Angustiado.
Era a palavra certa para descrever o que apertava sem dó o peito do jovem no qual fora descrito como Executor. Aquele que matou um humano corrompido por bem de sua nação e fora mal julgado, chamado de assassino quando havia boas intenções. Ele se isolou. Ele achou que seria bom o bastante para cuidar das próprias trevas.
Ele estava errado.
Ele não podia retirar-se de sua própria escuridão e ela a puxava para baixo, juntamente da mão do humano corrompido assassinado. O loiro gritava e agonizava como se aquilo queimasse sua delicada pele, estendendo a mão para sua frente. Chung sabia que não havia salvação e alguma hora seria tragado àquele orifício sem fundo de seus pesadelos; era sempre o mesmo. Julgava-se um ser sozinho e desacreditava na capacidade de generosidade de outros. E seu pé era cada vez mais puxado, não importando o quanto este cravasse seus dedos sobre o chão branco do cenário também claro e sem fim que ali aparentava ser.
E mais uma vez estava errado.
Mesmo tendo as tais trevas o puxando, ele cessou o agoniar ao visualizar uma sutil pena branca diante de seus olhos. O dito Executor rodou os olhos azuis celestes marejados pelo local, até mirar algo mais em cima.
- Você não está sozinho... Por que não entende? - A voz daquela pessoa era doce e lhe passava firmeza e segurança. Vinha de uma garota de baixa estatura, vestes brancas e cabelos liláses; seu rosto estava sereno e havia asas grandiosas e angelicais brotando em suas costas. - Nem tudo está perdido.
Esta estendeu os braços e começou a se aproximar do loiro de maneira lenta e delicada, fazendo mais penas espalharem-se pelo local. A menina abaixou-se até a altura atual do Executor e tocou suavemente suas bochechas, mantendo os mindinhos em seu maxilar, levantando ligeiramente o queixo do mais novo. Limpou um rastro de pranto de seu rosto pálido com o polegar e depositou um beijo delicado sobre a franja dele. Penas e mais penas o tocavam, mas não lhe eram incômodas; sentia cada vez mais a paz preencher seu coração perturbado e suas trevas perdiam a força.
- Enquanto você estiver ao meu lado, as trevas não lhe causarão mal algum. - Os finos braços enlaçaram-se carinhosamente ao redor do pescoço de Chung, enquanto a menina depositava a bochecha rosada sobre o topo de sua cabeça. Suas trevas se afastavam depressa, causando grande ruído perturbador. - Eu continuarei sendo sua lâmpada, mesmo quando a escuridãote consumir.
O que era aquilo...? Aquela sensação calorosa no peito, aquele contentamento... Aquela euforia que o mesmo não sabia demonstrar, que descompassava sua respiração e fazia suas lágrimas engrossarem. Aquela paz... Aquele conforto... Fechou os olhos com força e abraçou aquele ser angelical, temendo perdê-lo com todas as suas forças. Se era ela sua salvação, desejava encontrá-la mundo a fora e fazer dela seu ponto seguro, não importando que fosse uma menina baixinha e simplória, ou teimosa.
- Chung... Chung...? - A roxinha o chamava. Porém, estranhava. Sua voz ecoava fraca e era como se estivesse distante. Assustado, Chung levantou o olhar e se espantou ainda mais ao vê-la se desfazer aos poucos em mais penas. Bateu-lhe desespero.
- ... Volte! Volte! - Ele gritava, tentando abraçar todas aquelas penas que escapavam livremente de seus braços. - Volte!! As trevas ainda estão aqui! - O loiro juntou as mãos no peito e curvou as costas para frente, podendo assim repetir tais palavras com toda a força e fôlego presentes em seu corpo. Ela não estava mais ali e o desespero crescia em seu peito só de pensar que as trevas poderiam engoli-lo novamente.
Porém... Um puxão em sua bochecha foi sentido.
Abriu os olhos e levantou-se depressa. Mais um pesadelo, Chung... Ele passou a mão em sua testa retirando a franja colada ao rosto por causa do suor e suspirou.
- ... Bom dia...?
Arregalou os olhos. Ao acaso aquela voz de seu sonho estava o seguindo? Fitou seu lado esquerdo e lá estava aquela mesma jovem, que abriu um sorriso caloroso ao notar seu olhar sobre si, mais uma vez repetindo a frase com animação. Chung ainda estava surpreso... A jovem existia; e denominava-se Aisha, a Mestra Elemental. Um sorriso curto e tímido brotou nos lábios finos do mais novo.
- Bom dia, senhorita Aisha. - Tratou-a com cordialidade e virou-se para se sentar lateralmente na cama. - O que a trás aqui hoje? - Pos uma das mãos sobre a cabeça da mais velha - que estava ajoelhada ao lado da cama -, e passou alguns dedos sobre os fios roxos. Tanta ingenuidade por parte dela... Enquanto ele havia sido obrigado a amadurecer mais cedo.
Ela inflou as bochechas emburrada. Sentia-se um pet recebendo agrado de seu dono após fazer algo fofo. Soltou o ar acumulado num suspiro, fechando os olhos. - Caham... - Retirou a mão do loiro de sua cabeça com cuidado e se levantou depressa. - Raven ajudou Rena a fazer um ensopado de carne com verduras. - Sorriu simplória. - Vim te chamar antes que o brutamontes ruivo coma tudo, mas... Eu interrompi alguma coisa? - Olhou-a curiosa, curvando as costas para fitá-lo bem de perto.
As bochechas de Chung ruborizaram de leve; ver aqueles olhos grandes e roxos fitando-o de perto... Era algo tão fofo e infantil... Ele riu, fazendo-a tombar a cabeça de lado confusa. - Não interrompeu nada... Eu já vou. Assim que eu me arrumar, já apareço no refeitório.
- Okaaaaay! - Disse com determinação. - Vou estar te esperando lá! - E lá se ia a pequena, retirando-se do quarto.
Ele a observou até que ela fechasse sua porta. Permaneceu alguns minutos sentado na beira da cama, acariciando os próprios cabelos. "Você será minha luz... Huun?" Deixou seu rosto ficar sem expressão por breves segundos e em seguida esboçou um sorriso bobo. Era maravilhosa a sensação de ter esperança em algo e sentir paz com isso, coisa que já não sentia há anos.Talvez ela realmente fosse um anjo oculto atrás do rosto bolachudo e infantil.
Levantou-se da cama e pôs-se a se arrumar, não tardando a ir ao encontro do anjo.
Seu anjo da guarda.