Você ainda Está Aqui escrita por themarilyn


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Participei com essa fic do Desafio de Halloween do Fics de Bandas, comunidade no orkut. Mas eu gostei dela e quis postá-la aqui. :DD



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/47814/chapter/1

A porta do apartamento foi aberta, mostrando a sala vazia. Gerard passou devagar pelo cômodo. Tirou o terno com preguiça, jogando-o de qualquer forma nas costas de uma cadeira. Seus olhos não estavam totalmente abertos; acordara cedo e o compromisso que o aguardava não era dos mais prazerosos.

 

Deu uma última olhada em volta antes de ir para o quarto quando, em sua visão periférica, notou que alguém estava sentado em sua poltrona. Gerard tentou não olhar realmente para confirmar o que pensara que vira. Ultimamente, estava tendo sucesso em ignorar essa sensação de ser observado, mas isso não a fazia parar. Nem a imagem a sua esquerda de alguém de pernas cruzadas, as mãos sobre os joelhos e aquele caderno no colo.

 

Então, não havia ninguém mais naquele apartamento. Gerard estava novamente sozinho.

 

Respirou fundo. Achava que estava ficando louco, mas sabia que aquelas visões estavam ficando mais freqüentes. Mais vívidas. Pois cada canto daquela casa exalava a presença dele. Foi quando percebeu que nada havia mudado naqueles dois anos. Os móveis e porta-retratos estavam no mesmo lugar. Ele tinha o mesmo emprego e a mesma rotina durante esse tempo.

 

Absolutamente nada mudara desde que Frank se fora.

 

Foi só à noite que Gerard abriu sua pasta do trabalho, buscando por dois livros que pegara naquela manhã. Assim que saíra da missa, passara por duas bibliotecas com o intuito de pesquisar. Gerard não podia dizer que tinha certeza, mas desconfiava do que acontecia em seu apartamento. Nunca fora muito religioso, mas não era hipócrita e acreditava no que estava presenciando.

 

Sobre a mesa da sala abriu espaço para que dois livros ocupassem o lugar junto com um bloco de folhas. Com o silêncio da casa, a concentração na leitura foi imediata. Enquanto lia, escreveu algumas anotações. A primeira foi uma citação: "Espíritos são aqueles que deixaram assuntos inacabados em sua vida terrena." E a outra era: "Eles se prendem a objetos ou a sentimentos humanos, alimentando-se destes."

 

Uma idéia ocorria-lhe naquele momento. Gerard tinha a impressão de que sabia de qual "assunto inacabado" se referia naquele caso. E as lembranças antigas lhe causaram uma noite perturbada.

 

"Me descul-"

 

Acordou de madrugada quando as janelas do quarto bateram bruscamente. Elas tornaram a se abrir para se fecharem de novo com um estrondo. Levantou sonolento, trancando as janelas. Mal havia se acomodado na cama, ouviu as janelas novamente. Um barulho que ecoou pelos cômodos. Agora um pouco mais afetado pelo acontecimento, aproximou-se segurando as janelas antes que estas voltassem a bater. Percebeu atordoado então que não havia vento. Nenhum. Nem brisa alguma. As árvores à frente, que Gerard via com dificuldade, não possuíam um galho se quer em movimento. As folhas não pareciam balançar. Como era possível então que as janelas ficassem daquele modo?

 

E não era a primeira vez que algo estranho acontecia enquanto dormia.

 

"Eu preciso dizer que sinto-"

 

E naquele momento pôde ver, sem sombra de dúvidas, a imagem dele ali. Mais nítida do que em seus sonhos. Ele parecia tão real. Ele parecia tão... vivo. E nesse instante, uma raiva incomum se apossou de Gerard. Vendo-o de pernas cruzadas com o caderno em mãos ao pé de sua cama teve a pior sensação de todos esses dois anos. Gerard estava cansado daquilo tudo. Estava cansado de sentir culpa pelo acidente que causara a morte de Frank. De sentir a sensação de que Frank ainda o seguia e o vigiava todo o tempo. Aquilo o sufocava. Ele sentia que nunca mais conseguiria sair daquele círculo vicioso que sua vida se transformara. Ele queria Frank em paz. Ele queria estar em paz.

 

Com aquele sentimento de saturação, Gerard decidiu fazer sua parte. Ele próprio que tinha a obrigação de mudar sua vida. Foi pensando assim que Gerard ligou na manhã seguinte para a imobiliária para que esta anunciasse a venda de seu apartamento, com tudo que estivesse dentro. Seria um novo começo pra ele. Diferente.

 

Só faltava a parte de Frank, que o homem pedia inconscientemente que fosse cumprida. Porque, na verdade, Gerard tinha certeza de que Frank sabia do que se tratava. Sabia da dificuldade deste em expressar suas emoções, de confessar seus sentimentos. Sabia o quanto isso frustrava o outro e machucava a si mesmo. Mas quanto a isso, Gerard não tinha nenhum controle. Ele só esperava que tivesse um fim.

 

Aconteceu dois meses depois.

 

O moreno tinha acabado de deitar em sua cama e o sono já o dominara. Estava tranqüilo até aquela sensação voltar. A de estar acompanhado, sendo observado. Ele ainda dormia profundamente, mas algo em seu sonho se tornou agitado, fazendo-o suar. Gerard tinha a respiração pesada e difícil, parecia lutar para conseguir ar suficiente. E, ainda no sonho, pode ver novamente a imagem a sua frente, aos pés da cama. Frank estava ali, na mesma posição de sempre. Mas alguma coisa mudara. Gerard tinha a sensação de que tinha alguma coisa fora do lugar habitual. Tirando o fato de que dessa vez Frank o olhava. Diretamente nos olhos. E sua expressão lembrava algo como uma súplica.

 

Acordou em um pulo e quando recobrou os sentidos, a imagem não estava ali. Aparecera pela última vez. Restara somente o silêncio.

 

Contudo, este foi cortado pelo rasgar do vento no quarto. Entrava com força pela janela esquecida aberta e balançava furiosamente as cortinas, causando um barulho incômodo. Apenas segundos depois notou um barulho diferente e mais próximo. Percebeu que eram folhas de papel, provavelmente agitadas pelo vento. Quando olhou para o outro lado da cama, viu o caderno de Frank aberto. As folhas se aquietaram quando o vento parou subitamente. Gerard pôde, então, ver a página que virara, revelando uma única frase escrita ali. A caneta preta tinha a tinta molhada, ainda fresca. Usando então a luz da lua que banhava todo o quarto e semicerrado os olhos para conseguir entender, Gerard reconheceu a caligrafia torta de Frank.

 

Cada vez que abri a boca e não disse nada, era só pra dizer que te amava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

É isso, espero que gostem :D