O outro mundo escrita por Debby e Tehh
Notas iniciais do capítulo
Espero que gostem.
Ass: Tehh e Debbie
Charlie McKean.
Já no sótão, que é o tal “lugar de sempre”, mantenho minha atenção voltada para o chão poeirento, onde rabisco com a ponta do dedo. Emily, ao meu lado direito, está sentada sobre os joelhos, escondendo as mãos entre as cochas. John, ao lado da irmã, apoia o braço sobre o joelho, e mantém a outra perna esticada. Estão atentos a cada palavra dita pelas duas meninas, que falam de coisas muito desinteressantes. Kate permanece de pé, ao lado de Lucy, que não larga um bloquinho de anotações e uma caneta. As vezes eu desconfio que ela já veio para o orfanato com esse bloquinho, pois não desgruda dele um só minuto.
–Boa tarde, gente.- Cumprimenta Lucy. Não a olho, continuo rabiscando o chão poeirento. Afinal, isso é bem mais interessante que qualquer coisa que essas duas possam dizer.
–Sem formalidades, por favor.- Pede Kate.
Lucy pigarreia.
–Então vamos direto ao assunto.- Fala ela.- Quantos de vocês já tiveram curiosidade de saber o que há por trás da porta 17?
Ergo os olhos rapidamente. Todos erguem as mãos, e eu giro os olhos, voltando para o desenho.
–Por que, Charlie?- Lucy pergunta, soltando um suspiro.
Ergo os olhos novamente, esfregando a ponta do dedo indicador no polegar, afim de limpar a poeira.
–Porque não me interessa.- Digo, tranquilamente. Todos os olhares se voltam para mim.
–E você espera que acreditemos nisso, certo?- Kate diz, com cinismo.
Na realidade, eu sempre quis saber. O que poderia ser tão sigiloso a ponto de ser trancado em um quarto à sete chaves? E por que Márcia parece tão alterada ao mencionamos o quarto? Mas eu não quero ir lá assim, sem mais nem menos. Tenho curiosidade sim, mas ainda não enlouqueci a ponto de ir parar em um quarto terminantemente proibido, correndo risco de ser altamente castigado. Não. Não estou disposto.
–É sério...- Minto da melhor forma que consigo.- Não quero saber o que guarda aquele quarto estúpido.
–Charlie...- John me provoca.
Tamborilo os dedos nervosamente uns nos outros.
–Talvez um pouquinho...- Digo.
–Charlie...- Kate me provoca também.
–Tudo bem!- Ergo os braços em rendição.- Vocês venceram. Eu vou. Mas espero não me arrepender depois.
–Sabia que você não ia ficar de fora.- Emily diz, sorrindo, o que me faz corar.
–Podemos contar com você também, Emy?- Pergunta Lucy, esperançosa.
–Lógico!- Ela diz, entusiasmada.- Quando foi que deixei vocês na mão?
–E você, John?- Pergunta Kate.
–Podem contar comigo.- Ele sorri torto.
–Certo.- Lucy suspira.- Agora vamos planejar. A porta está trancada, como sempre.
–Tem razão.- Emily morde o lábio inferior.
–Precisamos de um plano.- Observa John.
Giro os olhos, voltando para o desenho.
Todos ficam em silêncio, e eu já estou ficando entediado. Passam-se alguns segundos e então, Kate solta um grito, e eu dou um pulo, assustado:
–Tive uma ideia!- Foi o que ela gritou.
Embora eu continue achando isso uma grande idiotice, devo admitir que as ideias de Kate nunca falham. E isso faz dela a líder do grupo: A mais velha, mais esperta, mais responsável e blá-blá-blá. Todos a veem como uma irmã mais velha, que faz o possível para nos proteger. Honestamente, acho que não preciso de ninguém que cuide de mim.
–Você- Ela aponta para Lucy, que posiciona a caneta sobre o bloquinho.- É ótima com desastres e nem um pouco silenciosa. Faça o maior barulho que conseguir no banheiro. Isso atrairá Márcia, que sairá de sua sala, tornando possível a entrada de Emily e John. Os dois vasculharão a sala dela, em busca da chave do 17. Charlie ficará de vigia, responsável por alertá-los caso a Nariguda esteja voltando à sala dela. Eu estarei encarregada de atrasá-la, quando estiver retornando. Entenderam?
Ergo as sobrancelhas.
–Isso é loucura.- Digo.
–Emocionante, não acha?- Emily diz, com os olhos verdes brilhando de animação.
–E que dia colocaremos o plano em ação?- Pergunta Lucy, rabiscando alguma coisa em seu bloquinho.
–Poderia ser amanhã.- Sugere Emily, dando de ombros.
–Perfeito.-Diz Kate, andando de um lado para o outro.
–Não. Está péssimo.- Discordo.- Está muito em cima. Ficaram loucas?
–Cala a boca, Charlie.- Diz John.- Está ótimo sim.
–Também acho que amanhã está bom.- Diz Lucy, pensativa, sem desviar os olhos do bluquinho.
–Três contra um.- Observa Kate.- Será amanhã.
–Por que eu sempre perco?- Resmungo.
***
Mais tarde, quando voltamos da escola, os malucos dos meus amigos decidem que executarão o “plano” depois do almoço. Eu discordo completamente, mas desde quando minha opinião é levada em consideração? Eles nunca me escutam. Se o fizessem, nossa lista de castigos seria bem menor do que realmente é.
Na hora do almoço, burburinhos aqui e ali, mas nenhum comentário desagradável sobre o tal do plano. Márcia escuta com atenção a cada palavra dita por nós (em especial às ditas por mim, Kate, Lucy, Emily e John.) Então, fazemos questão de comer o mais rápido possível e sair dali logo.
Assim que termino, arrasto a cadeira para trás e me levanto. No corredor, encontro Lucy, Kate e John. Provavelmente esperam Emily.
Os três me olham por um instante, mas depois retomam a conversa. Reviro os olhos para a estupidez que faremos.
Logo a loirinha vem andando apressadamente ao nosso encontro. Ela olha para trás, certificando-se de que não fora seguida.
–Prontos?- Murmura Kate para nós quatro. Jhon e Emily assentem
–Pode crer.- Diz Lucy, abrindo um sorriso.
–Na medida do possível.- Dou de ombros, cruzando os braços.
Ela assente, séria. Então nos dividimos. Lucy vai andando o mais rápido que consegue, rumo ao banheiro, Kate permanece no mesmo lugar, e Emily, John e eu vamos em direção à sala da Márcia.
Chegando lá, nos escondemos em algum lugar próximo.
Uma barulhada, no mínimo irritante, começa no banheiro.
–É agora...- Murmura Emily ao meu lado.
Solto um suspiro, entediado.
Ouço a porta ranger, e sei que Márcia acaba de sair da sala. Toc, toc, toc... faz suas sandálias de saltos enormes. Nós três nos entreolhamos.
John sai do esconderijo e ruma para a sala de Márcia. Emily o segue, me deixando sozinho. Como não resta outra alternativa, os sigo.
Os gêmeos entram na sala e eu fico ao lado de fora, tamborilando os dedos uns nos outros, nervosamente. E se a Nariguda voltar? E se Kate não puder contê-la? Mais que droga de ideia elas tiveram...
Olho para o interior da sala, onde Emily e John procuram a chave. Abrindo e fechando gavetas, remexendo em documentos, olhando em vasos de plantas, estojos, pastas...
Tudo vai dar certo, tento me convencer, Kate conseguirá detê-la
–Não dá para ser mais rápido?- Falo, apreensivo.
–Calma!- Reclama John.- Pensa que é fácil?
–E além disso, não podemos deixar a sala de Márcia bagunçada, ou...- Continua Emily.
–Tá, tá!- Resmungo.- Fala menos, procura mais!
Vejo-a girando os grandes olhos verdes e ir olhar no interior de uma caixinha de joias.
–Achei!- O grito de John me sobressalta. Em sua mão esquerda está a bela chave prateada, com uma etiqueta que, não consigo ver, mas tenho certeza que está o número 17.
–Shhhh!- Emily pressiona o dedo sobre os lábios.
Olho para fora, certificando-me de que ela não está vindo, e depois olho de novo para dentro, franzindo o cenho para John.
–Cala essa boca, cara.- Falo entredentes.- Vamos sair logo daqui!
Os dois saem do quarto.
–Vão para o quarto de vocês.- Diz Emily e arranca a chave da mão do irmão.- Isso fica comigo.- John faz a menção de que vai falar, mas ela o interrompe.- Não confio em vocês dois com essa chave.- Semicerra os olhos.- Vou avisar às duas que já temos a chave.
John e eu continuamos a olhá-la.
–Não ouviram? Já para o quarto!- Ela diz.- A invasão será hoje. Hoje à noite.
Vejo John soltar o ar dos pulmões e se virar.
–Mas eu não quero ir para o quarto.- Digo.
–Vá para onde quiser, Charlie, mas some daqui!- Ela diz, impaciente.
John já está bem longe, e eu sigo na direção oposta. Encontro Jack Cooper, Josh Taylor e Rachel White no caminho e resolvo me juntar a eles. São meus amigos também, apesar de não nos encontrarmos muito. Josh dorme no mesmo quarto que eu, mas mesmo assim, não trocamos muitas palavras. Jack é muito amigável, e conhece muita gente. É o tipo de amigo que, não importa quanto tempo fiquem sem se falar, permanece do mesmo jeito. Rachel é muito estudiosa. Nerd, eu diria. Na escola, já pedi mais colas a ela do que posso contar.
Acho que vou trocar de grupo. Esse aqui não me meterá em encrencas, pode ter certeza.
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