Olhos de Mármore escrita por Thaís Botelho de Freitas


Capítulo 1
Parte I - Pseudônimo




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Quando tinha 12 anos, Anne sentiu outra boca na sua pela primeira vez. Achava que assim como nos contos de fadas, sentiria borboletas revirando no seu estômago. Mas na verdade, só sentiu que foi molhado demais. O mesmo aconteceu aos 16, no sofá da sua casa, embaixo do vendedor de picolés. No final; decepcionada. E lembrar que passou noites acordada, atormentada, imaginando como seria sua primeira vez. Ela culpava sua mãe pelas decepções na adolescência; por tê-la educado sempre com livros sobre reinos e castelos distantes, habitados por príncipes e princesas que viviam felizes para sempre. Ela sabia que as coisas não seguiam uma ordem pré-definida, e muito menos que seu final seria feliz para sempre; mas ainda assim acreditava que existe algo de muito grandioso reservado para cada ser na Terra, pelo qual valeria lutar nas suas efêmeras jornadas.

Anne gostava de observar e aproveitar as coisas simples da vida. Ao se transportar pelos ônibus nas ruas caóticas, olhava para as pessoas e projetava cenas de acordo com as músicas emitidas pelos seus fones de ouvido. Quando cansava de olhar para as mesmas expressões fatigadas e as mesmas construções, erguia o rosto e deslumbrava o infinito azul. Ela tinha uma certa atração por estrelas, pelos desenhos enigmáticos das nuvens, pela única face da lua, que ainda assim conseguia encantá-la em todas as suas fases, e até pelas estrelas-cadentes, das quais ainda guarda certa ingratidão, por nunca terem realizado seus desejos na infância, que iam desde encontrar o “príncipe” da sua vida, até a erradicação da fome e fim da violência no mundo. Ela adorava o céu, pois era nele que Anne encontrava paz e sossego após rotinas e mais rotinas alimentando o capitalismo.

Encantava-se com a perfeição da natureza e se emocionava fácil com livros, filmes, músicas e esculturas, principalmente a de “Adônis e Vênus”; ela chorava ao ver o amor transparecer dos olhos de mármore.

Aos 13 anos, ela conheceu a tal da Literatura e da Filosofia. Por meio delas, Anne mantinha relações com Machado, Shakespeare, Drummond e até Lispector. Teve uma paixão platônica por Nietzsche, Sartre, Marx, e de quebra, quase se casou com Freud. Passava horas paquerando qualquer conhecimento que ousasse chegar perto dela. Após um tempo, entrou para o teatro, fez cursos de fotografia, vídeo, dança... Inclusive foi nesse período que ela se “casou” com um sujeito chamado Chaplin.

Realizada. Essa era a palavra que ela proferia ao chegar em casa. Tanto fez que se formou em Artes Cênicas. Sabia que era o seu lugar. Hoje ela é professora de Teatro e vez por outra, realiza algumas apresentações. Isso a renova. Ela respira Arte.

Diferente de muitas pessoas, o sonho de Anne não era ganhar na loteria, nem ser médica ou advogada, nem viajar para a Europa (aliás, até que essa não seria uma má ideia); nem mesmo sonhos mais absurdos e utópicos como se teletransportar e viajar para Marte. Seu maior sonho era nada mais do que viver até completar pelo menos 90 anos de vida.

Outro dia, Anne acordou 3 minutos atrasada, consequentemente, chegou ao ponto de ônibus 3 minutos depois. Assim, teve que esperar o próximo. Mas foi nessa espera, graças a ela, que Anne pensou se o sujeito malabarista no sinal poderia ser o seu Adônis. Olhos de mármore.

Hoje, ela está cursando o 3° período de Psicologia, mas ainda faz muitas peças de teatro, alguns curtas-metragens de vez em quando, e apresentações de dança. Mas na verdade, nesse exato momento; Anne se encontra na fila do INSS para que quando realizasse seu sonho, conseguisse uma vaga exclusiva nos transtornados estacionamentos dos shoppings futuramente; mesmo que fosse só para paquerar mais alguns livros por aí.


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