O Último Mago das Sombras escrita por QueenOfLetters


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Ok, ok. Demorou demais, mas tá aqui. Espero que gostem :3



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Estava novamente na cabana do sonho anterior. Um garoto saiu da casa carregando um grande saco de couro que parecia bem pesado. Ele tinha aproximadamente oito anos, usava farrapos e seu corpo estava assustadoramente sujo, a ponto de seus cabelos pretos parecerem quase marrons. Seus olhos negros ferviam de raiva e cansaço. Me aproximei. Era ele. O bebê.

Um menino e uma menina um pouco mais velhos saíram correndo da cabana e o empurraram, ele cai no chão com o saco por cima machucando seu corpo fraco e magrelo. Os irmãos riram vendo o garoto caído e o menino chuta seu rosto.

– Me obedeça, escravo! - ele falava com um sorriso debochado enquanto sangue escorria da face da criança caída.

– Revide, seu idiota! - a menina chutou seu joelho e disse como se se lembrasse disso agora. - Ah, é. Você é muito fraco para isso.

Ambos riram e repetiram os golpes algumas vezes entre gargalhadas. Então os olhos do garoto caído ficaram completamente negros e a clareira escureceu. A menina tremeu e se abraçou tentando se aquecer quando uma ventania fez as árvores balançarem freneticamente. O saco nas costas do menino caído voou e acertou o rosto do garoto mais velho fazendo a irmã gritar. Ele se levantou como se uma força invisível o puxasse para cima. Ele apontou para o irmão caído e com um sorriso perturbador o ergueu no ar. Ele se debatia e gritava sofrendo, como se fosse torturado. Como Meredith, só que pior. Sua irmã gritava de medo enquanto o brilho sumia dos olhos do garoto suspenso.

Os pais e três filhos mais velhos saíram assustados da cabana. A mãe gritou ao ver o garoto caído em um canto. O menino dos olhos negros apontou para a garota e seu pescoço girou matando-a. O pai, irado, correu é o socou, o sorriso do monstro se alargou é a mão do homem começou a queimar como se estivesse envolta por fogo. Ele se balançava e fazia de tudo para que a queimadura parasse de doer, mas aquela força invisível se espalhava rapidamente e ele gritava para que as chamas invisíveis parassem. Até que ele não gritou mais.Os irmãos restantes e mãe em prantos olhavam descrentes para o assassino que convivera com eles por todo aquele tempo.

– Seu ingrato! Estaria morto se não fosse por nós! O sorriso sumiu de seu rosto, os olhos voltaram ao normal e os cabelos pararam de voar.

– Morto? Bem, isso parece bem mais agradável que tudo que vocês me fizeram passar. Eu fui praticamente um escravo para vocês! - Seus olhos voltaram ao tom assustador e seus cabelos balançavam violentamente, a mulher gritou desesperada até o som ser abafado por uma névoa negra que a cercou. Ela nunca mais gritou.

Ele olhou para os três irmãos restantes. Dois ele aniquilou com um pequeno aceno e ficou encarando o mais velho.

– Consegue ver isso, Luke? Vê como sou poderoso? Poderia te matar com a maior facilidade do mundo, como fiz com sua família, mas você foi o único que não me maltratou por todos esses anos. Estou te dando uma chance, o que acha que ir comigo e dominarmos o feudo juntos?

– Você está louco, Thomas? Matou nossa família, sei que foram cruéis com você, mas a morte nunca é a solução.

– Pode até não ser a mais correta, mas é a mais prática e eficiente. Deveria se acostumar com isso, afinal, é assim que vamos resolver os problemas a partir de agora.

– Isso é ridículo, Thomas. Ninguém vira um assassino porque teve uma infância ruim. Se é isso que deseja, mate-me agora mesmo. - dizendo isso ele se ajoelhou e abriu os braços. - Se é o que quer se tornar, não vou impedir, mas saiba que não é saudável, Thomas. Sua vida não precisa tomar essa direção.

– Que seja. - retrucou com desprezo. Com um pequeno movimento da mão o pescoço do garoto ajoelhado se torceu e ele caiu morto. Ele se afastou e estalou os dedos olhando para a família morta sem demonstrar um pingo de culpa ou tristeza. Então sumiu na escuridão da floresta.

Não tive coragem de seguí-lo, apenas fiquei paralisada.

Tudo girou e acordei abalada. Será que eu havia torturado Meredith como o garoto fez com aquelas pessoas? Não. Isso é impossível. O sol ainda não estava no céu e a noite ainda dominava, mas podia ouvir algumas freiras andando de um lado para o outro. Olhei para o relógio de água e vi que estava perto do amanhecer. Me vesti e penteei meus cabelos fazendo uma trança. Estava nervosa e feliz, afinal ia sair dali. Porém abandonaria o lugar onde vivo desde sempre, tudo o que conheço e, o pior de tudo, Mildred. Realmente valia a pena perder tudo para ir embora com um homem medonho que não conheço?

Balancei a cabeça tentando esquecer esses pensamentos sombrios. Já era tarde demais para mudar de ideia. Dei uma olhada rápida para o calendário, estávamos no fim da quaresma. Sebastian chegaria em breve, se já não estivesse aqui. Adoraria me despedir antes de ir embora para sempre. Saí do quarto arrumada e andei calmamente no corredor em direção à cozinha para comer alguma coisa antes de ir embora para sempre. Estava distraída quando uma mão em meu ombro me tirou do transe.

Olhei para trás e vi o padre. Seu sorriso característico, amistoso e convidativo, brilhava como se me chamasse para um abraço. Usava as vestes características do cargo que ocupava, porém as suas eram brancas e simples, apenas duas cruzes em fios de ouro enfeitavam-nas. Seus cabelos completamente grisalhos e barba comprida davam a impressão de ter seiscentos anos, embora ninguém chegasse a essa idade. Sua face emanava sabedoria e confiança, além de muito carinho e compaixão, mas seus olhos eram misteriosos e sempre me intrigaram.

– Olá, querida.

– Padre!

– Madre Hyma me contou que vai embora hoje. Tão perto da Páscoa? Bem, não posso deixar que saia sem se confessar!

– Claro, padre.

Andamos até uma pequena sala ao lado da capela. Ela era completamente revestida de madeira e dentro dela só havia duas cadeiras. Me sentei em uma e ele em outra.

– Senti sua falta, padre.

– O que é saudade, Katherine? Cansei de tentar entender esses sentimentos humanos, sempre estão mudando de forma e intensidade. São coisas tão sensíveis e ao mesmo tempo duradouras eu me perco tentando encontrar explicações. Nem tudo tem uma resposta, Katherine, mas como nunca se sabe quando é realmente correto afirmar isso devemos sempre procurar a verdade. Afinal, do que seria o ser humano sem ela?

– Não faço ideia, padre. Ele riu calorosamente.

– Katherine, acho que nesse tempo que se passou me esqueci de como é sua companhia. Você é uma boa ouvinte. Continue assim, essa é a melhor forma de aprender.

– Obrigada, padre. - sorri.

– Eu tenho um presente para você, querida. - ele tirou um saquinho de couro do bolso e o entregou a mim. Era pequeno e simples, segurei com delicadeza e comecei a desembrulhar. - Sei que você não acredita, mas aceite como um último presente de um homem velho. - ele sorriu.

Eu segurava um medalhão de ouro, pendurando em uma corrente do mesmo material, com a imagem da Nossa Senhora carregando Jesus. Era bem antigo e suas laterais estavam um pouco amassadas.

– Guarde-o sempre perto do coração, pequena. A fé vai salvar sua vida. Sempre que olhar para ele se lembrará de mim e se um dia precisar de ajuda, saberá onde me encontrar. Tenha fé, querida. - dizendo isso ele saiu calmamente me deixando sozinha.

Era um objeto muito bonito e bem trabalhado. Estava sujo e amassado, mas eu sabia que era um presente do fundo de seu coração, e eu o guardaria o mais próximo possível do meu.

Passei a corrente cuidadosamente pela minha cabeça e o escondi por debaixo da roupa. O frio do metal tocando minha pele quente me deu arrepios, mas o peso era perfeito e parecia que seu lugar sempre fora comigo. Uma estranha sensação percorreu minha espinha e uma pergunta surgiu em me cérebro: Como eu nunca pensara nisso antes? Como eu não dei por sua falta? Sai da sala pensativa e esbarrei em Mildred.

– Me desculpe, me desculpe. Estava distraída, sinto muito. - disse a freira preocupada, então percebendo que falava comigo completou: - Aí está você, Katherine. Fui te procurar em seu quarto e não te achei. Já comeu alguma coisa?

– Ainda não, estava me despedindo de Sebastian.

– Então vamos rápido, logo ele chega e você deve partir. - pude notar uma sombra de tristeza em seus olhos e senti uma súbita vontade de abraçá-la.

– Mildred?

– Sim, querida? - ela perguntou se virando para mim. Seus cabelos castanhos estavam presos em um coque baixo escondido sob o chapéu de freira que a fazia parecer mais velha. Seu lindo sorriso sempre tão amigável e alegre fora substituído por um triste e cansado, mas mesmo assim continuava belo e iluminava seu rosto redondo. Seu nariz fino e empinado, que daria a qualquer pessoa um ar de confiança e orgulho, a fazia parecer ainda mais gentil e pura. Alta e magra, ela possuía uma beleza única e emanava bondade.

A abracei com força e disse:

– Sentirei saudades.

– Eu também, Katherine. Mas vamos logo, não queremos deixá-lo esperando.

Ela deu batidinhas no vestido para desamassa-lo, enxugou os olhos e deu um de seus lindos sorrisos. Retribui pensando no quanto sentiria falta de seu carinho. Andamos lado a lado até o refeitório, eu tentava memorizar cada centímetro, afinal, não voltaria lá tão cedo.

Sentei-me a mesa e logo Marylin trouxe um prato com pão, uvas e um copo de leite. Estava faminta. Comi rapidamente e me levantei, precisava pegar o resto das minhas coisas. O sol nascia e em breve ele deveria chegar para me buscar. Mildred não estava em lugar algum do refeitório então resolvi ir sozinha. Por onde passava freiras me olhavam atravessado e outras pareciam até felizes em saber que ia embora. "Não se preocupe, irmã. Também estou feliz em me livrar de você" pensava.

A mala estava pesada e enquanto a arrastava pelo corredor várias pessoas olhavam para mim, mas nenhuma se propunha a me ajudar. Parei na entrada do convento respirando ofegante. Auden, com sua capa preta, estava apoiado em uma carroça guiada por dois cavalos marrons e manchados. Eles pastavam tranquilamente. Mildred chega correndo com o rosto inchado e diz com voz de choro:

– Fui chamar Madre Hyma, ela queria se despedir. - enxugava os olhos freneticamente enquanto falava.

– Até mais, querida. Fique com Deus. - a madre me abraçou forte, mas pude sentir que olhava secamente para alguém atrás de mim. Várias feiras curiosas se amontoaram na entrada do convento e espiavam fofocando a cena incomum.

– Oh, Katherine. - disse Mildred com pesar enquanto me abraçava - Você sabe que eu não gosto de despedidas. - ela deu um sorriso e limpou as lágrimas. - Vou sentir sua falta. As pessoas daqui são muito certinhas, eu vou dar um sermão em quem, sem você aqui? Não vai ter mais ninguém para eu implicar com o cabelo e com certeza ninguém reclamando das orações. - ela sorriu novamente. Eu ainda abraçava Mildred quando escutei alguém pigarreando e senti uma uma mão fria no meu ombro.

– Vamos. - falou Auden secamente.

Saí do abraço e fui puxada com brutalidade para a carroça. Olhava para trás memorizando o rosto de Mildred. Jamais a esqueceria. Ele me ergueu no ar e me colocou no veículo com rapidez e força impressionantes para a idade dele. Subiu com um pulo, balançou as rédeas e saímos galopando. Ele estava na frente guiando e eu ficava atrás junto com sacos de pano encardido cheios de alguma coisa que não conseguia identificar.

– O que tem nós sacos? - perguntei quebrando o silêncio que se se instalara desde o convento. Ele não respondeu. - Estou falando com você. - disse já um pouco alterada.

– Eu sei.

– Então porque não responde?

– Não é da sua conta. Você tem muito mais com o que se preocupar do que com o conteúdo deles. Como por exemplo pra onde estou te levando.

– Para onde está me levando? - ele permaneceu quieto novamente e bufei cruzando os braços. Então notei como as pessoas nós olhavam. Algumas tinham medo, outras dó. - Por que estão nos olhando assim?

– Até que enfim uma pergunta interessante.

– Vai responder? - silêncio.

Ele respira fundo e vira um pouco a cabeça para me responder.

– Digamos que eles não são para você. Por enquanto.

Uma onda de medo me invadiu e eu queria pular da carroça, quando ele virou em uma curva pequena e me jogou do outro lado.

– Segure-se. Essa estrada é cheia de curvas e buracos.

– Você só me avisa agora?

Minha cabeça doía por causa da queda e logo me agarrei a borda. Estávamos na floresta. A flora ao redor da estrada era densa e deixava-a com um clima sombrio e alguns feixes de luz entre as folhas era toda a iluminação que o solo possuía. Ele parou em uma clareira com uma pequena cabana de madeira. Era bem velha e suas paredes estavam um pouco tortas. Uma pequena varanda com uma cadeira de balanço e cercas mal feitas completavam o visual simples da casa. Ele pulou da carroça e a levou até uma construção que era basicamente quatro estacas e um telhado de madeira improvisado. Amarrou os cavalos e voltou para pegar um dos sacos. Completou um recipiente com feno e observou os animais comerem por alguns segundos.

– Está esperando o que para descer, garota?

Andei até a borda e pulei, caí no chão com um ruído alto. Ele começou a andar em direção a casa e pude ouvir a pequena escada que levava a varanda rangendo. O som irritante se repetiu enquanto eu subia e ele entrava na cabana. O piso inteiro rangia. O cômodo era simples e completamente feito de madeira. Exceto pela fogueira de pedra no meio da parede esquerda.

O lugar era uma mistura de cozinha, copa, sala e local de trabalho. No centro tinha uma pequena mesa com um bule. Uma grande bancada ia da parede direita até a oposta á da porta. Nela haviam vários vidros com conteúdo colorido um grande armário de madeira ao lado. A parte "cozinha" estava bagunçada, cheia ingredientes perdidos e pó de café para todo lado.

– Sente-se. - obedeci e logo senti uma onda de calor, ele acendera a fogueira. Pegou o bule na mesa, um pouco de pó na gaveta e perguntou:

– Gosta de café?

– Não muito.

Ele preparava concentrado enquanto eu tamborilava os dedos na mesa.

– Será que pode parar com esse barulho irritante? - ele trazia o bule para a mesa e agora calçava pantufas.

– Desculpe. - recolhi os dedos e me virei para aceitar a xícara de café que ele me oferecia. Ele tomou um grande gole da bebida e se aconchegou na cadeira feliz.

Cuidadosamente experimentei um pouco e fiz uma careta. Estava forte e sem açúcar. Ele me olhou como se fosse a pessoa mais estranha que ele já conhecera.

– Você tem açúcar?

– Terceiro pote da esquerda para a direita. - respondeu seco apontando para a bancada.

Joguei praticamente todo o conteúdo e tomei um gole satisfeita. Ele me olhou reprovador, mas depois deu de ombros, virou o café restante em sua xícara na boca e serviu-se com mais porção generosa.

– Você vai me ensinar o que? - perguntei tentando quebrar o silêncio.

Ele me olhou um pouco e irritado e disse por fim.

– Seu quarto é aquele. -ele apontou para uma porta na parede direita perto da bancada. - Amanhã conversamos sobre isso. Sua mala está na carroça. - levantou-se e ao passar pela fogueira ela se apagou imediatamente.

Permaneci sentada por um tempo, até beber o resto de café na xícara, e sai da sala. Com muito esforço, puxei a mala e ela caiu no chão com um estrondo. Por onde andava, a arrastando, uma grande quantidade de terra se acumulava na frente me obrigando a puxar com mais força. Algumas vezes parava e empurrava a terra para fora com os pés.

Meu quarto também era de madeira e uma pequena cama de palha de encontrava perto da janela. Fui até o guarda-roupa e pendurei meus vestidos. Joguei a mala em um canto e vi como o lugar era pequeno e simples. No cômodo não havia cortinas e um criado mudo com uma vela completavam a simplicidade de lugar.

Sentei-me na cama e tirei um cochilo esperando sonhos terríveis que, estranhamente, não resolveram me perturbar desta vez.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado :3 eu prometo que o próximo eu posto mais rápido.



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