The Walking Dead - Rio de Janeiro escrita por HershelGreene
Notas iniciais do capítulo
Esta história se passa exatamente no mesmo período de The Walking Dead. Só que é contada no Brasil.
Não aguento mais essa escola. Eu sinto que nem deveria estar aqui. Gostaria de estar por ai, vagando sem rumo, acordando sem saber onde dormir, comendo o que vier pela frente. As pessoas se acostumaram demais com o conforto da sociedade e esqueceram o lado bom de viver como nômade.
Meu nome é Hugo Valdez. Tenho treze anos e moro na insuportavelmente quente cidade do Rio de Janeiro. Minhas principais características são meus cabelos castanhos e olhos verdes. Não precisa saber mais nada sobre mim. Além disso, tenho problemas de atenção e concentração. E luto contra uma maldita crise de tosse que me ataca a uma semana.
Estava na aula de história naquele momento, era um ótimo lugar para ficar relaxado já que o professor é surdo e mal vê. Tirei os olhos do quadro e comecei a prestar atenção na janela próxima à minha cadeira. Um enorme arco de pedra fechado com grades dos dois lados.
A rua que dava acesso à escola era uma das mais movimentadas da cidade, carros buzinavam e cuspiam rolos de fumaça, pessoas corriam pela calçada, bebês choramingavam nos carrinhos. Aquilo não era importante. As únicas coisas que importavam para mim eram Sophia e Gabriel, meus melhores amigos.
Procurei os dois com o olhar e encontrei Gabriel sentado, rabiscando em seu “manual de sobrevivência”. Ele é um daqueles paranoicos que acreditam que a sociedade irá ruir e todos irão para o buraco com ela. Sophia estava atrás dele e segurava um livro nas mãos com o título em um dourado ofuscante. Sophia era uma garota culta, lia mais livros do que eu podia contar. Os pais dela eram escritores de sucesso e forçaram a filha a ser inteligente igual a eles. Achei aquilo um absurdo. Você é livre para fazer as suas escolhas, não precisa ser forçado por ninguém.
Gabriel começou a conversar com Sophia e os dois discutiram logo depois. Ela achava que a paranoia dele pelo fim do mundo ultrapassava os limites e recomendara a ele um ótimo psicólogo. Cheguei mais perto para escutar mais:
- Você está delirando – disse Sophia – Isso é loucura!
Gabriel amarrou a cara.
- Você é uma despreparada – respondeu ele – Não aguentará quando vier!
Sophia revirou os olhos.
- Nada virá Biel – disse – Isso é tudo sua imaginação!
- Não, não é! – respondeu Gabriel, ríspido – Há milhares de teorias explicando o fim do mundo, Jesus disse isso na Bíblia. O mundo não vai mais durar. Está com seus dias contados.
Sophia chiou aos cochichos.
- Teorias?! Estamos falando de comprovações! Eu quero provas!
- Abra seus olhos e verá! Não acharam uma cura para o câncer ainda! Isso é apenas uma peça para a desgraça eminente!
Sophia abriu a mochila e tirou uma folha de jornal.
- Olha aqui seu pirado! – disse apontando para o jornal – Acharam sim a cura do câncer!
Até eu olhei assustado para o jornal. A primeira reportagem tinha uma gigante foto de uma cientista sorrindo para a câmera. Logo abaixo vinha:
Grupo de cientistas brasileiros consegue descobrir uma cura para o câncer
Ontem à Tarde o grupo de pesquisa da cidade do Rio de Janeiro, GPCRJ, conseguiu finalmente ultrapassar as barreiras do câncer e descobrir uma cura, que salvará milhões de pessoas. A cientista encarregada de cuidar das pesquisas relacionadas à descoberta da cura, Jayne Martin, deu uma entrevista exclusiva ao nosso jornal sobre os avanços da medicina.
Ela afirma que a vacina é 100% funcional e já está sendo distribuída por todos os postos de saúde do país. A própria presidente, Michelle Martinez, irá ao Rio de Janeiro numa festa organizada para celebrar esta conquista.
Gabriel já havia terminado de ler e olhava para o rosto dos amigos. Era incrível. Finalmente conseguiram descobrir uma cura para a doença. Eu já tinha perdido meus avós por isso. Olhei para o céu e tentei me convencer de que havia esperança.
Como eu estava errado.
Logo depois daquela cena, o sinal bateu estridente ressoando nas vidraças da classe. O professor pegou sua maleta e sumiu dentro do oceano de alunos que corriam para fora de sua prisão comunitária. Sophia e Gabriel me acompanharam e juntos descemos por uma escada secreta que apenas nós sabíamos.
O lado esterno da escola era protegido por uma enorme cerca de arame que circulava todo o perímetro do colégio. Os alunos saiam e entravam por dois portões de ferro fundido localizados nas laterais da propriedade. A frente da escola dava acesso ao prédio de escritórios onde a diretora e seus auxiliares cuidavam da parte administrativa do colégio. O outro prédio era formado apenas por salas de aulas e laboratórios. Os dois prédios eram ligados por uma sucessão de pontes que ziguezagueavam até o térreo.
- Isso nunca muda – comentou Gabriel olhando a vista da quinta ponte.
Sophia olhou com intensidade.
- O quê nunca muda? – perguntei.
- O progresso – respondeu ele – Pessoas como eu, que acreditam em tudo, sempre encontram algo para qual lutar. Uma razão pela qual viver. Mas a inabalável máquina do progresso acaba sempre por destruir este pequeno facho de esperança.
Não havia entendido nada. Olhei para Sophia.
- Ele quis dizer que o progresso sempre destrói as paranoias dos malucos.
Minha risada foi interrompida por um grito agudo e torturante que invadiu os terrenos da escola e balançou as pesadas janelas. Olhei para Gabriel e ele deu um pequeno sorriso.
- Isso sim vale a pena lutar – murmurou.
Sophia o olhou como se ele fosse louco. Os gritos aumentaram.
- Como assim?
- Este grito é o terceiro no meu grau de pânico – disse – E só pode significar uma coisa.
- O quê? – perguntei.
Os gritos se multiplicaram andares abaixo.
- Zumbis – respondeu Gabriel.
Foi a vez de Sophia dar um sorriso.
- Aqueles mortos-vivos que matam pessoas e devoram sua carne – riu ela – É patético.
Mesmo sendo cinco andares de distância, pude ver o que acontecia lá embaixo. Parecia que um aluno havia enfiado a boca na perna de uma das líderes de torcida e agora ela gritava muito. Havia algo errado. Ela sangrava muito. Parecia que o aluno a estava mordendo. Reparei nas pessoas que atravessavam a rua. Todas andavam com dificuldade e avançavam para a multidão de adolescentes parados no portão.
- Pessoal – disse – Temos que correr!
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