Eu aceito, Augustus.

Eu aceito.

Foi uma promessa que fiz para ele, mas não sabia se conseguiria cumprir. Me deitei, sem nem me conectar ao BiPAP, simplesmente me deitei. Na verdade, eu não queria acordar, mas estava indecisa entre o“infinito”e a felicidade dos meus pais. Se bem que ver a filha sendo tomada por um câncer, não os deixa feliz, mas mesmo assim, meus pensamentos ainda estavam confusos.

Já havia se passado um mês da morte de Augustus e eu estava sozinha em casa pela primeira vez em séculos. Depois de eu insistir muito, meus pais saíram para um jantar em comemoração ao casamento deles.

Eu já tinha decidido o que ia fazer, mas não sabia como fazer. Estava me sentindo mal há dias, mas agüentei, não falei nada para eles, porque eu não queria que eles fizessem nada por mim. Meus pulmões estavam ficando “apertados”. Pelo menos era isso que parecia quando eu me deitava, ou fazia algum esforço que não fosse ficar sentada, sem me mexer, lendo UAI ou vendo mais um episódio de ANTM. Eu sabia que estava chegando o momento de eu explodir, e, como um animal de estimação, não queria que isso acontecesse com meus “donos” olhando pra mim.

Peguei o livro, uma caneta e o Felipe, e me dirigi até o fundo da casa, onde antes havia um balanço velho, do qual Augustus me convenceu a doá-lo. Me sentei na grama e fiquei pensando se o que estava prestes a fazer seria o certo, e tomei a decisão que isso aconteceria a qualquer momento, eu só o estava adiantando, tentando por uma vez apenas, ser dona do meu próprio corpo.

Fiquei lendo parte de Uma Aflição Imperial por alguns minutos, vendo que se minha vida tivesse um autor menos depressivo, eu estaria feliz agora.

Creio que podemos escolher como contar histórias tristes. Você pode aliviar dizendo que nada é tão ruim que não tenha jeito como uma música do Peter Gabriel. Gosto dessa versão como qualquer garota. Só não é verdade.

Esta é a verdade.

Eu estava morrendo, e ninguém poderia fazer nada para impedir. Augustus tinha morrido, e o nosso pequeno infinito havia acabado. Então para que continuar com uma coisa que não irá tão longe? Se minhas chances fossem maiores, eu continua lutando, mas eu sou uma em um milhão que pode se salvar, e ao contrário das outras pessoas, eu não acredito em apenas 1%.

Eu nunca fui boa em poesia, muito menos em escrever um elogio fúnebre, mas sei que falei bem menos que queria falar para ele aquele dia. Eu precisava falar mais, mas sabia que ele não me ouviria.

Peguei meu carro e fui até o cemitério. Chegando lá, vi que o seu túmulo tinha mais flores do que o de várias pessoas. Algumas haviam deixado cartas, mesmo sabendo que ele não leria.

Me sentei e rasguei a última página de UAI, e comecei a escrever:

“Augustus, eu sei que não fui muito boa no seu enterro, falando apenas alguns encorajamentos, e não dizendo o que realmente deveria dizer. Sei que você esta bem melhor ai em cima, talvez esteja olhando por mim e tentando me impedir de fazer isso. Mas eu preciso. Eu não quero explodir perto deles, você sabe disso. Então resolvi desarmar minha granada mais cedo, sem riscos de ter morrido como uma simples adolescente com câncer. Você disse que queria que eu ficasse para continuar o nosso legado, mas eu não estou pronta para isso. Eu não estou pronta para enfrentar o mundo sem você, e acho que nunca estarei.

Na carta que você deixou ao Peter, você dizia “Não da pra escolher se você vai ou não vai se ferir nesse mundo, meu velho, mas é possível escolher quem vai feri-lo,” Eu sei que vou ferir meus pais e, de algum jeito, vou ferir você, mas eu só quero tomar apenas uma decisão na vida, e essa é a minha decisão, espero que aceite.

Eu te amo, Augustus Waters, e sei que o amor é apenas um grito no vácuo, que o esquecimento é inevitável, mas eu sei também eu nunca conseguirei te esquecer, que de alguma forma, eu ainda estarei sofrendo por não ter você comigo, então, é melhor prevenir do que remediar, certo?

Estou apenas adiantando o que já iria acontecer. E quero que isso aconteça da forma mais linda e calma, da forma como foi esses meus últimos tempos com você, do jeito que deveria ser pra sempre.

Afinal, “Okay” não era o nosso pra sempre?

“Para sempre” sempre acaba, mas o infinito, a esse sim, é pra vida toda. E o nosso infinito será maravilhoso, como toda nossa vida foi até então.

Eu sou grata por tudo que você fez comigo, e sou ainda mais grata por ser amada por você. Você me fez crer em coisas que eu jurava ser impossíveis nas minhas condições, você me fez sentir normal, e pensar que os outros que são diferentes, e não eu.

Obrigado por tudo Gus, você foi, é e sempre será o único amor da minha vida.

Me espere ai, estou chegando.”

Respirei fundo, enxuguei as lágrimas e olhei para o céu. Será mesmo essa idéia de que o céu é tudo que queremos? Eu prefiro acreditar nela do que ficar aqui esperando acontecer.

Olhei para o pedaço de papel, vendo que de nada adiantou eu escrever tudo aquilo, sendo que ele nunca poderá ler. E, se eu estava para ir ao encontro dele, porque escrevi? Talvez porque alguém leia isso um dia e entenda os meus motivos.

Arranquei a ultima página do livro e escrevi:”Fui atrás de Augustus, espero que me entendam. Eu amo vocês. H”

Me deitei ao lado de seu túmulo e fiquei olhando um pouco as estrelas. Afinal, a culpa não era delas. Sorri me lembrando do que ele havia me dito sobre constelações em seus últimos momentos acordado.

Pensei ter ouvido a voz dele dizendo Okay. Sorri novamente, tirei a cândula, respirei sozinha pela ultima vez. Fechei os olhos e respondi:

-Okay.