Sunday Bloody Sunday escrita por Sallich


Capítulo 1
One shot




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O vento gelado arrepiou suas mãos e pernas nuas enquanto ela tentava se aquecer no meio da noite. Por mais de uma vez ela pensou em procurar alguém para sentir um ultimo calor. O pensamento de ter algum calor evocou um profundo sentimento dentro dela e fez seus olhos brilharem, mas por mais que ela quisesse ficar aquecida, ela não iria levantar dali.

 

HOW LONG, HOW LONG MUST WE SING THIS SONG?

HOW LONG? TONIGHT WE CAN BE AS ONE

 

O frio da noite acariciou seu corpo e enviou outro calafrio espinha abaixo o que a fez se encolher em posição fetal, lutando para reter seu próprio calor corporal. Isso não era novidade pra ela, já havia enfrentado noites piores, mas essa noite ela não sabia se iria vencer a natureza e se preservar. Estava encharcada em suor e havia gotas de sangue esparramadas por toda sua saia puída. Ela não havia comido nada o dia todo e ardia em febre. Tentava fazer o melhor que podia para não ficar inconsciente, pois temia não mais tornar a acordar. Tentou lembrar de bons momentos, mas falhou em lembrar de algum. Houve algum em sua curta vida vivida?

 

BROKEN BOTTLES UNDER CHILDREN´S FEET

BODIES STREWN ACROSS A DEAD END STREET

 

Ela nasceu na pobreza, alcoolismo e prostituição. Desde quando ela podia lembrar sempre houve um fedor de suor e cigarro anexado a suas roupas e tudo ao redor dela. Sua mãe foi uma prostituta que a acusava de tê-la feito perder cinco preciosos meses de seu emprego.

 

Nikos não tivesse sido tão “bom” quanto era, Amarantha teria nascido e ficado no meio da estrada com lama e sujeira sobre seu corpinho nu de bebe. Ninguém no "abrigo" tinha bebês. Precauções tinham de ser tomadas para garantir que não haveria bocas extras para se alimentar, mas às vezes as precauções falhavam e o resultado foi ela. Ela sempre deveria ser grata a Nikos, sua mãe lhe dizia, pois sem ele elas teriam morrido de fome algumas vezes durante esses anos.

 

BUT I WON´T HEED THE BATTLE CALL

IT PUTS MY BACK UP,

PUTS MY BACK UP AGAINST THE WALL

 

Aos cinco anos ela sabia cozinhar, lavar os pratos e lavar roupa. Ela veria homens entrando no quarto de sua mãe toda noite, mas pela manhã eles já teriam ido embora. Às vezes ela via hematomas no corpo de sua mãe, assustou na primeira vez que percebeu. Agarrou-se a ela e chorou, pensando que algo terrível tinha acontecido com sua mãe.

 

Em resposta, sua mãe agarrou seu braço e a empurrou para longe e lhe disse para crescer. A vida era dura e arranhões inevitáveis se elas queriam ter comida em sua mesa.

 

SUNDAY BLOODY SUNDAY

SUNDAY BLOODY SUNDAY

 

Amarantha nunca mais tentou abraçar sua mãe. Às vezes havia noites que ela tinha pesadelos e queria correr para sua mãe conforta-la. Um dia o medo se tornou insuportável e ela não pode evitar ir ao quarto de sua mãe. O que ela viu ficou impresso em sua mente apenas lhe deu novos pesadelos.

 

Sua mãe estava amarrada à cama, nua, e havia um ancião nu a torturando e a chicoteando. Amy ficou tão impressionada que ela gritou para o velho parar de torturar sua mãe, apenas para ser maltratada pela própria. Amy não recebeu nada para comer no dia seguinte

 

Cada erro merece uma punição, sua mãe dizia...

 

então punida ela foi!

 

AND THE BATTLE´S JUST BEGUN

THERE´S MANY LOST, BUT TELL ME WHO HAS WON?

 

Quando ela tinha sete anos recebeu um golpe direto no queixo. Acordou aquela manhã e continuou a preparar o café da manhã para todos quando ouviu sirenes se aproximando e imaginou o que teria acontecido.

 

Ouvir sirenes ali não era grande coisa: alguém sempre era baleado, espancado ou esfaqueado. Quando a ambulância parou na frente da sua casa ela não tremeu, era bastante comum alguém de lá ficar ferido ou ter overdose e era levado para o hospital. Mas o que ela viu a chocou. Derrubou tudo que havia em suas mãos e correu para fora quando viu o corpo de sua mãe carregado para a ambulância. O ultimo cliente daquela noite havia batido tão forte nela que ela desmaiara. Como ele saiu sem dizer nada a ninguém, não saberia dizer quanto tempo ela ficou ali sangrando.

 

 

THE TRENCHES DUG WITHIN OUR HEARTS

AND MOTHER´S CHILDREN, BROTHERS,SISTERS FROM APART

 

Nikos empurrou Amy para fora do caminho e disse a ela para esperar enquanto levava sua mãe ao hospital. A menina assentiu, voltou para dentro e esperou. Esperou e esperou. Cada segundo parecia cobrar o preço de suas unhas. Pensamentos miseráveis correram por sua cabecinha enquanto ela esperava por noticias, mas se passaram horas e ninguém a informou de nada. Estava quase completamente escuro lá fora quando Nikos voltou, mas ele nada lhe disse. Pediu por chá e pão e como uma menina obediente, ela assim o providenciou. Esperou pacientemente enquanto Nikos comia.

 

SUNDAY BLOODY SUNDAY

SUNDAY BLOODY SUNDAY

 

-O que pretende fazer agora? – ele perguntou enquanto mastigava o pão.

 

-Como assim o que eu pretendo fazer? Mamãe vai voltar e nós vamos continuar como éramos – respondeu sua voz aguda e infantil.

 

-Sua mãe tinha 12 quando começou esse negócio, mas aqueles eram outros tempos. Você quer começar? O olhar de Nikos não deixou o rosto dela por um instante sequer.

 

-Eu nunca vou fazer parte desse mundo sujo, eu vou embora desse lugar tão logo quanto eu puder. – Seu tom de voz tornara-se levemente exaltado.

 

-Então acho melhor você fazer as trouxas, docinho. - Nikos pegou um palito-de-dente e começou a cutucar seu dente careado.

 

 

-Do que está falando? Como está minha mãe? Por que não me diz nada? – ela fez o que pode para não gritar com ele. Esforçou-se quase desumanamente para ser educada e gentil.

 

 

-Ela está morta, docinho. O filho da puta bateu nela e a deixou inconsciente para sangrar até a morte. A pressão sanguínea não era exatamente boa, então a perda de sangue não ajudou. – Dizia com tanta naturalidade, como se estivesse falando de um pedaço de pão que queimou na chapa, ou um macarrão que passou do ponto... Parecia falar sobre qualquer coisa, menos sobre a mãe de Amy...

 

HOW LONG, HOW LONG MUST WE SING THIS SONG?

HOW LONG? TONIGHT WE CAN BE AS ONE.

TONIGHT, TONIGHT

 

Amarantha não pode acreditar em seus ouvidos. Não pode acreditar que aquele homem estava lhe dizendo que sua mãe estava morta. Ela nunca mais iria ser capaz de falar com a sua mãe ou sentir a mãe dela quando ela penteava o cabelo de Amy às vezes. Ela nunca mais olharia naqueles olhos de novo. Nunca mais teria a oportunidade de dizer a sua mãe que a amava não importasse o que acontecesse. Sua fantasia de sua mãe um dia lhe dizer o quanto a amava jamais se tornaria verdade...

 

A única pessoa que ela amou nesse mundo não existia mais!

 

SUNDAY BLOODY SUNDAY

SUNDAY BLOODY SUNDAY

 

-Onde está o corpo? – Não havia tremor na sua voz ou lagrimas em seus olhos... Ela nem sequer importou-se com o tom de voz que dirigia aquele homem.

-Bostinha cabeça dura você, hein? – Disse Nikos ainda entretido com o palito de dente – Doado para o hospital. Quem iria pagar pela cremação? Por acaso a madeira iria caminhar sozinha da floresta até aqui e pedir para ser queimada em prol de sua mãe vadia? – Seu tom de voz era tão frio...

 

Foi tudo que ela pode agüentar. Sua mãe serviu – lhe, humilhou-se, se escravizou por esse homem que agora falava da sua morte tão levianamente. Ele estava comendo enquanto falava sobre sua mãe sangrar até morrer pelo amor de Deus!

 

WIPE THE TEARS FROM OUR EYES

WIPE YOUR TEARS AWAY

WIPE YOUR BLOODSHOT EYES

 

Fúria.

 

 Como ela nunca havia sentido antes tomou conta de se cegou seus olhos.

 

 Ela alcançou uma faca e talhou um grande C no rosto de Nikos, mas ela não foi rápida o bastante para causar algum dano sério, ele era grande e rápido demais para uma garotinha. Ele a agarrou pelo pescoço e a arrastou para o quarto dele sem esforço, a atirou na cama e começou a espancá-la. Cada golpe seu mundo parecia ficar mais e mais dormente até ela não sentir mais nada.

 

Absolutamente nada.

 

Tudo que ela pode ver eram os olhos de sua mãe um de seus raros sorrisos. Sua mãe havia partido e ela estava sozinha nesse mundo. Ela não sabe dizer quando Nikos arrancou suas roupas. Ela não podia ver nada, sentir nada exceto por alguma coisa a esfaqueando por dentro.

 

SUNDAY BLOODY SUNDAY

SUNDAY BLOODY SUNDAY

 

A dor a cegou completamente e eventualmente ela perdeu a consciência até escorregar para um mundo de sonhos. Sonhos sobre sua mãe sorrir para ela e dizer que a amava. Sonhos sobre sua mãe a levar ao parque ou ao shopping e lhe comprar roupas. Sonhos sobre o amor infinito. Sonhos sobre o que ela nunca teve e nunca teria!

 

AND IT´S TRUE WE ARE IMMUNE

WHEN FACT IS FICTION AND T.V. IS REALITY

 

Quando ela acordou na manhã seguinte, estava deitada no parque sozinha com sangue esparramado por tudo que sobrara de suas roupas. Ela tentou levantar e caminhar, mas suas pernas não eram fortes o suficiente. Seu corpo foi engolfado pela febre e encharcado em suor. Ela passou o dia alternando entre o sono e a consciência, esperando por alguém vira salva-la...

 

Ninguém veio.

 

Sua mãe poderia ter ajudado, mas ela não existia mais.

 

 

AND TODAY THE MILLIONS CRY

WE EAT AND DRINK WHILE TOMORROW THEY DIE

 

 

Fechou os olhos, num sono leve, sonhou com algumas imagens estranhas e cores escuras até o vento frio da noite trazê-la novamente ao mundo real... Acordada, temia o sono.

 

Temia não acordar nunca mais.

 

Tentou lutar novamente, mas fora tudo em vão. Mais uma vez, o demônio do sono engolia-a nas ruas de Casterlagh.

 

 

 

THE REAL BATTLE JUST BEGUN

TO CLAIM THE VICTORY JESUS WON

ON A SUNDAY BLOODY SUNDAY

SUNDAY BLOODY SUNDAY

 

 

Na manhã seguinte, a policia encontrou mais um cadáver nas ruas. Entretanto o que chamou a atenção e fez com quem passava por ali parar era o lindo sorriso estampado em seu rosto...

 

 Antes do fim, ela havia tido um lindo sonho.

 


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Notas finais do capítulo

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N/a: Comentários sempre bem vindos.