Em Família escrita por Aline Herondale


Capítulo 22
Ela, Ele, Eles


Notas iniciais do capítulo

Olá,
Compartilhar aqui que estou muito triste pelos pouquíssimos comentários do capítulo anterior. Sumi mas já retornei, então, por favor, não sumam e nem deixem de conversar comigo.
Espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/477406/chapter/22

— Não almoçarei em casa amanhã. – Anunciei, na primeira oportunidade que tive de ficar sozinha com Lena.

Após o almoço minha mãe tinha o costume de, religiosamente, ir até a cozinha e esquentar e tomar a sobra do café daquela manhã. Nesse mesmo tempo Charlie ia para o jardim ler um dos seus livros, sentado embaixo de alguma magnólia, ou se retirava para seu quarto O que eu tinha à dizer não deveria chegar aos ouvidos dele ou questionamentos e – muito – provavelmente momentos embaraçosos, futuramente, aconteceriam.

Não mesmo.

Esperei pacientemente qualquer pergunta de Lena mas ela continuava concentrada em derramar o líquido escuro na xícara de porcelana, como se fosse algo que exigisse tamanha atenção.

Me sentindo levemente humilhada, decidi responder à minha própria pergunta imaginária.

“Porque?”

— Estou ensaiando uma peça de piano com o Senhor Martins, meu professor de Artes, e a aula é amanhã, após o colégio. Então...não voltarei à tempo do almoço.

Lena largou a xícara dentro do microondas e o ligou. Lá dentro, a xícara começou a girar.

Continuei parada no lugar, de braços cruzados, aguardando qualquer reação da minha mãe. Qualquer. Por mais mínima que fosse.

Nada.

— Ok? – Insisti. Eu estava ridícula ali.

Finalmente Lena olhou para mim.

Seus olhos estavam incrivelmente azuis. Belos. Mas não eram receptivos. Ela os correu dos meus pés à cabeça e quando encontrou os meus o microondas apitou. Lena suspirou alto e, rolando sutilmente seus orbes claras, respondeu com desdém, balançando uma das mãos como se abanasse algo invisível.

— Tudo bem, querida. – Ela pegou sua xícara e passou por mim assoprando a fumaça da bebida.

O salto do seu scarpin ecoou por todo o interior da mansão.

Decidi pular o almoço e ir direto para a sala de músicas assim que todas as minhas classes acabaram naquela manhã.

Havia chovido então o cheiro de terra molhada e pólen inundara todos os cômodos do colégio. Inalei fundo assim que empurrei a porta e encontrei a sala vazia e escura.

Eu sempre adorara esse cheiro.

Sempre gostei também de como a cidade fica após um banho de chuva e quando localizei o piano me senti inspirada em tocar algo bonito. Coloquei minha bolsa sobre qualquer lugar e sentei no banco.

— Você é, mesmo, muito boa. – Eu estava no meio do ato quando levei um grande susto quando escutei uma voz grossa soar atrás de mim. Girei o corpo rapidamente, procurando pelo dono da voz, e encontrei meu instrutor escondido na penumbra.

Seu rosto estava rígido e seus olhos enegrecidos, fitando me de forma tão fixa que diria ter visto lampejos de raiva. Estranhamente ele parecia...irritado.

— Schubert Impromptu de Markus Gottschlich. – Ele disse.

O senhor Waylon desencostou da parede em que estava apoiado e começou a caminhar até mim quando pediu: - Toque outra coisa para mim.

Abaixei a cabeça e tornei a ficar de frente para o piano. Com aquelas poucas palavras, minha mente subitamente sofreu uma lavagem de memórias e me vi sem lembrança de partitura alguma. Talves tivesse sido o susto. Minha pressão cairia logo, logo.

Ótimo.

Começava a entrar em pânico.

— Like Spinning Plates do Christopher O'Riley. Conhece? – Waylon Holt parou ao lado do piano e me perguntou, colocando as mãos nos bolsos.

Concordei com a cabeça. Eu conhecia muitas músicas. Inspirei fundo toquei.

Levei um segundo para começar – repassando a partitura na mente - e quando meus dedos tocaram as primeiras notas, o senhor Holt apoiou um dos braços sobre o piano, tombando o corpo.

Não era uma música da qual eu escolheria. Parecia simples por conta das notas transmitirem uma idéia de leveza, mas era um tanto complexa para tocar. Mas eu consegui. É claro que eu conseguiria. Esta havia sido uma das quais papai havia me ensinado com maior afinco, ensaiando comigo todos os dias e me acompanhando.

Ao fim depositei minhas mãos no meu colo e pensei no meu pai, algo que eu já não fazia à algum tempo.

Senti saudades.

— Alguma idéia sobre o que vai tocar? – Senhor Holt perguntou, perto demais de mim, e levei o segundo susto do dia.

— Na...não. – Por alguns segundos me esqueci completamente de onde estava; em uma aula de piano, com meu instrutor ao lado.

— Bom, como o evento será para um público grande me permita dar um palpite. Toque algo alegre. Haverá crianças e pessoas que não entendem nada de música, então algo triste deixara as crianças inquietas e Mozart irá entediar.

— Claro. Bem pensado. – Concordei e o encarei. Seu cabelo cacheado estava bagunçado e os maiores cachos quase se encostavam às suas sobrancelhas. O senhor Holt era magro e muito branco. Vestia uma calça preta e uma blusa de manga e gola alta também pretas. Realmente, estávamos entrando na época de chuvas mas ele estava um tanto quanto adiantado.

— Algo em mente? – Ele perguntou, levantando uma das sobrancelhas.

Neguei.

— E que tal essa? – Waylon Holt esticou uma mão e dedilhou o início de uma nova melodia da qual eu nunca me lembrava o nome mas sabia tocar.

Ela me lembrava carnaval e verão.

Ele tocou mais algumas notas e quando ele estava prestes a parar, estiquei a mão para acompanhá-lo nas notas mais agudas. Pelo canto do olho senhor Holt me olhou e esticou as duas mãos sobre o piano.

Era o segundo dueto que eu fazia.

Repentinamente minha mente foi inundada por imagens de Charlie – seu sorriso, quando bebi da sua taça de vinho, abrindo a pequena caixinha onde estava a presilha que ele havia comprado para mim, me oferecendo a pá para enterrar Whip e por fim quando fizemos o dueto -. Automaticamente olhei para o meu lado e lá estava meu instrutor, tocando com tanta concentração quanto eu.

Errei de propósito e parei de tocar.

— Me desculpe. – Menti, deixando meu cabelo cair para esconder meu rosto dele.

Waylon Holt suspirou e se afastou, caminhando para longe de onde eu estava.

— Tudo bem, acontece com os melhores. Bom, vejo que não precisará tanto da minha ajuda assim. – Ele riu, na tentativa de iniciar uma conversa.

Não respondi.

A aula durou mais vinte minutos, com Holt se questionando o porquê do professor Martins pensar que eu precisaria de um instrutor.

“Você é muito boa. Quase perfeita.” Ficou repetindo e aquilo me causou desconforto. Aleguei precisar sair mais cedo e caminhei apressadamente para longe daquela sala, com meus passos ecoando pelos corredores desertos da escola.

Empurrei a porta da frente e levei o terceiro susto daquele dia.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

NÃO DEIXEM DE COMENTAR POR FAVOR, É IMPORTANTE PARA MIM.
XOXO
Eai, cadê minha recomendação???



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Em Família" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.