Elesa escrita por Metan


Capítulo 1
A Missão


Notas iniciais do capítulo

A história principal reside no texto abaixo. Espero que gostem.



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Mais uma vez, o sol confirmava o início de um novo dia em Freedom Harbor.

Enquanto aventureiros começavam a se amontoar diante do Leiloeiro, vendedores também acordavam para disputar pelos melhores locais nos arredores; não apenas para anunciar os seus espólios, adquiridos em ferozes batalhas, mas também ofereciam diversos suprimentos, voltados à cura ou puramente comida - afinal, era manhã. Embora agora ainda estivesse vazio, era uma questão de minutos até que uma multidão penetrasse nesse complexo de barracas; alguns, que ainda seguiam os velhos costumes de acordar antes do próprio Sol nascer, já se amontoavam em grupos ou duelavam entre si, metros à porta da Grande Biblioteca, com suas fomes já saciadas.

Um outro grupo, não tão seleto assim, rodeava uma casa em específica.

A residência dispunha de um terreno grande e bem aproveitado, com dois andares, na residencial da cidade, o Ninth District. De aparência, no entanto, parecia um pouco mal cuidada; de certa forma, abandonada. O motivo de tantos curiosos sendo atraído ao local encontrava-se também ao redor da casa: uma espécie de barricada improvisada de madeira, mas que conseguia passar a mensagem de "não vá além". Símbolos da facção Lionheart encontravam-se em cada parte da barricada. Rumores do porquê eram discutidos entre os curiosos, sempre entre sussurros e "diz-que-diz".

O que parecia um clima de suspense transformou-se em pânico quando um anão, vindo de dentro da casa, abriu a porta. Todos, sem exceção, olharam para ele ao mesmo tempo; com a atenção desejada, atirou com o seu rifle, mirando os céus. Enquanto as pessoas se afastavam, amedrontadas, da outra boca da sua arma, acionou o seu lança-chamas, desta vez mirando nos curiosos, que não pensaram uma vez sequer antes de correr para longe dali. Ao som de gargalhadas, o anão entrou e fechou a porta.

Dentro da casa, deparou-se com um dos seus companheiros: um guerreiro, de cabelos prateados, armadura similar e escamada nas pernas e braços, olhos castanhos e rosto malicioso por definição. Encostado numa parede e com os braços cruzados, os seus olhos exalavam desapontamento.

- Eu mandei você espantá-los - disse -, não para espalharem ainda mais boatos.

- Você pediu para que eu espantasse-os da maneira que eu achasse mais apropriada - respondeu, com a sua voz grossa, enquanto brincava com a sua espessa barba que ia até a cintura. - Se fosse você lá fora, teria decapitado alguém, com essa sua cabeça vazia.

- Ao invés disso, eu posso deixar você ainda mais baixinho - provocou. - Sem essa sua cabeça, você deve perder uns quinze centímetros, sem dúvida.

- Que tal um rombo nessa sua armadura cheia de merda? - No mesmo instante, o anão já estava com a arma mirada no guerreiro, que nem sequer se mexeu.

- Faça isso - descruzou os braços e levantou-os, como quem não realmente se importasse. - Já consigo imaginar os papéis de caça pela sua cabeça, espalhados por todas as cidades e acampamentos.

- E eu consigo imaginar os dois desonrados de seus cargos, se continuarem com essa palhaçada por mais um segundo - interferiu um terceiro homem; outro guerreiro. Com uma longa cabeleira ruiva, os seus olhos negros o tornava ao mesmo tempo estranho e intimidador enquanto ele se posicionava entre os dois a passos largos. Virado ao Marksman, ordenou que abaixasse a arma, permitindo que o guerreiro de cabelo prateado fitasse a sua colossal vorpal dourada de duas mãos pendurada em suas costas.

- Apenas porque eu te respeito - obedeceu, com um grunhido.

- Achei que tivesse o feito em prol da nossa busca - berrou, por fim, o quarto e último membro do grupo: um sacerdote humano. Embora estivesse em outro cômodo, era impossível não reconhecer aquela voz grave, de quem não costumava repetir o que dizia. - Cortem os seus corpos em quantas partes quiserem; eu não vou gastar nem um pouco de mana para curá-los. Mas, por favor, tenham um pingo da inteligência de Illyfue, deixem isso para depois e comecem a produzir algo de útil.

"Esse cara deveria ter nascido um Stonemen", pensou o ruivo. "Aliás, ele deveria ser o líder. Parece estar em seu sangue o poder de mandar em alguém", continuou, enquanto observava a cara dos seus dois companheiros. "Pergunto-me o que o Sutherland viu em mim que não viu nele."

- Vocês ouviram-no - decidiu quebrar o silêncio para completar a ordem. - Vocês dois, procurem pelo segundo andar, sem maiores confusões. Elfo, encontrou algum porão?

- Debaixo de seus pés, senhor.

O líder encarou o tapete por alguns segundos para depois dobrá-lo pela metade com os pés. Segurou uma exclamação de surpresa. "Não sei o que eu esperava", pensou. - Já que você já começou com o primeiro andar, antes de toda essa bagunça, eu fico com esse porão.

- Como quiser.

Apanhou um lampião ao lado da porta principal e, após acendê-lo com um fósforo, abriu a porta quadrada e começou a seguir escada abaixo. Sentira o ar antigo logo na metade da descida. Ao sentir o chão, reparou que nenhuma parede o rodeava por alguns bons metros.

"Isso vai demorar", pensou.

E demorou.

No quarto, além de várias anotações em alguma linguagem desconhecida e um mapa do tesouro aparentemente sem lógica, encontraram um anão dormindo em uma cama de rainha entre paredes rosas e brancas; alguns tapas no pescoço resolveram esse último caso. Também descobriram uma mochila, mas ela estava vazia.

Em outro quarto - ambos no segundo andar -, não encontraram nada no guarda-roupa, além de pijamas para ambos os sexos; provavelmente um dormitório para hóspedes. Estranharam o fato dele não ter janela alguma, além das paredes azuis que davam uma sensação aterrorizante, pela falta de luz ali dentro. Procuraram o quanto puderam e deram o fora dali.

Tanto no banheiro do primeiro andar quanto no do segundo não foi encontrado nada de valioso.

Ainda no segundo andar, encontraram uma lavanderia. De início, estranharam, mas a compreensão veio rápido: com as roupas estendidas no segundo andar, tanto o sol quando o vento agem com maior força, àquela altura. A busca não durou muito, já que, além do local não possuir muitos espaços de armazenamento, não tinha nenhuma roupa para secar ou lavar.

Ao descerem as escadas, porém, foram abordados por um sacerdote bem ocupado.

- Parece que já terminaram - concluiu. - Ótimo. O líder e eu ainda temos coisas a fazer. Agradeceríamos se fizessem algum almoço.

- Com que comida? - indagou o guerreiro.

- Com a comida que está na cozinha, oras. Eu já procurei tudo por lá; não achei nada, além de um estoque abundante.

Eles sabiam que não adiantava arranjar desculpas com ele; já se conheciam de longa data. O guerreiro não estava nada satisfeito com isso, embora tenha aceitado a proposta. Resmungando, seguiu o Marksman até a cozinha.

- Não gosta de cozinhar? - perguntou o anão, ao adquirir certa distância, mas não sem abaixar a voz.

- Eu não gosto é daquele cara - respondeu grosseiramente.

- Perdeu alguma mulher pra ele? - perguntou, dessa vez apenas pela provocação.

- Fomos inimigos de guildas distintas. Deparei-me com ele durante várias batalhas, e em nenhuma eu conseguia matá-lo. Sempre conseguia fugir, me atordoar ou até mesmo me derrotar – já dentro da cozinha, cuspiu na pia. – Sempre me senti um inútil por causa disso… e agora, aqui estamos, na mesma guilda e na mesma facção. Agora, cale essa merda de boca e me ajude a ver o que tem nos armários.

- Ha! Você, pedindo pela minhaajuda? Achei que a minha barba fosse cair primeiro - e gargalhou.

- Eu já não aguento mais - reclamou o líder. - Pelos Deuses, esse porão é alguma obra de Dysil.

Quanto mais ele explorava, mais ele descobria. Antigos cajados e vestimentas, símbolos de coragem e premiações; diversas pinturas da mulher que tanto procuravam, tudo isso entre prateleiras de um vidro exageradamente grosso. Os quadros mais antigos mostravam-na com o cabelo preso numa espécie de coque que virava um rabo-de-cavalo e vestimentas de uma novata; os mais recentes, no entanto, mostrava uma verdadeira sacerdotisa, não só com equipamentos de elite, mas também com um cabelo caindo em cachos dourados, somados a hipnotizantes olhos da cor do oceano. Além desses, outros quadros a exibiam com algumas roupas de festa. Um desses ilustravam uma moça mais nova, aparentemente tentando imitá-la, embora seus cabelos fossem castanhos e seus olhos, verdes. "Não lembro de ter ouvido falar de alguma prima ou filha dela", pensou, quando encontrou a pintura sob as chamas do lampião.

Mas não era isso que estava esgotando a paciência do homem. Todo aquele ar empoeirado estava provocando tosses potentes e contínuas, que ecoavam por todo o local. Tudo isso dentro daquele espaço gigante por onde o porão se extendia; parecia bem maior do que a própria casa.

- Será que passa por debaixo das casas vizinhas? - O Ninth District era envolvido por, basicamente, famílias pobres; algumas, pobres demais para sequer terem uma casa. A casa em questão, no entanto, era uma exceção; geralmente, a parte rica, composta por comerciantes ou aventureiros bem-sucedidos, escolhia algum lugar pelo Craftsman Fair - um lugar destinado para a especialização e compra de materiais para certas profissões: cozinheiros, alquimistas, tecedores, artesãos, ferreiros, mineiros, entre várias outras -, logo abaixo do Ninth District; outros, também com dinheiro - embora nem tanto -, procurava algum lugar na Libra Bazaar, ao noroeste da City Square, também movida por certo comércio e outro Leiloeiro, embora nem tão visitado quanto o do centro da cidade, que, ao invés de residências, dispõe de tavernas e hospedarias - nenhuma tão boa quanto a Toteu's Tavern, num dos extremos da cidade. De qualquer forma, a chance de alguém daquele lugar ter dinheiro para construir um porão era improvável; se descobrissem que a extensão desse subsolo era ilegal, seria mais um crime na conta da mulher.

Um dos quadros chamou a atenção do homem.

Era bem mais protegido do que o anterior, embora inacabado. A luz do lampião era forte o suficiente para mostrar que a mulher fora completamente ilustrada, com mais uma de suas roupas brilhantes de festa... mas a parte intrigante estava do lado da mulher: uma cabeça negra e pontuda, de olhos vermelhos e um sorriso acabado pela metade. Debaixo de onde deveria estar o resto do corpo, espalhava-se uma grande mancha vermelha que não deixava claro se era tinta ou algo mais.

Foi só então que o líder parou para pensar em como tudo isso era aterrorizante: um porão gigante esquecido por tempo o suficiente para tornar o ar sufocante, numa casa abandonada por uma criminosa, recheado de equipamentos, quadros e utensílios antigos, tudo devidamente protegido... aquilo era paranóico demais; paranóico o suficiente para tornar qualquer outra pessoa paranóica.

“Não era como se ela quisesse evitar que alguém retirasse qualquer coisa daquela casa; não, era ainda pior. Era como se ela não quisesse nenhuma presença humana por aqui”, pensou, que descobriu que as suas mãos estavam começando a tremer. Nunca foi um homem forte para esse tipo de experiência.

Uma outra sessão de tosses revelou que sangue começou a sair de sua boca, um líquido bem parecido com o que se encontrava no quadro. Subitamente, ele decidiu que ficar mais um minuto naquele porão o deixaria definitivamente louco. A passos largos, virou as costas - não sem dar uma última olhadela para trás - e subiu as escadas, quase caindo no processo.

- Pega uns quatro ovos aí. Não, no terceiro armário, na parte de baixo... DIABOS, não jogue os ovos, você vai acabar fazendo uma melaceira - gritava o guerreiro prateado. Quando o anão foi levar o cesto de ovos, tropeçou num dos pisos da cozinha e quase se estatelou pelo chão, mas não sem derrubar um dos ovos em direção ao chão. Ao invés disso, o ovo encontrou uma manopla prateada... infelizmente, com o impacto no metal, o ovo acabou explodindo na mão esquerda do guerreiro.

- Como você consegue ser tão burro? – Um pouco antes, o sacerdote adentrou o cômodo e se deparou com toda a cena. Logo atrás do anão, percebeu que se tratava de um piso falso.

- Esperem um pouco - sem saber de onde o elfo veio, os dois apenas observaram o homem robusto e negro se abaixar, posicionar a mão de baixo de onde o anão tropeçou e começar a forçar o piso para cima. Após alguns segundos, o piso cedeu à força e, ao ser levantado, revelou uma porta pequena de vidro grosso e temperado. Não era possível ver de certo o que estava contido. Quando o guerreiro tentou socar a porta, o sacerdote o parou:

- Não gaste os seus esforços, rapaz. Você vai socar esse vidro até os seus ossos racharem e não vai causar nem um arranhão nele – começou a coçar a sua cabeça. Era algo que nem mesmo o próprio sacerdote entendia de certo, já que ele era careca.

- Alguma sugestão? - perguntou cautelosamente o anão.

O sacerdote começou a procurar por alguma fenda ou abertura. O anão resolveu ajudá-lo, e dessa vez, ele que encontrou o outro piso falso. Rapidamente retiraram-no e descobriram a continuação do vidro com uma alça para levantá-lo, aparentemente sem nada por baixo daquela parte. Enquanto o trabalho era feito - com muito esforço, o que deixou os três membros extremamente surpresos pelo seu peso descomunal -, o líder entrou na cozinha, limpando a manopla ensanguentada com um pano.

- O que vocês estão fazendo?

- Encontramos algo - deu uma pausa para respirar - abaixo do solo - terminou de informar o guerreiro.

"Eu também encontrei várias coisas ali em baixo", pensou em dizer. Decidiu ficar calado e checar o que era.

A essa altura, a grande placa de vidro já estava aberto pela metade, mas já era possível espiar o que se encontrava por baixo: provavelmente alguma espécie de livro. Com a ajuda do líder, empurrando o vidro pela parte de baixo, confirmaram a descoberta. O livro tinha um tamanho médio, em perfeitas condições.

- Para ter tido todo esse trabalho, esse livro deve ter alguma coisa importante - apontou o líder. O sacerdote revirou os olhos; o anão, adicionou:

- É bom que tenha algo importante - o que se seguiu logo depois foi um anão escarrando em uma das mãos e limpando no chão. O guerreiro fez questão de se afastar de onde a mão passou.

- Deixem que eu leio em voz alta - ofereceu-se o elfo. Tomou o silêncio como um "sim" unânime e agarrou os livros com as duas mãos. Com ele em seu colo, abriu a primeira página.

- Essas letras - exclamou o guerreiro prateado.

- É a mesma linguagem que vimos no quarto dela, em algumas anotações - continuou o anão.

- Que diabos de língua é essa? - indagou o líder, logo depois.

"Devo responder a verdade?", refletiu o elfo. Foi apenas então que lembrou-se de seu voto vermelho: contar toda a verdade e apenas a verdade. Mentalmente, fez uma prece, pedindo perdão por se esquecer de seu dever, enquanto explicava:

- Essa linguagem é conhecida apenas por uma minoria do Angeal Temple e da Magic Fountain. Embora os símbolos sejam similares aos da linguagem arcana, os seus significados são completamente diferentes.

- Isso é pra enganar algum mago ou sacerdote descuidado? - imaginou o líder.

- Bem, digamos que sim. Não preciso dizer que essa linguagem não foi criada por alguém com um bom propósito - prosseguiu. - É por isso que apenas uma minoria de alto nível possui conhecimento dessa língua: como um auxílio contra seja lá que demônio a tenha criado, e não para auxiliar o seu caminho até eles. - Essa última frase deixou o trio apreensivo. "Eu sabia que isso aconteceria, mas eu obedeci os meus votos."

- Não podemos simplesmente fechar esse livro e esquecê-lo por causa disso - lembrou o líder. - Estamos aqui para investigar essa mulher, e assim faremos.

"É bom saber que o espírito gritou mais do que o medo."

- E assim será feito. - Começou a ler o livro em uma voz firme.

"Lembro-me daquele dia como se fosse ontem.

Sob ordens do General Hugh Sutherland, todos os tipos de guerreiros, de todos os níveis, experientes ou novatos, foram convocados para um aviso de prioridade emergencial. Todos os tipos de mensageiros, de Humanos a Kindreds, de pombos a corvos, foram utilizados para viajar para todos os acampamentos e locais de guildas.

Sob ordens do General Hugh Sutherland, toda a City Square reuniu-se em frente a um pequeno pódio, antes da escadaria da saída oeste, aonde o General daria a sua tão importante - e, por alguns, temida - mensagem.

Não foi sob ordens do General Hugh Sutherland, mas era impossível não temer que tipo de mensagem seria entregue.

Seria mais uma invasão, similar aos Dias Negros de Oeste? Seria ele o nosso novo Raisinger a sacrificar-se contra Dysil para que a vida possa continuar a existir? Alguns outros cochichavam sobre algum possível novo General para substituí-lo. O sentimento de consternação era mútuo, embora as suas razões fossem diferentes.

O barulho piorou quando a sua comissão começou a abrir caminho até o pódio que, embora coubesse apenas uma pessoa, começava numa escadaria que terminava em uns vinte metros de altura. Para a maioria esmagadora presente, era a primeira vez que viam o General sem o elmo chifrudo para a frente, expondo os seus cabelos louros e olhos azuis como o oceano. De cima do pódio, ele provavelmente sentiu-se no inferno. Se um enxame de abelhas passasse por ali, provavelmente ninguém ouviria.

Mas, com toda a certeza, eles ouviram o choque de uma espada runada de duas mãos - não para o General - batendo em um escudo. Três desses baques foram o suficiente para que o silêncio imperasse. Se uma mosca passasse por ali, provavelmente todas as pessoas presentes ouviriam.

- Guerreiros de Eyrda - começou, com uma voz firme como uma montanha, forte como um trovão -, consigo enxergar o temor nos seus olhos como vejo fome em um mendigo. Embora eu veja razão para os seus temores, posso dizer que são infundados. - Com os olhos viajando sobre o mar de gente, prosseguiu. - Todos nós temos sonhos, e é importante que corramos atrás deles. Um dos meus vêm me consumindo desde os meus primeiros dias de general... ou, melhor dizendo, vinha. Uma instância onde todos os aventureiros podem não apenas treinar em batalhas, mas também receberem equipamentos por isso, com o intuito de armarem-se contra a Storm Legion, encontra-se em sua fase final de construção. Uma Arena. - Teve que ameaçar a bater a espada no escudo mais uma vez quando uma nuvem de questionamentos começou a poluir a audição geral. “Nos meus planos, funcionará da seguinte forma: serão formados dois times, cada um de três ou seis pessoas, e vocês lutarão entre si. Cada vez que o seu time ganhar, ganharão reputação na Arena e, semanalmente, pontos de Arena, baseados na porcentagem entre vitórias e derrotas daquela semana. Ao adquirir ambos em certa quantidade, poderão trocar por equipamentos valiosos. A proposta é simples: com um exército com treinamento e equipamentos de elite, a nossa luta contra os Storms será melhor para nós.”

Uma chuva de aplausos se seguiu, e é claro que o General permitiu que a chuva prosseguisse, por certo tempo. Levantou a mão para prosseguir:

- O motivo para esse chamado emergencial não foi apenas para este anúncio. Quero que todos mantenham a fé e a esperança no coração, a responsabilidade no cérebro. Para isso, não quero diz-que-diz, nem medo. Aqueles que possuírem perguntas, essa é a hora para fazê-las - levantou a mão, antes que alguém perguntasse qualquer coisa - ordenadamente. Levantem as suas mãos e esperem pela sua vez. Até lá, ouça.

Entre várias mãos levantadas - como se todos quisessem perguntar a mesma coisa -, o General escolheu uma delas em meio à multidão.

- Lhe dou a palavra, aventureiro.

- Senhor Sutherland - gritou -, como teremos noção de nossa reputação e pontos de Arena?

- No dia da inauguração e após, ao atingir certo nível, vocês estarão habilitados a pegarem esta medalha comigo - para os céus a apontou: menor do que a palma de uma mão de um bebê, uma estrela dourada habitava o seu centro, cujas pontas se estendiam até um círculo, um pouco antes da borda igualmente redonda da medalha. - Essa medalha servirá para medir a sua reputação. A borda redonda estará partida pela metade; uma metade para o tipo de Arena 3 contra 3, e a outra ao tipo 6 contra 6. Quanto menor for a sua reputação em uma dessas modalidades, mais vermelha ela vai ser; quanto maior, mais azul será. A estrela representará os seus pontos de arena. Ela também irá do vermelho para o azul, mas quando ela atingir pontos o suficiente para comprar algum equipamento, em relação à sua maior reputação entre um dos modos de Arena, ela começará a brilhar; tudo isso é determinado por pura magia.

Algumas mãos se abaixaram, mas algumas permaneceram; a mesma dúvida permanecia. Uma outra mão foi escolhida.

- De que maneira conseguiremos esses equipamentos? - gritou.

- Batalhando na Arena, oras.

- Sim, mas aonde trocaremos? E como?

-Ah, sim - coçou a cabeça, como que uma negativa por não ter entendido isso antes. - Os equipamentos já estarão estocados, apenas esperando alguém com pontos o suficiente. Metas atingidas, a sua estrela perderá coloração de acordo com o custo daquele equipamento; a sua reputação de arena nunca será consumida para a troca, apenas como um requisito para provar que você é um guerreiro experiente e, portanto, merecedor daquele equipamento. Quanto ao local de troca, ainda está sendo planejado.

Outras se abaixaram, mas a mesma dúvida remanescia; desta vez, a maioria das pessoas que queriam perguntar estavam com a mão abaixada. Uma terceira mão foi escolhida.

- Qual é o potencial desses equipamentos?

- Ah, finalmente essa pergunta. Guarda, traga-na - um homem começou a subir as escadas enquanto carregava, com todo o cuidado, uma grande caixa retangular de madeira. Lá de cima, já com a sua própria espada embainhada, o General abriu a caixa e retirou uma espada runada de duas mãos de dentro. Apontou aos céus, de modo que a luz do sol brilhasse constantemente nela. - Incrível, não acham? Este é o nível dos equipamentos entregues, modéstia à parte.

Alguns sussurros e exclamações se seguiram, ao passo que o General devolvia a espada à devida caixa. E a dúvida persistia, assim como outra mão era escolhida.

- Será permitido algum tipo de consumível dentro dessa Arena?

- Nada de consumíveis externos; apenas algumas poções que estarão à venda. Aliás, tanto os equipamentos quanto os consumíveis necessitarão de Gold Coins para serem adquiridos; precisamos pagar os funcionários e realizar manutenções periódicas, afinal. Não será nada absurdo, eu garanto.

A esse ponto, apenas algumas questões sobre a maneira que a Arena funcionaria, especificações sobre o edifício restavam, todas devidamente adiadas pelo General para o dia da inauguração; exceto uma única maldita dúvida que ainda atacava a mente de todos os presentes. Era o meu dever realizá-la, ou ninguém faria.

Levantei a mão.

- Lhe dou a palavra, senhorita - concedeu.

- Agradeço, general. Você diz que essa Arena está sendo construída com o intuito de prepararmo-nos contra a Storm Legion; mas, numa arena, apenas o vencedor contempla as premiações, enquanto que o derrotado encara a morte.

Com um sorriso e de braços cruzados, o General respondeu, após alguns segundos:

- Milhares de pessoas, e apenas esta sábia senhorita manteve-se firme para realizá-la. Muito bem. Essa resposta será concedida no dia da inauguração, mas posso dizer que esse problema já foi resolvido.

Nenhuma mão permanecia levantada; apenas cabeças.

- Se é assim, declaro este aviso global terminado, mas não sem antes avisá-los de uma outra para a inauguração, daqui a um mês. Espero por vocês lá. - Desenbainhou a espada. - Precisamos nos unir para que possamos dar um fim em Dysil e em sua terrível legião. Por Freedom Harbor!

- POR FREEDOM HARBOR! - Repetimos todos em um único coro. Se um enxame de abelhas estivesse passando pelo local, elas provavelmente evitariam a nossa cidade por um bom tempo."

-Esse dia do aviso foi impagável mesmo - comentou o sacerdote, para quebrar o clima.

- Então isso era, no final das contas, um diário de uma mulher. Excelente - esbravejou o anão, ao que, logo após, escarrou mais uma vez na mesma mão e limpou no mesmo local.

- Que provavelmente não acaba por aí, ou não estaria enterrado a seis dedos abaixo do chão, sendo quatro de uma porta de vidro. - Olhou para o elfo, que confirmou com um aceno de cabeça. - Continue.

- Sim, senhor.

"Esse mês que se passou foi equivalente a uma década.

Foi equivalente a uma década de discussões acerca dos planos do General; uma década de batalhas entre diversas guildas pelos espólios de algum World Boss; uma década de invasões à cavernas habitadas por criaturas de Dysil, com preciosas perdas para ambos os lados em ambos os casos.

Mas, como se é sabido, isso foi tudo em apenas um mês.

O dia de hoje, o dia da inauguração, foi, na verdade, o dia para a entrega das medalhas. Não apenas o General, mas também os seus ajudantes e funcionários estavam realizando a entrega. Eu, particulamente, achei essa tal medalha bem bonitinha. Qualquer atrasado ou aventureiro que se tornasse mais apto para a Arena poderia pegá-la quando quisesse, a partir daquele dia. A inauguração estava prevista para o dia seguinte. Ninguém consegue se conter.

Esse dia que se passou foi equivalente a um mês; talvez, a uma década.

Por alguma razão, o número de pessoas presentes não era tão grande quanto da última vez, mas continuava sendo uma grande multidão aglomerada na frente do mesmo palco, no mesmo local. O General já estava lá, esperando, com o seu elmo chifrudo e a sua capa branca a balançar vigorosamente, por conta do vento, que era mais forte lá em cima.

- Esse mês foi turbulento e eterno para todos nós, acredito eu - começou. - Mas não há mais necessidade de espera; Eu, General Hugh Sutherland, declaro a inauguração da Arena! - Permitiu que o público aplaudisse por alguns momentos. - O edifício da Arena fica de cara para a minha casa. Do lado dele, há um portal que levará vocês para a laje desse edifício, aonde será possível a compra de equipamentos e consumíveis. Uma vez dentro do edifício, basta seguir a escadaria abaixo. Não se preocupem; além de ter espaço para todo mundo, ele fica bem mais acima da Prisão Esquecida. - Pigarreou um pouco. - Uma vez dentro do Hall da Arena, uma bifurcação dividirá o público, uma para cada estilo de Arena. O que importa é que o modelo de cadastro é o mesmo: você pode se registrar com alguma dupla ou equipe, ou você pode tentar a sua sorte com o modelo aleatório. Terminado o cadastro, a sua medalha começará a brilhar por completo; isso significa que você está esperando por um grupo, emanando magia. Essa magia é rastreada por uma espécie de catalisador e trabalhada com a ajuda de alguns magos, que utilizarão como base a sua reputação e o nível médio da equipe. Outros magos utilizam algo similar para criar a Arena aonde vocês batalharão.

"Aliás, sobre a Arena, existem apenas dois modelos de sala; elas são perfeitamente redondas, com tamanho o suficiente para que ocorra uma luta e ao mesmo tempo não permita fugas prolongadas. Uma estátua ficará no meio de cada uma delas, também como prevenção. Existe também uma base para cada equipe, uma no oposto da outra. As arenas serão disputadas em melhores de três, com cinco minutos de limite para cada rodada. Dentro de cada uma dessas arenas, algumas surpresinhas podem aparecer: objetos em forma de caixas, espadas, escudos, cartas, runas e interrogações aparecerão na arena. Com exceção da interrogação todos lhe trarão benefícios para a batalha; a interrogação é extremamente aleatória. No final de cada partida, receberão suas devidas recompensas em forma de reputação do estilo e, algo novo que criei, reputação geral: esta última, ao contrário da reputação do estilo, nunca abaixará, independente do resultado da partida, e poderá ser medida pelos espaços entre as pontas da estrela, da mesma maneira: de vermelha para azul. Ela, porém, não é utilizada para comprar equipamentos ou suprimentos, e sua cor será calculada de acordo com a média da reputação geral de todos os participantes."

"Isso foi, basicamente, um resumo da funcionalidade da Arena. Eu quero saber, agora, quem se prontifica para estreá-la."

Sem pensar duas vezes, pedi licença à multidão e me prontifiquei; junto comigo, mais cinco pessoas: dois magos humanos, um protector, um marksmen e uma guerreira humana... sem contar que eu também sou uma humana.

Ah, a humanidade.

- Agradeço pelo espírito forte de vocês. Tudo o que eu quero é provar a todos que a Arena é segura.

- É sempre uma honra prestar nossa ajuda ao senhor, General - respondi.

Após descermos as escadas e pego o caminho da direita, chegamos ao estilo de três contra três. Ao contrário do que pensei, a sala era enorme, com pelo menos uns vinte balcões de cadastro e uma infinidade de cadeiras aparentemente confortáveis. Fomos até o primeiro, comandado por um sacerdote elfo.

- Boa noite, senhores. Já decidiram as equipes?

- Melhor irmos por sorteio, não? - sugeriu um dos magos. Como ninguém objetou, assim se registraram.

- Pronto. Mostrem do que são capazes.

Mal tivemos a chance de responder, pois fomos imediatamente teleportados para as bases.

A formação das equipes era bem óbvia, já que nos registramos juntos: o protector e os dois magos contra a guerreira, o marksmen e eu.

- Sinto-me lisonjeado, perto de vocês duas - murmurou o anão, já vermelho.

- É hora de batalhar, não de fazer amor - "Não que eu fosse fazer isso com você", deixou no ar. Depois de um tempo, o anão assegurou-se de que a sua arma estava recarregada.

- Qual é a estratégia? - perguntou a guerreira.

- Aposto que os magos avançarão logo depois do Protector, todos com ataques em área. Melhor combinarem ataques contra um dos magos enquanto eu me viro com os outros dois. Não se preocupem, eu vou manter vocês dois vivos - assegurou.

Sob o aceno dos meus parceiros, os portões subiram.

Uma grande estátua marrom tomava contra do centro, com raízes se dirigindo até metade do raio da sala, cada uma. "Será melhor se eu evitar correr por ali, para não tropeçar", pensei de imediato. Com uma prece, conjurei um escudo divino ao meu redor.

Como previsto, os magos estavam esperando atrás dessa estátua, enquanto o protector avançava em mim. Um dos magos foi pego de surpresa quando a guerreira correu em carga contra ele, com a cabeça na frente. O alvo caiu no chão, atordoado com a cabeçada, enquanto a guerreira era congelada com uma nevasca, mas o marksmen já tinha o conjurador na mira. Um tiro no peito fez o dito mago voar alguns metros enquanto liberava alguns pedaços da sua alma, todos coletados pelo anão, que começava a emanar uma aura mais forte de suas mãos.

Enquanto eu direcionava uma cura à guerreira, uma martelada pegou num ponto crítico do meu estômago, além de também me mandar para longe. Com o impacto, o anão se virou e rapidamente atirou no joelho do protector. Com isso, deu um piso falso com o outro pé e tropeçou. Ficaria ali por um tempo, mas não por muito; os protectors possuíam uma capacidade fenomenal de ir além da dor. De qualquer forma, foi o suficiente para que eu pudesse me recuperar e lançar duas preces: uma, para curar-me; a outra, com um movimento circular com as minhas mãos, para lançar-lhe uma maldição púrpura; agora, seu ataque, bem como suas resistências, foram reduzidos.

Ao mesmo tempo, um duelo dava sequência entre a guerreira e os magos, um deles sendo o alvo, mas sempre se esquivando. Enfim conseguiu congelar as pernas da guerreira mais uma vez, mas se esqueceu do marksmen e pagou por esse erro com um tiro no estômago. Abismado com a visão, o segundo mago deu uma brecha para que a guerreira literalmente arremessasse a sua espada, atravessando os seus órgãos e costelas. Os dois caíram inertes, enquanto os meus dois parceiros coletavam pedaços de suas almas. Quanto a mim...

Eu tentei correr como pude enquanto mantinha-o lerdo com ondas de gelo, uma tática que estava dando certo até ele se esquivar com um salto de uma delas. Caiu bem na minha frente, com um estrondo que me intimidou por tempo o suficiente para que um golpe poderoso o bastante para destruir a minha barreira, acertar o meu peito e me arremessasse em direção à estátua. Por um instante, senti que todo o meu ar havia se esvaído; no outro, não sentia mais as minhas costas. Mal consegui me virar para ver o final da batalha, mas consegui ouvir golpes de espada; um martelo caindo no chão; um tiro; um morto. O protector, a julgar pelo impacto.

Com a vitória daquela rodada, uma luz azul tomou conta de todo o local; em seguida, estávamos todos de volta para as respectivas bases, sem ferimentos.

-Então é mesmo verdade - pensei alto. - Nossos ferimentos são mesmo curados.

- Isso quer dizer que eu posso decapitar as pessoas sem remorso algum - comentou a guerreira, desferindo um golpe no ar. – Ótimo.

- Eu aposto como o Protector vai esperar os magos nos congelarem.

- Ele não se deu muito bem da última vez mesmo. Os dois vão chegar juntos, provavelmente.

- Algo me diz que vai ser diferente disso…

- Não se preocupe. Já sabemos o que eles farão - como se fosse um arauto, os portões se abriram logo após o término da frase do marksmen.

E, como previsto, eles NÃO fizeram isso. Embora nós tenhamos encontrado um dos magos atrás da estátua, parte do plano deles era que déssemos de cara com ele. Imediatamente conjurou a mesma nevasca e manteve a guerreira dentro de um cubo de gelo, mas isso não o salvou do marksmen recuado. Após o tiro, o que vi foi uma cabeça explodindo e uma gargalhada seguida de um escarro. Vindo pelo lado oposto, o segundo mago congelou os pés do marksmen, um alvo fácil para o protector, que vinha logo atrás. Mirou um tiro no joelho, mas o gigante de pedra posicionou a marreta na frente. Mesmo as minhas curas não seriam eficazes; com um ataque de cima pra baixo, o anão virou uma pasta de sangue e carne, com alguns pedaços de ossos. A quantidade de pedaços de sua alma que se libertaram foram o suficiente para que o mago soltasse uma aura vermelha de suas mãos.

Quando se viraram para a guerreira, ela já estava descongelada. Era necessário fazer alguma coisa; caso contrário, ela seria a próxima e, então, eu. Com uma prece rápida, conjurei um escudo divino nela. Rapidamente, os meus inimigos entenderam o recado: eu estava desprotegida. O protector começou a correr contra mim, mas assim fez também o mago. O último foi pego de surpresa por uma carga da guerreira, mas teve o reflexo de se congelar antes que a espada atingisse a sua cabeça - ao invés disso, bateu contra o gelo e voltou, sem causar um arranhão sequer.

Já esperando pelo próximo movimento, o protector virou-se contra uma guerreira, achando que teria a vantagem do ataque surpresa, enquanto brandia a marreta em fúria. O escudo absorveu todo o golpe; em contrapartida, ele não absorve efeitos secundários, como estonteamento. Com isso, o gigante de pedra virou-se contra mim.

Com uma prece mental, conjurei a benção dos ventos sobre os meus pés. Com um aumento na minha velocidade, provavelmente seria similar, senão melhor, ao que aconteceu na rodada anterior...

... se não fosse o maldito mago. Descongelado, lançou uma bola de gelo mirando os meus pés e, logo depois, avançou até certa distância para conjurar outra nevasca. Com o corpo completamente congelado e três pedaços da minha alma a menos, era um alvo fácil.

O mago coletou apenas uma delas, para manter a sua aura viva; o protector pegou as outras duas. Em seguida, avançou em carga com a marreta abaixada; com a distância certa, brandiu a arma e partiu o gelo pela metade. Com um giro, bateu no lado oposto e mandou-me voar para a mesma direção do corpo da guerreira. Durante o vôo, senti - e ouvi - uma lança de gelo passar um centímetro acima da minha cabeça; um erro que custou a vitória deles.

Mesmo com o estrondo do meu corpo rolando no chão até bater duramente na parede, eu ainda tinha energia o suficiente para invocar o Santuário sobre a guerreira e a mim, com uma prece lenta e dolorosa.

Era hora do acerto de contas.

Cambaleando, a guerreira levantou-se, confusa, mas dissipou-a quando finalmente percebeu que estava viva. Avançou em fúria, com a espada faiscando em verde, contra um mago que se achava destemido. Descobriu que uma onda de fogo não era o suficiente para consumir alguém cujo sangue estava tão quente quanto. Mesmo com um raio de gelo rápido não foi capaz de inibir a guerreira de seu golpe, que esquivou-se com um salto. Quando voltou ao chão, a sua espada também; o corpo do mago, pela metade.

Mas o protector ainda estava vivo e operante. Enquanto ela estava abaixada, fez o chão tremer com a sua marreta. Cambaleando, não teve tempo de consumir os vestígios da alma do mago. Teve tempo apenas para observar um gigante de pedra furioso; mal sentiu a marreta amassando o seu peito, embora o seu corpo inerte tenha dito o contrário.

Envolvi-me com o meu escudo, ao passo que o protector começava a emanar uma aura cada vez mais poderosa, alma após alma. Com as mãos cintilando em um tom de vermelho escurecido, virou-se e se deparou com uma onda em arco congelante em suas pernas. Não pareceu ter muito efeito, em matérias de dano, mas ele certamente sentiu-se mais lerdo. Com uma prece e um movimento de minhas mãos, cerquei-o com uma maldição púrpura: novamente, seu ataque e resistências foram diminuídos. Dava tempo para lançar mais uma prece, antes de ser necessário correr. Ao final dela, mirei-o com o cajado e soltei uma nova onda de gelo, em forma de engrenagem. Assim que o acertei, senti a minha mana regenerar-se um pouco; um efeito secundário que só acontecia de tempos em tempos. A engrenagem podia ir além do plano físico e atingir parte da mana do usuário para, assim, redirecioná-la para mim.

Com a mesma prece mental, corri com os ventos a favor dos meus pés do gigante de pedra, que já se encontrava próximo - as preces de ataque demoram alguns segundos, afinal. Em minha frente, um escudo de torre estava girando no ar. Lembrei-me do que o General mencionou e corri até tocá-lo. Ao toque, o escudo se desfez e senti a sua energia sendo passada para mim; era como se eu tivesse me tornado um escudo humano. Rezando, virei-me em direção ao gigante de pedra e lancei-lhe mais uma onda de gelo para mantê-lo longe e lento.

Enfim, a sorte soprou aos meus braços.

Um pedaço de sua alma voou bem diante aos meus pés. Assim que a peguei, duas espadas cruzadas apareceram ao meu lado direito. Com o toque, o mesmo tipo de magia foi passada para a minha arma. Repeti a prece da engrenagem e lancei-a mirando o protector que, embora não tenha perdido mais de sua mana, assustou-se com o poder da engrenagem e quase tombou para trás. Excitada com tamanho poder, rezei, com a mão do cajado numa transversal fechada, e lancei um tipo diferente de onda de gelo, com tamanho para atingir qualquer um entre a estátua e a parede, embora tenha um poder mais fraco e menos probabilidade de causar lentidão.

No entanto, quando a conjuração estava quase completa, vi uma aura diferente exalando do gigante. Não tive tempo para cancelá-la e, por isso, a onda o atingiu. Ao invés de machucá-lo, porém, ela o regenerou: um poder especial dos protectors para casos extremos.

Era hora de correr mais uma vez; no entanto, não podia conjurar a benção dos ventos, não ainda. Pra piorar, outra habilidade situacional fora utilizada: um pedregulho oco apareceu sobre a minha cabeça, deixando-me estonteada por alguns instantes.

Quanto voltei à realidade, me deparei com uma marreta, brilhando como uma estrela, ainda no alto - a única parte que me salvou. Rolando, pude sentir a terra tremer vigorosamente, mas nada que me atrapalhasse a conjurar uma última prece para acabar com aquilo de uma vez por todas. Levantando, brandi o cajado e lancei a onda de gelo que faria o protector, enfim, tombar, morto.

Mais uma vez, a luz azul tomou conta de tudo e todos. Mais uma vez, estávamos dentro da base, mas agora com um botão vermelho em uma das paredes.

Sob o olhar perverso do anão, apertei o botão, esfarelada após toda aquela batalha. Logo após, as nossas medalhas começaram a brilhar; sinal de que as nossas reputações de fato aumentaram. Logo após, fomos teleportados para o salão de três contra três.

- Espero que tenham se divertido com o teste - disse um dos balconistas.

Nos reunimos com o outro grupo, em direção à saída. Quando a porta se abriu, um General, fora do balcão - que, aliás, havia sido retirado - e sentado sobre uma cadeira, virou-se para uma multidão apreensiva.

- A Arena é um sucesso, como eu prometi. Lembrem-se de que ela só é aberta algumas horas por dia, nunca às terças e quintas. A Arena - levantou-se - é de vocês.

Uma festa começou a se propagar enquanto a notícia chegava a todos. Aos bandos começaram a entrar."

- Ela sabe narrar batalhas muito bem - comentou o sacerdote. Só então percebeu que, na verdade, estavam todos dormindo, incluindo o líder. Furioso, levou o cajado à boca, profanou uma prece silenciosa e abriu os braços, conjurando uma fúria divina dos céus. Todos receberam o dano e gritaram, enquanto parte de sua mana se esvaia.

- Você ficou maluco? - gritou o anão.

- Vocês que ficaram - esbravejou de volta. - Dormindo durante o serviço. Até mesmo você, senhor. O que há com você?

-Desculpe-me - bocejou, com uma mão na boca. - Essa parte do livro foi extremamente entediante. Nunca fui fã de histórias de batalhas.

- Certo, certo - grunhiu o sacerdote, que agora folheava o diário da mulher, procurando por informações mais interessantes - pelo menos para aquelas cabeças vazias. Após alguns minutos - sempre checando se alguém voltava a dormir -, encontrou algo.

- Isso aqui parece ser interessante - informou. - Assegurem-se de não dormirem mais uma vez, ou vão pagar por isso.

"Com razão, o General estava preocupado com a sua irmã, Capitã Charlotte. Ela andava aparentemente doente... estranha. Foi numa excursão para as Ancient Catacombs, junto com Morin, que ela revelou uma nova natureza dela: dobrando de altura, feriu Morin quase que mortalmente e fugiu...

Ela foi alvo do Deus do Desastre.

Em outro plano, aonde o tempo não se altera, surgiu uma base secreta da Storm Legion, durante a Primeira Guerra Continental, também conhecida como Os Dias Negros de Oeste. Invocado pelo Deus do Desastre, serviu de asilo para dois dos generais da Storm Legion: a Aeon Spire.

Recentemente descoberto pela Lionheart, é guardado por cinco manifestações dos Deuses:

A Manifestação da Chacina, Kluer.

A Manifestação da Guerra, Clark.

A Manifestação da Praga, Pakhra.

A Manifestação da Desolação, Terra.

A Manifestação do Desastre, Lucy; outrora, Capitã Charlotte.

Uma mulher pode ter o direito de chorar, mas não consigo imaginar como o General deve estar se sentindo agora; além de triste, não pode expressar os seus sentimentos abertamente. Mas eu sei que é o meu dever terminar com isso."

"Não houve motivo para alegria ou festividades quando eu entreguei a notícia da morte de Lucy. Mesmo eu entreguei essa notícia com pesar; significava, também, que Charlotte estava morta. O General pediu por um momento de solidão; sem questionamentos, saí da sala."

Sob a luz do sol, a um terço do meio dia para o oeste, o comércio estava vivo, como estava, todos os dias.

Entre barracas e funcionários, compradores e ladrões, aventureiros e moradores, uma mulher deixava ser notada.

Seus cabelos dourados alisavam-se até metade das costas, com cachos que se formavam nas pontas. Seus olhos, hipnotizantes e azuis como o mar. Vestia-se com trajes púrpuras de batalha e apenas andava, aparentemente em direção à Craftsman Fair. Um cajado enorme pousava em sua mão direita; um diário sobre um homem da Sleeping Jungle, em sua mão esquerda.

Alguns minutos depois, estava na frente do cozinheiro, comprando alguns materiais básicos. Enquanto subia a rampa de volta à City Square, um trio conversando, aparentemente aterrorizados, bem no topo da escadaria que se seguia, lhe chamou a atenção. Decidiu passar bem devagar, fingindo ler o livro para não levantar suspeitas.

- Será que eles ainda estão naquela casa?

- Por mim, você pode checar - respondeu um segundo. - Eu não tô afim de ser alvo daquele lança-chamas mais uma vez.

- Homens da Lionheart não deveriam fazer isso - opinou um terceiro. - Aliás, nem deveriam sair inspecionando casas por aí, mesmo aquela.

- Nunca entendi por que alguém construiria uma casa daquelas, pra falar a verdade. Deve ser tão rico... se eu fosse essa pessoa, compraria alguma na Craftsman Fair ou passaria minhas noites em alguma hospedagem, no local da minha guilda... Não naquele muquifo.

Seu coração saltou. "Então ele já suspeita de mim? Até quanto ele sabe?" Procurou manter o mesmo passo. Tudo o que sabia era que um marksman estava lá; quantos mais estariam?

Metros a frente do trio, entrou pela Grande Biblioteca. Lá, guardou o seu livro e mudou o seu passo calmo para um andar furioso.

- O diário dela está começando a ficar cada vez mais escasso...

- Mas ele ainda não acabou. Vamos até o final. - ordenou o líder, impaciente.

- Como quiser.

"Tenho me sentido bem esquisita, ultimamente...

Com um Talent Compass, mudei o foco dos meus talentos para o tipo Glacial. Por consequência, meu dano está infinitamente maior, ao custo dos meus poderes de cura. Mesmo sob a negação dos meus conhecidos, eu queria mudar um pouco.

Mas não é isso que está me incomodando. Tudo bem, uma mudança drástica dessas pode te deixar um pouco confuso, às vezes, mas não é isso. Parece ser algo mais... intenso."

"Finalmente consegui os equipamentos supremos da Arena.

Foi um caminho duro até conseguir uma borda completamente azul, mas agora eu posso finalmente desfrutar dos melhores equipamentos que a arena pode oferecer. Desnecessário dizer que eu guardei centenas de Cristais de Estrela para refiná-los de uma vez, sem contar as gemas para embutí-las. Mas algo me diz que ainda não estou terminada..."

"Agora eu sei por quê.

Toda a tontura, confusão e desespero que eu senti de uns tempos para cá me recompensaram, enfim, pois eu encontrei o propósito do meu destino. Ironicamente, com a ajuda daquele que eu tanto desprezava... O mundo dá volta, eles dizem. E eu vou mostrá-los o real significado dessa frase.

Sinto muito, pai. Cuide bem da pequena."

-Acabou aqui - informou, enquanto folheava as páginas restantes, todas em branco.

- Ainda não consigo entender o propósito de toda essa chacina que ela fez - questionou o líder.

- Já saímos da parte de entender, chefe - respondeu o guerreiro prateado. - Podemos deixar isso pra depois, ou para outras pessoas. Agora, precisamos procurar essa mulher e matá-la.

"Estou aqui", pensou, olhando da janela de fora os quatro homens em sua cozinha. "Mas serão vocês os mortos."

Calmamente, a sacerdotisa caminhou até a porta.

Três toques foram ouvidos do lado de fora, vindo da porta.

- Parece que ela te ouviu - brincou o anão. - Se for ela, eu lambo o chão.

- Pois, se for ela, eu a mato - declarou o guerreiro prateado. Levantou-se e foi em direção à porta, com a espada nas costas.

Ao abrir a porta, deu de cara com uma sacerdotisa rezando, de olhos fechados e cajado na mão.

"Essa sacerdotisa...", pensou, "pela graça de Vyda, essa mulher é a Shylia reencarnada." Estava perdidamente apaixonado por aquela mulher, de cabeça abaixada e parte dos seus cabelos caídos para a frente.

Estava tão apaixonado que não parou para prestar atenção ao que ela rezava.

Foi preciso meio segundo para perceber quem era quando ela levantou seu lindo rosto e olhou-lhe nos olhos, mas já era tarde demais para pedir por ajuda. Uma onda de gelo trespassou o seu pescoço. Além de uma tentativa de grito, nada pareceu acontecer com o guerreiro, agora imóvel.

- O que foi isso?

- Era a voz dele. Vamos checar, agora - ordenou o líder, já com a arma em mãos.

Depararam-se com a mesma sacerdotisa, rezando e de cabeça baixa em frente ao guerreiro, ainda imóvel. A cena deixou a todos perplexos.

-Quem é você? - indagou o líder de imediato, preocupação em sua voz. - O que fez com ele?

Como resposta, a mulher digiriu a eles um olhar inocente, sem mais preces. Com o cajado, empurrou levemente o guerreiro pela cabeça. A cabeça, no entanto, escorregou pelo pescoço até caiu no chão. Em seguida, o corpo se desequilibrou e tombou para trás.

Aquilo era tudo que o trio precisava.

- Matem-na - ordenou o líder, com um grito.

Mirando o anão, mais uma onda similar foi conjurada; poderia matar os três de uma vez com uma onda maior, mas isso significaria destruir parte de sua casa também. Não valia a pena.

Novamente, a onda atravessou o anão, partindo-o em dois pela horizontal. O sacerdote preferiu conjurar um escudo alado no guerreiro, imaginando que conseguiria aguentar um ataque dela. O líder correu até ela em carga.

A mulher desviou da carga, porém, ganhando alguns segundos até que o guerreiro se virasse. Com uma prece, lançou um transe no elfo, imobilizando-o por algum tempo. Agora, era hora de focar no guerreiro.

Desviou de um, dois golpes, o suficiente para posicionar-se ao lado dele e empurrá-lo. Com o tempo ganho, proferiu uma pequena prece. Ao fim dela, sentiu o ar à sua volta congelar.

Até o líder se levantar e brandir a sua arma, ela já tinha acabado de conjurar a sua outra prece. Uma engrenagem dirigiu-se até o guerreiro. Embora o escudo tenha absorvido quase todo o dano, antes de explodir, não conseguiu impedir a mana que foi sugada. Ainda pior: com o impacto, uma outra parte equivalente esvaiu-se, deixando o líder com algo próximo a zero de mana.

"Não tem jeito", pensou. Numa reação rápida, deu um passo rápido e desarmou a mulher, ao que, em seguida, começou a correr em desespero.

"Preciso pará-lo agora", pensou, enquanto conjurava uma maldição. "Se ele for para fora, não terei como simplesmente seguí-lo e matá-lo." Com a maldição, o guerreiro seria preso toda vez que recebesse um ataque; se, após algum tempo, nada o atingisse, um cubo de gelo tomaria conta do alvo.

Para a infelicidade da sacerdotisa, ela não contava com a porta sendo fechada. Furiosa, cancelou a maldição e olhou em direção à voz do homem, que agora acordava.

- Onde estou... - murmurou. Os seus olhos se arregalaram quando eles encontraram a sacerdotisa, recitando uma última prece; um tiro de misericórdia.

- No mundo dos vivos - ela respondeu, com os olhos fixos nos do homem -, mas não por muito tempo.


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