrependi. Porque de repente seus olhos voltaram ao normal, e ela era Riley de novo.

Ela apenas balançou a cabeça.

Vamos, vamos mais para os fundos antes que nos achem.

Eu assenti, pensando em pegar minha mochila, e então me lembrando de que não estava mais comigo. Deixei que ela fosse na frente e a segui, imaginando quanto tempo demoraria para aquilo acontecer comigo.

O tempo passava e ficava cada vez mais claro que a minha hora não iria chegar.

Riley se isolou em um canto da cozinha onde nos enfiamos, repetindo mais e mais vezes o comportamento que eu vira perto da janela. Quando eu a chamava, ela parecia perdida por alguns segundos antes de me responder. Uma vez, mais para o fim da tarde, pude jurar que ouvi um gemido baixo vindo dela. Senti vontade de vomitar, gritar, morrer, tudo ao mesmo tempo. Ela estava sofrendo. E eu não.

Por que não? Por que não?

Ela percebeu isso naquela noite. Em mais alguns preciosos momentos de lucidez, ela me encarou avidamente por vários segundos antes de me entregar sua arma.

Whoa, whoa — eu falei, sem querer aceitar. — O que pensa que está fazendo?

Te protegendo. Anda, pega.

Pra quê? Eu não vou precisar disso, e eu nem sei usar.

É simples — ela falou, virando novamente a pistola para me explicar o que fazer. — Você destrava aqui, e para trocar a munição é assim... você pode acabar achando alguma depois. Para atirar, bem, acho que você sabe apertar um gatilho.

Riley! — falei mais alto, assustada por um segundo pela forma irritada como ela me olhou. — Eu não vou precisar disso! Nenhuma de nós vai, joga isso fora, eu...

Ellie, deixa de ser idiota. Olha pra você.

Eu engoli em seco. Não queria ter essa conversa. Não queria acreditar nisso.

Você está intacta — ela continuou, a voz ganhando um tom diferente, meio nervoso, meio divertido... meio louco. — Não sei, talvez...

Talvez o quê?

Talvez você seja imune.

Eu ri. Literalmente, ri.

Você tá brincando? Não existem imunes. Só está demorando mais comigo, só isso!

Riley sacudiu a cabeça e me empurrou a arma, de forma que tive que pegá-la.

Não importa. Eu só quero que você me prometa.

Eu não gostava do rumo que isso estava tomando.

Prometer o quê?

Que vai fazer o que eu disse. Que vai lutar.

Riley se aproximou, rápido, o que me assustou um pouco, mas logo voltou ao normal. Então levantou a mão e empurrou um pouco do meu cabelo para trás. Sua voz ficou mais baixa, e eu quase consegui esquecer que ela já não era completamente a mesma Riley de antes.

Prometa que vai lutar. Que vai sobreviver, encontrar algo pelo qual viver, essas coisas todas. Prometa que não vai desistir. Mesmo que...

... mesmo que o quê?

Mesmo que precise usar isso.

Ela apontou com os olhos para a arma, e não precisou falar mais nada.

Eu estava decidida. Não, não e não. Eu não iria fazer aquilo, não...

Mas será que eu realmente poderia ser imune? Será que Riley poderia realmente me matar?

Os pensamentos me inundaram, e continuaram assim durante o resto da noite. Eu consegui dormir, de algum jeito, apesar de todo o medo, frio e fome.

Mas acordei antes do amanhecer, pelos barulhos mais desagradáveis que eu poderia ouvir.

A respiração forte. O som agudo e molhado vindo da garganta. O gemido prolongado e perto, perto demais.

Eu me virei, e ela estava lá. A arma estava comigo, e ela já a tinha deixado preparada.

Eu não podia. Eu não podia.

Ela viu minha movimentação. Por um segundo, não fez nada, e eu achei que ainda tínhamos algum tempo.

Mas seus olhos a traíram, e sua boca soltou o som que provavelmente me atormentará pelo resto da vida: mais um gemido, quase igual ao anterior, mas agora era uma mistura de loucura e de dor, de fraqueza e de força, de infectado e de humano. E ele dizia Ellie.

Eu não sei o que me fez atirar. Se foi quando ela correu, se foi ouvir meu nome sendo pronunciado daquela forma, se foi sem querer. Mas a questão é que eu atirei.

Foi muito rápido, e eu levei algum tempo para perceber que ela estava jogada no chão, sangrando, sem conseguir respirar, ou falar, ou viver.

Engatinhei para perto dela, sentindo o choro entalando minha garganta, me deixando quase tão incapacitada quando ela. Seus olhos voltaram ao normal, nesses últimos momentos. Eu sabia que era ela quem estava ali. E não tenho certeza, mas talvez... talvez ela tenha tentado sorrir.

Eu não saí de perto do seu corpo, e nunca desejei tanto ser um também. Mas não havia mais balas. Não sei o que eu faria se houvesse.

Sinceramente, eu não ligava mais para nada.

Os militares me acharam por causa do tiro, e provavelmente por causa dos meus gritos, também. Eu não me importei em ser arrastada de volta para meu quarto, nem com as punições por ter fugido. Mal sabia eu que logo Marlene iria me buscar, e que toda a minha vida ganharia um novo sentido.

Porque, ali, naquela hora, não havia sentido algum.

Você entende agora, Joel? Você entende o que eu perdi? O que poderia ter sido? Você entende minha raiva?

Você entende que, se eu estou viva até agora, é por culpa daquela garota?

Ok, eu sei, todos perdemos alguém. Eu não sou especial, tenho certeza disso agora. Mas ela era. Riley era. E é por isso que é tão importante para mim fazer algo com o que me sobrou.

Se eu tiver de passar por tudo aquilo que passamos de novo, Joel, eu vou passar. Mas eu preciso de você lá comigo, porque você é a minha razão agora, você é o cumprimento da promessa que eu fiz para Riley.

Você me promete também, Joel?

Promete que vai lutar?


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Notas finais do capítulo

So, era a Ellie contando pro Joel (essa é a surpresa, ahn). Imagine que ela contou tudo que aconteceu no DLC, e agora estava dizendo como foi depois. Tudo pra fazer o Joel se sentir mais culpado ♥ -q
Espero que tenham gostado ;-;