Por Inteiro escrita por Schmerzen


Capítulo 1
Por inteiro


Notas iniciais do capítulo

Primeiramente, gostaria de lembrar que hoje, 10 de março, é o aniversário do nosso lobo favorito, Remus Lupin! ♥
~
Bom, por agora, mais nenhum comentário. Nos vemos nas Notas Finais (sim, essa tem Notas Finais, o que é bem raro, rs).



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Sirius estava estranho. Isso era fato.

James simplesmente não sabia o que fazer, estava se sentindo péssimo por não ter nem a mínima ideia do que afligia o amigo. Logo Sirius, que sempre o ajudava quando ele estava mal e que parecia sempre saber o porquê dele estar chateado, se tornava um enigma na única vez em que estava irritado. E na verdade, Potter nem sabia se podia usar a palavra “irritado”, afinal o amigo podia não estar irritado. Talvez ele estivesse triste, ou bravo, ou chateado, irritado também era uma opção, claro, e com medo também. Afinal de contas, tudo o que ele sabia era que Sirius estava agindo de modo estranho.

Há algumas semanas o garoto se tornara quieto e um pouco introspectivo demais. Ele também parecia estar com uma careta de dor sempre que se perdia em pensamentos, o que era bem comum. Além disso, Sirius estava evitando sutilmente ficar perto dos amigos, o que era muito estranho, porque Os Marotos eram simplesmente inseparáveis e toda Hogwarts sabia disso.

Naquela noite, James estava um pouco pensativo, como Sirius, depois que o amigo saíra mais cedo da mesa de jantar – o que também se tornara comum nos últimos tempos. Após pensar por uns minutos, resolveu falar com os outros dois sobre isso. Não sabia se eles haviam realmente percebido que havia algo de errado com Sirius, Peter provavelmente não, quanto a Remus, não sabia.

- Eu estava querendo falar com vocês há alguns dias... – começou meio indeciso. Continuou quando ganhou a atenção de Lupin e Peter. – Não sei se perceberam que Sirius anda agindo meio estranho...

- Achei que só eu havia percebido! – Remus exclamou parecendo aliviado. – Pensei até que fosse só comigo, que ele estava chateado comigo ou algo assim.

Peter encarou com confusão os dois. A verdade era que não percebera nada.

- Ele está me assustando – James confidenciou para Lupin. – E o pior é que não faço ideia de porque ele está assim.

- Também não sei – o castanho mexeu um pouco no prato, reflexivo. – Pretendemos fazer algo quanto a isso?

- Acha que devemos falar com ele? Nós três?

- Não sei se é uma boa ideia. Ele pode ficar na defensiva, vai parecer que nos unimos contra ele. Como uma intervenção, ou algo assim.

James meditou um pouco nas palavras de Lupin. Ele estava certo, Sirius odiava ser pressionado, ficaria possesso se percebesse que os amigos se uniram pra extrair uma resposta dele. Não diria nada se os três chegassem desse modo.

- Talvez seja melhor só eu falar com ele, sem pressões nem nada assim – Potter falou finalmente.

Remus concordou com ele, voltando ao seu prato. Parecia meio triste com algo.

- Ele deve estar no dormitório sozinho, agora – James continuou. – Vou até lá. Vocês me dão alguns minutos e eu tenho certeza que resolvo tudo.

- Está certo – Remus murmurou após alguns segundos. – Mas James, seja sutil!

- Claro que serei! – o garoto rolou os olhos.

Lupin balançou a cabeça, sabendo que James Potter era tão sutil quando um bombardeio alemão na Segunda Guerra. Peter os olhou confuso.

- O que devemos fazer?

- Só ficar aqui mais um pouco, Peter.

- Ah, certo.

-

James entrou no dormitório normalmente, procurando Sirius, que se encontrava deitado com a cabeça enterrada no travesseiro, o cortinado em volta de sua cama meio aberto, revelando que ele ainda não tirara o uniforme.

- Sirius? Está acordado?

O moreno levantou a cabeça ao som da voz do amigo. Estava apenas pensando, como andava fazendo muito recentemente. Abriu o cortinado e viu que James estava sozinho, relaxando com essa constatação.

- Estou.

- Ah. Saiu mais cedo do jantar, achei que já estivesse dormindo.

- Sim, eu só... Estava meio cansado. Nem mesmo tirei o uniforme, precisava deitar um pouco.

- Hmm... – James fingiu desinteresse no amigo enquanto trocava o uniforme pelo pijama, rapidamente. Depois se sentou em sua cama, que ficava ao lado da de Sirius e olhou pra ele com a mesma expressão falsamente calma. – E aí, o que achou do treino essa semana?

- Foi bom. Quero dizer, precisamos treinar um pouco mais a questão da precisão, mas acho que até o grande jogo contra a Sonserina já estaremos ótimos. E o time como está agora vencerá facilmente a Corvinal.

- Sim, com certeza. Acho que ninguém da Corvinal realmente liga pra quadribol. Eles preferem... estudar, acho – James riu. – Assim como o Remus. Ele é muito corvinal às vezes.

- Hmm, é. Verdade.

Potter percebeu que algo que havia dito desencadeara novamente aquele modo estranho e defensivo do amigo. Ele havia se deitado novamente, de costas, encarando o teto e respondera meio secamente. Estreitou os olhos para ele, tentando compreender o que era.

Vamos lá, Pad! Me ajude a te ajudar... – James pensou, enquanto dava um suspiro fundo.

- Ei, Padfoot...

- Sim?

- Está tudo bem?

Sirius soergueu-se, encarando James, que novamente parecia desinteressado, como se apenas tivesse comentado o tempo. Sirius realmente parecia um cachorro às vezes e ele não queria assustá-lo, para que ele não se tornasse agressivo.

- Claro, Prongs. Por quê?

- Por nada, oras... Quero dizer, se tivesse realmente algo errado você contaria.

- É claro – Sirius concordou sem vontade.

- Sirius. Olha pra mim, cara.

- O que houve, Prongs? – o moreno finalmente o encarou, meio temeroso. – Está tudo bem com você? Algo com a Lily ou...

- Sirius! – James gritou, meio exasperado. – Nós nos conhecemos desde que você tinha onze anos e era só um pirralho com medo de ir pra Sonserina! Cara, para de fingir que não tem nada errado!

- Do que você está falando?

- De você agindo desse jeito e fingindo pra mim que está tudo certo! Padfoot, me conte o que está errado, quero poder te ajudar.

- James, você não pode me ajudar, não tem nada errado, ok? De onde tirou isso?

- Você está estranho, eu sei disso! Olha, não é coisa da minha cabeça, Remus concorda e...

- Ah, é?! – James se assustou com a exclamação de raiva do moreno, que o interrompeu. – Então vocês ficam pelos cantos do castelo falando de mim enquanto eu não estou por perto?

James soltou um suspiro de frustração pelo seu próprio deslize. Tudo o que queria era que o amigo não pensasse que eles haviam de alguma forma se unido contra ele – mesmo que fosse para ajudá-lo – e agora tudo soava, até mesmo pra ele, como uma grande conspiração.

- Sirius, nós não estamos falando de você pelos cantos do castelo, estamos preocupados com você!

- Então parem de estar, não tem motivo, estou perfeitamente bem.

- Perfeitamente bem? Por Merlin, Sirius! Em que mundo você nem terminar de comer o prato principal e vir pro dormitório é perfeitamente bem?

- Eu já falei que estava cansado!

- Aparentemente você vive cansado ultimamente porque está sempre se afastando de nós!

Os dois se encararam por uns segundos, Sirius com os olhos flamejando de raiva e James quase implorando ao amigo para que lhe contasse o problema. O moreno simplesmente suspirou, levantou-se e mudou de semblante, de pura irritação para algo próximo do desinteresse.

- Olha, James, cansei dessa sua paranóia. Vou ao banheiro e depois vou dormir. Não me perturbe mais por hoje.

- Sirius Black! – James voou pra cima do amigo, quase o derrubando novamente na cama. – Você não pode ficar fugindo do problema eternamente.

- Não há nenhuma droga de problema, James, me solta! – Sirius estava gritando agora, e parecia à beira de lágrimas. – Me deixa em paz, que inferno! Eu já lhe disse que não tem nada errado.

- Eu sei que tem algo errado, Sirius, você só precisa me contar! – James também parecia estar quase chorando, meio desesperado – Sirius, só me conta o que é, eu juro que resolvo, seja o que for!

- James, você não pode resolver nada, me deixa em paz, por Merlin, sai daqui!

Remus havia chegado ao dormitório há alguns instantes, encontrando James quase em cima de Sirius, ambos parecendo que não demorariam muito a desmoronar em lágrimas e um gritando com o outro tão intensamente que não perceberam sua chegada. O garoto imediatamente foi até eles, puxando James de perto do moreno, assustado com o que acontecia. Quando percebeu o que houve, Sirius sentou-se muito quieto em sua cama, atordoado e assustado.

- James, já chega – Lupin comandou brandamente, olhando nos olhos de Potter. – Deixe Sirius em paz.

James demorou uns segundos para recobrar a consciência e entender quem havia interrompido a discussão, não se deu ao trabalho de responder e saiu do quarto apressado, também assustado com a dimensão que a sua “conversa sutil” com Sirius havia tomado. Remus respirou pesadamente e voltou-se para Sirius, que parecia muito fragilizado no momento, os braços apoiados nos joelhos, quieto.

- Você está bem? – Remus conseguiu articular idiotamente, logo em seguida se martirizando mentalmente; era óbvio que o garoto não estava bem!

- Sim – a voz de Sirius era quase inaudível. – Obrigado.

Remus apenas acenou, sem saber o que mais dizer. Quando viu Sirius levantando da cama, decidiu dizer alguma coisa.

- Sirius, se quiser conversar... Se estiver com algum problema, eu...

- Não preciso – o moreno sussurrou apressadamente. – Eu só... Eu estou bem, ok? Obrigado.

Lupin viu com frustração Sirius refugiar-se no banheiro, trancando a porta em seguida. Passou a mão pelos cabelos sem saber o que fazer. Era óbvio que James não fizera por mal, a culpa afinal era dele, que sabia que o garoto não era muito sutil e mesmo assim o encorajou a falar com Sirius. Ficou se culpando porque agora o problema só aumentara e Sirius estava ainda pior, afinal antes nem era muito visível que ele estava mal. Trocou de roupa e deitou-se, pensando se conseguiria dormir naquela noite.

Quando finalmente silenciou sua mente, pode ouvir os soluços abafados de Sirius no banheiro. Sentia cada um deles como uma facada em seu peito, desesperado por não saber o que fazer para ajudar o amigo.

-

O dia estava claro e bonito, mas James nem se importou com isso enquanto vagava com a namorada pelos jardins de Hogwarts.

- Você está muito quieto hoje, James. O que não é nenhum pouco comum – a garota sorriu. – Algo errado?

- É um problema com Sirius.

- Vocês brigaram? Ele parece meio estranho há algum tempo, mesmo.

- Você também notou? – James parou e encarou a ruiva. – Fui falar com ele sobre isso ontem e acabamos brigando, eu acho.

- Não falou com ele ainda?

- Não. Quando acordei, ele já não estava no dormitório.

- Vá procurá-lo para resolverem isso. Vou fazer algumas tarefas, nos vemos depois no salão comunal.

- Obrigado, Lily.

A garota sorriu e beijou o namorado, retirando-se em seguida. Sabia que era melhor que se resolvessem logo, ou James ficaria naquele estado meio evasivo até que isso acontecesse. Ele por sua vez parou um momento imaginando onde Sirius poderia estar, pensando que não seria dentro do castelo. Resolveu procurar à margem do lago.

Andou até lá pensando no que diria, sentindo-se péssimo pelo modo como havia agido na noite anterior e implorando para que Sirius aceitasse desculpá-lo por ser um babaca.

Quando se aproximou do lago pode ver o amigo sentado um pouco longe da margem, escorado nos braços, o rosto voltado para cima. Andou até ele de modo silencioso e simplesmente se sentou ao seu lado. Sirius percebeu a presença de alguém próximo a si e olhou para o rosto para James, voltando à mesma posição de antes após reconhecer o amigo.

- Me desculpe. Por ter agido como um idiota.

- Você é um idiota, James – o moreno comentou ainda olhando para cima.

- Eu sei – James rolou os olhos. – Mas isso não justifica o modo como agi ontem. Eu só queria me certificar de que você estava bem e acabei surtando – ele suspirou. – É só que você sempre sabe como agir quando eu estou mal ou tenho algum problema e eu queria poder fazer isso por você também, mas não faço ideia do que houve com você.

Sirius moveu-se um pouco, desconfortável, e cruzou as pernas.

- Eu não queria agir diferente com vocês. Nem imaginava que vocês haviam percebido algo.

- Claro que percebemos, Sirius! Nós nos importamos com você. Bom, Peter não percebeu, mas ele não conta. Ele é meio desligado.

- Eu só... não posso admitir que tem algo errado. Porque se admitir eu precisarei lidar com o problema e não posso fazer isso agora. Entende?

- Sim. Me desculpe por pressionar você. E saiba que quando decidir que pode falar sobre isso, eu vou estar aqui para te escutar.

- Obrigado, James – o garoto murmurou com gratidão. – Desculpo você se me desculpar por agir diferente com vocês. Eu não queria, acho que apenas não consigo evitar. Prometo que não farei mais isso.

- Bom, não se desculpe apenas comigo. Remus também percebeu – James percebeu um leve tremor no amigo ao falar de Remus e então entendeu algo. – É ele, Sirius? É Remus o problema?

- O que... Por que você..? Por que acha isso?

- Porque você parece se perturbar quando ele está perto ou quando falo dele e... – James se calou, vendo o olhar horrorizado de Sirius. – Desculpe, você não quer falar sobre isso.

Ambos ficaram em silêncio alguns minutos. James olhava o lago, Sirius estava com os olhos fechados.

- Sim.

- O que? – Potter virou-se de volta para o amigo, confuso.

- Sim, o problema é Remus – os olhos ainda fechados denunciavam a resistência do moreno de falar sobre o assunto.

- Sirius, não precisa falar se...

- Não. Eu acho que preciso falar sobre isso, de qualquer forma.

- Ele... Ele fez algo? – James perguntou confuso, não conseguia imaginar o que Lupin, sempre tão bom, poderia ter feito para deixar Sirius daquela forma.

- Não. O problema não é com ele, é comigo. É o que eu estou sentindo – Sirius pareceu meio estrangulado. – James, eu o amo.

- Eu sei, eu também. Somos amigos há seis anos. Amo todos vocês. – James ainda parecia confuso.

- Não! – Sirius bufou, irritado e meio desesperado para se fazer entender. – Eu quero dizer, eu amo Remus, estou apaixonado por ele.

- Oh! – James finalmente entendeu, soltando uma exclamação de surpresa com o que Sirius dissera. – Isso é... Bom, isso realmente não havia passado pela minha cabeça.

- Não me odeie.

- Odiar você? Por que eu faria isso, Sirius?

- Porque é horrível! – Sirius choramingou, escondendo o rosto.

- Não é horrível, Padfoot – James rolou os olhos. – Olha só, você está reagindo exageradamente a isso.

- Exageradamente?! James, consegue imaginar como Remus se sentiria se soubesse disso?

- Lisonjeado, talvez? – o garoto riu levemente.

- Estou falando sério, Potter!

- Eu também, Black! Olha, não consigo entender o que te fez surtar dessa forma por causa disso.

- Isso é porque você é extremamente obtuso.

- Não, isso é porque não existe razão pra tanto drama. Você está agindo estranho esse tempo todo porque está apaixonado por Remus? – James perguntou meio incrédulo, recebendo um “shhh!” irritado do amigo. – Você descobre que está apaixonado pelo garoto e começa a agir como se ele tivesse matado seu cachorro? Em que mundo isso faz sentido?

- Quer parar de repetir isso?

- Repetir o que? Que você está apaixonado por Remus?

- Para!

- Sirius, você já admitiu, agora lide com isso. É perfeitamente normal se apaixonar, Padfoot.

- Não por um amigo.

- Na verdade é sim, porque os amigos são pessoas que gostamos e com as quais nos sentimos bem.

- Eu quis dizer, um amigo.

- Ah. Bom, não é comum, mas acontece.

- Talvez você não ache estranho, Prongs, mas o resto do mundo não pensa assim.

- Mas o que importa aqui não é o resto do mundo, certo? Remus é quem importa.

- Certo – Sirius olhou com incredulidade para James. – Vamos apenas supor que ele não vai se assustar nem parar de falar comigo por achar que sou uma aberração, isso não quer dizer que existe qualquer chance de ficarmos juntos. Por que então eu contaria pra ele, apenas para expor meus sentimentos sem nenhuma perspectiva de reciprocidade?

- Porque isso parece estar incomodando você, Padfoot! Você nem mesmo consegue ouvir o nome dele sem ficar todo esquisito e mudar de assunto.

- Eu já disse que não sabia que estava agindo assim! – Sirius bufou com frustração, sentindo necessidade de expor ao amigo como se sentia. – James, eu estou assustado e confuso! É tudo muito esquisito porque nunca me senti dessa forma antes por ninguém, e quando finalmente acontece, não existem chances de dar certo porque Remus e hétero e o que ele iria querer comigo afinal? E eu não sei o que fazer porque parece que uma parte de mim se rasga cada dia mais e toda vez que o vejo. Então é óbvio que isso está me incomodando!

James ficou em silêncio absorvendo o que Sirius dissera. Ele só podia imaginar como devia estar sendo difícil para o amigo esconder o que sentia, como devia estar sendo difícil passar vinte e quatro horas por dia ao lado de Remus e não dizer nada a ele. James pensou no quanto o amigo estava assustado, quanto medo ele devia estar sentindo, a ponto de fazer com que mantivesse tudo em segredo mesmo que isso acabasse com ele.

- Há quanto tempo você sabe?

- Descobri há alguns meses – Sirius suspirou, deitando-se na grama. – Mas pra ser sincero com você, estive pensando e acho que me sinto assim há muito tempo, só não tinha percebido ainda o que era, agora me parece que me sinto assim desde que conheci Remus, sempre foi diferente com ele, não sei se consegue entender o que digo.

- Eu entendo. Na verdade, faz bastante sentido – James concordou, deitando-se do lado do amigo. – E o que pretende fazer agora?

- Como assim o que pretendo fazer agora? Não pretendo fazer nada, a não ser continuar a agir como se nada estivesse diferente.

- Sirius, já provou pra todos nós que não consegue agir como se nada estivesse diferente.

- Eu vou me esforçar. De verdade – Sirius afirmou, categórico, e então se sobressaltou com algo que lhe passou pela cabeça. – James, você não pode nunca contar isso pra ninguém, você me entendeu? Principalmente para Remus! Você não pode contar!

- Eu sei, Padfoot! Não vou contar nada a ninguém, o que te faz pensa o contrário?

- Não sei, talvez você tenha uma de suas geniais ideias de resolver as coisas e acabe estragando tudo como sempre faz.

- Olha aqui, Sirius, minhas ideias geniais nunca estragam tudo, entendeu?

- Que seja, apenas não tenha nenhuma ideia genial quanto a isso.

- Eu sei, Padfoot. Até eu consigo perceber que esse é um assunto que vocês precisam resolver sozinhos.

- Certo. Mas não vamos resolver nada. Simplesmente vou continuar sendo amigo de Moony como antes, porque isso basta.

James concordou em silêncio, apenas contemplando o sol, enquanto pensava que era óbvio que aquilo não bastava, não para Sirius. Mas não comentou nada, eventualmente o garoto descobriria aquilo e tomaria uma atitude.

Só espero que não demore muito – pensou, virando o rosto para ver Sirius com os olhos voltados para o céu.

-

Assim que começou a escurecer, James e Sirius encaminharam-se para o salão principal conversando sobre coisas aleatórias. Chegaram à mesa da Grifinória e Lily acenou para os dois, que foram até onde ela estava sentada, James sentou-se ao lado dela e Sirius se colocou no lugar a frente de Lily, do lado de Peter. A garota sorriu, percebendo que já estava tudo resolvido.

Antes que eles pudessem dizer qualquer coisa, Remus chegou meio apressado e se sentou do outro lado de Sirius.

- Desculpe o atraso, perdi a noção do tempo na biblioteca.

- Remus – James começou com uma careta de desgosto –, quem é que perde a noção do tempo na biblioteca? Como eu disse ontem para Sirius, você é muito corvinal às vezes.

- Bom, sua constatação está seis anos atrasada e o chapéu disse Grifinória, então... – ele sorriu, logo em seguida virando-se para Sirius, ansioso por saber se estava tudo bem novamente.

- De qualquer forma, Sirius e eu também acabamos de chegar – James deu de ombros, começando a se servir em seguida.

Remus suspirou aliviado porque aparentemente os amigos estavam se falando normalmente. Tudo o que queria saber era se Sirius voltaria ao normal ou continuaria meio soturno como estivera nas últimas semanas. Sorriu para ele num questionamento mudo. Sirius retribuiu ao sorriso lembrando-se do que dissera a James e depois voltou a atenção para seu prato, tentando controlar a vontade de gritar todo seu desespero.

Dessa vez ele não saiu antes do final da janta e quando estavam todos os cinco voltando para a torre da Grifinória, Remus diminuiu o passo e se aproximou dele. Aproveitando que Peter estava distraído com um bolinho e James e Lily conversavam um pouco mais a frente, ele se dirigiu ao moreno.

- E então, está tudo bem? – perguntou um pouco encabulado.

- Sim. Quero dizer, eu falei com James hoje a tarde e... Bom, está tudo normal novamente – Sirius sorriu levemente. Então seu sorriso voltou a desaparecer. – Moony, desculpe pelo modo como tenho agido com vocês. Eu só estava com algumas coisas na cabeça e, bem, de qualquer forma, não deveria ter descontado em vocês.

- Sem problemas, Pad, eu entendo – Remus sorriu grandemente, feliz por ter o amigo de volta. – Se quiser falar sobre o que o incomoda, sabe que eu estou aqui.

- Sei. Mas já resolvi tudo, prometo que não vou mais agir de outro modo que não seja eu mesmo, certo? – ele sorriu fracamente, encarando o amigo.

- Fico feliz por você estar de volta, Sirius – Remus passou o braço esquerdo pelos ombros do amigo.

- Eu também, Moony, eu também – Sirius o abraçou de volta, sentindo-se mal por mentir para Remus, mas feliz por tê-lo de volta. Mesmo que não fosse por inteiro.

-

Ninguém podia dizer que Sirius não estava se esforçando para agir normalmente. Ele voltara a ser ele mesmo, com algumas sutis diferenças. Ainda se esforçava para não ficar muito tempo sozinho com Lupin, para não fazer ou falar nada do que se arrependeria depois, mesmo que isso o quebrasse ainda mais, porque ele sentia muita falta de conversar com o amigo. Também continuava a se tornar meio pensativo às vezes, sempre ficando um pouco soturno depois desses momentos de reflexão.

James percebia esses pequenos lapsos, mas se mantinha quieto, sem saber o que mais fazer. Obviamente Lupin também percebia que Sirius continuava a agir estranho com ele – mesmo que com frequência muito menor –, mas esperava que com o tempo o moreno voltasse completamente ao normal.

James e Sirius estavam voltando sozinhos da aula de Defesa Contra as Artes das Trevas uma tarde, Remus se encontrava na enfermaria se recuperando de sua última transformação e Peter não conseguira nota suficiente nos NOM’s para fazer a matéria. James comentou algo sobre Lupin e viu Sirius mudar a expressão por um instante, o que o levou a externar o que estava pensando já há uns dias.

- Sirius, você disse que não quer contar a Remus como se sente pra que ele não se afaste de você, mas não percebe que é você quem está se afastando dele.

Sirius parou no corredor e encarou o amigo como se quisesse acertá-lo com algum feitiço doloroso. Recomeçou a andar, em silêncio.

- Não sei da onde tira essas ideias, James.

- Por favor, não insulte minha inteligência dizendo que está agindo normal com ele.

- Claro que estou! – Sirius o encarou, indignado. – Vamos até a enfermaria agora mesmo, pode perguntar o que ele acha.

- Tenho certeza de que ele ficaria do seu lado, como sempre! – James rolou os olhos. – Sinceramente, Sirius, não me surpreenderia se ele também estivesse apaixonado por você.

- Cala a boca! – o moreno empurrou James na parede, com uma expressão de pânico.

- Desculpe – o garoto levantou as mãos em sinal de rendição. – Não precisa ficar todo estranho quando eu toco no assunto.

- Não tem motivo para você tocar no assunto – Sirius comentou, estrangulado.

- Padfoot, estou falando sério! Você ainda parece estar evitando Remus de vez em quando. Você não quer que ele pense que está com raiva dele, quer?

Sirius suspirou, parecendo muitíssimo cansado. Se James percebera que ele estava evitando Remus, então era obvio que o garoto também percebera.

- Eu não o estou evitando, Prongs! Só é complicado falar com ele às vezes, sei que você pode me entender. E ficar sozinho com ele também, porque posso deixar escapar alguma coisa.

- E então você prefere ter uma fantasia de amizade?

- Não é nenhuma fantasia, James, ainda somos tão amigos como antes.

- Claro, claro. Você realmente prefere manter a sua relação com ele do jeito que está agora do que contar a verdade?

- Sim! – Sirius falou enfático, virando-se para James e obrigando-o a parar. – Sabe por quê? Porque eu não conseguiria aguentar se ele parasse de falar comigo de vez. Eu iria ficar cem, mil vezes pior do que estou me sentindo agora, porque por enquanto, eu ainda tenho Remus, entendeu? E não se meta nesse assunto, porque não diz respeito a você.

Sirius saiu pelo corredor, dizendo a senha para a mulher gorda e entrando no salão comunal de modo tempestuoso. James só pode ficar parado pensando que era claro que o assunto também dizia respeito a ele, afinal a felicidade de seus dois melhores amigos estava em jogo.

-

Alguns dias se passaram, Lupin já havia voltado da enfermaria e os garotos decidiram dar uma escapada até Hogsmeade, coisa que não faziam há algum tempo. Era uma sexta-feira à noite e o clima estava agradável, por isso as ruas do vilarejo estavam apinhadas e não tinha nenhum risco de serem vistos e identificados como alunos desgarrados de Hogwarts. Entraram no Três Vassouras e fizeram seus pedidos, sentando-se em um canto meio escondido.

- Madame Rosmerta não disse nada? – Peter perguntou, temeroso. – Ainda acho que um dia desses ela vai nos denunciar a Dumbledore.

- Claro que não, ela nos adora! – Sirius comentou, dando um gole em sua cerveja amanteigada. – Além disso, por que ela iria querer que parássemos de vir e gastar nossos galeões por aqui?

Peter considerou isso por um instante, relaxando em seguida.

- Corrigindo, por que ela iria querer que vocês dois parassem de vir? – Lupin comentou, fingindo desinteresse.

- Como assim, Moony? – James o olhou, intrigado.

- Bom, ela sempre parece bastante... hum, bastante interessada em você e Sirius.

James fez uma careta de confusão. Sirius olhou para a dona do bar, também não entendendo por que Lupin dissera aquilo. Ela servia alguém no balcão, mas assim que olhou para cima e viu que ele a olhava, deu um sorriso e uma piscadela.

- Viram? – Remus, que estava de frente para o balcão, comentou, bebendo um pouco do líquido a sua frente.

- Não acho que...

- Bem, eu tenho namorada – James cortou o que Sirius dizia, rindo. – Fique a vontade, Padfoot.

Remus engasgou, tossindo em seguida. Olhou para o tampo da mesa, mas nenhum dos três percebera de fato que ele havia engasgado. Sirius estreitou os olhos para James.

- Obrigado pela generosidade, James, mas realmente acho que Remus se enganou.

James sorriu, observando a reação inquieta de Lupin por uns instantes. Depois terminou o conteúdo de seu copo e sugeriu que eles fossem comer algo. Andaram até achar um restaurante de aparência agradável e fizeram seus pedidos, sentando-se em um lugar bom, porque naquela parte de Hogsmeade – mais para dentro do vilarejo – não precisavam se incomodar em serem reconhecidos.

Peter se distraiu perguntando a James como estavam as aulas de Defesa Contra as Artes das Trevas e dizendo que ficava feliz por não estar fazendo, porque sempre tivera péssimo desempenho na matéria. Lupin se lembrou de algo e virou para Sirius, que estava sentando ao lado dele.

- Padfoot? – Sirius se virou para ele, interessado. – Pode me ajudar com Poções? Sabe como sou péssimo nisso e não estou conseguindo fazer a minha Poção do Morto Vivo corretamente.

- Ahn... – o moreno pensou um pouco, apreensivo. – Claro. Claro que posso te ajudar.

- Ótimo – Lupin deu um sorriso aliviado, revelando o fato de que estivera com medo de que Sirius se recusasse a ajudá-lo.

O garoto levou um choque ao perceber isso. Não queria que Remus ficasse com medo de pedir ajuda a ele, ou que se sentisse mal em fazê-lo.

- Sempre que precisar de algo, pode me falar, Moony. Sabe que vou estar sempre disposto a te ajudar.

Lupin sorriu, sentindo algo dentro de si se aquecer. Pensou que Sirius estava começando a tratá-lo como antes.

Os pedidos dos garotos chegaram e eles comeram, conversando sobre assuntos diversos, pagando e voltando ao castelo logo em seguida, porque já estava realmente tarde. Subiram em silêncio até o dormitório, para não acordar o outro garoto que dormia lá, e se deixaram cair na cama, cansados e sonolentos após a boa refeição que fizeram.

-

James acordou tarde no outro dia, demorando-se na cama. Quando finalmente levantou, percebeu que era o único no quarto. Colocou as vestes e foi até o salão comunal, em busca dos amigos e da namorada. Encontrou os quatro em uma mesa no canto do salão comunal, isolados dos outros alunos. Sirius e Lupin faziam algo em um caldeirão e Peter assistia, enquanto Lily dava palpites ocasionais.

- Ei, o que estão fazendo? – ele olhou para o caldeirão, reconhecendo a Poção do Morto Vivo.

- Sirius está me ajudando com o trabalho que Slughorn passou – Lupin olhou para James, voltando em seguida a cortar alguma coisa.

Lily sorriu para o namorado, dando espaço no sofá onde estava sentada para que ele se acomodasse. Mas algo passou na cabeça dele e James recusou o lugar, rapidamente.

- Estou com fome. Lily, Peter, me acompanham até o salão principal?

- Você estava demorando, então nós já comemos – Lily olhou para ele, desconfiada.

- Sim, sim, mas não quero tomar café da manhã sozinho. Vocês podem comer de novo ou só ficar lá. Enquanto isso, Sirius e Remus terminam a poção. Encontramos vocês depois – ele falou, puxando Lily pela mão e Peter pelo braço.

Sirius estava entretido com a receita, por isso só percebeu o que o amigo havia feito quando os três já saiam do salão comunal. Tentou protestar, mas percebeu que não adiantaria nada, então só ficou amaldiçoando em silêncio o quando James era intrometido.

- O que houve com James? – Lupin perguntou, levantando os olhos do caldeirão.

- Não sei o que houve, mas sei o que vai haver se ele continuar agindo assim – Sirius bufou.

Remus balançou a cabeça, achando melhor não perguntar nada. Jogou o último ingrediente e mexeu, vendo a poção ficar transparente.

- Acho que deu certo dessa vez – ele sorriu, aliviado. Já estava entrando em pânico com aquela poção idiota. – Vou testar e engarrafar. Temos que entregar na segunda, certo?

- Sim – o moreno confirmou, passando um frasco destampado para Lupin.

- Fico feliz por ter você – Remus sorriu, tampando o frasco, sem perceber a reação que suas palavras causaram. – Provavelmente já teria explodido a sala de Poções sem sua ajuda.

- Também fico feliz por ter você – a voz de Sirius saiu em um sussurro. Ele encarou Lupin. – Muito feliz, Moony.

- Nem faço nada por você – Remus comentou baixinho, com um sorriso cúmplice, parecendo entender que naquela frase Sirius dissera muito mais do que queria dizer.

- Você não faz ideia de tudo o que faz por mim...

De repente, Sirius pareceu despertar, percebendo o que havia dito e como havia dito, percebendo também que sua mão estava muito próxima da mão do amigo. Levantou-se rapidamente, sentindo-se o mais estúpido dos seres humanos; quase se deixara levar, outra vez. Ele sabia que não devia ficar sozinho com Remus, que acabaria se entregando e estragando tudo.

- Remus, tenho que ir – ele parou por um instante, pensando aonde poderia dizer que ia – até a biblioteca.

- Hoje é sábado! – o castanho riu, achando a ideia de Sirius na biblioteca em um sábado extremamente engraçada. – Estava pensando que poderíamos fazer alguma coisa. Faz dias que não passamos um tempo juntos.

- Não – Sirius quase gritou, pensando que tudo o que menos precisava no momento era fazer alguma coisa sozinho com Lupin. – Desculpa, Remus, tenho que ir, mesmo.

E antes que Lupin pudesse tentar convencê-lo, Sirius saiu quase correndo pelo salão comunal, desviando com agilidade de mesas, sofás e alunos e saindo pelo retrato. Só parou alguns corredores a frente, lembrando-se de que não tinha destino definido. Decidiu que iria realmente até a biblioteca, lugar onde podia ficar em silêncio colocando seus pensamentos no lugar.

Estava tudo tão confuso para ele, nos últimos meses. Aos poucos foi percebendo que sua necessidade de ter Remus por perto e sua impaciência quando ele estava na enfermaria, ou de algum modo impossibilitado de estar perto dos amigos, significava que o que ele sentia pelo garoto ia um pouco além da amizade. Surgira com a amizade, é claro, mas ia mais além. Era diferente do que tinha com James, de se sentir bem ao conversar e saber que podia contar sempre com ele. Era saber que só se sentiria bem com a certeza de que Remus estaria por perto, poder contar ao garoto tudo o que queria, expor o que sentia e se sentir feliz com isso. Era cumplicidade, necessidade. Era amor.

E descobrir que amava Remus fora um choque tão grande que o modificara barbaramente por muito tempo. Como podia novamente olhar na cara do amigo quando havia traído a amizade deles e se apaixonado por ele? Como se sentir bem sabendo que Remus contava com ele e confiava nele, enquanto ele só queria beijá-lo e dizer que o amava, e se aproveitava da confiança nele depositada para ter o garoto sempre por perto? Ele estava se aproveitando de Lupin, aproveitando da amizade que tinham para satisfazer sua necessidade de tê-lo por perto, mesmo sabendo que se Remus descobrisse o que Sirius verdadeiramente sentia, nunca mais tornaria a ficar no mesmo ambiente que ele.

Ele precisou de tempo para se controlar, para decidir o que fazer. Sabia que antes mesmo de descobrir que amava Remus, andara deixando indiretas sutis escaparem quando estava sozinho com o amigo. Quando percebeu isso, decidiu não mais se deixar ficar sozinho com Remus. E se ele percebesse? Não havia a menor chance de suportar a rejeição. Se algum dia Remus decidisse se afastar dele, Sirius sabia que não conseguiria suportar. Precisava demais dele por perto, isso era fato.

Saber que nunca teria Remus como queria de verdade, por inteiro, e o peso de ter que se afastar sutilmente do amigo, tudo para não perder o que eles já tinham, havia acabado com Sirius. Como ele sentia falta das noites que os dois passavam jogando xadrez bruxo, andando pelo castelo ou simplesmente conversando na torre de Astronomia. Sentia falta do quanto era fácil conversar sobre qualquer assunto com Lupin e como ele sempre parecia compreendê-lo inteiramente. Mas todas essas coisas o faziam lembrar por que se apaixonara e isso era muito doloroso.

Estava sentado em um dos bancos da biblioteca pensando em todas essas coisas e no que fazer para resolvê-las, o livro aleatório que pegara, largado aberto a sua frente. Ergueu a cabeça para dar uma olhada em volta e percebeu algumas garotas da Corvinal o observando. Uma delas sorriu ao encontrar seu olhar. Meio confuso e ainda perdido em pensamentos, ele retribuiu automaticamente ao sorriso, dando um breve aceno. A garota pareceu prestes a desmaiar de enlevo. Voltou a olhar para o livro que pegara, sem realmente vê-lo. Seus pensamentos em Remus.

- Olá.

Sirius ergueu a cabeça abruptamente, assustado com o cumprimento que o arrancara de suas divagações. Era a garota para a qual ele retribuíra o sorriso, estava sentada logo a frente dele, os braços apoiados na mesa. Olhou para o lado e percebeu que as amigas dela haviam sumido.

- Ahn... Olá.

- Percebi que estava sozinho aqui, o que é bem incomum, porque geralmente você está cercado pelos seus amigos – ela sorriu. – O que torna bem difícil a aproximação.

- Ah, bem... – Sirius estava atordoado com a presença da garota, sem saber exatamente o que dizer. – Eu precisava pesquisar algo, então...

- Nossa! – a garota parecia impressionada. – Nunca te vi na aula de Runas Antigas, aprendeu sozinho?

Ele ficou confuso por uns instantes, sem saber do que ela estava falando. Só então percebeu que o livro que pegara na estante e supostamente estava lendo esse tempo todo era todo escrito em runas. Ficou um pouco constrangido e murmurou uma resposta aleatória, fechando o livro e colocando-o de lado.

- Sabe, eu estava pensando – ela começou, parecendo envergonhada. – Temos aquela visita a Hogsmeade marcada para a próxima semana. Talvez você pudesse querer uma companhia diferente... Eu adoraria ir com você. Sabe, se estiver a fim.

Sirius finalmente superara a surpresa da abordagem da garota (elas geralmente não eram tão diretas). Passou a observá-la atentamente. Era bonita. Tinha cabelos longos de cor meio indefinida, um belo tom entre castanho claro e loiro, os olhos expressivos de um azul mais claro que o dele, os lábios bem desenhados eram ressaltados da pele bem branca por serem rubros e cheios. Na verdade, bem mais do que bonita. E Sirius ficou um pouco apreensivo por não se sentir atraído por ela.

Pensou um pouco, imaginando se não seria uma boa ideia aceitar o convite dela, sair com alguém, distrair seus pensamentos de Lupin. Decidiu aceitar, mas antes que pudesse responder, James apareceu, saindo de um dos corredores entre as estantes.

- Finalmente! – o garoto falou um pouco alto demais, atraindo olhares irritados de algumas pessoas por ali. – Remus disse que você estava na biblioteca, mas não tinha acreditado nele.

A garota olhou para trás, na direção de James, parecendo irritada. Percebeu que Sirius estava prestes a dizer que sairia com ela e ficou com raiva da interrupção de um dos amigos que viviam agarrados a ele.

- O que você está fazendo aqui? Hoje é sábado! – James encarou o amigo como se ele tivesse enlouquecido. – Nós vamos sair. Vem.

Sirius levantou rápido, indo em direção ao amigo. Olhou para a garota com ar de quem se desculpa, mas ela sorriu novamente para ele.

- Se decidir que quer ir comigo, só me avisar – ela piscou. – Fazemos Feitiços juntos. Alessa Jenkins.

- Ahn... certo – Sirius acenou com a cabeça, pensando se deveria dizer seu nome também. Imaginou que sim. – Sirius Black.

- Eu sei – a garota riu, achando que ele estava tentando ser engraçado. – Até!

James o puxou levemente, parecendo muito contrariado. Passaram rápido por entre as estantes e quando já estavam do lado de fora da biblioteca, ele se virou para Sirius, olhando feio para o amigo.

- O que é que você estava fazendo? – James parecia prestes a azarar Sirius. – Tirei Lily e Peter do salão comunal para deixar o caminho livre para você e você simplesmente deixa Remus sozinho e vem ficar de gracinha com uma corvinal na biblioteca?

- Eu não estava de gracinha com ninguém, James, para de ser idiota! E, além disso, que ideia é essa de deixar o caminho livre? Quem foi que te pediu para fazer alguma coisa? Não te mandei não se meter nisso?

- Eu estou te ajudando!

- Então pare! E se eu quiser sair com ela, você com certeza não vai me impedir.

James estacou no lugar com essas palavras, agarrando Sirius pelas vestes e o deixando assustado. Sua expressão estava tão furiosa que Sirius nem mesmo tentou escapar.

- Escuta aqui, seu imbecil – James começou a falar e sua voz era um silvo furioso. – Se você quer mentir para Remus, ok, eu não posso fazer nada quanto a isso. Mas não pense, nem por um minuto, que vou deixar você mentir para si mesmo. Você sabe que não quer ficar saindo com nenhuma dessas garotas e não vai fazer isso só porque pensa que o que sente é errado. Você me entendeu?

- James, eu...

- Você me entendeu? – a voz do garoto saiu tão decisiva que Sirius só pode acenar afirmativamente. – Ótimo.

James soltou o amigo, passando a mão nas próprias vestes para ajeitá-las. Esperou Sirius se recompor e então voltou a andar, sentindo mais do que ouvindo a presença dele ao seu lado. Estava com raiva do modo como Sirius estava agindo e querendo que ele entendesse logo que só piorava tudo em suas tentativas de manter a amizade dele com Remus. Era óbvio que não estava dando certo, estava claro como um dia de verão que Sirius nunca ficaria feliz tendo Remus apenas como amigo.

E ele tinha suas dúvidas de que Lupin se sentisse do mesmo modo quanto a Sirius. Na verdade, isso se tornou bastante claro para ele quando passou a observar a relação dos dois, depois de Sirius confessar a ele que se apaixonara por Remus. Mas Sirius não acreditaria nele se ele lhe contasse isso e ele não podia contar a Remus porque prometera manter segredo. Suspirou com raiva da dificuldade que as coisas assumiam de vez em quando.

- Aonde nós vamos? – Sirius começou, com um pouco de medo da reação de James. – Você disse que vamos sair.

- Não vamos a lugar nenhum. Só queria que você saísse de perto da garota.

Sirius lançou um olhar azedo ao amigo e bufou, acelerando o passo e andando na frente dele em direção a torre da Grifinória.

- Estamos todos sentados lá fora, não vai até lá com a gente? – James falou alto, quando viu Sirius virar em um corredor, a sua frente.

- Não. Vou para o dormitório – Sirius respondeu sem se virar.

Ele chegou rápido no quarto e se jogou em sua cama, pensando que a vida já estava difícil o suficiente sem James tentando bancar o cupido. O garoto parecia ter tomado como missão pessoal fazer com que Sirius e Lupin ficassem juntos, por mais impossível que isso fosse – na visão de Sirius. Não que ele não quisesse, era óbvio que o que ele mais queria em sua vida era estar com Remus, mas não queria se dar esperanças, sabendo o quanto era improvável que o castanho um dia viesse a se sentir do mesmo jeito sobre ele.

Não estava deitado em sua cama, lamentando sua sina infeliz, nem há cinco minutos quando ouviu a porta ser aberta com força. Levantou com a expressão mais furiosa que conseguiu, pronto para mandar James deixá-lo em paz de uma vez, mas não era James quem estava na porta, olhando para ele com preocupação. Era Lupin.

- James te mandou aqui? – Sirius perguntou ironicamente, tão logo recuperou a fala.

- James? Não! Por que James me mandaria aqui? – Remus se aproximou do moreno, confuso. – Ele saiu para te procurar e não voltou, então vim procurar vocês. Ele não te encontrou ainda?

- Ah, com certeza ele encontrou! – Sirius ficava cada vez mais sarcástico.

- Padfoot, por que está usando esse tom comigo? – a voz de Remus saiu magoada, enquanto ele chegava mais perto do amigo.

- Me desculpe – Sirius corou, percebendo que estava agindo como um babaca. – James me deixou irritado e eu... Bem, me desculpe.

- Vocês brigaram outra vez?

- Mais ou menos.

- Mas eu não tenho culpa disso, tenho?

- Eu já pedi desculpa, Moony, não precisa ficar desse jeito – o moreno rolou os olhos e cruzou os braços, em tom de desafio.

- Bom, eu só queria saber por qual motivo você está agindo assim comigo. Você disse que ia voltar ao normal, mas continua me tratando diferente.

Eles ficaram se encarando em silêncio por alguns minutos, Lupin encarava Sirius com uma expressão determinada, querendo fazê-lo entender que não desistiria até receber uma resposta. E Sirius nunca o achara tão bonito. Com o cabelo meio desorganizado pelo vento que soprava lá fora e o rosto expressando uma leve petulância, os olhos cor de âmbar brilhando de modo perigoso, os braços cruzados e a gravata meio solta. Precisou de todo seu autocontrole – que não era muito – para não puxá-lo pela gravata e apagar o atrevimento de seu rosto com um beijo.

Percebeu que conseguiria pensar melhor se afastando daquela visão e virou para a mesa ao lado de sua cama, pegando a varinha de cima dela e guardando dentro das vestes.

- Não estou te tratando diferente, Moony. Você tem conversado muito com James, está ficando tão paranóico quanto ele – tentou dar um ar de displicência ao que falava, mas não achou que conseguira isso muito bem.

Ainda mexia em pergaminhos aleatórios que se encontravam na mesa quando sentiu a mão de Remus em seu ombro e se virou para ele, alarmado com a proximidade. O castanho já não tinha aquele ar de superioridade, mas parecia cansado e infeliz.

- Sirius, por favor, me fala o que foi que eu fiz.

- Você não fez nada, Moony, de verdade.

- Então o que aconteceu? – Lupin soltou um suspiro frustrado. – Eu tenho pensado todos esses meses no que eu fiz para te afastar de mim, mas não consigo pensar em nada. Não sei por que você está agindo assim.

- Remus, escuta o que estou te falando. Você não fez nada de errado, está bem? – Sirius sacudiu um pouco o amigo, não querendo que ele pensasse que a culpa era dele. – Está tudo bem.

- Não está tudo bem! – Lupin estava quase gritando. – Não está tudo bem, Sirius! Não me faça implorar para você me dizer o que aconteceu.

- Não aconteceu nada! – Sirius falou, sua voz estrangulada. Aquilo já estava virando uma tortura, ver o castanho tão desolado. – Não tem nada acontecendo. Você entende isso? Agora, por favor, por favor, Remus, me deixe em paz.

- Não! – o castanho gritou, ao mesmo tempo em que a porta do dormitório batia com um estrondo. Ele pegou a varinha e lançou um feitiço de imperturbabilidade no quarto. – Você vai me dizer o que está acontecendo, Sirius, ou eu juro por Deus que vou azarar você e ninguém vai te ouvir gritando.

Lupin estava muito próximo de Sirius agora, a varinha apontada para o peito do garoto de um modo assustador. Sirius percebeu, pela primeira vez em anos de amizade, uma sombra do lobo passar pelos olhos de Remus, e se assustou com o quanto ele parecia fora de si. Deu um passo para trás, batendo as costas na parede do quarto.

- Remus, calma...

- Calma? – Lupin gargalhou sem nenhum humor. – Como você se atreve a me pedir calma? O mínimo que você pode fazer é me dizer por que começou a me evitar do nada!

- Eu não estou evitando! Eu estou falando sério – ele encarou Remus, querendo que o amigo visse a verdade do que ele diria a seguir. – Moony, não tem nada que me cause mais dor do que pensar em me afastar de você.

- Eu não acredito em você – a voz de Remus estava baixa e furiosa, e Sirius teve certeza de que preferia quando ele estava gritando.

- Você não entenderia, está bem? – o moreno agora parecia irritado.

- Então tente me explicar!

Eles se encararam por muito tempo e então Lupin finalmente se afastou de Sirius e se virou, dando a impressão de que estava determinado a ir embora. Mas ele apenas ficou andando pelo quarto por um tempo, parecendo decidir algo muito importante. Sirius continuava colado a parede, muito assustado com a explosão do castanho. Após uns minutos Remus se voltou para ele, chegando muito perto novamente. Sirius ficou horrorizado ao perceber que Lupin tinha lágrimas nos olhos.

- Você não pode fazer isso comigo, Sirius – Remus falou em um tom choroso, agarrando as vestes do garoto. – Eu te amo, eu preciso de você. Você não podia ter feito com que eu me apaixonasse por você e então simplesmente decidir que não mereço mais sua presença. Seu imbecil prepotente.

Sirius tinha certeza que Remus ainda falava algo, porque via a boca do amigo se movendo, mas já não fazia ideia do que era. Ele parara de ouvir todas as outras palavras quando Remus dissera que se apaixonara por ele. Ficou muito quieto, assombrado, tentando colocar as coisas em perspectiva. Seria possível que ele, entre todas as pessoas o mais interessado em saber se Remus retribuía ou não seus sentimentos, tivesse se perdido tanto na sua própria desesperança que não percebera que o tempo todo Lupin se sentia da mesma forma quanto a ele?

Olhou para o castanho, parecendo vê-lo pela primeira vez em meses. Lindo, mesmo com as lágrimas fazendo caminho pelo seu rosto, a face afogueada pelo esforço de finalmente despejar em Sirius tudo o que vinha querendo dizer há semanas. O moreno sorriu, sentindo felicidade pela primeira vez em muito tempo, sentindo-se finalmente completo. E, interrompendo algo que Remus dizia, puxou-o para bem perto, passando o braço por seu corpo, enlaçando-o como queria fazer desde que o conhecera.

Lupin pareceu atordoado e apoiou as mãos no peito do moreno quando este o puxou. Antes que ele pudesse perguntar o que estava acontecendo, Sirius encerrou toda a distância entre eles, iniciando um beijo voraz e desejoso. O castanho retribuiu com a mesma vontade, mal ousando acreditar que estava realmente beijando Sirius.

Eles continuaram abraçados por muito tempo, beijando ou simplesmente sorrindo, sem motivo nenhum e com todos os motivos do mundo, e então voltando a se beijar. Não precisaram dizer nada naqueles momentos, e apesar de ambos estarem cheios de dúvidas e medos, tudo o mais foi esquecido quando estavam finalmente juntos.

- Não que eu esteja reclamando – Lupin começou, depois de muito tempo e de um beijo que o deixou particularmente sem rumo –, mas por que você está me beijando?

- Porque eu sempre quis fazer isso. Porque eu sinto muita falta de você. Porque você é a única pessoa que eu quero. Porque eu te amo.

Remus sorriu, feliz. Teve tanto medo do afastamento súbito de Sirius, e depois disso, ouvi-lo dizer que o amava era quase surreal.

- Eu também amo você. Deve ter me ouvido dizer isso quando eu estava... ahn... gritando com você.

Sirius gargalhou, sentando-se em sua cama e puxando Lupin com ele.

- É, eu ouvi algo assim, mesmo.

- Por que estava se afastando de mim, Padfoot? – o garoto pareceu se entristecer por um momento. – Por que não me disse nada?

- Porque eu estava com medo de que você me odiasse e nunca mais olhasse na minha cara.

- Como pode pensar isso? – Lupin segurou o rosto do moreno entre as mãos. – Você não percebe que é a pessoa que mais importa para mim? Você quase me matou agindo assim, Sirius.

- Bom, foi igualmente difícil para mim. E você também não me disse nada.

- Mas nunca tentei me afastar de você.

- E você vai ficar jogando isso na minha cara para sempre? Não seria melhor se a gente só ficasse se beijando?

- Idiota.

Remus rolou os olhos, mas estava rindo também. Concordou com Sirius e puxou o moreno pela gravata até que ele ficasse muito perto, acariciando o cabelo preto. Os olhos se encararam fixamente, cinzento e âmbar, e nenhum deles parecia querer quebrar esse contato. Sirius sorriu com calma, respirando contra a pele do pescoço de Remus e gostando da reação que causou com isso. Mordiscou a pele muito branca, deixando marcas sutis. Voltou a encarar o castanho, vendo a expressão de prazer em seu rosto.

Lupin levantou a mão e tocou o rosto de Sirius lentamente, apreciando o contato. Só ele sabia quanto tempo passara desejando poder tocar o amigo dessa forma, poder tê-lo a essa curta distância, poder beijá-lo sem medo.

- Você é lindo, sabia? – Lupin riu ao ver que Sirius havia corado com suas palavras. – Quer namorar comigo?

- Não tem nada que eu queira mais.

Eles trocaram outro sorriso cúmplice e voltaram a se beijar, alheios a todo o resto.

-

James subiu as escadas sem pressa, tencionando chamar os amigos para a janta. Quando chegou ao fim da escada, percebeu que um silêncio anormal reinava ali. Bateu na porta, percebendo pela ausência de som que ela estava imperturbada. Ficou apreensivo, imaginando por que teriam lançado um Feitiço de Imperturbabilidade na porta, e a abriu, cauteloso.

Ficou um pouco surpreso com a cena que viu, mas logo deu um sorriso. Sirius e Lupin pareciam bem entretidos em se beijar, tão entretidos, de fato, que nem perceberam que alguém abrira a porta. Fechou novamente a porta imperturbada, pensando que, afinal, nem precisou fazer nada para que os amigos se resolvessem.


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Notas finais do capítulo

Essa é outra das ones mais longas que tenho escrito... Achei maravilhoso escrevê-la e amei o resultado final.
Amo esse Sirius surtado e perdido e esse James todo "vou resolver seu problema porque você é muito tapado pra resolver sozinho". hahaha
~
Eu percebo constantemente que em geral não trabalho tanto quanto gostaria com o James, porque eu realmente o amo e etc, mas acabo não dando muito espaço pra ele nas minhas fics e não dialogando com ele tanto quanto queria. Nessa eu me redimi, até porque vemos bastante dele e o quanto ele é leal e preocupado com seus amigos, que é como tenho certeza que ele era.
Acabei fazendo dessa uma fic com mais foco na relação James/Sirius do que Remus/Sirius. A amizade deles sendo trabalhada enquanto os dois discutiam sobre o que Sirius sentia e o que James podia fazer para ajudar, etc. Lindos!
Mas é claro que não falta uma pegação Wolfstar no final, porque eu não vivo sem ♥
~
Gente, eu acho que nunca tinha falado tanto...