Passamos a tarde na secretaria da biblioteca.

Pow me contou como sobreviveu quando fugiu na madrugada do primeiro dia no Verão Para Alunos Recuperáveis, havia latinhas de refrigerante e salgadinhos na mesa.

O garoto da nuca foi direto a seu quarto naquela madrugada, seus colegas de quarto contaram-lhe que ele deu sorte dos instrutores não terem passado no quarto ainda, fazendo a chamada para ver se cada aluno estava em sua devida cama. E naquela noite não houve chamada de alunos, apenas no dia seguinte.

Quando ouvi, senti-me aliviada em saber que eles não passaram no meu quarto para conferir se eu estava lá também.

E de lá o garoto começou a estudar normalmente, no momento em que estava estudando, ele e toda a sua turma foi interrompida por nós, Irrecuperáveis, fugindo de instrutores.

–Foi vergonhoso. – Ele disse desviando o olhar. – Eu abandonei vocês, e puis vocês em risco.

Sorri, embora estivesse chateada com ele, sorri por que ele estava aqui, e estava se desculpando.

Snow observava o rapaz com a cabeça inclinada.

–Você precisa voltar. – Disse Pow olhando pra mim. – Não podem nem suspeitar que nos encontramos. Snow vai manter segredo. – Disse ele olhando pra garota de óculos redondos. Ela manteve sua cabeça inclinada.

Eu concordei, e logo me retirei. Caminhei sozinha nos corredores do colégio, suas paredes eram longas e possuía pinturas da cor prateada. De trás de uma de suas pilastras saiu Joe, a garota agora com os cabelos pretos curtinhos andou até mim e encaixou um de seus braços no meu sorrindo como uma melhor amiga. Notei as marcas em sua orelha, de piercings que já não estavam lá.

–Vamos caminhar juntas Molly. – Disse ela. – Eu estava esperando você.

–Como estão as coisas? – Perguntei ansiosa.

–Vai tudo bem. - Disse ela com um olhar sincero. – Eu ouvi que vamos ter algumas aulas juntas, então não importa se somos de anos diferentes. Val também, ouvi que está todo mundo chamando ela assim.

Caminhamos até o jardim da escola, os muros de Towcland estavam bem mais distantes do que eu imaginava, seria uma longa corrida se decidíssemos fugir do colégio. Lembrei da história sobre Irrecuperáveis que tentaram fugir pelos jardins do colégio, e como foram pegos tragicamente.

Sentamos em um dos bancos de madeira embaixo de uma árvore. A garota punk suspirou relaxando o pescoço pra trás.

–Foi um sufoco sumir com os estudantes que substituímos. – Disse ela olhando o jardim para ver se tinha alguém mais por perto. – Estou no mesmo quarto que Kat, inventamos uma desculpa esfarrapada pra outra garota.

Arregalei os olhos perplexa.

–O que vocês fizeram com os estudantes?

–Deuses, não me olhe assim, eu não os matei ok? – Disse ela sorrindo. – Nós conseguimos fazer com que eles adoecessem sem lhes causar danos, estão descansando na enfermaria sem perigo algum. Colin entrou no laboratório e encontrou um vírus que possuía uma doença de dois meses. Demos sorte, você não imagina que tipo de coisas tem no laboratório daqui.

–Ninguém suspeita de vocês terem tomado seus lugares? – Perguntei.

–São recuperáveis Molly, eles não questionam, não suspeitam de nada. – A punk tirou um chiclete do bolso e me ofereceu.

–Não obrigada. – Disse, enquanto a punk colocava outro na boca. – Você tem notícias dos outros? Como vai o Panda, e Colin? Eu não os vejo desde o nosso primeiro dia de aula.

–Colin me contou que ele e o garoto panda estão no mesmo quarto também. Eles têm algumas aulas comigo, logo você deve ter também, sabe, aulas como laboratório e educação física. – Joe olhou pra mim e sorriu.

A punk me contou também como conseguiram hackear o sistema de Towcland, e os riscos que sofriam devido a lista de nomes Irrecuperáveis. E no final mencionou rapidamente sobre Sam, o veterano que desapareceu.

Lembrei de conta-la sobre Pow, a garota punk pareceu feliz de ter recebido notícias dele, e seus olhos brilharam quando mencionei que ele se desculpou.

–Eu fico feliz que você esteja aguentando a pressão. Logo nos aproximaremos da liberdade, e por dois anos presa entre os corredores de Towcland, vou poder correr livremente pra longe. - Olhei para a punk devolvendo o sorriso, a garota corou levemente por ter relevado o seu desejo de dois anos. -Nos vemos logo. – Disse ela em despedida.

Aulas com Joe, Panda, Kat e Colin. Meu coração palpita pela breve felicidade.

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Passou-se duas semanas desde que conversei com Joe, entediada pelo cotidiano do colégio resolvi ir a biblioteca. Embora eu e Pow tínhamos combinado de não ficar no encontrando assim as escondidas, por ser perigoso e suspeito. Acabamos tornando parte do nosso cotidiano cometer esses riscos.

Pow manteve a imagem que conheci dele, desde que se desculpou relevando ser um pouco mais frágil do que eu esperava, o garoto sempre duvidou de tudo e sempre foi quieto.

Costumamos nos encontrar na sala da bibliotecária, encontrei alguns corredores na biblioteca que podia percorrer sem ser vista por ninguém, e lá encontrava Snow também, a garota estava sempre com seus óculos redondos, seus cabelos pretos brilhavam sobre sua pele pálida.

Entrei batendo de leve na porta da bibliotecária. Ela abriu timidamente e sorriu.

–Pow não chegou ainda, senta eu fiz um chá. – Ela disse colocando o livro que carregava sobre a mesa.

–Mente Humana e Seus Segredos. – Li em voz alta a capa.

–Pois é, Pow pediu para eu pesquisar sobre isso, ele também mencionou hipnose, mas não encontrei nada sobre isso na biblioteca.

–Ele não te deixa em paz. – Disse suspirando em tom de brincadeira. Snow riu.

–Já li a maioria dos livros que gostava aqui mesmo. – Contou ela ajeitando os óculos. – Alguns eu até queria ler, mais meu pai proibi.

Sr. Gold era o pai de Snow, a garota não teve sorte em ter um pai melhor. O homem com poucos cabelos foi o incomodo de Pow em quase todas as aulas que tivemos juntos com ele. O porquê dele ter recebido o convite para a V-PAR eu ainda não fazia ideia, sempre que eu me aproximava desse assunto Pow desviava-se sabiamente, até que eu percebo que já estamos falando de outra coisa.

Quanto mais o tempo passava e eu conversava com o garoto da nuca, mais eu percebia o quanto os Recuperáveis eram ignorantes, realmente não suspeitavam de nada. Só mediamos nossa conversa na presença de professores e instrutores agora.

Antes que eu pudesse dizer algo mais a Snow, a porta foi batida de leve, fazendo-me esquecer o que ia dizer.

–Um minuto Pow. – Disse a garota, abaixando a xícara de chá e levantando-se. Quando a garota bibliotecária abriu a porta, arregalou os olhos levemente e depois suas pupilas ficaram dilatadas pelo medo.

–Pai. – Disse a garota.

–Hayley. – Disse o homem com poucos cabelos. – Porque está assim tão pasma? O que você fez dessa vez?

–N-nada. – Respondeu a garota abaixando a cabeça.

–Não esconda nada de mim, ou te coloco para fora dessa escola como fiz com sua mãe. – Soltou o professor secamente.

A garota assentiu brevemente ainda parada na porta, dava-me tempo para recuar e me esconder atrás do sofá, e assim fiz com medo de ser encontrada antes mesmo de me esconder. Onde estava não havia luz, e o cômodo era mais escuro do que o normal, por não haver janelas. Eu tinha uma chance de não ser descoberta.

–Eu só vim te ver. – Disse o pai, notei que ele devia estar sorrindo quando terminou essa frase. – Alguns alunos estão dando problemas para o colégio, e quero ter certeza que não está entre eles, por isso marquei com a Srta. Clary de encontrarmos com você aqui, prepare algum chá filha.

Meu coração acelerou com o nome Srta. Clary, minha mente alertava para que eu fugisse daquele lugar.

Gold pareceu ter entrado na sala desviando da filha, mas o piso parou de ranger indicando que ele ficou parado por um instante.

–Por que tem três xícaras na mesa, e duas delas estão cheias? – Perguntou o pai sinistramente.

–Eu ia começar uma festa do chá papai. – Disse a garota, embora tivesse uns 15 anos.

–Sim, claro, brincadeiras de meninas. – Disse ele soltando risadinhas.

–O senhor quer ficar com a xícara da Srta. Florence? – Perguntou ela docemente.

–Claro, se não for incomodo. – Disse ele soltando outras risadinhas que não lhe caía nada bem.

Notei que Snow mentia para o pai, algo que um recuperável não fazia normalmente, conclui que era uma atitude inocente de sua parte, e se Srta. Clary perguntasse, ela não omitiria.

Logo a porta foi aberta por Srta. Clary, e eles tiveram mais um diálogo formal. Depois disso Clary sentou-se, Snow sentou-se na poltrona onde eu estava escondida, ficando ao meu lado.

–Certo Hayley, vou te fazer algumas perguntas, e você deve ser breve com as respostas está bem? – Perguntou Clary com uma voz doce.

Subitamente o tom de voz de Snow mudou, sua voz doce ficou baixa e sombria.

–Sim.

–Onde estava no primeiro dia de aula da Verão Para Alunos Recuperáveis? – A voz de Clary era muito agradável, suava pela sala quase como uma canção. Sentia-me de alguma forma feliz em ouvi-la. Mas estava ciente de que era uma hipnose, ou uma bruxaria. Seja lá o que for que estivesse fazendo, estava controlando a mente de Snow.

E logo tudo estaria perdido, eu precisava fazer algo para salva-la. Ela vai contar sobre nós.

–Eu estava na Sala da Bibliotecária. Depois na Biblioteca Secreta senhora.

Senti uma pontada de dor na voz de Snow. Meu coração apertou.

–O que estava fazendo lá?

–Eu estava procurando a saída. – Disse ela brevemente.

–Ela se perdeu? – Sussurrou professor Gold. Clary pareceu ter ignorando-o.

–De quem foi essas ordens? – Perguntou a mulher com raiva na voz.

–Da senhora, é claro. – Ela respondeu.

Alguns segundos de silêncio foram feitos, e Clary cortou-os.

–Você se encontrou, ou sabe de algo sobre alunos Irrecuperáveis?

Eu e Pow mencionamos várias vezes a palavra Irrecuperável, mesmo que Snow fosse uma recuperável e não desconfiava de nada, a garota estava ciente do que ouvia. Dessa vez a resposta não foi breve, olhei para cima com cuidado e vi que saia lágrimas dos olhos de Snow.

–Nada sei sobre Irrecuperáveis minha senhora. – Respondeu ela.

Arregalei os olhos assim como Srta. Clary deve ter arregalado.

–Pois bem - Respondeu ela. – Obrigado pela perda de tempo Sr. Gold.

O homem tentou dizer algo mas a mulher se apressou para sair da sala. Logo Gold também saiu, batendo a porta.

Levantei-me e a bibliotecária chorava perturbada com o rosto nos joelhos. Suas mãos pálidas tremiam.

–Snow. – Disse ficando de joelhos na frente dela. – Você acordou?