A espada e a rosa escrita por Liu M


Capítulo 2
1. Flores sempre desabrocham




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/480247/chapter/2

A ESPADA E A ROSA

Liu M

As gaivotas rondavam o porto à procura de peixes de superfície como as folhas rondavam em círculos em ventanias fortes. O calor do Sol estava forte demais para as belas damas de Magnólia vestidas com aqueles vestidos bufantes cheios de armações e rendas. Os comerciantes constantemente enxugavam as gotas de suor que caíam da testa, embaixo das bancas cheias de peixes e frutos do mar. Graças ao bom Deus! Os peixes não paravam de se reproduzir e a correnteza não parava de banhar a costa de Magnólia com eles.

Nas ruas calçadas de pedras pesadas e granito, podia-se ver duas senhorinhas subindo a ladeira em direção ao porto. Ora. Aquilo não era lugar para duas damas da sociedade, mas a senhorinha mais nova era teimosa e não se deixava influenciar muito pelo que as pessoas falavam a seu respeito. A maioria sentia pena dela.

O menino Romeu, irmão mais novo de sua criada, vinha puxado o cavalo ao qual a senhorita Heartifilia montava. Todos acenavam para ela, embora, assim que ela desse as costas, começassem a proferir mexericos a respeito de sua pessoa.

– Com mil demônios! – A sua criada proferiu abaixo do sol escaldante, passando o lencinho, bordado e dado de presente pela sua senhora, pela fronte pequena e escondida parcialmente pela franja. – O sol está quente demais hoje, senhorita Heartfilia. Não sente sede?

– Que bobagem, Virgo – a senhorita Heartfilia, que comumente olhava para cima quando queria falar com as pessoas, direcionou seu olhar para baixo. – Estamos chegando ao porto. Veja, aonde mais poderíamos ver tanta água reunida?

– Oh, minha senhora, as águas que banham a nossa cidade é muito salgada. Chego a sentir mais sede se ficar olhando demais pra ela.

– Pois eu não, Virgo – a senhora mais nova sorriu –, nada me alegra mais do que esse mar. Esse mesmo mar que em poucos dias estarão trazendo a frota do capitão Dragneel.

O capitão Natsu Dragneel era filho do honorável capitão Igneel Dragneel, que há muito morreu no mar, dizem os mais velhos que comido por tubarões das águas densas. Ah, Natsu Dragneel era um homem que transpirava jovialidade por cada poro e músculo da pele bronzeada. Os seus cabelos queimados representava o quanto o Sol adorava as suas batalhas em calor escaldante.

Estava nos seus vinte e cinco anos, atravessando correntezas e conquistando terras novas. Levando o legado de seu pai para cada pedaço de terra que pisava e habitava com seus homens e sua frota de navios. Ele que de ano em ano voltava para a cidade onde sua mãe pariu a criança que um dia teria o nome aclamado pela boca dos mais nobres homens do reino de Fiore.

Senhorita Lucy Heartfilia suspirava de amores por ele. Ela e todas as outras mocinhas solteiras da cidade de Magnólia.

– Ouvi rumores de que vai se casar com a filha mais nova dos Strauss.

– Duvido muito. Piratas nunca fincam raízes, e nunca estão satisfeitos com uma mulher só. Preferem ter uma mulher e um filho em cada porto. Eu ficaria muito feliz se fosse a escolhida do capitão Dragneel para esse porto.

Virgo, a sua criada, fez uma careta ácida. Não gostava do modo como senhorita Lucy o venerava, pois tinha a menina como irmã mais nova e sabia que com isso sofreria mais desilusões que a pouca idade já lhe deu.

– Sei que é um homem honrável, mas não seria melhor que a senhora se casasse com um homem de posses, bem apanhado, praticante do catolicismo?

– Que homem nessas condições se interessaria por uma aleijada? Com mil demônios! Como ele me levaria para a igreja? Nas costas? Um homem se casaria com o que eu tenho debaixo das minhas saias, mas nunca comigo.

– Meu Deus, senhorita Heartfilia, não fale assim! O que a sua mãe, que Deus a tenha, diria disso?

– Diria que é verdade. – A jovem senhora sorriu e apressou as cavalgadas de seu cavalo, deixando menino e irmã mais velha para trás.

Quando montava em Pegasus, seu cavalo, Lucy Heartfilia podia sentir que estava viva. A imagem de seus cabelos loiros acesos como tochas de fogo, seu sorriso de guerreira, e força nas mãos toda vez que erguia as rédeas para domar o animal, era mais precioso do que qualquer diamante lapidado. De fato, se não fosse aleijada, seria a jovem mais cobiçada pelo reino.

Ela subiu a ladeira e fez o animal cavalgar devagar quando chegou à passarela de pedras que dividia a cidade das águas salinas. Cumprimentou a todos que viu; os comerciantes, se não a conhecessem pela sua família, conheceriam-na pela frequência com que andava no porto nos últimos anos, nos últimos dias. Menina Lucy da Primavera, alguns o chamavam.

O cavalo parou para que ela pudesse olhar o sol do meio dia, brilhante e escaldante como a bola de fogo que era. A linha onde morria o mar ficava ainda mais brilhante nessa hora, como as joias que as damas usavam nos bailes e nas missas do domingo. Queria demasiadamente atravessar aquela linha, viver aventuras, caminhar sobre as madeiras de um navio, saber que tipo de animais marinhos a esperavam nas águas mais densas e profundas.

Ela esperou pacientemente até as duas da tarde. O navio do capitão Dragneel não chegou.

– Senhorita, não está com fome? – Virgo perguntou, enquanto observava seu irmão mais velho correr com os outros meninos filhos dos comerciantes.

– Você está com fome, Virgo? Vá para casa e dê comida a Romeu. Ele deve estar com fome e é uma criança.

– Oh, não, Senhorita. Não posso ir sem você. O que a sua mãe, que Deus a tenha, diria disso?

– Eu agradeceria se deixasse o esqueleto da minha mãe descansar em paz. Fala tanto nela que os ossos devem estar quentes. Por mil demônios!

Senhorita Lucy esperaria o dia inteiro, se não fossem as exigências de sua criada. Fora assim todos os anos desde que completou os treze anos. Agora, com dezessete, as coisas continuavam do mesmo jeito.

Os dias a contar da primeira flor desabrochada na primavera eram de preparo para Virgo, que sabia que sua senhora não descansaria até que a frota de navios do capitão Dragneel não desembarcasse no porto. Depois de visitar o bar do velho Makarov, a segunda coisa que fazia era cavalgar pelos campos com a sua “irmã” mais nova.

Ele via em Lucy tudo o que viu em Wendy, sua irmã de sangue, um dia. A pequena morreu aos quatro anos, também vítima da cólera, que assombrou o reino naqueles anos. Até que se descobrisse medidas sanitárias, muitas pessoas perderiam as vidas. Mas Lucy, diferente dele, sempre o viu com outros olhos. Pensava naquele homem como uma donzela sonhava com o príncipe encantado que deixaria sua cama vermelha na primeira noite de núpcias. Nunca se viu encantada por homem nenhum, senão ele.

Ele, por outro lado, sonhava com a filha mais nova dos Strauss, Lisanna. Lisanna diferia em Lucy na delicadeza. Enquanto uma foi criada ao seu bel entendimento, herdeira de um pequeno comércio de seu pai, a outra estava sendo criada nos padrões da sociedade da época. Sabia bordar, cozinhar, ia à missa aos domingos e sabia se comportar como uma esposa. Com essas qualidades todas, e feita sob molde, já devia-se imaginar que mais cedo ou mais tarde acabaria casando com o herói de Magnólia. Pirata não era sinônimo de bandido por ali.

– Como estará o capitão Dragneel esse ano... – Lucy pensou em voz alta. – Já consigo imaginar as pessoas correndo de suas casas para saudá-lo. E ele, sem camisa, sorrindo como um garoto de sete anos e acenando a menos de 50 metros para o porto.

– Não deveria pensar em homens sem camisa, senhorita – Virgo abaixou o tom de voz –, não é certo. O que dirão da sua pessoa?

– Que sou uma aleijada – completou a senhora amargamente e ironicamente. – É só isso o que dizem. As mesmas bocas que sorriem pra mim e dizem “como está bonita, senhorita Heartfilia, ainda ontem lhe vi aos quatro anos” são as mesmas que debocham de mim quando dou as costas e dizem “oh, pobrezinha, que triste destino teve a pobre”.

– Não deveria ter uma visão tão amarga, senhora. – Virgo abaixou os olhos.

– Pensaria o mesmo se estivesse em meu lugar. A vida me tirou os movimentos das pernas, mas me deu uma visão e uma audição mais aguçada.

* * *

Frio. A senhorita Heartfilia sentiu frio durante a noite. Os mais velhos diziam “não há terra quente durante o dia que não esfrie durante a noite”. A sua casa não ficava longe do porto; dava pra sentir a brisa do mar do seu quarto, onde, às oito da noite, estaria sentada em sua cama, escrevendo ou lendo um de seus livros de cabaceira.

Rotineiramente, em dias de primavera, mesmo quando o capitão Dragneel já estava na cidade, Lucy Hartfilia não conseguia pregar os olhos.

Prevendo isso, sua criada veio lhe trazer um copo de leite de quente. – É saudável ficar pensando tanto nele? – Ela deixou o leite na cabeceira e se sentou ao pé da cama, encarando a jovem Heartifilia que, ao invés de ler, penteava as madeixas macias.

– Eu não sei dizer, Virgo – encarou-a –, mas não consigo parar de fazer nisso. Acha que nunca tentei? Ele nunca irá olhar pra mim, então eu sempre tenho tentado. Mas como vê, nunca deu certo.

– Tantos homens lhe querem bem, senhorita – a criada disse, compreensiva. – O garoto Loke, filho do Sr. Alfeu alfandegário, parece gostar muito da senhora. O Sr. Eucliffe também, e ele já se mostrou atraído diversas vezes. Lembra-se daquele incidente na festa da padroeira?

Como não lembrar? Lucy sentia o estômago remexer de medo só por lembrar-se do jeito como caiu de Pegasus, quando foi assustado pela banda. Sting Eucliffe a salvou da queda e ficou longas horas com a jovem nos braços.

– A minha vida já é monótona demais para me casar com qualquer um desses homens monótonos. Se o capitão Dragneel me visse com outros olhos, tenho a certeza de que viveríamos muitas aventuras juntos. A primeira coisa que iria fazer seria tocar em um golfinho. Não como aqueles golfinhos feitos de Argila que Loke me deu, mas um golfinho de verdade.

– Como é sonhadora, senhorita... – Virgo sorriu com a imaginação de sua amiga. – Não está mais apaixonada pelo mar e por outro estilo de vida do que pelo capitão?

– É difícil dizer. Mas todas as mulheres solteiras da cidade são apaixonadas pelo capitão, então por que eu também não haveria de ser? Diga-me você, nunca se sentiu atraída por ele?

– Oh, não, minha senhora – Virgo corou desconcertada –, eu não penso em me casar.

– Acho que todas as mulheres pensam em se casar. Somos criadas pra isso.

* * *

No dia seguinte, Lucy tentou mais uma vez.

Ela pediu para que Romeu pusesse a sela em seu cavalo e, juntamente com a irmã mais velha, ajudassem-na a subir. Ela cavalgou na frente, desesperada, deixando Virgo e Romeu para trás, porque era mais um dia de Primavera – já fazia 7 dias – e o capitão ainda não havia desembarcado no porto.

Chegou à passarela de pedras e deixou que Pegasus descansasse, ainda que continuasse escorada em suas costas. Mirou a linha brilhante no fim do mar.

Os comerciantes voltavam os olhos para aquela menina e cochichavam entre si. Já estava óbvio demais os seus passeios rotineiros para o porto, sempre no mesmo horário, sempre com a mesma ânsia; ainda mais sabendo que eles cessavam sempre que a frota de navios do capitão Dragneel desembarcava.

Foi assim durante vários dias até que completasse mais uma semana, até que a frota do capitão apontasse há cerca de 100 metros do porto. Seu coração encheu-se de alegria quando conseguiu avistar o seu sorriso faceiro. “É o capitão Dragneel, Virgo. Veja! É o capitão!”, ela repetiu inúmeras vezes.

O capitão foi o primeiro a deixar o navio, e depois de cumprimentar os homens que foram ter com ele, ele viu Lucy sentada no galope de seu cavalo.

– Senhorita Heartfilia – ele beijou a sua mão –, está mais linda do que nunca. Ainda no ano passado, parecia uma menina.

– Toda flor desabrocha, capitão. – Ela sorriu.

– Oh, eu tenho certeza que sim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!