Encarava-me no espelho do banheiro em meu dormitório me achando a pessoa mais patética do mundo. Meu semblante estava abatido e eu estava cheia de olheiras arroxeadas sob os olhos. Tomei um enorme susto ao ouvir meu celular tocar e ao reconhecer o número, logo atendi.

– Você tem alguma noção do que eu estou sentindo? Nenhuma das pessoas que me entrevistaram ligou! Vou virar uma mendiga e morar debaixo da ponte sem trabalho e com minha faculdade trancada. Terei que ficar na fila da marmita junto com vários mendigos que não conseguiram arrumar um emprego e andar nas ruas como um gato vadio! Bryan, eu não irei durar nem dois dias! – exclamei desesperada.

– Olá, Rainha do drama. Eu estou bem, obrigado por perguntar e você? – eu conseguia imaginá-lo revirando os olhos e bufando ao ouvir meu desespero pelo telefone – Lolita, fique calma ok? Você só está desempregada há menos de uma semana e já está com todo esse fuzuê, garota?

– Byan você é um péssimo melhor amigo! Tinha que estar me ajudando ao invés de zombar da minha cara aí na praia vendo esses gostosos seminus! – falei furiosa.

– Lolinha, meu amor, você é linda e gostosa, então vai dar para o Logan que seu mau humor passa rapidinho e aí sim você verá que sua vida estará brilhante, com pôneis coloridos e arco-íris.

– Você quer que eu fume maconha? – perguntei rindo – Porque eu não vejo como o Logan vai me fazer ver pôneis coloridos sem ser dessa forma.

– Viu? Já está melhorando o humor, primeiro passo concluído. Não é hoje que você vai almoçar com a família do Logan?

– Ai meu Deus, Bryan! O que eu vou fazer? É hoje e eu não tenho meu melhor amigo que cursa moda aqui para me ajudar a escolher uma roupa descente. – recomecei a me desesperar.

– Sabia que era só por isso que você era minha amiga. – brincou fingindo estar magoado – Use aquele sutiã de renda branca e bojo que deixa seus peitos parecendo maiores e aquele vestido azul maravilhoso que está enfurnado no fundo de seu guarda roupa. Como é um almoço não precisa colocar salto, calce aquela sapatilha branca bonitinha.

– Eu te amo! Não sei o que seria de mim sem você! – exclamei sorrindo e sentindo uma imensa vontade de abraça-lo – Estou com saudades.

– Eu também, Lolita, mas daqui três dias eu já estarei iluminando sua vida novamente. O Alexander está aí?

– A Lauren o levou para conhecer São Francisco, eles saíram há algumas horas. – contei enquanto enxugava meu corpo, já que havia saído do banho um pouco antes do telefone tocar.

– Força na peruca Lolita! – ouvi sua gargalhada pela piada horrível por alguns segundos, antes dele se recompor – O Logan irá te encontrar em uma lanchonete perto da casa da Lauren meio dia, certo? – afirmei – Uma e meia da tarde irei te ligar para ver se você quer algum pretexto para cair fora do almoço sem parecer uma mulher desrespeitosa com os futuros sogros.

– Que desculpa você vai inventar? – perguntei penteando o cabelo.

– Fale que sua amiga descobriu que está grávida e está tendo um colapso nervoso e precisa de você urgentemente ou irá se jogar do Empire States. – respondeu tentando ser sério.

Comecei a rir sendo acompanhada por Bryan e só parei quando minha barriga estava dolorida e possuía lágrimas nos olhos.

– Ai, Bryan, o que seria de mim sem você?

– Boa sorte, Lolita. Você pode até ir como Lira, mas não precisa fingir ser alguém que não é só para agradar os outros, ok? Você é uma pessoa fantástica do jeitinho que é e ninguém tem o direito de te fazer sentir inferior. Lembre-se disso e arrase geral.

– Obrigada Bryan, por tudo. – agradeci e desligamos o telefone.

Respirei fundo e lavei o rosto. Recomponha-se Lola! Meu rosto estava um pouco vermelho e meus olhos inchados, mas não poderia fazer nada a respeito agora, por isso resolvi ir procurar o bendito vestido azul do qual eu nem sabia a existência. Achei-o após retirar quase metade das minhas roupas para fora do armário, mas valeu a pena. Aquela roupa que Bryan escolheu realmente ficou maravilhosa em mim.

O vestido era soltinho, um pouco justo na parte de cima e possuía o decote em formato de coração. Aquele visual se encaixava completamente ao evento e agradeci mentalmente por Bryan conhecer melhor minhas roupas do que eu. Coloquei a peruca cuidadosamente verificando várias vezes se ela estava bem presa para que não ocorressem acidentes e eu fosse revelada. Passei uma leve maquiagem que consistia em rímel, base e um gloss que realçava os lábios.

Olhei para o relógio e vi que já eram onze e quarenta. Se não saísse naquele momento iria chegar atrasada. Peguei uma pequena bolsa branca para combinar com as sapatilhas e saí da universidade, conseguindo um taxi rapidamente. A facilidade de se encontrar um taxi era um fator que me fazia amar ainda mais Nova Iorque. O que seria de mim sem eles, afinal?

Graças à ausência de trânsito, chegamos à pequena lanchonete em quinze minutos. Enquanto estava parada na calçada, o receio me invadiu e comecei a ficar nervosa ao pensar em tudo que poderia dar errado naquele dia. Inspirei profundamente olhando para o céu azulado com algumas nuvens tentando me acalmar e dei um pulo ao sentir uma mão tocando meu ombro.

– Opa! Desculpa, Lira, não queria te assustar. Você está maravilhosa! Pronta para irmos? – perguntou Logan sorrindo.

Ele usava uma calça jeans escura juntamente com um tênis preto e uma blusa polo branca. Seu cabelo estava bagunçado, mas ao mesmo tempo arrumado, como se ele tivesse ajeitado os fios para que parecessem naturalmente desarrumados. Resumindo: ele estava muito gato.

– Obrigada, você também está incrível. – agradeci sorrindo – Estou pronta para ir, onde está seu carro?

~ ♥ ~

Por que gente rica gosta de ter essas casas enormes? Provavelmente até se perdem e devem ter aqueles mapas de identificação em algumas paredes apontando o ‘‘você está aqui’’ para saberem se orientar como nos shoppings centers. Mas se eu tivesse tanta grana minha casa seria exatamente assim. Havia me esquecido do quanto aquele lugar era esplendoroso .

O extenso e perfeitamente cortado gramado não possuía luzes douradas como da última vez na festa, mas as pequenas gotas de água faziam aquele lugar parecer uma pintura. O lugar possuía uma enorme janela, permitindo com que fosse possível visualizar o luxuoso salão vazio e as paredes de cor creme ainda tinham a coloração impecável. Olhei para o lado para dizer algo ao Logan, mas ele estava me encarando fixamente.

– O que foi? Tem alguma coisa estranha em mim? – perguntei passando a mão automaticamente em minha peruca.

– É estranho te ver em uma roupa simples e sem ser claramente provocativa. – comentou – Não que você não esteja provocativa, porque você está realmente muito gostosa com esse vestido.

– Gostosa é o melhor adjetivo que tem para mim? – perguntei arqueando a sobrancelha e cruzei os braços fingindo estar indignada.

– Tem razão, fui um babaca. – concordou rindo – Você, senhorita Lira, está completamente maravilhosa e sou o cara mais sortudo do mundo por ser seu falso namorado. – afirmou fazendo uma exagerada reverência e começamos a rir.

– Você é muito idiota, falso namorado. – falei rindo.

– Mas sou muito convincente. – falou dando uma piscadela e entrelaçando seus dedos nos meus.

Caminhamos em direção à porta que foi prontamente atendida por algum empregado alto e negro usando uniforme. O homem nos levou para a área externa que tinha uma grande piscina límpida e um jardim muito bem cuidado. Em uma mesa branca, os pais de Logan conversavam com as mãos dadas ose olhando apaixonadamente.

– Eles são tão lindos juntos. – sussurrei.

– São mesmo. Quero um amor assim para mim, ficar com alguém até a velhice, até termos tantas rugas no rosto que ninguém saberá que eu era maravilhoso e até eu quase não conseguir ver minha aliança por causa das dobras em meus dedos. – falou Logan surpreendendo-me.

– Então por que você é... Quer dizer, aparenta ser tão galinha? – perguntei quase dando um grande deslize.

– Estou solteiro, não vou ficar no celibato esperando pela pessoa certa. Fico com muitas mulheres e tenho certeza que nenhuma delas é a certa, por isso os casos não passam de uma noite. Na faculdade sou bem popular, mas tem pessoas lá que nem sabem da minha existência e são essas que quero conhecer.

– Por quê? Por que toda essa fixação pelas pessoas que não te conhecem lá?

– Quero ver se encontro minha ‘‘pessoa’’ lá. Meus pais se conheceram na faculdade e se apaixonaram. Quero ver se tenho a mesma sorte que eles, mesmo que isso signifique conhecer, pelo menos de vista, a maioria das mulheres naquele campus. – respondeu surpreendendo-me.

Nunca imaginaria que Logan realmente queria algo duradouro e que, por não sentir a ligação necessária com as mulheres que dormia, não as namorava. Passei a gostar dele como pessoa naquele instante, ele havia deixado de ser o alvo da minha aposta, alguém para sacanear e virou um colega, mesmo que ele não me reconhecesse como tal. Porém, aquilo me fez sentir ainda pior sobre fingir ser a namorada de Logan, pois seus pais realmente deveriam achar que ele achou a pessoa certa.

– Olá, Lira! É realmente um prazer ver que ainda não se cansou desse meu filho. – exclamou Melissa sorrindo e me abraçando.

Seu cabelo loiro estava solto e havia pouca maquiagem em seu rosto, possibilitando ver as rugas de expressão. Ela usava um short branco com uma blusa larguinha verde e uma maravilhosa sandália trançada.

– Seja bem vinda, Lira. – falou Edgar abraçando-se com um grande sorriso no rosto.

Ele usava uma blusa polo vermelha e uma bermuda bege e um sapato marrom claro. Seu cabelo preto com fios grisalhos estava balançando levemente devido ao vento e seus olhos castanhos brilhavam ao olhar eu e o Logan.

– É um prazer revê-los. – disse sorrindo.

Senti os braços de Logan me abraçando por trás e ele beijou meu ombro delicadamente. O sorriso de Melissa quase rasgou seu rosto e aquilo me fez sentir pior ainda pelo fingimento. Por sorte, aquele momento foi interrompido pelos empregados colocando os pratos na mesa. Graças a Deus.

Sentamo-nos para comer e fiquei encarando todos aqueles talheres diferentes completamente perdida. Havia quatro garfos de tamanhos variados, três do lado esquerdo e outro do direito, três de facas, dois cálices e muitos outros. Tive vontade de arregalar os olhos e sair correndo ao ver aquilo somado às comidas chiques que nem em um milhão de anos eu iria saber os nomes. Percebi naquele momento o quão grande era a distância econômica entre Logan e eu.

– Não irá comer, Lira? – perguntou Melissa cordialmente.

– Desculpe-me senhora, eu não faço a menor ideia de como usar todos esses talheres e tenho medo de parecer inapropriada. Nunca tive aulas de etiqueta para aprender essas coisas. – falei envergonhada mexendo-me desconfortavelmente na cadeira.

Levantei o olhar assim que Melissa começou a rir sendo acompanhada por Edgar e por Logan. Encolhi-me na cadeira sentindo meu rosto esquentar. Raramente corava e, diferentemente dos desenhos em que só as bochechas ficavam avermelhadas, a minha cara inteira virava um pimentão. E eu realmente odiava aquilo.

– Foi mal, amor. Isso tudo é uma brincadeira, não comemos com mais de um tipo de cada talher, relaxe. – falou Logan apertando minha mão e afagando meu braço.

– Nós realmente não quisemos constrange-la, é só uma iniciação em nossa família. – esclareceu Melissa – Bem vinda à nossa família, Lira.

Logan me olhou apavorado e retribui o olhar. Ele se levantou pedindo licença e me conduziu pela mão até ficarmos mais afastados de seus pais a fim de que eles não nos ouvissem.

– Acho que esse falso namoro não foi uma boa ideia. – falei.

– Concordo, vamos terminar.

– Você vai dizer que percebeu que eu não era a mulher certa. Mas não podemos terminar agora, tem que parar de dar notícias minhas aos poucos para eles irem se acostumando de nos ver separados.

– Mas como ainda temos que fingir ser apaixonados hoje...

Logan nem mesmo concluiu o que dizia e me deu um beijo. Passei meus braços ao redor de seu pescoço e ele me puxou pela cintura para mais perto. Ele realmente beijava muito bem. Quando nos separamos, como um bom namorado, ele começou a me dar selinhos e sorriu. Entrelaçamos nossos dedos e voltamos para a mesa de almoço, que já não tinha toda aquela diversidade de talheres – o que foi um grande alívio.

Uma coisa eu tinha que admitir: aquelas comidas dos ricos era realmente muito gostosa. Daquele jeito eu iria acabar fiando mal acostumada. O único contra era que costumava ver nos programas de televisão que os pratos chiques eram servidos em pequenas porções e tive receio de repetir e parecer uma esfomeada, já tinha ficado muito envergonhada por um dia só.

– Lira, fiquei sabendo de sua ajuda a terminar de convencer Barakah Afif, o árabe da festa, a fazer negócios conosco. Além de maravilhosa é também uma garota muito inteligente que tem alguns conhecimentos sobre negócios. Muito obrigado, vai ser uma honra ter você ao lado do meu filho para nos auxiliar com algumas coisas da empresa. – falou Edgar.

Conhecimentos sobre negócios aprendidos um dia antes, mas tudo bem. Pelo menos não fiz papel de boba naquela festa importante, já era um começo.

– Obrigada, Edgar. Foi um prazer ajudar. – agradeci sorrindo.

– Filho, vamos dar uma palavrinha em meu escritório, tem um assunto que eu quero tratar com você. – avisou o pai de Logan e os dois saíram andando.

Um silêncio estranho se instalou entre mim e Melissa. Sentia que ela queria falar algo, mas estava pensando encarando fixante a piscina. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando pensar em todas as possibilidades de pergunta que a mulher poderia me fazer. Mas nada poderia ter me preparado para o que ela disse.

– Sabe, me orgulho de ser uma mulher muito inteligente e bem observadora. Alguns acham que a empresa é só do meu marido, mas sou em quem toma grande parte das decisões. Então só vou perguntar uma única vez e espero que você seja bem sincera comigo porque estou gostando muito de você Lira. O que você está escondendo?