Con-Textos escrita por Ilana Sodré


Capítulo 5
Foi o que ela disse...


Notas iniciais do capítulo

Olá, depois de milênios volto com um texto. Espero que gostem desse é um dos novos e que eu aprecio bastante.



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"Eu me amo demais para ficar você", foram as palavras que ficaram gravadas em minha mente por dez longos anos. E é apenas nisso que consigo pensar quando alguém fala sobre ela. Hoje eu reconstruí minha meu mundo, sou casado, tenho filhos e ainda assim, quando minha vida dá uma pausa em sua exausta rotina, eu consigo me lembrar de como ela me ensinou a ser a pessoa que sou hoje. Em como uma mulher, com apenas uma frase conseguiu me fazer repensar toda a minha vida.

Eu era apenas um rapaz sem perspectivas, sem desejos e sem ambições. A conheci na faculdade, no primeiro dia de aula. Havia sido obrigado por meus pais a frequentar a faculdade, eles haviam escolhido por mim porque não aguentavam mais a minha falta de escolha e a maneira como eu protelava para achar algo que me interessasse. Eu não levava nada a sério, eu assisti às aulas por assistir e foi em uma dessas aulas que me tornei amigo dela.

Fazíamos um trabalho em dupla a primeira vez que conversamos realmente. Ela era inteligente e dedicada, gostava do que estava fazendo. Escrevia fervorosamente na folha de papel, olhava hora ou outra o livro e escrevia suas ideias. Foi ai que passei a notá-la e no fim da aula, quando ela entrou o trabalho com nosso nome, mas que havia sido feito por ela, eu a agradeci. E pedi desculpas por não tê-la ajudado. Ela disse que era besteira, que em algum momento ela me faria fazer um trabalho inteiro sem sua ajuda. Eu desconfiei que era apenas uma brincadeira para quebrar o gelo.

E a partir daquele dia, nossas poucas conversas, se tornaram dias, semanas, meses de amizade. Nós falamos sobre tudo, sobre eu não saber se queria mesmo aquele curso, sobre ela ter problemas com o pai e até mesmo sobre uma mania terrível que eu tinha de fumar três cigarros antes de entrar em casa para conversar com meus pais. Riamos, brincávamos, mas também falávamos sério. E aos poucos fomos desenvolvendo uma afeição que nos fez mais próximo ainda. E, tomando coragem não sei de onde, a chamei para sair.

Nós namoramos por exatos sete meses e nos cinco primeiros meses eu não pude ser mais feliz. Toda a nossa felicidade foi por água a baixo quando tive uma grande briga com meus pais porque queria trocar meu curso na faculdade. Foi ai que começou a minha primeira briga com ela, eu descontei toda minha frustração e toda raiva que estava acumulando. Eu fui idiota, disse coisas horríveis. A partir daquele momento nossa relação, assim como uma bola colocada em uma ladeira, desceu descontroladamente e sem freio.

Eu fui me tornando introspectivo, fui sendo novamente o cara que era. Voltei a fumar, fazendo o meu "grande feito" se converter novamente em meu vicio. Fui ridículo com meus pais, com ela e com todo mundo. Não notava o quão mudado estava até que uma noite, depois de mais uma briga, que havia começado por minha culpa, ela resolveu desabafar.

—Eu não aguento mais. Sei que dizem que devemos sempre reconstruir o relacionamento, tentar conversar, mas não consigo. Eu o conheci, descobri que tipo de pessoa era você, me apaixonei e o vi mudar ao longo dos meses. Não por minha causa, mas por sua causa. E então, de uma hora para outra, você resolve voltar a ser o que era. Não estou reclamando de você querer se achar no mundo, o que não gosto é de ver que para se achar você tenha que me perder. Eu não aguento e sei que não estou totalmente errada por isso. Você fala coisa horríveis, se porta de formas horríveis e eu não sei mais o que pensar e o que fazer. Se até agora nenhuma briga adiantou, se nenhuma conversa o fez voltar a razão...Eu sinto muito, mas não vou me destruir como você está fazendo. Eu me amo demais para ficar com você.

Ela, que estava parada em minha frente com os olhos cheio de água, lágrimas prestes a desabar, andou até mim, beijou meu rosto e então pegou sua jaqueta, abriu a porta do meu quarto e saiu para nunca mais voltar. Nunca mais a vi com vida e me culpei durante muito tempo por aquela noite. Pelos meses antes daquela noite e, em certas ocasiões, me culpava até mesmo por ter entrado na vida dela. Com o tempo entendi e até mesmo aceitei que ela estava no lugar errado e na hora errada, que foi atropelada por alguém sem escrúpulos que não foi humano o suficiente para lhe dar socorro.

Ainda assim, quando fecho os olhos, às vezes a imagino. Como ela estaria hoje, se estaria casada, com filhos, se talvez... Se talvez estivéssemos juntos e felizes. Nunca terei essas respostas, mas ainda assim gosto de imaginá-la, sorrindo como da primeira vez que a vida, falando sobre o que sempre gostou de fazer e sendo a mulher que amei e que me mostrou, mesmo que sem querer, o que eu queria ser e fazer no mundo. Talvez não seja o suficiente, mas hoje eu tento. Tento salvando vidas, todos os dias nos hospitais e a cada vida salva eu, em minha intima e idiota esperança, desejo que fosse ela. Apenas ela.


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