Divergente - por Tobias Eaton escrita por Willie Mellark, Anníssima


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Obrg pelos Reviews Lindos fiquei super feliz....

Para quem estava ansioso. Aí está um capítulo cheio de emoções...

Boa Leitura!!! Espero que gostem!



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Percorro os dedos sobre minha caderneta, constatando que passaram-se dois da luta entre Tris e Peter; dois dias em que tive de enfrentar Eric. Os machucados dela apenas estão começando a curar, mas é inevitável que eu a coloque para lutar hoje, sendo assim, sua melhor oponente é Myra, que perdeu todas as lutas.

Antes que os transferidos cheguem, eu listo no quadro-negro os que terão de lutar hoje, colocando o nome de Myra ao lado do de Tris e aguardo a chegada deles. Logo o pequeno grupo se aproxima e mando-os se posicionarem. A luta dela será a última, então, apenas me recosto na parede e finjo prestar atenção nas duas primeiras duplas.

Enquanto isto eu penso sobre nossa ida aos portões que dão acesso às fazendas da Amizade. É estranho que apenas os líderes do Destemor saibam as razões da necessidade de tanta segurança naquela região. A divisão da sociedade em facções não foi o bastante para manter a paz? Se sim, por que tamanha necessidade de proteção? Estamos protegendo o que e de quem? É difícil chegar à uma conclusão...

Conversei com Jane, mas é incrível que os guardas simplesmente não pensam sobre as razões de estarem lá. Eles só cumprem suas tarefas sem pensar. Alienados sobre o que quer que esteja acontecendo, mas não posso julga-los. Se não fosse eu ter descoberto os arquivos da Erudição, talvez ainda estivesse alheio de seus planos ao se aliar com o Destemor. Na verdade, o que me incentivou a investiga-los foi a quantidade e constância de tais mensagens. Não fosse isso, ainda estaria ignorante de tudo... Mas o que será que eles estão planejando?

Noto que a segunda luta terminou, e agora Tris já se dirige para o canto esquerdo da arena e começo a prestar atenção. Myra, com sua aparência sempre tão delicada, no canto direito. Ela é tão frágil que uma leve brisa a poderia derrubar. Não faz sentido ela ter escolhido esta facção...

O amor é realmente um sentimento complexo. Myra poderia ter continuado em sua facção ou escolhido outra que se encaixasse melhor com sua compleição, mas ao invés de tomar o caminho mais lógico, optou pelo Destemor e esta decisão provavelmente fará com que ela se torne uma sem-facção ao final da iniciação. E eu entendo que ela não fez isto porque sua personalidade é destemida ou por motivos semelhantes aos demais iniciandos. Ela escolheu o Destemor por causa de Edward, por amor à ele.

Meus olhos correm para Tris e para a luta que acaba de começar. Ela dirige um golpe certeiro, fazendo com que Myra desabe inconsciente no chão em pouco tempo. Dispenso o grupo e carrego Myra até a enfermaria – como fiz em todas as outras vezes -, olhando seu pequeno corpo em meus braços, acho que talvez eu tomasse a mesma decisão que ela se fosse para ficar perto de Tris.

Dentre os transferidos, Edward é o mais qualificado a se tornar um membro do Destemor. Ele não é burro e sabe muito bem que as chances de Myra conseguir ficar nesta facção são quase nulas. Não o julgo por tê-la deixado o acompanhar porque as facções nada sabem sobre os ritos de iniciação umas das outras e ele não poderia supor que haveriam lutas e exposições de risco à vida. Mas ao final, ele a deixará ou partirá com ela para o incerto destino de um sem-facção?

Se isso acontecesse com Tris, eu apenas seguiria meus planos já traçados antes de mergulhar no azul de seus olhos. Juntos, iríamos fazer nosso próprio futuro, independentes de facção.

*************************

Como é costume de todos os anos, parte da primeira fase da iniciação consiste na disputa de caça à bandeira. Max pediu para que Eric e eu disputássemos paintballs entre nossas equipes, para lhes aprimorar na competição e no planejamento estratégico, expressões que mim não significam outra coisa senão despertar mais rivalidade. Caso contrário, Lauren viria, e não Eric.

Já era tarde da noite quando entramos no quarto dos iniciandos. Eric fez questão de fazer as honras, com lanterna em punho, lançando fachos de luz no rosto de todos. Típico dele se sentir mais forte ameaçando os que julga mais fracos.

Entro junto com outros membros do Destemor e faço uma varredura visual no local. Fico desnorteado quando meus olhos se encontram com os de Tris e não é o fato dela estar me encarando que mais me perturba, mas sim, que esta conexão não possa ser rompida por minha vontade.

“Ficou surda, Careta?” - Eric diz e eu me sobressalto e olho rapidamente para outra direção. Na primeira oportunidade, saio e me dirijo para o lado dos trilhos esperando o resto do pessoal.

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Assim que Eric chega com os inciandos ele grita para que todos peguem uma arma de paintball.

“Tempo estimado?” - Eric pergunta.

"A qualquer minuto a partir de agora. Quanto tempo vai demorar para você memorizar a hora do trem?”

Ele olha ao redor e vê que os iniciandos estão prestando atenção em nossa conversa. - “Porque deveria se tenho você para lembrar?” - Ele diz enquanto empurra meu ombro de leve a fim de amenizar seu constrangimento.

Avalio que Tris precisará de ajuda para se equilibrar quando ela pular para dentro do trem e não quero que seja Al ou outro dos garotos a pessoa que irá ajuda-la desta vez, então, me antecipo e sou o primeiro a pular. Logo atrás de mim ela pula e eu a amparo firmemente, esquecendo seus machucados e qualquer forma de vida que esteja ali a não ser a ela.

Eu me foco na agitação do meu corpo contra o dela. Minha perna esquerda, parte da lateral do meu tronco e meus braços estão em contato com seu corpo e estremeço só de pensar em soltá-la, mas quando procuro seus olhos, buscando uma resposta sobre o que ela sentiu, vejo que não fui correspondido. Ela me solta e se afasta. Não agradece ou sequer olha em meus olhos. Sinto todas as minhas expectativas serem dissolvidas no ar. Qual é o seu problema? A raiva estoura dentro dos meus pensamentos. Quando Albert a ajudou, desajeitado e a machucando, ganhou um sorriso como agradecimento. Por que comigo é diferente?

Uma vez que todos já haviam pulado, começo a explicar que nos dividiríamos em dois times para a caça à bandeira. - “Cada time terá uma mistura de seis membros, iniciantes do Destemor e transferidos. Um time irá sair primeiro e achará um lugar para sua bandeira. Em seguida, o segundo time irá fazer o mesmo. Isso é uma tradição do Destemor então eu sugiro a vocês levarem a sério.”

“O que acontece se ganharmos?” - Pergunta alguém.

“Não parece o tipo de pergunta que um membro do Destemor faria.” - Digo segurando um riso. - “Você ganha, é claro.”

“Quatro e eu seremos líderes dos times. Vamos dividir os transferidos primeiro, não?” - Eric pergunta se dirigindo à mim.

“Você primeiro."

“Edward.” - Diz e não posso dizer que foi uma surpresa. Edward é o iniciando que mais se destaca. Não para os meus critérios, contudo. Eu me inclino contra o vão da porta, sorrio por dentro quando a vejo encurvada, certa de que será a última escolhida. Mal ela sabe que é minha primeira escolha.

“Eu quero a Careta." - Eu tive que falar isso, talvez pelo menos assim ela me olhe, nem que seja com raiva e é o que consigo. Ela olha para mim com uma expressão confusa.

“Tem algo a provar?” - Eric pergunta. - “Ou você está escolhendo os mais fracos para no caso de perder ter alguém para colocar a culpa?”

Ele não entende que isso não será um jogo de força bruta. Se trata de agilidade.

“Algo assim.” - Dou os ombros. Ela corou ao ouvir minha resposta. Deve pensar que a julgo incapaz. Não queria que ela me tivesse em tão baixa conta.

Dividimos os novatos e depois os iniciandos do Destemor. Eric está com um sorriso de orelha a orelha, então, paro para observar minha obra de arte – ele tem sorte de ter um amigo como eu, seu sorriso realmente ficou interessante depois do trato que eu dei.

“O seu time pode sair em segundo.” Diz ele.

“Não me faça nenhum favor.” - Permito-me sorrir um pouco ao lembrar sua expressão facial, na nossa última conversa. - “Você sabe que não preciso deles para vencer.”

“Não, eu sei que você irá perder não importa o quanto você desça.” - Responde irritado. - “Pegue seu time magricela e desça primeiro então.”

Depois que pulamos do trem, os iniciandos começaram a discutir um bom lugar para esconder a bandeira. Marlene que estava do meu lado, colocou uma das mãos no meu ombro, mas ao contrário do fogo que percorre minhas veias quando Tris somente me olha, nada sinto. Tris nunca precisou me tocar para causar sensações em meu corpo. Eu, por outro lado, procurei tocá-la só para ver se ela correspondia de alguma forma... É frustrante que até hoje eu não tenha notado qualquer alteração em seu comportamento comigo.

“Quando o seu time ganhou, onde vocês esconderam a bandeira?” -Marlene pergunta.

“Dizer a você não estaria realmente dentro do espírito do jogo, Marlene” - Digo e volto a pensar objetivamente na mão dela pousada em meu ombro e constato que somente sinto desconforto. Zeke já tentou me empurrar para encontros com algumas garotas do Destemor, mas sempre recusei. Afinal, fui criado na Abnegação e isso é considerado luxúria por lá.

“Vamos lá, Quatro.” - Ela me dá um sorriso galanteador achando que por ser bonita eu cederei, mas eu me limito a tirar sua mão de mim, primeiro porque não estou interessado nela e depois porque não quero que Tris pense que estou alimentando este comportamento de Marlene. Se ela já não reage a mim mesmo eu dando mais atenção à ela do que qualquer outro novato, pior será se pensar que sou um safado.

“Porto da Marinha, meu irmão esteve no time vencedor. Eles esconderam a bandeira no carrossel.” - Uriáh diz.

“Vamos lá então.” - Sugere Will.

Dito isto, todos seguiram para o leste, em direção ao pântano. Andamos sobre as pontes e quando estamos prestes a chegar, Marlene liga a lanterna. Antes, porém, de manda-la desligar, Uriah irmão de Zeke fala algo e ela faz por conta própria.

Ao passarmos pela roda-gigante, olho para o topo. Meus pensamentos me conduzem à minha paisagem do medo e começo a ficar com um nó na garganta. Prosseguimos caminho. Já no carrossel, tiro a bandeira do bolso.

“Em dez minutos o outro time escolherá sua localização, eu sugiro a vocês que tomem esse tempo para formar uma estratégia. Nós podemos não ser da Erudição, mas preparação mental é um dos aspectos mais importante.” - Eu digo.

“Algumas pessoas deviam ficar e guardar e algumas pessoas deviam sair e vigiar a localização do outro time.” - Diz Will pegando a bandeira da minha mão.

“Sim? Você acha?” - Marlene toma a bandeira de sua mão.

Sei que esta discussão demorará, já vivenciei o mesmo no ano anterior, portanto, tento me fazer mais confortável para aguardar até que ela termine. Encosto-me no carrossel e elevo meus olhos para o céu sem estrelas, e por alguns instantes consigo me afastar da confusão do grupo ao lado ao mesmo tempo em que consigo evitar encarar Tris como se fosse um alucinado.

Ela sequer me olhou... Cada vez é mais certo que ela não sente absolutamente nada por mim. Sou apenas um instrutor que não é digno de seus sorrisos, de suas palavras, de seus toques e nem de seus lindos olhos azuis.

Suspiro e olho em volta a procurando porque ela pode ser indiferente à mim, mas eu fico melhor só de olhá-la. Mas ela não está aqui e fico meio desesperado porque todos ainda estão discutindo, menos ela. Saio andando próximo ao cais e a vejo colocando o primeiro pé na escada da roda-gigante. Esta garota não pode ser normal. Parece que eu não estava brincando quando disse que ela tem habilidade de tomar decisões erradas.

“Tris.” - Falo baixo e calmo porque não quero assustá-la. Ela poderia cair. Pensar nisso me causa um estranho arrepio na espinha.

“Sim?” - Ela pergunta.

“Eu vim para descobrir o que você acha que está fazendo.”

“Estou procurando por um ponto mais alto, eu não acho que estou fazendo nada.” - Ela é muito esperta como eu tinha pensado. O que Tris não possui em força física ela supera em inteligência.

Eu não acredito que estou prestes a fazer isso, mas tenho certeza que valerá à pena.

“Tudo bem. Eu estou indo.” - Falo sorrindo.

“Eu ficarei bem.” - Certamente que ficará, não digo o mesmo de mim, estando longe de você.

Talvez esta seja minha oportunidade de conversar com a garota e tentar ser seu... amigo? Não. Essa palavra me incomoda porque limita a vastidão do que quero com ela.

“Não tenho dúvidas disso.” - Respondo para que entenda que confio em sua capacidade. Só quero ficar com ela.

Eu escalo me movendo mais rápido que ela. Tris é pequena e tem que subir mais devagar, de modo que quando me aproximo dela já estou sem fôlego. Tento me focar nela, mas o meu medo me consome pouco em pouco.

“Então me diga...” - Eu começo uma conversa para me distrair. - “Para você, qual o propósito desse exercício? O jogo quer dizer, não a escalada.”

“Aprender sobre estratégia.” - Ela começa a falar descrente do que diz. - “Trabalho em equipe, talvez.”

“Trabalho em equipe."

“Talvez não, trabalho em equipe não parece ser uma prioridade no Destemor”

O vento bate mais forte e começo a ficar nervoso.

“Deve ser uma prioridade. Costumava ser. Agora me diga... O que você acha que estratégia tem a ver com... bravura?”

“Isso... te prepara para a ação. Você a aprende para usá-la.” - Ela responde, mas quase que não estou conseguindo prestar atenção. A altura é imensa, estou com falta de ar e ela consegue falar normalmente. - “Você está bem, Quatro?”

“Você é humana, Tris? Estar a essa altura... Isso não te assusta?”

Uma rajada de vento colide em nós, estou estável graças ao meu corpo e peso. Já ela é balançada para a direita e, sem pensar, apoio minha mão em um dos seus quadris, para dar-lhe equilíbrio, mas sou pego de surpresa quando encontro uma tira de pela delicada e fria, exposta pela bainha de sua camisa que subiu um pouco. Mil sensações atravessam meu corpo. Eu a aperto e a estabilizo, empurrando-a gentilmente para a esquerda, e relutando tiro minha mão dela.

“Você está bem?” - eu pergunto, sentindo dormência no local em que minha mão a tocou.

“Sim.” - Ela responde tensa e eu penso que finalmente deve ter ficado assustada com a altura. Ela recobra rapidamente controle sobre si e continua escalando. Eu a imito, tentando me concentrar no que estou fazendo: mãos, escada, impulso, pés. Até meu medo de altura é preferível à este desejo de tocá-la novamente porque isto não é uma opção se ela obviamente também não deseja.

Ela se senta em uma das plataformas e me deixa espaço para sentar ao seu lado, mas não o faço. Tenho medo desse coisa toda desabar conosco aqui em cima. Eu me agacho e respiro fundo.

“Você tem medo de altura.” - Ela conclui. - “Como você sobrevive ao Complexo do Destemor?”

“Eu ignoro o meu medo. Quando tomo decisões, finjo que ele não existe.”

Ela me encara por muito tempo e isso me deixa louco para saber o que ela está pensando.

“O quê?” - As palavras escapam por minha boca.

“Nada.” -MEla responde, olhando para longe da cidade e se concentrando naquilo. Eu, por outro lado, me concentro mais nela do que na altura em que estou e de certa forma isso ajuda.

“Nós não estamos alto o bastante, eu vou escalar.” - Ela diz determinada.

“Pelo amor de Deus, Careta?” - Digo frustrado e nervoso. Não quero mais subir. Vir até aqui me custou mais esforço do que eu imaginaria quando saímos do Complexo em direção à esta prova. Eu sabia que teríamos que ficar no escuro, esperar e tentar superar a outra equipe, mas nem nos meus sonhos mais malucos eu poderia supor que acabaria com Tris, no alto de uma roda-gigante só para ganhar um jogo que não preciso. Não sou mais um iniciando!

“Você não tem que me seguir” - Ela fala enquanto olha o labirinto de barras acima de nós, como se tivesse ouvido meu breve ataque mental de histeria.

“Sim, eu preciso.” - Digo após respirar fundo. Preciso estar aqui porque Tris está. O meu benefício nesta prova é sua companhia e garantir que ela retornará em segurança ao solo. Ignorar o medo, Tobias. Você precisa ignorar seu medo, eu repito para a ideia ser gravada em mim, ou pelo menos para me incentivar a continuar.

Subimos mais alto dessa vez e eu me concentro em acompanhar sua escalada para fazer o mesmo que ela. Agarro uma das barras com cada mão e me impulsiono para cima, mas sempre abaixo dela. Então ela para e olha para o horizonte. Vejo um sorriso brincar em seus lábios, deixando sua feição ainda mais bela. Ela parece estar orgulhosa de algo.

“Vê aquilo?” - Ela fala apontando. Paro de escalar, me aproximo dela, quase a abraçando por trás, considerando que fiquei posicionado com o peito contra suas costas e o meu queixo próximo à sua orelha. Percebo que poucos centímetros nos separam.

Quando olho por cima de seu ombro - na direção em que ela me indicava – noto uma luz tremulando ao longe. A arrogância deixou Eric descuidado.

“Sim. Está vindo do parque no fim do cais, faz sentido, está cercado por espaço aberto, mas as árvores providenciam alguma camuflagem, obviamente não o bastante.”

Eu poderia simplesmente me afastar e começar a descer, mas aqui, nesta posição, não sei o que mais me deixa sem fôlego: os centímetros que me afastam dela ou os metros me separam do chão. Suportar os dois exigem todo o meu autocontrole.

“Certo” - Ela diz enquanto me olha. - “Hm, comece a descer, eu te seguirei.”

Aceno e começo a descer facilmente. Quando estou próximo do chão escuto um barulho e olho para cima. Algumas barras caíram e ela não conseguirá descer sem ajuda, mas eu não posso subir também. Não há mais nada em que me segurar para escalar. Acalme-se, Tobias. Desespero não a salvará e você precisa tirá-la de lá. Olho ao redor procurando qualquer saída para descê-la em segurança.

“Quatro!” - Ela grita e isso parece estalar algo dentro de mim. É a única saída. Deus, me ajude!

“Segure-se, só segure-se tenho uma ideia.” - Digo e já desço correndo em direção ao painel de controle do brinquedo. Aperto os botões e nada acontece. À esta altura, minhas mãos tremem. Arranco a placa de metal e agradeço o fato de que eu possua algum conhecimento de eletrônica, pois junto os velhos fios soltos, fazendo-os soltarem faíscas que reanimam instantaneamente a roda-gigante. Tento frear a roda, mas não surte efeito. Tris nota que a roda não parará e por isso se joga no chão, se desviando dos andaimes.

Corro até ela que está deitada no chão com as mãos pressionadas contra o rosto. Envolvo minhas mãos em torno seus pulsos para vê-la.

“Você está bem?” - Pergunto segurando sua mão entre as minhas.

Ela me responde que sim. Um sim que mais pareceu um suspiro de alívio que eu também sinto. Isso me faz rir e ela me acompanha num riso que mistura alegria e nervoso. Até que enfim, pensei que só Al, e Will merecessem esse sorriso.

Com a mão livre ela se apoia para sentar e, então, ficamos mais próximos que antes e o conhecido calor - que sinto sempre que a olho ou estou perto dela – desce como uma lava por meu corpo. Por mais que eu queira ficar assim com ela, os outros não entenderiam isso caso viessem até aqui, portanto, me levanto, trazendo-a comigo.

“Você deveria ter me dito que a roda ainda funcionava.” - Ela fala casualmente. - “Nós não teríamos que escalar em primeiro lugar.”

“Teria se soubesse, eu não poderia deixar você pendurada lá, então arrisquei.” - Claro que eu não a deixaria presa lá em cima. Não gosto nem de pensar em que poderia ter acontecido se a roda não tivesse funcionado.

“Vamos lá, hora de pegar a bandeira deles.” - Hesito a princípio - hoje mais cedo quando a ajudei no trem ela não parecia disposta a aproximação -, mas, depois de tudo que aconteceu, não custa tentar. Seguro a parte interna do seu cotovelo, sorrio para ela e a guio para o carrossel.

O resto da equipe continua inerte, sentada ou escorada no carrossel, ostentando olhares mortos. Não fizeram nada, como se esperassem que a bandeira da equipe concorrente se materializasse diante deles. Sorte eles terem Tris em sua equipe.

“Para onde os outros foram?” - Pergunto assim que me aproximo

“Você ligou a roda? Que diabos você estava pensando? Você também poderia ter gritado ‘Nos estamos aqui venha nos pegar’ Se eu perder novamente a vergonha será insuportável. Três anos consecutivos?” - Como se ela não fosse capaz de perder este jogo sozinha. Deveria agradecer Tris porque agora terá pelo menos uma chance de ganhar.

“A roda não importa, nós sabemos onde eles estão!” - Eu digo

“Nós?” - Christina pergunta olhando de Tris para mim. Não entendo seu olhar, muito menos consigo imaginar o que ela pensa sobre nosso sumiço. Não me importa, de qualquer jeito.

“Sim, enquanto o resto de vocês estava girando seus polegares, Tris escalou a roda-gigante para ver o outro time.” - Eu estou tão animado e nem sei se é só por causa disso.

“O que nós fazemos então?” - É, eu não tinha pensado nisto. Talvez Tris tenha ideia do que poderemos fazer agora, já que até aqui seguimos seu plano. Olho para ela e espero.

“Dividir ao meio.” - Ela responde determinada após pensar por alguns segundos. - “Quatro de nós vão para o lado direito do cais, três para o esquerdo. O outro time está no parque no final do cais então o grupo de quatro irá atacar enquanto o de três se esgueira e pega a bandeira.” - Eu sinto um certo orgulho ao ouvi-la. A garota é incrível!

Todos concordam e enquanto Tris, Christina e Uriah, saem sem ser notados, nós atacamos pela frente como uma distração. Como Tris havia planejado, a bandeira ficou totalmente desprotegida e quando ouvimos o grito de Christina com a bandeira em mãos, todos correm em sua direção e a levantam nos braços.

Depois de que Uriáh dá um leve tapinha de aprovação em seu ombro, Tris fica um pouco afastada do grupo animado. Eu ando até ela, passo por Eric que está bufando, não me controlo e acabo sorrindo. Toco de leve no ombro de Tris. - “Bom trabalho.” - Eu falo e saio assim que seus amigos vêm parabeniza-la.

No trem eu não me controlo e aproveito para fazer piada com Eric que está com uma cara de poucos amigos. - “E aí Eric, o ruim é que agora, você, é quem não tem ninguém para colocar a culpa, não é mesmo?”

Seus olhos faíscam de raiva e ele morde o lábio inferior com força. - “Sorte. Todo mundo tem um dia de sorte na vida.” - Diz despeitado e sai.

Tris está sentada, rindo com Uriah, Marlene, Christina, Al e Will e eu queria fazer parte desse quadro. Rir com ela e não apenas observá-la de longe. A alegria que seu sorriso me traz é indescritível, aquece meu coração e sinto vontade de sorrir também.

Eric falou em sorte. Realmente, só que a minha sorte não foi ter vencido o jogo, mas Tris ter escolhido o Destemor, como eu. De poder - todos os dias - me perder em seus olhos, ouvir sua voz, ver seus sorrisos e quase explodir de felicidade quando nos tocamos, mesmo que a iniciativa sempre parta de mim.

Sempre imaginei que eu não tinha um lugar no mundo, que não pertencia a nenhuma facção, desde que decidi abandonar a Abnegação. Hoje eu sei que se ela pertence ao Destemor é lá que, por enquanto, devo ficar também.


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Notas finais do capítulo

E aí gostaram???
Espero que tenha ficado bom!!!!