O anjo e o Condenado escrita por Sissy Strit


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Primeiro Capítulo!
Espero que gostem!



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- Você tem certeza que vai levar esse livro de novo?

- Claro Sr. Carter! Sabe muito bem que eu amo essa história, ela é simplesmente perfeita. Tem duelos, castelos assombrados, magia e um príncipe encantado! Ou seja, é o conto de fadas completo! – Sempre fui uma fã de livros e aquele, realmente, era o melhor que eu já tinha lido.

Quando eu era pequena, minha mãe sempre me contava histórias maravilhosas que me faziam sonhar e viajar por lugares que eu nunca tinha imaginado. Ela me ensinou a amar os livros e observar todas as coisas boas que eles poderiam nos ensinar. Sempre me dizia que os livros de histórias ensinam mais do que os filosóficos, porque estes já tem as idéias escritas e expostas, naqueles você mesmo tem que observar e descobrir sozinho o que há por trás do que o autor escreveu, todas as intenções dele ao colocar cada palavra.

Por causa dessa paixão eu sempre ia à biblioteca e com isso os moradores da aldeia me achavam estranha. Eles não entendiam como eu preferia meus livros a uma conversa com as outras moças ou rapazes e nem como nunca tinha ânimo para bailes e festas.

- Bom, se gosta tanto dele, eu lhe dou. É só você que o lê mesmo...

Nem podia acreditar no que estava ouvindo! Ele estava mesmo me dando aquele livro?!

- Muito obrigada! - Dei um abraço nele de tanta alegria, porém tive que me conter. O senhor Carter era um homem idoso e parecia tão frágil que qualquer abraço muito apertado dava a impressão de poder quebrá-lo.

- De nada Lizzie, mas só porque eu lhe dei o que queria não vá sumir daqui, gosto quando vem me fazer companhia. Esta biblioteca é tão quieta e vazia. – Ele disse olhando ao redor. - Você dá vida a esse lugar quando vem.

Isso era verdade. Poucos naquela aldeia tinham o costume de ler e o pobre homem ficava ali, perdido entre as longas fileiras de estantes repletas de livros.

Mesmo sendo tão pouco freqüentada, a biblioteca era muito bem abastecida de livros, já que o antigo reitor era um grande amante da literatura e tinha o sonho de que um dia as pessoas daqui se tornassem grandes leitores. Infelizmente ele morreu sem ver seu sonho realizado.

- Não se preocupe, não posso deixar de aparecer por aqui para conversar com o senhor. Suas historias ainda são melhores, mas não posso levá-lo pra casa! – Tive que rir depois de dizer isso. Ele também achou graça.

- Ah, sim menina. – disse ajeitando os óculos em cima do nariz fino e pontudo. - Não venha de gracejos. Mas agora está na hora de fechar a biblioteca e você deveria ir pra casa, seu pai deve estar precisando de sua ajuda.

Olhei para o grande relógio que ficava pendurado na parede, logo atrás da mesa do Sr. Carter. Realmente estava bem tarde.

- Nossa, eu sempre perco a hora quando venho aqui. Até logo!

- Até logo Lizzie!

Antes de ir dei mais uma rápida olhada na prateleira de novidades. Mas ali não havia nenhuma que me interessasse. O livro que eu mais gostava agora era meu e eu poderia lê-lo na hora que quisesse.

Saí para a rua e tomei o rumo de casa. A biblioteca ficava bem próxima da praça principal, ao lado pequena prefeitura e em frente à igreja. Minha casa ficava mais afastada do centro, no alto de uma colina. De lá se podia ver todo o vilarejo e, dos fundos da casa, o rio que cortava toda a planície.

Danorum era uma pequena aldeia a poucas léguas da estrada principal que dava em Lighenfor, a capital do reino. Todos os moradores daquele lugar se conheciam e, quando aparecia alguém novo nas redondezas, era assunto para a semana inteira.

Já fazia muitos anos que meu pai e eu havíamos nos mudado pra cá. Antes morávamos em Lighenfor e meus pais tinham uma pequena padaria, mas, quando minha mãe morreu, meu pai resolveu viver numa cidade menor e se dedicar às suas invenções. Ele era muito inteligente e sempre estava inventando alguma coisa. Às vezes suas criações complicavam mais a vida do que facilitavam, mas este era seu prazer.

Nas últimas semanas, principalmente, andava alvoroçado por causa de uma feira de novas invenções que aconteceria na capital dentro de poucos dias, por isso trabalhava o dia todo, no porão de nossa casa, em uma máquina de fatiar queijo que, por sinal, quase tinha fatiado o dedo dele.

O sol estava se pondo atrás da montanha e o céu estava num tom avermelhado bem vivo. Eu amava olhar o céu e imaginar histórias. Quem sabe um dia elas poderiam se tornar realidade.

Ia caminhando assim, distraída pela rua, quando alguém se aproximou de mim.

- Posso te acompanhar até em casa?

Levei um susto quando ouvi Jasper ao meu lado. Não reparei que

estava me seguindo.

Na hora do susto deixei o livro cair no chão e ele o apanhou.

- Calma! Não precisa se assustar assim. É isso que dá andar por aí tão distraída – Ele me entregou o livro – E então, posso te acompanhar até em casa?

Jasper vestia uma calça preta e um casacão, seus cabelos avermelhados estavam bagunçados, as botas sujas de barro e tinha uma espingarda pendurada no ombro. Provavelmente voltava de uma de suas caçadas pelo bosque.

- Não sei Jasper, você já está me acompanhando mesmo. Não imagino o que mudaria se eu recusasse.

Ele riu da minha resposta e continuou a caminhar ao meu lado.

- Sabe Lizzie, você deveria deixar esses livros de lado um pouco. Por que não sai de vez em quando para passear com as moças da cidade, ou não vai a algum baile? Nem precisa ser algo tão formal. Pode aparecer nas festas da minha estalagem. Sabe que é sempre bem vinda lá.

- Como você é gentil. – Tentei ser a mais educada possível, mas meu tom saiu um tanto quanto sarcástico. – Infelizmente não sirvo para a vida social. Sabe muito bem que sou uma péssima companhia e por isso não posso obrigar ninguém a me aturar. Prefiro incomodar os livros às pessoas.

- Ora Lizzie, não seja modesta. Sua companhia é uma das mais agradáveis desta aldeia.

Como eu não estava com vontade de conversar com ele, nem de ouvir seus elogios forçados, após alguns segundos de silêncio, Jasper continuou a falar:

- E me atrevo a dizer até que é mais agradável do que qualquer outra pessoa, mesmo que seja alguém de Lighenfor.

“Quase me comoveu agora”, tive vontade de dizer, mas contive minha língua antes que fosse mais grosseira.

- Obrigada pelo seu elogio, mas ainda tenho a mesma opinião e não precisa se dar ao trabalho de me acompanhar. Veja só, estamos na frente da sua estalagem. O caminho até minha casa é muito longo e está tão frio, não quero obrigá-lo a pegar um resfriado por minha causa.

Torci para que esse argumento o convencesse de ficar por ali mesmo e que eu pudesse seguir sossegada o meu caminho. Sei que minhas atitudes não eram muito educadas tentando afastá-lo, mas eu sabia de suas reais intenções para comigo e não estava disposta a entrar no joguinho de donzela cortejada.

– Quanta gentileza de sua parte! Tem certeza que não quer mesmo que eu a acompanhe? – ele parou em frente à estalagem.

– Absoluta! Não iria me perdoar em obrigá-lo a se cansar por minha causa. E, além disso, eu preciso ir rápido pra casa. Meu pai deve estar precisando da minha ajuda.

– Haha! Essa é boa!

Não tinha reparado que Steve estava parado na porta ouvindo nossa conversa. Ele era o melhor amigo de Jasper; seu leal e idiota amigo. Nunca gostei muito dele. Suas maneiras eram sempre desagradáveis e seu olhar malicioso.

– Boa tarde senhorita Lizzie! – disse me cumprimentando com aquele olhar desagradável. - Então seu pai precisa da sua ajuda? Eu se fosse a senhorita não iria. É muito perigoso – um sorriso cínico se formou em seu rosto - Um dia aquele velho maluco vai explodir a casa inteira!

Não podia acreditar no que tinha acabado de ouvir!

– Não fale do meu pai desse jeito! Ele é muito inteligente e sei que nunca faria alguma coisa que me colocasse em risco! - Isso já era de mais! As pessoas implicarem comigo era uma coisa, mas chamar meu pai de velho maluco era o fim!

Virei as costas e saí pisando duro. Quanta grosseria! Eu queria sumir daquele lugar, já não agüentava mais. Não era uma pessoa de chorar, mas lágrimas de raiva começaram a escorrer pelo meu rosto.

Fui caminhando com passos rápidos pelo caminho de pedras tentando desviar meus pensamentos daquilo. Lembrei da história que o senhor Carter havia me contando naquela tarde e comecei a repassá-la em minha mente.

Era sobre um príncipe amaldiçoado com um feitiço terrível por causa da sua arrogância e soberba.

Segundo a historia, o príncipe era muito bonito e tinha tudo o que queria, mas a sua vaidade era muito maior que sua beleza.

Ele maltratava quem estava a sua volta e só se importava consigo mesmo. Até que, numa noite fria e chuvosa, uma velha senhora apareceu pedindo abrigo da chuva. Os empregados do castelo a acolheram, mas, quando o príncipe a viu, mandou que mandassem a mulher embora e não quis saber o que aconteceria com ela. A pobre mulher tentou falar pessoalmente com ele, mas não houve jeito de o convencer a deixá-la ficar.

Quando o príncipe estava tirando ele mesmo a mulher para fora do castelo, ela se transformou e revelou ser a grande feiticeira da terra. Ele ficou muito assustado e tentou se desculpar, pois se soubesse quem ela realmente era teria preparado na mesma hora uma grande festa para recebê-la.

Porém as desculpas foram em vão, pois a feiticeira tinha visto o quão rude, mesquinho e egoísta ele era. Como castigo o transformou em uma besta horrível e o condenou a ser assim pro resto da eternidade.

Quando dei por mim já estava em casa.

“Querido senhor Carter!”

Como amava as historias que me contava, principalmente essa que, além de tudo, me foi muito útil pra desviar as lembranças indesejadas e desagradáveis da minha mente.

O interessante foi que ele contou com tanto vigor e convicção que até cheguei a pensar que a história fosse verdade.

Entrei em casa e deixei o livro sobre a mesa da cozinha. Desci as escadas que levavam ao porão e lá encontrei meu pai compenetrado em sua máquina. Estava tão absorto em seu trabalho que resolvi não incomodá-lo, até porque, se tentasse falar com ele, acabaria dando um susto no pobre.

Resolvi subir e preparar a janta. Comecei a fazer uma salada bem complicada que tinha aprendido com uma das senhoras da vila e um molho para comer com pão. Concentrei-me ao máximo no que estava fazendo para não começar a chorar de novo.

Os últimos meses tinham sido muito desgastantes para mim. Parecia que todo mundo tinha resolvido se meter na minha vida só porque eu tinha feito 21 anos e ainda não havia escolhido um pretendente. Eu não queria escolher alguém só por obrigação, queria alguém que me entendesse, que gostasse das mesmas coisas que eu, que sonhasse junto comigo.

O problema até não era o numero de pretendentes, mas a qualidade deles.

Dentre os rapazes que tentavam chamar minha atenção, Jasper era o mais insistente. Sempre estava atrás de mim na rua, querendo me acompanhar aonde eu ia e sempre me convidava para as festas de sua estalagem. Resumindo, vivia me rodeando.

Além disso, tinham se tornado freqüente ouvir comentários das pessoas sobre mim. O ultimo foi quando eu estava no mercado comprando algumas verduras e ouvi duas senhoras fofocando sobre minha vida. Uma delas perguntou à outra o que ela achava da “Srta. Lizzie” desprezar todos os rapazes da aldeia. A mulher torceu o nariz e respondeu que talvez a moça, no caso eu, se achava muito superior ao povo daqui. Claro que perceberam que eu estava ouvindo a conversa, porque tinha me escondido entre as prateleiras, mas aquilo me magoou muito.

É verdade que eu não era muito de conversar, não freqüentava as festas e era um pouco fechada. Mas parte disso era devido à minha timidez, porém sempre tentava ser o mais gentil possível com todos.

Claro que Jasper era uma exceção a isso, mas ele estava começando a me incomodar e essa era a maneira que eu tinha de tentar afastá-lo.

- Lizzie! Já chegou em casa! – Meu pai apareceu na porta da cozinha limpando as mãos sujas nas calças. – Hum, o cheiro está bom! Estou morrendo de fome. Trabalhei o dia todo naquela máquina.

Ele se sentou à mesa e eu o servi. Parecia realmente cansado, mas seus olhos brilhavam de satisfação.

- E então pai, como está a máquina? Falta muito para terminar ainda?

Ele sorriu e encheu o peito de orgulho.

- Ela está prontinha filha! Uma maravilha! Meu esforço foi recompensado! Espero que os jurados da feira gostem dela tanto quanto eu!

- Tenho certeza que eles irão lhe dar o primeiro prêmio! – dei a volta na sua cadeira e lhe abracei por trás – E vai se tornar um inventor muito famoso!

- Deus lhe ouça filha! Você sabe como eu sonho com isso. Quero que se orgulhe do seu velho pai.

Dei-lhe um beijo no alto de sua cabeça e olhei fundo nos seus olhos.

- O senhor já é meu orgulho! Não há ninguém melhor nesse mundo!

- Ah sim! – Ele deu um sorriso – Mas deve ter mais alguém nesse mundo tão bom quanto eu, não é Lizzie?

- Como assim pai? – o soltei e sentei na cadeira ao seu lado esperando para ver onde ele queria chegar.

- Ora filha, algum rapaz por quem você se interesse.

- Não pai! Você com isso também, eu não agüento! – me levantei exaltada, peguei os pratos da mesa e os coloquei na pia com força.

- Calma! Eu não estou falando que é para você casar agora. Só estou querendo dizer que em algum lugar por aí deve existir um bom rapaz para você!

- Desculpe pai, é que todo mundo só sabe falar nisso. Parece que não existe mais assunto nessa aldeia e todos resolveram se preocupar com a minha vida!

- Oh querida, não fique chateada. Essas pessoas não merecem a sua atenção. Não se preocupe. Com o prêmio da feira, quem sabe, a gente pode se mudar para um lugar melhor.

Não sei se mudar de cidade iria resolver alguma coisa, mas eu concordei com ele para encerrar o assunto.

- Bem, vou me deitar. Estou exausto e você deveria fazer o mesmo. – Ele me deu um beijo na testa e subiu para o quarto.

Realmente eu precisava dormir também, estava cansada e quem sabe uma noite de sono melhorasse um pouco meu ânimo. Com isso terminei de arrumar a cozinha e fui para o quarto.

Antes de dormir, li um pouco aquela história que tantas vezes eu já tinha lido e adormeci sonhando com alguém que eu ainda não conhecia.

Os dois dias seguintes passaram rapidamente. Ajudei meu pai com os preparativos para a viagem e dei uma rápida passada na biblioteca para visitar o sr. Carter.

Finalmente chegou o grande dia e meu pai estava muito animado.

- Lizzie, deseje-me sorte! – ele subiu na carroça e tomou seu lugar.

Estarei torcendo pelo senhor! E tenho certeza que virá com um troféu quando voltar!

Aquele era o sonho dele e indiretamente era meu também, já que isso o faria extremamente feliz e a sua felicidade era o que me importava.

- Cuide-se filha! Logo estarei de volta.

Dizendo isso, tomou as rédeas e a carroça foi se distanciando na estrada.

Fiquei ali, parada na frente da casa, o vendo desaparecer no horizonte.


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Notas finais do capítulo

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