As portas eram pretas de madeira de cerejeira, com maçanetas grandes de ouro pintadas com um vermelho vivo. Não era uma igreja como as outras que se veem espalhadas pelo mundo. Ela exibia, em sua entrada, a aparência de uma capela com mosaicos lindos de anjos e mulheres nuas escondendo suas vergonhas. Mas essa somente era a fachada, ou, quem sabe, um local para cultos esporádicos. Hoje o dia era diferente.

Caminhando um pouco mais para o fundo do grande desenho de um símbolo que se parecia com um cinco, quase um S, e encontrando uma porta menor e mais estreita, descendo três lances de escadas, ao longo de várias lamparinas que acendem ao movimento, com fogo de verdade aparecendo aos poucos iluminando o corredor com várias portas que poucas pessoas já adentraram, no final do corredor, estava a maior porta daquele lugar. Ela é o que interessa no dia de hoje.

Um grande salão com vários bancos de madeira da mesma cor da porta da entrada. Velas que iluminavam parte da sala – a outra parte era ornamentada com grandes vigas esculpidas como gárgulas que seguravam o teto. Logo em frente, o sacerdote vestido de uma túnica rubro e uma touca que lembrava a de uma bruxa. Com ênfase ele lhes pregava a profecia:

Irmãos de sangue! Aqueles que vieram para cá, desceram ao mais profundo túmulo da cidade, onde se encontra enterrado o corpo daquele que ressuscitaremos em momentos.

Nossa devoção a Trigon, o demônio do medo. Aquele que se alimenta dos gritos das pessoas da Terra e de todos os mundos e dimensões. Trigon, aquele que vem para acabar com aqueles que profanam a terra com a alegria. Devastados sejam da face da Terra aqueles que se levantam contra Trigon e sua prole.

Os pecados, assim chamados por aqueles que conduzem à luz, estão sob os cuidados de Trigon e seus filhos. Filhos nascidos da semente do mal que trazem o poder dessas virtudes: Ira, Gula e Vaidade.

Sua vingança àqueles que o prenderam na dimensão vazia será plena. Os pés de Trigon pisarão naqueles que se dizem detentores da verdade.

Adorado seja Trigon. O Senhor do medo. Aquele que ruge e separa a o corpo da alma e do espírito. Aquele que traz a salvação aos que o adoram e o fogo àqueles que são contra. Trigon, o demônio que se alimenta do medo. Temam ele! Tragam ao mundo o medo para que nosso deus seja mais forte. Tenham medo e fortifiquem o medo.

Adorado seja Trigon, o demônio. Aquele que trouxe a nós a verdade. A nossa salvação do mundo da luz. Trouxe-nos o sangue que bebemos daqueles que não acreditam em seu poder. Trouxe-nos a vida.

Adorados sejam seus filhos! Aqueles que emanam de seu ser e seu espírito a Trigon e espelham suas atitudes em seu pai. Aqueles que preparam o caminho para que ele venha em plenitude. Filhos que se apressam a anunciar suas obras. Profetas da maior patente. Matadores exímios que nos trazem alimentos. Sangue.

A única verdade é a de Trigon! Trigon virá quando a sua gema entregar-se. O corvo da profecia. A criação da semente do mal. A menina que nasceu. A menina que foge.

Busquem-na! Achem-na! Tragam-na para cá enquanto aqueles que adoram a Trigon e possuem a benção da ressurreição levantam do túmulo a Sebastian, o nono descendente dos Irmãos de Sangue.

Os olhos da garota abriram e um grito sufocou sua garganta. O suor descia de sua testa. A profecia começara e a adoração a seu pai se fortalecera. Trigon a buscava. A igreja a buscava. E um dia eles a achariam.